A água, a flor e o lume, as variações do hipocampo,
a Estela Guedes falando de Herberto Helder.
Estávamos em Silves, a noite era fria, a aragem límpida,
o vento lúcido.
Ao longe, um incêndio.
Nas golfadas de aroma, a noite primitiva e só respirava,
entre a sílica e o açúcar,
num longo canto, onde o odor se inclinava,
em montanhas claras, hialinas.
Nas têmporas, a luz irradiava.
Nas grandes árvores do cérebro, a ânsia era a seiva e a flor,
sobre os muros cálidos, brancos, as glicínias amenas,
e as buganvílias exuberantes.
Nas variações da lua endógena, a terra era o cântico,
o fulgor, o oceano do sangue.
A água era a fonte, onde os leões bebiam a sua sede,
a noite era um violino.
Ao longe, um deserto brilhava, entre âmbar, rolas,
neblinas, canteiros verdes.
Nas galáxias da escuridão, as palavras irrompiam,
longas, como fábulas.
Num copo cheio de música, a poesia era um ancoradouro
branco, na Fábrica do Inglês,
entre artefactos de cortiça e a maquinaria antiga.
No silêncio, coberto limões repletos, o céu floria.
Entre o hipocampo e a amígdala, o vento era roxo,
a noite fria.
Nas metáforas da seiva, as metáforas da vida,
os hibiscos de lume,
a lua coberta de crateras, órbitas fendidas,
aquedutos brancos.
No cérebro, em pedúnculos de sílabas,
oscilavam membranas cor de pérola.
|