como se em breve
às vezes, pela noite,
uma grande jarra de onde brotam
jarros altos, brancos,
brota-me da cabeça.
às vezes, um céu muito azul claro
abre-se diante de mim
pela noite, e por ele começa a subir
a fachada do duomo de pisa,
numa espécie de ascensão rosada,
espantosa.
vejo o rodado das saias
das raparigas sobre a sua
inocência verde: não tardarão
a subir-lhes as raízes
pelo ventre, essa aptidão de caules,
o ardor da inocência,
a extensão verde.
e tudo isto me aparece
a meio da noite
como um crucifixo erecto,
impúdico,
como um lagarto
trepando pela parede parado
nos olhos muito abertos.
teia das imagens.
grande cesto que levo
à cabeça, que me cresce
a meio da noite, e enterra
os vimes no meu crânio.
e vejo subir os anjos
ao longo das fachadas
do baptistério de pisa,
ruborescidos, na sua ambiguidade.
por que razão aparecem
estas figuras a impedir o repouso,
a pedir que as escreva
tão compulsivamente,
como se eu fosse morrer
pela alvorada?
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Vítor Oliveira Jorge. Nasceu em Lisboa em Janeiro de 1948.
Formou-se em História na Faculdade de Letras daquela cidade em 1972.
Desde Setembro de 1974 é docente da Faculdade de Letras do Porto, onde se doutorou em 1982.
Poeta, arquéologo, ensaísta, dirigente associativo, tem tido uma actividade diversificada. |