Na época da Paz de Versalhes, era pelo grau de civilização que se aferiam as nações, entendendo-se por civilização a do Ocidente. Por este motivo, só eram admitidas na Sociedade Internacional “(...) e como parte desta, as que as demais julgassem como seus pares (...)” (1).
No Tratado de Versalhes, a Alemanha renuncia a todos os títulos e direitos sobre as suas possessões além-mar, sendo as colónias alemãs partilhadas pelas principais potências aliadas e associadas. Assim, se Berlim foi a primeira partilha da história colonial, Versalhes terá sido a segunda.
Até esse momento, a função dos territórios coloniais era a de equilibrar as forças e os interesses entre as potências do concerto europeu. Com a criação da Sociedade das Nações, surge o sistema de mandatos sobre o território dividido do Império Colonial Alemão, mostrando-se, desta forma, que o “novo organismo” não se desinteressou da política colonial. Na realidade, é a partir do seu Artº.12º que vem a organizar-se a comissão permanente de mandatos, apontando, assim, para uma internacionalização da colonização ou, de acordo com Franco Nogueira, “(...) procurou-se desta forma institucionalizar o fenómeno colonial (...)”(2).
À Sociedade das Nações coube a missão de regular a entrega e fiscalizar a forma como os mandatários cumpriam o seu papel, estabelecendo-se no Artº. 22º do Pacto três tipos de mandatos, designados por A, B e C, cada um para situações diferentes.
Definiu-se uma nova era da política colonial, onde se reflectiam não só os impulsos idealistas mas também os interesses materiais, uma vez que se, por um lado, se pretendia o bem estar, a protecção e o estímulo do progresso dos aborígenes (objectivo interpretado como em função do interesse da comunidade internacional), por outro pretendia-se a afirmação dos objectivos políticos nacionais, dado que a dependência cessava logo que as colónias se encontrassem aptas para se regerem por si, “(...) nas condições particularmente difíceis do mundo moderno (...)”(3). Com este sistema, iniciou-se a “(...) fiscalização internacional da Gestão Ultramarina (...)”(4).
Versalhes consolidou a situação colonial vinda de trás, com a correcção devida ao desaparecimento das colónias alemãs distribuídas pelas potências vencedoras, pelo que a Sociedade das Nações estava longe de ser anti-colonialista (5). Podemos mesmo dizer que considerava a acção colonial como civilizadora.
Em 1935, a imprensa europeia começou a noticiar referências quanto à possível utilização das colónias portuguesas como moeda de troca para a satisfação das necessidades coloniais alemãs e italianas. A 4 de Dezembro de 1937, a imprensa lisboeta fez referência a possíveis negociações entre a Inglaterra e a Alemanha para a entrega de uma parte de Angola à última. A opinião pública portuguesa reagiu de imediato (6). Na sua memória ainda permaneciam as negociações secretas para partilha de parte do território colonial entre as potências referidas, quer em 1898 quer em 1912-1913, respectivamente.
A potência continental, por necessidades económicas, reclamava a restituição integral das suas antigas colónias de África, não tendo qualquer pretensão sobre outros territórios. Mas logo “(...) houve quem pensasse em aplacá-la pela entrega de possessões de outros países menos carecidos de «espaço vital» (...)” (7).
A Inglaterra, ao mesmo tempo que negava as negociações sobre territórios portugueses, dialogava com a Alemanha uma redistribuição das colónias no território da Bacia do Congo (à semelhança do Acto Geral de Berlim). Assim, restituir-lhe-ia só algumas ex-colónias, mas compensava-a “(...) pelo livre acesso às matérias primas na bacia convencional do Zaire (...)” (8).
Sobrevieram os problemas dos Sudetas e da Áustria, caducando desta forma o projecto inglês.
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(1) Franco Nogueira, “O Juízo Final”, pág. 166, Editora Civilização, 2ª edição Porto, 1993.
(2) Idem, “Portugal Ultramarino Perante a ONU”, pág. 43, em “Conferências Proferidas em 1958/59”, 1º vol., Instituto de Altos Estudos Militares, Lisboa.
(3) Nº 1 do Art.º 22º do Pacto SDN.
(4) Franco Nogueira, “Portugal Ultramarino Perante a ONU”, pág. 44.
(5) Idem, ibidem.
(6) Marcello Caetano, “Portugal e a Internacionalização dos Problemas Africanos - História duma Batalha: da Liberdade dos Mares às Nações Unidas”, pág. 228.
(7) Idem, pág. 219.
(8) Idem, pág. 239. |