O acesso rápido e fácil à Informação é uma das marcas indeléveis dos tempos que vivemos.
A Biblioteca acessível a todos, sem distinção de cor ou credo, de idade, sexo ou local de residência e defensora de uma concepção dinâmica e ampla de informação é hoje uma instituição crucial para o desenvolvimento sócio-cultural, e deve ser vista tanto como instrumento de fortalecimento cultural como da Democracia.
Se hoje ainda existe um défice de informação, é um défice cultural e se este é, por sua vez, um défice de democraticidade e de exercício de Cidadania, a Biblioteca ocupa hoje um espaço central no desenho de qualquer política sócio-cultural e educativa. A Biblioteca pode constituir-se num recurso de enorme alcance e contribuir para inibir ou impedir a proliferação de novas assimetrias sociais.
A Biblioteca poderá ser, ao lado de outros, um lugar privilegiado de acesso à informação que assegure, directa ou indirectamente, uma participação cívica e uma experiência cultural mais efectiva dos cidadãos, contribuindo para a preservação da qualidade de vida em todos os aspectos, desde o educativo, industrial, económico, científico e cultural.
As bibliotecas "tradicionais", eram lugares fechados, reservados apenas para alguns, que nos impunham regras de comportamento, alimentavam-se de si próprias e desdenhavam do utente. Este panorama aos poucos vai mudando, e hoje as bibliotecas estão directamente envolvidas na procura de auto-soluções, que é feita com outros agente, onde o próprio utilizador/utente é chamado a opinar e a própria comunidade é convocada a reflectir.
As bibliotecas abriram-se a novos valores e a novos usos, onde se redefiniu um vasto conjunto de novos desafios. De lugar restrito de leitura passou a instrumento de amplo acesso de à Informação, de espaço de isolamento transformaram-se em espaços de interacção.
Hoje, a Informação e as ideias constituem necessidades humanas básicas onde os cidadãos, como já referi, independentemente da raça, credo ou posição económica, devem ter acesso a esta de uma forma livre e igual. Para tal as bibliotecas devem disponibilizar livremente todos os registos da experiência humana, promovendo e preservando o livre fluxo de Informação e ideias. Como nos diz Saramago[1], "a leitura deve ser um acto de satisfação e não de obrigação, o desafio perante as bibliotecas é o de se apresentarem como lugares onde as necessidades culturais de leitura e de acesso à Informação podem ser satisfeitas, de um modo atractivo e com prazer".
Em suma, as bibliotecas devem empenhar-se na recolha e divulgação do património documental, assim como facilitar o acesso à educação, à informação e ao conhecimento, onde a Informação de ser vista como um Direito Fundamental da Humanidade.
Poderemos reflectir no seguinte, se há algum tempo atrás, para procurar alguma informação, ou resolver um problema prático ou teórico iríamos procurar um livro ou uma biblioteca "tradicional".
No entanto hoje, cada vez mais procuramos informação na Internet, pelo simples facto de ser muito mais rápido, onde utilizamos agentes digitais personalizados que percorrem as redes à procura da informação que desejamos. Podemos dizer que, "todo" o conhecimento da Humanidade está, hoje, disponível na Internet, pois temos acesso a Bibliotecas "tradicionais", museus, universidades, etc., sem restrições de espaço ou de tempo.
As bibliotecas "tradicionais" sempre desenvolveram e usaram diversas técnicas para organizar livros, periódicos, etc., com o fim de facilitar a procura de informação. Por detrás de toda esta iniciativa de organização está o conceito de metadado, ou seja dados sobre dados. A organização só é possível graças a campos ou atributos específicos que descrevem os itens dos acervos. Estas técnicas podem-se utilizar na Internet, e o seu uso específico possibilita a criação de Bibliotecas Digitais.
Mas o que são Bibliotecas Digitais?
Segundo a Digital Library Federation (DFL)[2], "As Bibliotecas Digitais são organizações que fornecem os recursos, incluindo o pessoal especializado, para seleccionar, estruturar, oferecer acesso intelectual, traduzir distribuir, preservar a integridade, e garantir a permanência das colecções digitais, de tal forma que elas estejam disponíveis para uma ou várias comunidades.
As Bibliotecas digitais são pois, colecções de materiais digitalizados, instituições que possuem materiais digitalizados e que controlam estes materiais, sendo detentoras dos direitos de autor. Estas têm a capacidade de reproduzir imagens de alta definição, assim como nos podem oferecer, com reprodução quase imediata em qualquer computador e oferecem-nos também novas formas de as visualizarmos.
De uma forma sintética, entende-se Biblioteca Digital como uma colecção organizada de Documentos, onde cada fonte de informação possui dois atributos relacionados, os relativos ao seu conteúdo e os que identificam de forma descritiva o documento, ou a colecção de serviços e a colecção de objectos de informação, disponíveis directa ou indirectamente via meio electrónico/digital.
Temos então, duas grandes tendências que marcaram o aparecimento das Bibliotecas Digitais, a catalogação do material existente nas bibliotecas "tradicionais", formando os bancos de dados que, em seguida, passam a estar disponibilizados na rede, e o início da digitalização de códices, livros e textos impressos já disponíveis nas bibliotecas "tradicionais".
Se desde Gutenberg, a Informação passou a ser divulgada e, principalmente produzidas a um ritmo exponencial, pode-nos levar a imaginar que as bibliotecas "tradicionais" estarão à beira do seu limite de saturação. A cada dia que passa as bibliotecas deixam de ser lugares quase sacros para depósito de materiais preciosos e passam a incorporar algumas inovações, ampliando de forma considerável o seu acervo e acesso. Como já foi referido, a própria concepção espacial está a transformar-se, e as bibliotecas tornam-se espaços abertos, onde os leitores convivem intimamente com livros, CDs, mapas, slides, etc.
Hoje com o recurso à digitalização, não só fica aumentada a possibilidade de circulação, como há uma tendência para fazer desaparecer o "princípio da raridade".
Presentemente, a cópia e original confundem-se, as obras são digitalizadas inicialmente por razões de conservação e, imediatamente passam a viabilizar a sua socialização. Dentro deste contexto, muitas das maiores bibliotecas do mundo estão a digitalizar os seus acervos, como por exemplo, a Biblioteca do Congresso Americano, a Biblioteca Nacional de França, a British Library, a Biblioteca do Vaticano, a Alexandria Digital Library, e muitas outras onde se encontra também a Biblioteca Nacional de Portugal, com milhares de obras já digitalizadas e disponíveis na Web.
Muitos governos dão tanta importância à criação de Bibliotecas Digitais, que investem grandes quantias de dinheiro em pesquisas nesta área, como é o caso do governo dos Estados Unidos da América, entre outros que já seguem o mesmo caminho. Um pouco por todo o mundo as bibliotecas estão a disponibilizar na Internet as referências dos seus acervos bibliográficos tradicionais, assim como já existem projectos internacionais como Projecto Gutenberg[3], ou mesmo como o Projecto Cervantes 2001[4], e outros bancos de dados que estão a ampliar o conceito de biblioteca, como o Web of Online Dictionaries[5], o Internet Movie Database[6], etc.
Depreendemos, pois que a actividade de catalogação, de indexação e compilação, ultrapassou, já, o campo das bibliotecas "tradicionais", e estendeu os seus domínios e vai ganhando novas possibilidades na Internet.
Estamos pois, a assistir a um aumento considerável de informação disponibilizada em todo o mundo, como o de simplesmente transpor o mundo não digital para a Web.
Poderemos pensar nas Bibliotecas Digitais, como centros de referência digital sobre aquilo que está a ser produzido em determinada área do conhecimento. Para isso, todo o Saber precisa ter o seu valor, seja ele o saber do investigador ou do cidadão comum. A produção do conhecimento deve pois, ser o resultado de um processo crítico, público e comunal, no qual todos participem. A Web pode e deve representar, portanto a possibilidade concreta de optimização desse processo.
Poderemos então pensar numa Biblioteca Digital Unificada?
Uma Biblioteca Digital que contenha todo o conhecimento humano registado, que se possa aceder a partir de qualquer lugar.
Muitos investigadores, pensam que o caminho a seguir são as Bibliotecas Digitais, ou seja todo o conteúdo dos jornais, livros, revistas, etc. que já foram ou que serão publicados, obras de arte, etc., digitalizados e disponíveis na Internet. Mas um dos problemas, ou mesmo o maior problema das Bibliotecas Digitais prende-se com a organização e pesquisa da quantidade abismal de informação que estas poderão conter.
A solução poderá passar pela unificação dos materiais de muitas bibliotecas existentes em diferentes formatos e linguagens e sumariar a informação, de tal modo que se torne mais fácil e rápido o acesso do utilizador. Ao mesmo tempo as Bibliotecas Digitais estão a suscitar novas questões como, O que irá acontecer às Bibliotecas "tradicionais"? Serão todas convertidas para o digital? , Se todo este processo implica novos profissionais, estarão os bibliotecários em extinção?
Há quem defenda que sim, no entanto penso que os bibliotecários do "futuro" terão novos papéis como gestores da informação e organizadores do ciberespaço digital, assim como as Bibliotecas "tradicionais" terão sempre a sua utilidade na esfera da preservação do meio físico e original das publicações, pois por mais perfeita que seja uma digitalização, esta nunca irá substituir o objecto em si. No entanto, só ao futuro caberá uma resposta.
Gostaria de concluir, reafirmando que as Bibliotecas Digitais trazem inúmeros benefícios para a Sociedade, onde um dos mais óbvios é o fim das restrições de espaço e de tempo de acesso à Informação, além de contribuir para a redução das desigualdades sociais.
[1] Jornal da Noite, SIC, 23.04.98
[2] http://www.diglib.org/
[3] http://gutenberg.net/
[4] http://www.csdl.tamu.edu/cervantes/V2/index.html
[5] http://www.yourdictionary.com/
[6] http://www.imdb.com/ |