Judite Maria Zamith Cruz

A PERSPECTIVA ARQUETÍPICA DA MENTE
O inconsciente colectivo de Carl Gustav Jung (Index)

2.6. Sereias dos mares, armadilhas de marinheiros

O princípio feminino anima foi visto como uma ou outra criatura híbrida, ambígua, uma espécie de ser vindo do ar, do mar ou do mais profundo inconsciente: simultaneamente peixe e mulher. Primeiro o seu corpo foi de pássaro e depois de peixe, de acordo com as lendas nórdicas (1).

No Egipto (2), como a alma dos mortos era um pássaro, a sereia encarnava uma alma transfigurada, caso não cumprisse o seu destino/finalidade. Transformava-se então em vampiro. Somente mais tarde as sereias foram desenhadas em sarcófagos para indicar que o morto - Bem-Aventurado - atingira as Ilhas Afortunadas.

Na mitologia grega, ficou reconhecido Odysseus (o Ulisses romano) pois foi o rei da ilha de Ítaca e um dos heróis da guerra de Tróia. Na lenda difundida por Philip (3), conta-se que o imaginado Ulisses, «o Sobrevivente» (4) , tapou os ouvidos com cera de abelha e pediu para que o amarrassem a um mastro, evitando deixar-se encantar pelo canto de Parténope e das suas amigas sereias. Caso contrário, ele seria comido pelas bestas. Seguira o conselho da feiticeira Circe e provocou o suicídio das sereias.

Ao longo da época medieval, a sereia chegou a ter duas caudas de peixe.

Uma sereia tem duas facetas corporais (peixe e mulher) a que se associou a Harpia (5) («a Depenadora», comedora de cadáveres) e a sua consciência – a Erínia (6)(Fúria romana) .

Na Idade Média, um desses monstros do mar continuava a alucinar os navegantes, sendo idealizada a sua formosura nas histórias de piratas e aventureiros. Seria, inclusive, vaidosa e inconstante para desejar e abandonar o seu «querido» marinheiro preso nas suas redes, ou melhor, nas suas artimanhas.

Na imagem realista (7), representada na figura nº 6, a anima era uma sereia pouco atraente, ao contrário da associação comum à sua beleza. Foi o trabalho de um homem do mar.



















Notas

(1) Jean Chevalier & Alain Gheerbrant (sem data, trad. port. 1997, p. 594).

(2) Chevalier & Gheerbrant, ibid, p. 594.

(3) Neil Philip (1999, trad. port. 1999, pp. 64-65).

(4) Ulisses foi o primeiro herói a ouvir o canto das sereias e a sobreviver. O seu cognome deriva dessa façanha, posterior à heroicidade de Jasão e dos Argonautas.

(5) No mito grego, a Harpia comeria cadáveres (Walker, 1988, trad. port. 2002, p. 245) e foi associada a sacerdotisas funerárias cretenses que se enfeitavam com penas de abutre.

(6) Na Antiguidade, a Erínia representou a consciência e, quando interiorizada, aproximou-se da culpabilidade e do remorso para quem não expie a culpa (Chevalier & Gheerbrant, sem data, trad. port. 1997, p. 288).

(7) David Fontana (1993, pp. 96-97).

Judite Maria Zamith Cruz é doutorada em Psicologia pela Universidade do Minho, onde lecciona cursos de licenciatura e mestrado dedicados ao estudo do desenvolvimento humano e do auto-conhecimento do profissional de educação, desde 1996, é membro de instituições nacionais e internacionais dedicadas ao estudo e investigação da sobredotação, talento e criatividade e, em 1997, integrou equipa internacional e interdisciplinar, coordenada pela Professora Doutora Ana Luísa Janeira, nos domínios de ciência, tecnologia e sociedade - «Natureza, cultura e memória: Projectos transatlânticos». Colabora, desde 2000, no Instituto de Estudos da Criança, em projectos centrados na educação matemática; depois, na área da língua portuguesa e artes plásticas, como membro do Centro de Investigação «Literacia e Bem-Estar da Criança» (LIBEC) da Universidade do Minho .

Entre Janeiro e Julho de1982 foi professora de psicologia e de pedagogia em Escola de Formação de Professores do Ensino Básico de Torres Novas. De Junho a Setembro de 1982, assumiu o lugar de Assistente Estagiária na Universidade de Lisboa – Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação, de que se afastou para desempenhar funções de psicóloga clínica em cooperativa dedicada a crianças e jovens deficientes motores e mentais, em Lisboa – CRINABEL (1982-1985). De 1985 a 1988 foi professora do Ensino Secundário, em Braga, leccionando a disciplina de psicologia na Escola D. Maria II. De novo ocupou funções de psicóloga clínica em associação dedicada à educação de crianças e jovens deficientes auditivos (APECDA-Braga), entre 1988 e 1992. Em 1987, realizou trabalho como psicóloga no Hospital Distrital de Barcelos, de que se afastou em 1990 para efectuar curso de mestrado. Em 1992 ocupou o ligar de Assistente de metodologia de investigação, na Universidade do Minho, em Braga, onde é professora auxiliar.