José Manuel Anes licenciou-se em Química na Faculdade de Ciências de Lisboa. Em finais dos anos 70 entrou como perito superior de criminalística, para o laboratório de Polícia científica da Polícia Judiciária. Aliás sobre esta experiência existe no presente livro um capítulo a assinalar. Em meados dos anos 80 começou funções docentes, como assistente convidado, no Departamento de Antropologia da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, onde é meu estimado colega. Lecciona, entre outras cadeiras, Antropologia da Religião e do Ritual. Tem dado no Instituto de Sociologia e Etnologia das Religiões, cursos livres e de pós-graduação sobre correntes esotéricas ocidentais, novos movimentos religiosos e mágico-religiosos. É doutorando em Antropologia Social e Cultural, na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas e está de momento a ultimar a tese.
Das Re-criações Herméticas I, de 1996/7, para este volume II, há uma manutenção de temas, por exemplo, esoterismo, imaginário, simbólico, transdisciplinaridade, numa abordagem renovada. Estas Re-criações Herméticas II celebram segundo o próprio José Manuel Anes um definitivo regresso aos livros após vários anos de intensa actividade (nacional e internacional) em funções de responsabilidade numa ordem maçónica.
José Manuel Anes foi o 1º investigador que deu corpo teórico à decifração do simbolismo da Quinta da Regaleira.
A Quinta da Regaleira, na sua essência, denota a existência de uma coerência simbólica e mítica, assente numa concepção do mundo triunitária, de natureza maçónico-templária, e, ao mesmo tempo, católica e monárquica.
Destacam-se os seguintes símbolos:
- Na concepção maçónico-templária existe, por exemplo, uma sala com uma pintura no tecto, representando os 3 pilares da maçonaria de S. João - Força, Sabedoria e Beleza.
- A capela ostenta à entrada o delta luminoso (triângulo com o olho de Deus), ostenta também a cruz da Ordem de Cristo e no chão existem cruzes templárias e pentagramas
- Outro elemento a assinalar é o banco com o 515 da Divina Comédia de Dante. O 515 é o anunciador da Idade do Espírito Santo.
- Na Regaleira, Cristo nunca aparece crucificado, o que revela uma perspectiva gnóstico-oriental do cristianismo que influenciou os Templários.
- Existe também um poço vitriólico que permite o duplo percurso alquímico de descida no interior da Terra e da ascensão das trevas para a luz
- Destaca-se o Athanor (forno alquímico) que representa o mundo superior do espírito, o mundo inferior da matéria e o mundo intermédio - hermético
Nas Re-criações Herméticas II encontramos o capítulo sobre os jardins iniciáticos da Quinta da Regaleira. Estes jardins são significativos duma linguagem simbólica e esotérica e só nessa perspectiva podem ser compreendidos.
Como elementos simbólicos aparecem o já referido 515, o athanor, a águia com seios e dois poços que dão acesso a túneis subterrâneos.
Os poços, para José Manuel Anes, são aquilo que poderemos denominar de percurso organizador ou estruturante que segue, em suma, um esquema muito geral de morte e ressurreição, descida para as trevas e subida para a luz.
Para provar a Idade do Espírito Santo e o seu culto popular torna-se visível a presença de pombas no Palácio, nomeadamente na escultura da dama de cujo regaço saem pombas.
Os temas herméticos e alquímicos reforçam-se com a presença do forno alquímico e ainda a estátua de Hermes e a ave Íbis.
Nos temas templários de raiz maçónica destaca-se a cruz templária que está no fundo do poço iniciático.
A Quinta da Regaleira evidencia uma continuidade de temas entre o mundo pagão e o mundo cristão.
Um outro tema que nos cumpre aqui falar é o itinerário pelo simbolismo das festas do ciclo anual.
As festividades cristãs distribuem-se ao longo do ciclo anual por 3 períodos: o ciclo do Natal, o ciclo Pascal e o ciclo de Pentecostes.
A José Manuel Anes interessam sobretudo os ciclos pascal e de Pentecostes. Neste importante capítulo o investigador integra as festas cristãs no conjunto das estas cósmicas e pagãs.
Há uma coincidência entre o ciclo anual ligado à religião natural e a certas formas de paganismo e o ano litúrgico cristão.
Na página 166 do volume agora publicado o autor afirma: "esta dessacralização na relação com a mãe natureza e o pai celeste caracteriza a civilização ocidental urbana".
Em conclusão a este capítulo podemos dizer que a organização do Ano Litúrgico, em função do ciclo solar, deve-se a iniciados que souberam colocar as festas em datas e em períodos apropriados e significativos.
O Ano Litúrgico reproduz a vida de Cristo, a evolução do cosmos e a evolução espiritual do Homem.
Entre os temas que eu não vou abordar aqui e que deixo especialmente para José Manuel Anes falar temos os seguintes capítulos:
- Theosis, a criação do Homem divino;
- O segredo debaixo de uma pedra, discurso sobre a matéria do lápis e a sua preparação;
- Introdução aos ritos e rituais herméticos do século XVIII;
- Da divinização do 4 à diabolização do cinco.
No capítulo templarismos e milenarismos destaco o sub-capítulo "O imaginário milenarista e o esoterismo neo-templário contemporâneo".
Para concluir podemos dizer que as Re-criações Herméticas II remetem, apesar de serem um todo, para as Re-criações Herméticas I, obra notável daquele que já é o principal teórico do esoterismo, do hermetismo e dos percursos alquímicos em Portugal.