O nobre caracol: nobre porquanto tem história velha, desde tempos romanos, quando as legiões transportavam as caracularia, grandes caixas de rede onde os gastrópodes se criavam e reproduziam – serviam de gratificante alimento aos soldados do Império. Hermafroditas, com posturas várias ao ano, os caracóis estimam áreas calcárias que contribuam para as casas às costas. Mas serão uma praga para a horticultura se não debastados. Estupidamente, há quem atire para a lavoura pesticidas que, se os destroem, sempre contaminam o humano – preferível é que se comam os caracóis, cujo valor nutritivo é elevado: uma destas pratadas terá mais proteínas que um bife.
Os alentejanos fizeram-se devoradores destes bichos e espalharam o vício por outros pontos do País. Por isso, quando a Primavera vai entrada e até que o Outono o desaconselhe, é ver pelas bermas de estradas e caminhos do Alentejo a gente que por lá vai, catando ervagens e postes e matos. Estão na colecta. Sacos cheios, a abarrotar. Só por mandriice se compreende que, nos nossos dias, até os caracóis se importem – do norte de África, calculem! Ao que chegamos. Habituamo-nos a desprezar o trabalho, falta-nos o engenho para a criação em caracolário, sobra a preguiça e toca de recorrer a importações, com prejuízo da economia (a tal balança comercial) e de portugueses – então não seria mais conveniente trazer desempregados a vasculhar os campos e a vender o produto aos centros comerciais? Que se importem nos anos de má abundância, como foi este. Mas nos restantes?
Saiba-se que o caracol português é mais saboroso que o importado, talvez em consequência dos pastos e do clima. Talvez. E não só o riscado (erradamente chamado “algarvio”); mesmo o branquinho. Convém é que o habitáculo tenha já três voltas, indicativo de que o bicho já tem idade para a panela.
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