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REVISTA
TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências
ISSN 2182-147X
NOVA SÉRIE |
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Adelto Gonçalves |
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A história de Pedro e Inês em cordel
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I |
Quem não conhece a secular história
de Pedro e Inês? Provavelmente, as novas gerações não a conheçam muito
bem, mas, com certeza, já ouviram a expressão “agora Inês é morta” que
equivale a dizer “agora é tarde demais”. Por isso, não custa nada dizer
que é possível encontrar essa história em várias obras literárias, desde
Fernão Lopes (1385-1459), cronista e guarda-mor da Torre do Tombo de 1418
a 1454, passando pelo poeta Sá de Miranda (1481-1558), até chegar ao
grande Luís de Camões (ca.1524-1580).
Trata-se da história da infeliz Inês
de Castro (1325-1355), nobre galega que foi para Portugal como aia de dona
Constança Manuel, futura esposa de dom Pedro I (1320-1367), de Portugal.
Se há uma história de amor marcante na História de Portugal, como a de
Romeu e Julieta, tragédia do
poeta inglês William Shakespeare (1564-1616), essa é a do amor proibido
entre o infante d. Pedro e Inês de Castro.
Como se sabe, apesar do casamento, o
infante mantinha encontros furtivos com a dama de companhia de sua esposa.
E, depois da morte de d. Constança em 1345, passou a viver maritalmente
com ela, o que acabou por afrontar o rei d. Afonso IV (1291-1357), que
mandou assassinar Inês de Castro em janeiro de 1355. Magoado e
tresloucado, Pedro liderou uma revolta contra o rei e, quando finalmente
assumiu a coroa em 1357, mandou prender e matar os assassinos de Inês,
arrancando-lhes o coração, o que lhe valeu o cognome de Cruel.
Mais tarde, jurando que se havia
casado secretamente com Inês, d. Pedro impôs o seu reconhecimento como
rainha de Portugal. Em abril de 1360, ordenou a trasladação o seu corpo
para o Mosteiro Real de Alcobaça, onde mandara construir dois magníficos
túmulos, para que pudesse descansar para sempre ao lado da sua eterna
amada.
É o desenrolar desse amor proibido,
vivido em meio a uma atmosfera pesada e de disputas palacianas de poder,
que o leitor irá encontrar em linguagem polida e culta, mas ao estilo de
cordel, em O Caso de Pedro e Inês – Inês(quecível) até o fim do mundo (São
Paulo: Kapulana Editora, 2015), de Francisco Maciel Silveira, em que o
autor alia criatividade e rigor poético. Segundo o seu autor, a obra,
fartamente ilustrada por Dan Arsky, é dedicada aos leitores jovens adultos
que estão à procura de uma literatura menos conservadora e com
profundidade literária, mas distante dos calhamaços acadêmicos. Por isso,
chama o seu livro de “ABC de Literatura”, pois, imaginariamente, teria
sido escrito para ser lido e repetido em voz alta por cantadores de feira.
Eis uma amostra:
(...) Rainha eterna (na
memória
para sempre viva do povo
lenda na futura História)
só trazendo-a à vida de novo:
exumá-la da triste cova,
sagrá-la numa vida nova.
Fazê-la do Reino rainha,
reinando-o além da vida,
era ter promessa cumprida:
brotar dentre a erva daninha
rasa, da corte mal cheirosa,
pétalas de rosa amorosa.
(Amor além da vida, desbordante,
exige que metro se mude e rima,
para cadenciar sua extensão.
Que, sepulta em marmórea obra-prima,
não cabe na exígua dimensão
da rasa sepultura limitante.)
Pedro, o Cru, mandou construir
no sacro templo de Alcobaça
morada que lá no porvir,
dirá ao vivente que passa:
“Tal foi teu amor – coeterno?
Vivo na morte, sempiterno?” (...)
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II |
Em linhas gerais, nesta obra, o
professor Francisco Maciel Silveira deixa de lado os títulos acadêmicos –
e que são muitos – para se assumir como o vate Xico Maciel, contador de
casos. E o faz, em formato de literatura de cordel, a partir de um texto
clássico da Literatura Portuguesa.
Na apresentação que escreveu para
este livro, a professora Flávia Maria Corradin, coordenadora na Faculdade
de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São
Paulo (USP) do projeto Autor por
Autor: a Literatura e História portuguesas à luz do teatro, do qual o
professor Maciel é o diretor, diz que o autor, em seu novo percurso numa
arte tão popular como a do cordel, procura brincar com a estrutura da
epopeia clássica, ao dividir o seu texto em introdução, narração e
epílogo. No caso, a Narração apresenta a história do “amor que, contra
tudo e todos,/ acabou virando infração./Infração contra as leis de
Deus,/infração contra as leis da grei”.
De fato, como aponta a professora,
Maciel saiu-se bem mais uma vez ao trabalhar um conteúdo canônico por
intermédio de um meio de comunicação extremamente popular, “dialogando
intertextual e criticamente com a História, com a Literatura, suscitando
no leitor o desejo de explorar as sugestões aí contidas, de modo a que o
amor de Pedro e Inês continue se perpetuando na memória dos brasileiros,
portugueses, espanhóis, franceses, ingleses...” E acrescentamos nós: dos
galegos, que ainda um dia hão de se tornar uma nação independente e
integrante de Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).
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III |
Professor titular de Literatura
Portuguesa na FFLCH-USP, onde obteve os títulos de mestre, doutor e
livre-docente, com trabalhos em torno da oratória sagrada dos padres
António Vieira (1608-1697) e Manuel Bernardes (1644-1710) e da
comediografia de António José da Silva (1705-1739), o Judeu, Francisco
Maciel Silveira é crítico literário, com ensaios e resenhas publicados em
periódicos do Brasil e do exterior. Poeta, ficcionista, dramaturgo e
ensaísta com mais de duas dezenas de prêmios, atua na docência, pesquisa e
orientação com ênfase no Classicismo, no Barroco, no Realismo e no Teatro
Português.
É autor dos livros de contos
Esfinges (1978) e A caixa de
Pandora: aquela que nos coube (1996) e de poemas
Macho e fêmea os criou, segundo a paixão... (1983), além de outros
ainda na gaveta. Nas áreas didática e ensaística, publicou ainda
Português para o segundo grau
(São Paulo: Cultrix, 1979; 5ª ed. 1988);
Aprenda a escrever (São Paulo:
Cultrix, 1985; 2ª ed. 1989); Padre Manuel Bernardes – Textos doutrinais (São Paulo: Cultrix,
1981); Poesia clássica (São
Paulo, Global, 1988); Literatura
barroca (São Paulo: Global, 1987);
Concerto barroco às óperas do Judeu
(São Paulo: Perspectiva/Edusp, 1992);
Palimpsestos – uma história intertextual da Literatura Portuguesa
(São Paulo: Paulistana, 1997; 2ª ed., 2008, Santiago de Compostela:
Laiovento, 1997); Fernando Pessoa(s)
de um drama (São Paulo: Reis Editorial, 1999);
Ó Luís, vais de Camões? (São
Paulo: Reis Editorial, 2001; São Paulo: Arauco, 2ª ed,. 2008);
Saramago – eu-próprio o outro?
(Aveiro: Universidade de Aveiro, 2007);
Eça de Queiroz: O mandarim do
Realismo português (São Paulo: Paulistana, 2010);
Canteiro de obras (São Paulo:
Todas as Musas, 2011), e Exercícios
de caligrafia literária: Saramago quase (Curitiba: CRV Editora, 2012).
É responsável pelo site Pinceladas
em que discorre sobre a pintura alheia:
http://www.pinceladas-fms.com.br
Dan Arsky, formado em Direito, é
design editorial é ilustrador de livros. Suas paixões são filmes,
fotografia, quadrinhos, seriados e jogo de videogame.
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O caso de
Pedro e Inês – Inês(quecível) até o fim do mundo (ABC de Literatura),
de Francisco Maciel Silveira, com apresentação de Flávia Maria
Corradin e ilustrações de Dan Arsky (Série Intersecções Literárias). São
Paulo: Kapulana Editora, 78 págs., R$ 29,90, 2015. Site:
www.editora@kapulana.com.br E-mail:
www.kapulana.com.br
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Adelto
Gonçalves é doutor em Letras na área de Literatura Portuguesa pela
Universidade de São Paulo (USP) e autor de Os Vira-latas da Madrugada
(Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1981), Gonzaga, um
Poeta do Iluminismo (Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1999),
Barcelona Brasileira (Lisboa, Nova Arrancada, 1999; São Paulo,
Publisher Brasil, 2002), Bocage - o Perfil Perdido (Lisboa,
Caminho, 2003) e Tomás Antônio Gonzaga (Rio de Janeiro, Academia
Brasileira de Letras; São Paulo, Imprensa Oficial do Estado de São
Paulo, 2012), entre outros. E-mail: marilizadelto@uol.com.br |
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