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REVISTA
TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências
ISSN 2182-147X
NOVA SÉRIE |
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Adelto Gonçalves |
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A trajetória do jornalista mais premiado do
Brasil |
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I |
Poucos jornalistas são tão populares como José Hamilton
Ribeiro (1935), já que há três décadas é visto pelo menos todas as manhãs
de domingo às voltas com reportagens no programa Globo Rural, da
TV Globo. Mas é ao mesmo tempo não só o jornalista brasileiro que mais
Prêmios Esso acumulou, sete ao todo, como uma unanimidade entre os seus
colegas, que o consideram uma referência profissional e um exemplo de
ética na carreira e na vida particular.
Conhecer melhor essa trajetória é a oportunidade que
oferece o livro O jornalista mais premiado do Brasil: a vida e as
histórias do repórter José Hamilton Ribeiro (Secretaria Municipal de
Cultura de Araçatuba-SP/Eko Gráfica, 2015), de Arnon Gomes, com prefácio
de Sérgio Dávila, editor-executivo da Folha de S. Paulo.
Inicialmente trabalho de conclusão de curso (TCC) em Jornalismo
apresentado à Universidade Santa Cecília (Unisanta), de Santos-SP, em
2004, este livro foi reescrito pelo menos duas vezes por seu autor, o que
demonstra a sua preocupação com o estilo e a apuração da informação.
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II |
Mestre consumado da reportagem, que influenciou
gerações de profissionais com textos que marcaram época, como aqueles
produzidos para a revista Realidade como correspondente na Guerra
do Vietnã (1965-1975), da qual saiu mutilado, ao pisar numa mina, José
Hamilton Ribeiro está em atividade desde a década de 1950, quando deixou
Santa Rosa do Viterbo, cidade do Interior paulista, na região de Ribeirão
Preto, perto da divisa com Minas Gerais, para estudar Jornalismo em
São Paulo na Faculdade Cásper Líbero, inaugurada em 1947 e até então a
única do gênero no País. Ainda estudante, começou a trabalhar na Rádio
Bandeirantes escrevendo notícias para leitura por um locutor durante a
madrugada.
Como se lê no livro de Arnon Gomes, Zé Hamilton, como é
conhecido popularmente, logo trocou a emissora por um trabalho na redação
do jornal O Tempo, hoje desaparecido, e, em seguida, foi para a
Folha de S.Paulo, em 1956. Não concluiria o curso de Jornalismo
porque seria expulso, ao lado de outros colegas, por participar como
presidente do centro acadêmico de um movimento que exigia a contratação de
melhores jornalistas para o corpo docente. Naquele tempo, porém, a
profissão de jornalista não era regulamentada, o que se daria em 1969, e,
portanto, esse detalhe não atrapalharia sua carreira. Mesmo assim, ele não
desistiria da sua formação acadêmica e iria concluir o curso de Direito em
Uberaba, em Minas Gerais, em 1964.
Da Folha de S. Paulo, em 1962, Zé Hamilton
iria para a Editora Abril, a convite do jornalista Mino Carta, para
trabalhar na revista Quatro Rodas, a uma época em que a imprensa
brasileira começava a passar por grandes reformulações. Quatro anos
depois, mudaria de redação na mesma empresa, passando para a revista
Realidade, que, lançada em abril de 1966, trazia uma proposta
inovadora com grandes reportagens e textos de alta qualidade.
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III |
Alguns dos textos de Zé Hamilton daquela época são
reproduzidos neste livro de Arnon Gomes e ainda hoje servem de modelo para
quem pretende escrever bem. São textos objetivos, que prendem a atenção do
leitor desde a primeira linha. É preciso que se diga também que, ao
contrário do que ocorre hoje na grande imprensa, a Editora Abril daquela
época investia em reportagem e o repórter tinha todas as condições
financeiras para ir a campo e escrever seu texto.“Tinha gente que se
fechava no apartamento e ficava às vezes uma semana inteira hibernando,
para só sair com o texto pronto”, lembra Zé Hamilton.
Àquela época, a ideia que permeava a direção da revista
é que os repórteres precisavam “viver” aquilo sobre o qual escreveriam.
Assim, Zé Hamilton iria se empregar numa fábrica para viver na pele as
dificuldades de um operário ou ainda iria tentar “ficar” negro para sentir
como era a vida de um afrodescendente, experiência pela qual não chegaria
a passar porque fracassariam todas as tentativas, desde um banho de
tintura a um trabalho de maquiagem.
Com esse mesmo espírito foi escrita a reportagem que,
segundo Arnon Gomes, é a preferida de Zé Hamilton, intitulada “Coronel não
morre”, publicada na edição de novembro de 1966 de Realidade.
Para mostrar como funcionava o coronelismo naquela época – hoje, o
coronelismo ainda existe com toda a força, mas disfarçado e modernizado –,
o repórter conseguiu a façanha de acompanhar o dia a dia do fazendeiro
Chico Heráclio, grande proprietário de terras e homem politicamente
influente em Limoeiro, na zona do agreste de Pernambuco.
Mas o que catapultaria Zé Hamilton para a fama seria a
reportagem que faria como correspondente de guerra no Vietnã, da qual,
infelizmente, viraria a própria notícia, ao pisar numa mina e perder boa
parte da perna esquerda. A fotografia de Zé Hamilton sendo socorrido no
Vietnã seria capa da edição de maio de 1968 da revista. Com o título “Eu
estive na guerra”, a reportagem traz o depoimento de Zé Hamilton de todo o
episódio e suas consequências, como a sua recuperação num hospital nos
Estados Unidos e a batalha para se adaptar a uma prótese. A reportagem
pode ser lida (ou relida) neste livro de Arnon Gomes.
Obviamente, a carreira de Zé Hamilton não parou aqui.
Pelo contrário. O livro de Arnon Gomes recupera sua trajetória à frente
das redações de vários jornais do Interior paulista, a uma época em que
trabalhar na grande imprensa de São Paulo não era tarefa amena por causa
das perseguições dos esbirros da ditadura militar (1964-1985). Recupera
também os 14 livros que escreveu, desde Vietnã, o gosto da guerra,
de 1969, obra de estreia, até Jornalismo Científico, teoria e prática,
o último, de 2014, em parceria com o professor José Marques de Melo,
passando por Pantanal, Amor Baguá, romance infanto-juvenil com
mais de 40 reimpressões, de 1974, Jornalistas (1937-1997), sobre
os 60 anos do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São
Paulo, e outros, até a sua entrada, aos 46 anos de idade, no mundo da
televisão para trabalhar no programa Globo Repórter, da TV Globo.
Logo passaria para o programa Fantástico e, em
seguida, para o Globo Rural, de onde não saiu mais. Suas
reportagens televisivas no Pantanal, na Amazônia e em outros lugares
paradisíacos do sertão ficaram na memória de muitos telespectadores e são
recuperadas em detalhes por Arnon Gomes, que não se limitou a ouvir o seu
biografado, mas muitos outros profissionais que trabalharam com ele –
alguns dos quais faleceram nos últimos anos. Até porque, como diz Zé
Hamilton com muita modéstia, o repórter teve “a sorte de sempre trabalhar
com equipes de jornalistas melhores do que ele, equipes que o ajudam a
fazer matérias boas o suficiente para serem premiadas”, como se lê na
apresentação que Arnon Gomes fez para o seu próprio livro.
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IV |
Como seu ex-professor, este articulista pode dizer que
Arnon Gomes foi aquele tipo de aluno que todo mestre gostaria de ter como
orientando. Quando se apresentou para receber a primeira orientação para o
seu TCC, já trazia não só o tema escolhido como sabia muito bem os
caminhos a seguir. Além de tudo, já apresentava uma condição essencial
para quem pretendia seguir carreira no jornalismo impresso: sabia escrever
praticamente sem erros de Português, construir imagens atraentes e
insólitas, sem rebuscamento, com um estilo direto.
O resultado foi um TCC que fez história naquela
universidade e é até hoje lembrado pela direção e pelos professores do
curso que tiveram a oportunidade rara de acompanhar a sua apresentação
diante de um auditório lotado. Até porque o homenageado era o jornalista
José Hamilton Ribeiro.
Nascido em Santos-SP, em 1983, o jornalista Arnon Gomes
é editor-executivo do jornal Folha da Região, de Araçatuba,
segunda maior cidade da região Oeste do Estado de São Paulo, que se
caracteriza pela força econômica de sua pecuária e por seu polo
universitário. Pós-graduado em História e Cultura, é autor de mais dois
livros: Com o véu da alegoria, cem anos de carnaval em Araçatuba
(Somos, 2008) e Genílson Senche, homem de ideias e ação (Somos,
2011).
Jornalista ainda jovem, fez deste livro um manual de
jornalismo, reunindo as lições do veterano José Hamilton Ribeiro em meio a
pequenas e grandes histórias, todas saborosas, que fazem parte de sua
longa trajetória. Aos poucos jovens que ainda sonham com uma carreira no
jornalismo impresso, hoje ameaçado de morte pela concorrência digital,
recomenda-se que, antes de prestar vestibular, leiam este livro. Equivale
a fazer o curso de Jornalismo por inteiro.
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O
jornalista mais premiado do Brasil: a vida e as histórias do repórter José
Hamilton Ribeiro, de Arnon Gomes, com prefácio de Sérgio
Dávila. Araçatuba-SP: Secretaria Municipal de Cultura/Editora Eko Gráfica,
260 págs., R$ 35,00, 2015. E-mail:
arnongomes.esc@gmail.com |
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Adelto
Gonçalves é doutor em Letras na área de Literatura Portuguesa pela
Universidade de São Paulo (USP) e autor de Os Vira-latas da Madrugada
(Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1981), Gonzaga, um
Poeta do Iluminismo (Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1999),
Barcelona Brasileira (Lisboa, Nova Arrancada, 1999; São Paulo,
Publisher Brasil, 2002), Bocage - o Perfil Perdido (Lisboa,
Caminho, 2003) e Tomás Antônio Gonzaga (Rio de Janeiro, Academia
Brasileira de Letras; São Paulo, Imprensa Oficial do Estado de São
Paulo, 2012), entre outros. E-mail: marilizadelto@uol.com.br |
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