TERESA FERRER PASSOS

Lei injustificada numa sociedade aberta

 A pretensão de levar à discussão na Assembleia da República (conforme foi defendido pelo Primeiro-Ministro, recentemente) a questão do casamento “de jure”, ou seja, de direito, dos homossexuais, não deixa de causar espanto e perplexidade.  

É que não se trata de uma legislação para pôr fim a uma situação injusta. Não se trata de legislar novas leis a favor de excluídos como os pobres, as mulheres que não têm as mesmas oportunidade profissionais, os deficientes cujas diferenças físicas não são respeitadas eficazmente. 

O objectivo da discussão do casamento dos homossexuais é legislar a favor da possibilidade de poderem contrair um contrato de casamento idêntico ao casamento com as suas estruturas normalmente seguidas. 

A homossexualidade como união livre de dois homens ou de duas mulheres não sofre na sociedade portuguesa de qualquer sanção jurídica. Não consta que haja discriminação no emprego, na habitação ou nos direitos cívicos, caso um indivíduo tenha comportamentos íntimos não consentâneos com a estrutura social vigente. 

 Trata-se de um assunto do foro pessoal ou íntimo e se ninguém é prejudicado com isso, é impossível que qualquer lei possa evitá-lo. Ninguém deixou ainda de ter esse comportamento sexual, se o desejou no seu foro íntimo. 

 Ninguém o pode impedir, se não ofende a integridade de outra pessoa, porque esta não só o consente como o deseja. Ninguém sofreu qualquer discriminação social por esta prática aberrante, e digo aberrante por não ser natural (nem mesmo está de acordo  com os códigos da maioria dos animais irracionais). Pelo sentido provocador que tem esta pretensão, em qualquer sociedade, a união de duas pessoas do mesmo sexo não pode equiparar-se a um casal que tem uma legitimidade jurídica na comunhão das suas vidas dada pelo casamento religioso ou civil, ou mesmo a uma união de facto.  

A pretensão de se legislar a favor do casamento de pessoas do mesmo sexo não tem qualquer justificação aceitável. Trata-se de uma questão que foi levantada por uma escassa minoria de pessoas cujo principal motivo de legalização jurídica é usufruir de direitos patrimoniais e de descendência artificial (como a consequente adopção de crianças procriadas por casais heterossexuais). 

 Quando alguém diz que discorda do estatuto de casamento de pessoas do mesmo sexo, di-lo porque este estatuto respeita a uma figura jurídica consignada como sendo apenas uma comunhão entre duas pessoas de sexos diferentes. Este ponto é  a primeira condição que fundamenta o contrato jurídico de um casamento, que se pauta por uma ligação afectivo-sexual recíproca, uma comunhão de vida entre um homem e uma mulher. Por isso, casamento só existe entre um homem e uma mulher. 

A vida em comum de pessoas do mesmo sexo não implica (nunca implicou) um estatuto jurídico, porque não exige compromissos mútuos e a complementaridade de sexos diferentes. Logo, como chamar casamento a uma ligação cuja base consiste em duas pessoas viverem em união, como se fossem marido e mulher, mas tendo o mesmo sexo e não sexos diferentes? E aqui é que está o cerne do problema. 

Pretendem os adeptos do casamento homossexual defender que não são duas realidades diferentes. Esquecem que, na essência, não há nenhuma correspondência efectiva. Daí criarem uma questão falaciosa, mais do que falaciosa, uma enganadora questão. Deste modo, o estatuto social do casamento até hoje aceite como tal, é gravemente ofendido porque esta figura jurídica é, na sua fundamentação ética, uma ligação entre sexos diferentes o que, em consequência, permite ainda a constituição, na maioria dos casos, de uma nova geração de seres (caso do casamento tenham resultado filhos).  

A coabitação “marital” de homossexuais é uma deformação social extravagante, numa sociedade ansiosa por encontrar novas maneiras de se identificar em relação ao passado. Só quando se insere em esquemas e falácias deste jaez é que uma sociedade exorbitante nos comportamentos julga ter chegado à inovação. Mas esta inovação está inquinada de imitações que negam a própria capacidade criatividade do ser humano. 

A imitação vai ao ponto de utilizar a própria vida afectivo-sexual da instituição do casamento. Quer apropriar-se dela para atingir fins pouco claros. Todos estes esquemas defensores de um sistema em que se impõe a diferença são falaciosos. Os caminhos desviantes em que querem prosperar conduzem ao que pode haver de mais pernicioso na sociedade humana, a não conseguir escapar dos rumos que levam à angústia e ao desespero.  

 Uma sociedade pode ser uma sociedade aberta, democrática e de direito, sem ter de consentir em tudo quanto a nega nos seus fundamentos, nos seus valores maiores, os quais a maioria dos seus cidadãos não põe em causa.

 Lisboa, 10/2/2009                                                                    Teresa Ferrer Passos

 

 

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