FRANCISCO PROENÇA GARCIA

A IMPORTÂNCIA DAS INFORMAÇÕES
na condução da guerra em Moçambique (1964-1974)

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Conclusão
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Na guerra revolucionária, as populações (aquém e além do artificialismo das fronteiras) constituem o objectivo principal, pelo que para o Poder português era forçoso o seu conhecimento e respectivo accionamento; logo, também, dos mecanismos informais de comunicação que transcendem as fronteiras clássicas, revestindo-se de importância extrema, no contexto de Moçambique, o sócio-religioso, pois potencializado pela presença de muito largas comunidades muçulmanas.

Para compreender e accionar aqueles mecanismos informais na sua concepção global de defesa, o Poder português teria carecido, logicamente, de deter o completo conhecimento do panorama religioso; das estruturas familiares e dos seus elementos dominantes, ou das legítimas (nem sempre as legais) autoridades tradicionais; nomeadamente, na generalidade, de como funcionavam os canais de comandamento e accionamento, para, no mínimo, serem perceptíveis numa carta de situação quais as trajectórias utilizadas pelas acções do In, pois não há subversão/contra-subversão que não use ou não vise itinerários humanos .

Nesta ordem de ideias, o Poder, através das suas estruturas, designadamente de Informações, efectuou diversos estudos e difundiu-os aos vários escalões com capacidade para actuação sobre as populações. Porém, estes trabalhos acabavam por ter pouco impacte e ressonância na rendibilidade das Operações (portanto ao nível táctico); era como se os conhecimentos da Informação se perdessem no trajecto das cúpulas para os Sectores e destes para os escalões inferiores. Além do mais, os diversos organismos que trabalhavam as Informações dependiam de tutelas diferentes, existindo ainda canais informais como Jorge Jardim; surgiam pois falhas que induziam muitas vezes o Governo Central em erro, relativamente a várias situações. Aquelas falhas deviam-se sobretudo a uma inadequada (ou mesmo ausente) coordenação do esforço de pesquisa e a uma disfunção na análise global, com consequências graves para a viabilidade de uma basicamente fraca Acção Psicológica . Assim, face ao elevado grau de importância da resposta em tal âmbito, teria sido necessário o Poder português, reservar para si, nesta guerra, o controlo total e unificado do binómio Informações/Acção Psicológica.

O Clero Católico, que na ordem política, mas mormente no terreno, se identificava profundamente com o “Poder Colonial”, na sequência do Concílio Vaticano II e durante a guerra procurou diligentemente “descomprometer-se”, como já antes alguns Prelados vinham fazendo em Angola e Moçambique. Certos elementos enveredavam por excessos nesse aggiornamento , revelando-se contrários à soberania portuguesa no território; hostilizando a Administração Portuguesa e as Forças Armadas nas homilias; chegando a colaborar no fornecimento de Informações e no apoio logístico às guerrilhas em operações (nestas práticas, sobretudo padres estrangeiros).

As Missões protestantes (responsáveis, através da sua actividade educativa, pela formação de vários elementos das futuras elites da FRELIMO) eram dominadas por estrangeiros e mostravam franca hostilidade à soberania portuguesa; apoiavam também logisticamente e em Informações todos os movimentos independentistas; desenvolviam campanha internacional contra Portugal e a sua política ultramarina; algumas confissões prestavam apoio e controlavam diversas seitas nativas cristãs, nelas estimulando orientação nitidamente contrária aos interesses portugueses.

As comunidades muçulmanas de Moçambique, detiveram um papel muito particular na guerra desencadeada em 1964 pela FRELIMO. Assim, o Poder português (que sofria por parte das comunidades muçulmanas resistências activas e passivas, oriundas sobretudo da própria natureza do Islão), compreendendo o fenómeno (e porque era necessário controlá-lo conforme as circunstâncias permitissem ou determinassem), teve a necessidade de estudar as massas islamizadas para pelo menos neutralizar as influências “nefastas” sobre elas, pois, mesmo verificando-se que a maioria das populações islamizadas do Norte se conservava fiel à soberania portuguesa, cremos que o Islamismo era para combater se ; era para prevenir entretanto ; era para aproveitar sempre que !.

Entre 1968 e 1972 as comunidades muçulmanas, após certa hesitação inicial, integraram o esforço contra-subversivo da Administração, após o que entraram em retracção cautelar até 25 de Abril de 1974. A aliança das etnias islamizadas com o Poder português era, no fundo, de conveniência, sem paralelamente deixar de constituir sinal de coerência, porquanto, sendo espiritualista o Islão, seria “contra-natura” a aliança com o recorte ideológico da FRELIMO.

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