14.04.04
Joëlle –
Perdoe a demora em responder ao seu livro e à carta. Tenho de chamar todas as forças que me restam para fazê-lo. Estou no fundo do fundo. No Negro. Na pior das várias depressões (como chamam por aí a esses infernos). Não poderei ser extenso como desejaria – e você merece –, mas escreverei com certeza o bastante para dizer-lhe que ler o seu livro foi uma das pouquíssimas exaltações que tive nos últimos – e já extensos – tempos. O livro é inteiramente seu. Se é verdade que você utiliza material meu, em bruto, cristaliza-o depois num sistema peremptoriamente seu. Le son et e sens, isto é: forma e demonstração de entendimento do mundo – nada tem a ver comigo. Se eu estivesse bem, decerto poderia dizer-lhe melhor. Desejo apenas que fique tranquila quanto a este assunto.
Não posso escrever mais.
Parabéns pelo seu livro excepcional e obrigado por ter-me dado a oportunidade de ser o seu primeiro (ou segundo, visto o Júlio já o ter lido) leitor.
Talvez um dia, mais tarde, quando (e se) eu sair do inferno, lhe diga mais longas palavras.
Um beijo.
Muito afectuosamente,
Herberto
P.S. – Não hesite nem um momento em publicar a sua obra.
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