Procurar textos
 
 

 

 

 











JOSÉ EDUARDO FRANCO
O CENTENÁRIO DE UMA "ENCICLOPÉDIA UNIVERSAL" À PORTUGUESA: A REVISTA BROTÉRIA
.
Cerimónia comemorativa de Cem Anos de Cultura e Ciência

No dia 14 de Fevereiro, a Casa dos Escritores dos Jesuítas organizou no grande auditório do Colégio de São João em Lisboa um colóquio para assinalar o Centenário da Revista Brotéria. Neste colóquio, subordinado ao tema "Fé, Ciência e Cultura", intervieram três grandes figuras da intelectualidade portuguesa: Guilherme de Oliveira Martins, Peter Stilwell e João Resina.

Na sequência deste colóquio foi também realizada uma sessão solene de lançamento do livro comemorativo do Centenário da Revista Brotéria, que tem como um dos seus dois coordenadores o historiador madeirense José Eduardo Franco. O livro dos Cem Anos da Brotéria foi publicado pela Editora Gradiva e foi apresentado pelo prefaciador desta obra, o Doutor Eduardo Lourenço. Este celebérrimo pensador da cultura portuguesa chamou a atenção para a importância da revista Brotéria na qualificação da ciência e do saber cristãmente inspirado, assim como destacou o seu contributo para o estabelecimento de pontes de diálogo com os universos da cultura laica. Sublinhou ainda a dimensão do enorme património cultural, científico e pedagógico da Companhia de Jesus de que a Brotéria é apenas uma das expressões contemporâneas mais visíveis e de maior qualidade. Neste âmbito, referiu que o que a cultura jesuítica representou e significou em Portugal é uma espécie de iceberg , isto é, apenas se conhece uma ponta, um pequena parte, a parte visível da grande dimensão e influência deste património jesuítico que foi submergido quer pelas perseguições pombalinas e republicanas, quer pela polémicas antijesuíticas laicas.

Significado da Brotéria: Uma Universidade de Letras

Falar do centenário da revista Brotéria é falar necessariamente do que aconteceu de melhor nestes últimos cem anos na ciência e na cultura em Portugal. Quando mergulhamos no interior denso e vasto das assíduas páginas deste periódico ficamos com a impressão, muito justa aliás, de que estamos diante de uma verdadeira universidade edificada em pilares de letras. De facto, a Brotéria procurou produzir um saber e uma mundividência capaz de ampliar decisivamente um horizonte conhecimento de extensão universalizante. Um horizonte de compreensão cristã dos mais diversos âmbitos - com atenção especial aos mais emergentes e mais problemáticos - do conhecimento humano.

O enorme valor da Brotéria impôs-se em Portugal pela sua seriedade na procura interrogante verdade, propondo um sentido unificador para o entendimento do homem, do mundo e da dimensão transcendente da vida. Qualquer instituição cultural ou religiosa que se preze (conforme se pode constatar facilmente em Portugal), seja ela uma universidade, um seminário, uma congregação religiosa, um centro cultural, etc., tem nas suas estantes bibliotecárias a Brotéria como revista de referência para consulta em vários domínios da reflexão sobre a actualidade. Ela, com efeito, penetrou em muitos sectores das ciências humanas e marcou a sua presença e influência com um sinal de prestígio e de qualidade.

Fornecendo um acervo de conhecimento verdadeiramente enciclopédico-analítico de dimensão inédita em Portugal, a Brotéria não desmereceria o título (dentro dos limites e do curso próprio de um periódico) de ser chamada uma espécie de enciclopédia universal em versão lusitana, ou ainda uma espécie de Diário (ou melhor, Mensário) cultural que foi fazendo eco e foi reagindo de forma reflexiva e interpretativa aos mais importantes e pertinentes acontecimentos e fenómenos do espírito humano ocorridos ao longo do século XX.

Um aspecto relevante que importa destacar no diz respeito ao cumprimento do ideário fundacional desta revista foi o facto dela ter dado e de continuar a dar um contributo notável para reparar a fractura ou para atenuar o divórcio operado desde a modernidade, e de modo mais intenso desde o século XIX, entre fé e cultura. Assim sendo, a Brotéria contribuiu, pois, para tornar a fé mais esclarecida e a cultura e a ciência mais completa e mais rica de sentido.

José Eduardo Franco