O historiador Adelto Gonçalves ─ jornalista,
professor de literatura brasileira e portuguesa, contista, romancista,
ensaísta e biógrafo dos poetas Tomás Antônio Gonzaga e Manuel Maria
Barbosa Du Bocage ─ é autor do livro “Direito e Justiça em terras d’El-rei
na São Paulo colonial: 1709-1822”. Por sua formação multifacetada e
erudita, produziu uma obra marcante sobre a formação e consolidação da
estrutura jurídica, administrativa e política do Brasil colônia e, em
especial, da antiga capitania de São Paulo.
Pesquisador minucioso da documentação primária
existente nos arquivos de Portugal, de São Paulo e Salvador, enriqueceu
seu trabalho com a leitura feita da vasta bibliografia sobre o tema que
tratou no livro.
Em linguagem acessível a qualquer leitor, Adelto
montou com destreza a história de ouvidores, juízes, desembargadores,
governadores, capitães-mor e outros representantes da Coroa portuguesa no
Brasil colônia. Tratou da vida real desses homens em seus haveres na
colônia, nominando-os e tratando dos fatos concretos que vivenciaram.
Narra os meandros da ação desses servidores públicos no redemoinho dos
conflitos de autoridades civis, religiosas e militares, assim como a
movimentação e jogo de interesses dos colonos que viviam no amplo
território paulista e das minas: índios, brancos, negros e miscigenados.
O método usado pelo autor na montagem do
embasamento teórico e documental para chegar a suas conclusões é tão
didático que envolve o leitor, sendo orientação para novos estudiosos
sobre o tema e chamariz para a leitura histórica de forma simples e não
rígida de alguns textos acadêmicos.
Recomendo que a leitura da parte inicial “Direito
e Justiça no Brasil: origens” seja feita com vagar e anotações para melhor
entendimento de como se deu, inicialmente, a relação do aparelho estatal
com a sociedade em formação, dada a quantidade de cargos e funções que se
estruturavam em diversos tempos e lugares do então território brasileiro,
relacionados ao hoje estado de São Paulo.
Entender as origens dessa estrutura
administrativa, política, religiosa e da justiça colonial é necessário
para seguir, com segurança, a leitura do texto seguinte.
Nesta obra, o historiador Adelto Gonçalves
utilizou todos os seus saberes de forma harmoniosa, mostrando a riqueza
existente no estudo de um fato histórico sendo analisado e entendido,
segundo visões dos literatos, dos especialistas do tema, do uso das leis,
relatórios, estatutos, cartas, depoimentos etc. produzidos na época
estudada. Essa capacidade e abertura intelectual do autor caminhando por
diversas fontes e áreas do conhecimento está expressa na abertura do livro
pelas citações aos “Deveres dos Juízes” através da milenar Bíblia e do
poeta baiano Gregório de Matos Guerra, em sua “Sátira ao governo de
Portugal”, datada de 1713.
Após dissecar as origens e consolidação dos
diversos membros da justiça colonial, Adelto faz minuciosos estudos de
caso de cada agente ligado ao poder judicial: juízes ordinários,
vereadores, juízes de fora, provedores e corregedores, para então se
dedicar aos ouvidores. A esses profissionais foram destinadas 160 páginas,
isto é, 45% do texto.
É muito saboroso ler o estudo desses ouvidores
por aflorar suas vidas reais, quando são nominados, contextualizados no
tempo e espaço e suas histórias vivenciadas. Muitos têm registros de
atuações mesquinhas, sendo envolvidos em corrupção, autoritarismo,
parcialidade e outros atos incompatíveis com a função delegada pela Coroa.
Devemos ressaltar que o autor registra que esses corruptos, após o
processo chamado de residência, respondido por cada servidor ao término do
mandato, se provados os desvios, eram punidos. Às vezes, apenas com sua
transferência do Brasil, com simples censura do Conselho Ultramarino, e
outras eram encarcerados, degredados e obrigados a ressarcir a Coroa.
Adelto Gonçalves nos lega nesta sua recente obra
rica fonte de pesquisas, existente nos arquivos por ele pesquisados, com
mais de 680 citações de documentos do Arquivo Ultramarino e mais de 70
citações de atas de câmaras de vilas e da cidade de São Paulo, além de
vasta bibliografia sobre o tema e demais a ele vinculados, resultando em
texto fluente, cativante e profundo. O leitor que desejar identificar a
origem dessas centenas de citações usadas pelo autor terá a sua disposição
as notas de rodapé.
Foi gratificante a leitura desta obra Adeltina
que veio para marcar a historiografia sobre a estrutura judicial,
administrativa e política do Brasil, em especial de São Paulo, colônia.
Rio de Janeiro, março de 2016.
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Adelto
Gonçalves é doutor em Letras na área de Literatura Portuguesa pela
Universidade de São Paulo (USP) e autor de Os Vira-latas da Madrugada
(Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1981), Gonzaga, um
Poeta do Iluminismo (Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1999),
Barcelona Brasileira (Lisboa, Nova Arrancada, 1999; São Paulo,
Publisher Brasil, 2002), Bocage - o Perfil Perdido (Lisboa,
Caminho, 2003) e Tomás Antônio Gonzaga (Rio de Janeiro, Academia
Brasileira de Letras; São Paulo, Imprensa Oficial do Estado de São
Paulo, 2012), entre outros. E-mail: marilizadelto@uol.com.br |