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Do juízo ao juízo próprio
Sem dizer nem principiar
Valor e limite da circunstância
Intuição cabresta
Desta elementar ontologia
Banal e decrépita
Que é a porra da lógica
De estar vivo!
Estamos a falar
Entre o significado
E a lei do significado.
Entre o carimbo
Que te colocam na testa,
E a testa, que acreditas que tens.
Não podes afirmar,
E se pudesses
Metias o rabinho
Entre as pernas,
E ias mijar de aflição
Na primeira esquina
Escondida.
É preciso estar de acordo
Comer na manjedora pública.
E se um tirano
Te vier comer as tripas,
Tanto pior!
E lavar-te a fala
De qualquer sentido,
Tanto pior!
A ciência cognitiva é do melhor que há:
Dois ramos de sálvia são 2 ramos de sálvia.
Acima de tudo
Não te contradigas
Mas queremos que digas,
Anda lá
Anda lá
Conta-nos o que viste
Conta-nos o que viste
E ouviste
Vá lá, conta lá
Deste chão de pedra fechado
Deste afastamento das galáxias
Deste aquecimento progressivo
Do universo
Vá lá, conta, a mais elevada
Dor do choro indecente
De chorares por ti
E das impotências.
Esta contracção mútua
Conta-nos o que ouviste
E viste.
A densidade da razão
O rigor de um corpo morto
A força de ser imbecil,
E de o poder afirmar.
Conta o que viste e ouviste.
O hidrogéneo que se transmuta
Rapidamente em núcleos pesados
A falta de gasolina que não
Deixa o carro andar
As estrelas que param em fila
No pavimento imundo do céu
Conta o que viste e ouviste.
Dá uma segunda explicação
Para esta porra toda,
Porque a primeira explicação
Que deste,
Não foi explicação, não chegou,
Não chega o que viste e ouviste
Não chega o conhecimento dos
Capítulos precedentes.
Não chega.
Diz-me o que viste e ouviste.
Outra vez
Explica-me
Como a matéria é mole e maleável.
Temos de supor que sabes
Falar.
Temos de supor que sabes
Pensar.
Conta-nos o que viste e ouviste
Mais cedo ou mais tarde
Não te lamentes
De não o ter dito, de não o ter
Visto.
Não é com interrogações
Embaraçosas
Que vais conseguir escapar
Sem dizer o que viste e ouviste.
Permaneces na transição
Ão ao ão
Permaneces na transição
Que também dá canção, acção e mergulhão.
Traz os teus olhos e os
Teus ouvidos
E conta o que viste e ouviste.
Porque neste tempo de profundas
Mudanças
O que tu viste e ouviste
Não tem o menor interesse.
Por isso conta lá o que viste e ouviste
Para eu, não poder ver, e ouvir,
Para nós, não podermos ver e não ouvir!
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O alcance da força da gravidade
Aparenta não ter limites.
Isto é muito grave,
E podemos dizer isto, com uma
Voz muito grave.
É grave
Morreram hoje
Milhões de pessoas com fome.
É grave muito grave.
Todo o mundo tende para a entropia
É grave
É muito grave porque não podemos
Fazer nada, nós os que estamos
Vivos não podemos fazer nada,
E os mortos por maioria de razão também não.
É isso que define a gravidade, não
Podermos fazer nada.
É isso que define o estar morto,
Complica-se a definição
De mortos e de vivos
Ou a definição
De mortos, semi-vivos, semi-mortos
Mortos não
Quantos os que aqui estão.
São mortos, semi-vivos,
Semi-mortos, mortos
Quantos são os
Que não podem fazer nada?
Milhões, em cada ocasião!
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Quanto mais nos afastamos do centro
Mais outro centro se aproxima
O súbdito do czar sorriu à
noite
Sorriso de igreja debruado a dourado.
No fundo de tão cioso sorriso
Guarda milícias,
As Que partem a bordo do paquete,
Junto ao czar.
Agora que os russos já não canonizam nem czares,
Nem comunistas,
O que poderão canonizar ?
Já esquececeram o Estaline curvado sobre a mesa
A ler o Pravda.
A fama com ele teve sucesso
Quanto maior o sucesso da fama menor o do Autor.
Não não foi um vigarista astuto,
Foi um,
Dos que viram matar uns,
Deixar morrer outros
E olharam para o lado,
Para o objectivo maior,
Para a proximidade primitiva
De governar.
E pensar que o súbdito do czar
É agora nesta Pravda bolchevique
E depois, e agora novamente súbdito.
É possível nas páginas dos livros
Contar os mortos às centenas
E ler os sofrimentos dos que tiveram
Que cumprir
Os designíos da grande Obra
Oursins de l`Éstaque
Servidos com Mouet Chandon
E o papel dos indolentes estúpidos
Cumprido na perfeição
De obedecer e morrer.
Quem te mandou ir pelo carreiro?
No centro, na praça, é que estão os grandes homens que nos governam,
Nestas paisagens não há corredores fétidos
Nem arranha céus
Nem verdes campos com ovelhas pascentes,
Só praças onde os que governam
Querem subvserviência como honrra
E estupidez como odediência.
É aqui e em mais nenhum lugar
Que se perdem os olhos e os ouvidos
E se erra cego e surdo por entre
O som daqueles que vão caindo
Cansados …
Mas estes homens que mandam têm mistério,
É no chelindró das suas biografias que muitos
Refocilam.
Foram grandes homens
Confessaram-se grandes homens.
É no calafrio voluptuoso de tal adjectivação
Que podemos e somos abjectos!
Acabo de comer a minha refeição à dentada
Se calhar tenho uma grande boca, ou sou apenas uma grande alarve?
Ficamos todos sentados, ao seu lado, na mesa
A ler o Pravda e a comer omolete de amoras.
Durou pouco tempo, porque muito destruiu,
Mas tinha carácter, enquanto outros partiram os Pulsos junto ao Muro das
Lamentações?
Brutalidade versus Lamentalidade!
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Assisto assim à vontade de digerir o mundo
Vontade de enlouquecer
Ou isto já é uma forma de loucura?
Assiste-se a um espectáculo
Não há vida
Isto é de mau gosto
Sabe mal
Pior que mal
A merda
Assistir à decomposição
Mental do próprio
Ou assistir, já é um sintoma
de decomposição
Mental do próprio?
Podemos ficar eternamente a falar com os Mortos
Um exercício militante de passividade
Falar com os mortos
Exercícios de voltar para trás
Mesmo
Quando eles estavam à frente
Exercício de prolongar o nada
Rétórica
Prolongar a passividade
Disfarçada de discurso
Porque é que os cordeiros se querem enfiar
Nas tocas dos coelhos?
Porque é que procuram os ovos da Páscoa?
Porque é que os coelhos se enfiam
Nas barrigas das ovelhas que pastam?
Porque é que querem voltar a ter mães?
Perguntas sem resposta
E porque é que
Os elefantes se riem dos cordeiros? Porque é Que na floresta, só se pode
ser natureza?
Indústria do sentir
Cansada de julgar
Cansada de avaliar
Assim morrem os caçadores em caçados
Não há tempo para os indiferentes
Quem ignora cede lugar aos que não querem.
Ignorar é do lado em que elas acontecem,
Aquecer aos raios do sol
As mãos e o rosto,
Empurrar com a barriga ou com as costas o Inverno
Encostar às boxes o outono
Adormecer com doce canto
A primavera
Só calor
Quentura de forno
Assar como um pastel de nata.
Mata e mata
Que parecidos que são
A nata mata
A mata cresce com as natas
Não é igual uma mata que cresce ou uma mata Que arde
Uma mata que dorme ou uma mata acordada
Um nata que se come ou um nata que se proíbe.
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_ E agora vamos à parte séria,
Vá, semblantes carregados!
(A elogiadora faz um gesto de mãos
Como se estivesse a dirigir uma orquestra)
_ Vá preparem-se!
Preparem-se…
_ Já estão preparados?
Um, dois,
três:
TOC-TOC lá vai a moleirinha
Toc-toc lá vai a moleirinha
Com o burro pela arreata
TOC_TOC_TOC
TOC-toc-toc-toc-toc-toc
Porque não tem o burro
Humana voz para dizer toc-toc-toc-toc
E a moleirinha
Porque não enxuta as moscas
Com a adejante cauda
E porque não tem ela
Orelhas grandes e olhos doces?
E já de agora,
Força de cavalo
Para carregar os sacos de farinha?
E quando passam os dois juntos à Várzea
Dos Amarelos
Os sapos cantam todos a mesma tontina
Toc-toc-toc-toc-tocv-toc-toc-tov
_ Ah tirem-me deste ámen colectivo!
Tanto consenso adormece
Tanta abstinência de opinião irrita
Convirjam os heróis
E os génios para a fossa asséptica,
É isolá-los,
Antes que contaminem os outros.
Derretam as velas e os santos
E os ganidos de nostalgia
Onde se encarceram
Os convergentes.
Quero a moleirinha a dançar
Com o Sandokan:
Cosa fai in questa foresta?_ chiese Sandokan,
E a moleirinha responde
: Danço in questa mattina
não há pedagogia analítica
que nos salve de optar
dança a moleirinha e o Sandokan
músicas carnais sem sintaxe
dançam até à exaustão
encaixam Deus na Samaritana
Cristo em Buda
E Alá, num canto, treina a dança do ventre
_ Tirem-nos da pobreza da igualdade!
Gilgamesh nasceu na Baixa da banheira
E os porcos que morrem
Aos milhões nos matadouros
Ainda ontem foram soldados em Aleppo.
Os sapos encantados
Tiram sapos da cartola
E cantam um qualquer hino nacional
Convencidos de que há uma só Pátria
_ Palermas de todo o mundo, nos
Quais me incluo,
Uni-vos contra o aparelho da penalidade
Correctiva
Hoje palermas, amanhã presos
Hoje presos, amanhã mortos,
Aos mortos a poderosa convergência
Do fim
Divirjo, divirjo, divirjo, divirjo
Os parolos dos peixes
Substituíram na frase o juramento
De Hipócrates, substituíram juramento por
Julgamento
E lançaram-se a julgar
Toda a canalhada que anda a navegar
As fronteiras são delinquentes:
Tu ficas aqui, aqui nascestes
Tu vais para ali, não te queremos
Desanda, estás a mais
Põe-te a milhas, não és daqui!
Não fales, não te compreendo
Apanha porrada, sou eu que a dou
Tolero-te, porque sou melhor do que tu.
Dialéctica rude a das fronteiras
: Três mil, ana, três e quatrocentos, Mouchcine, 6 biliões,
Kunduz, 1298 , Nicolau,9876, Fikki,
200, , Cabul,4567, Maria, 6600, Lurdes,
8900, kirkut, 332.000, Tikrit, 7800, Djibouti,7600,
Benim, 9900, Burundi, 2457, Ùbia
Números a seguir a nomes
Tabela de logaritmos
Numa lista de não sujeitos
Mudos e mais surdos
Céu colado à terra
Cadáveres de água
Ensopados de não memória.
Canta-os um baladeiro triste
Numa canção de raiva e auto-punição.
Nos cabarés onde a moleirinha passa
Um sabbat de condenados à porta!
_ E esta a dar-lhe com a moleirinha,
Porque fala esta de moleirinhas,
Pensa que está no século 19?
Já não há moinhos, oh escritora arcana,
Vai juntar sílabas para outra freguesia!
_ Já vou, deixem-me falar mais um pouco.
_ E agora, insisto,
Vamos rezar!
E agora?
Agora o quê?
Não há agora
E agora vamos rezar:
Plâncton nosso que estais no mar,
Santificado seja a vossa matéria
(Cala-te, oh estúpida!)
Venha a nós o vosso corpo
Seja feita a nossa vontade
(Herege dá de frosques!)
Assim no mar como no rio.
O plâncton nosso de cada dia
Nos dai hoje.
(Porque não te calas, não tarda
apanha no focinho!)
Comei-vos a vós mesmos
Assim como os outros nos comeram.
Não nos deixai cair em redenção
Mas livrai-nos da Rede, ámen!
Ah, calou-se, se não ia-lhe às trombas!
_ E depois de rezarmos, pergunto:
Por acaso sabeis
Se além do paraíso
E aquém
Do jardim das delícias
As rosas dão figos
E os figos rosas?
Haverá no máximo
Duas respostas iguais.
Maravilhosa dúvida
Ao pôr do sol
Sei que os figos
Não são apenas doces
As rosas não são apenas belas.
Na boca do lobo
Ouve-se o eco da cascata
E se alguém à noite
Me quiser ordenar
Os olhos e o coração
Vade retro
Aqui há REBELIÃO!
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