Esplêndida é a palavra, o plasma, o alimento do poema,
a sua luz feita de gestos simples, quotidianos.
Esplêndida é a palavra e o seu sangue de leite e romãs.
Por vezes entre rimas ancestrais,
os pássaros gritam, atordoados, no silêncio da noite
e a poesia é uma musa coroada, um objecto de ternura.
Nas arcas leves do sonho, um fulgor dionisíaco desprende-se,
entre vestígios de caravelas, especiarias.
E as palavras rescendem, desprendem o seu aroma sempre
vivo,
nas telas, nas cores, nos violinos, nas quimeras azuis.
Sobre harmonias versáteis de pintura e poesia,
um vertiginoso fulgor coroa as pombas, os limões,
entre as sombras coloridas pintadas, nas arcas leves do sonho.
Esplêndida é o corpo, a luz do poema, a sua fronteira azul.
Dela despertam velas, memórias,
roteiros íntimos de secretas viagens.
A poesia é um objecto rasgado na inocência,
na sua polpa doce,
a sua seiva é a seiva gloriosa das vinhas do silêncio.
Os dias são de seda e os seus instantes são sombras
de veludo;
as suas iridiscências fundam no amor o seu reino
de música e perfume, dança de pássaros ébriados,
sobre páginas enrugadas,
alisadas,
resgatadas ao tempo,
em harmonias claras
de ardor e melancolia.
Lisboa, 20-11-2005
Maria do Sameiro Barroso
In Mealibra, Caligrafias, Separata, Organização Maria João Fernandes, Colaboração Gonçalo Salvado, III Série Nº17 Inverno 2005/2006 –Centro Cultural do Alto Minho, p. 24.
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