Vítor Oliveira Jorge

Electri-Cidade - Index

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Eu procuro dizer como tudo é outra coisa. *

 

Eu procuro dizer como tudo é outra coisa.

Eu procuro ver o cão recém-chegado.

A sua boca, a espuma da sua

Proximidade.

 

Eu procuro as costas da tarde

Nos seios expostos da luz.

 

A curva que a casa faz

Ao dobrar-se sobre a colina: esse

Movimento.

 

O espanto do cão.

A sua mordedura no sofá. Sentir

A mesma sensação nos Dentes.

 

A exposição dos candeeiros.

Os globos rolados da colina.

A tentativa do cão os apanhar com a boca,

Apesar de serem muitos, e intermináveis.

 

Eu sou o cão recém-chegado.

O cão Espantado.

 

Acerco-me da hiprocrisia dos sofás

Da sua falsa exposição e disponiblidade.

 

E neles espeto as facas

À procura de algo escondido dentro

Como o dentista se debruça sobre a boca e cai

Entre as amígdalas.

 

O médico frio que se aproxima

Com o estojo dos estiletes.

 

Eu procuro as jarras, as pinças

Que decoram os apartamentos das pessoas,

Essa Consensualidade.

 

Com as facas. Com as fauces.

Com a raiva contraída.

 

Porque eu vejo que tudo é outra coisa.

Que toda a coisa está um milímetro

Ao lado de si mesma.

 

E em vez de as querer fazer coincidir, ou sobrepor,

Eu gozo com essa fenda.

 

Eu sou um um cão em fato completo

E gravata

Que se aproxima com olhos dilatados

Dos sofás.

 

Da sua espantosa ontologia.

 

 

TriploV, 1.11.2008

Conjunto de 10 poemas para o livro
ELECTRI-CIDADE
(a publicar em 2009)

Vítor Oliveira Jorge. Nasceu em Lisboa em Janeiro de 1948.
Formou-se em História na Faculdade de Letras daquela cidade em 1972.
Desde Setembro de 1974 é docente da Faculdade de Letras do Porto, onde se doutorou em 1982.
Poeta, arquéologo, ensaísta, dirigente associativo, tem tido uma actividade diversificada.