Britiande é uma freguesia do concelho de
Lamego, com 5.39 km² de área e 1 015 habitantes (2001). Densidade: 188.3
hab/km². Foi sede de concelho até ao início do século XIX. Britiande é
constituída apenas por uma freguesia e pertence ao concelho de Lamego,
distrito de Viseu.
Datando de tempos recuados, temos
indicações de influências ibéricas - naturalmente, pré-celtas, celtas e
celtibéricas -, da presença dos Romanos na região, com vestígios ainda
existentes, como a conhecida Quelha da Azenha, parte de uma via romana
que unia Lamego a Britiande, ultrapassando a cidade e a vila para um
lado e para o outro. Datará do governo do imperador de Roma, Cláudio [10
a. C.- 54 d. C.], a acção das legiões que levaram à morte colectiva dos
Lusitanos. A Hispânia veio a ser invadida pelos Suevos (em 476, uniam a
Galiza ao rio Tejo, com a capital em Braga, centro laico e religioso
cristão) e conquistada e romanizada, no seu todo, pelos Visigodos. Da
presença moura pouco se sabe. Histórias e lendas, com Lamego como pano
de fundo, em quase nada, ligam os Muçulmanos aos Cristãos nesta área
geográfica.
A História fala, porém. Nas operações
militares contra os Mouros, durante a “Reconquista”, a tomada
definitiva, em 1057, de todo o triângulo Norte que incluía Viseu, Seia e
Guarda a Lamego e Tarouca – não pôde deixar de fora Britiande, Lalim, e
Silvares, entre outras de igual ou menor importância. A liderança das
acções bélicas que deram origem a este importante acontecimento ficou a
dever-se a Fernando I de Leão e Castela [1016-1065], o primeiro monarca,
representante da dinastia de Navarra, bisavô de D. Afonso Henriques,
primeiro rei de Portugal [1109-1185].
Podem ver-se, em Vila Nova, as ruínas do
Paço que outrora pertenceu a D. Egas Moniz. O mais antigo documento que
nos resta, pela perda de anteriores, data de 1153 e diz respeito à viúva
daquele, D. Teresa Afonso. Assim, desde 1146 que se refere a “Villa
de Bretenandi”, ou uma área agrária e populacional. Nesta mesma
sequência, ela é localizada “abaixo do monte Esculca, junto às águas
correntes do rio Barosa, no território de Lamego”.
No entanto, a actual freguesia está longe
de corresponder, em área, à antiga, pois demos conta que evoluiu, com a
adição de uma freguesia e a supressão de outra, entre 1758 e 1850,
reajustada ainda posteriormente. Quando os distritos foram instituídos
em 1835, por uma reforma de Mouzinho da Silveira, Lamego foi,
inicialmente, prevista como sede de distrito; mas, nesse mesmo ano, a
sede distrital seria deslocada para Viseu, devido à sua posição mais
central.
Britiande foi doada sob a forma de uma
honra a Egas Moniz, em 1102, pelo conde D. Henrique, marido de D. Teresa
de Leão e ambos pais do que viria a ser rei de Portugal.
O património ou domínio de Egas Moniz
fora, na realidade, imenso, com prédios seus. Situava-se Britiande, com
outras, entre os rios Balsemão e Barosa.
Tendo passado para a posse da viúva,
transitou, à morte dela, para a 3.ª filha de ambos, D. Elvira Viegas,
provavelmente a única que era viva ao tempo.
À morte desta senhora que a teve como
honrada, por falta de descendentes, Britiande passou para os domínios da
Coroa e, só com D. Dinis, transitou para os Condes de Barcelos, passando
por D. Pedro Afonso, 3.º Conde (séc.s XIII e XIV), por D. Afonso, 8.º
Conde de Barcelos (século XV), genro de D. Nuno Álvares Pereira, sendo,
hoje, o título pertença de D. Duarte Pio, como já o fora de seu pai, D.
Duarte Nuno (séculos XX e XXI). Todo o aro de Lamego, incluindo grande
número de casais e villas com suas quintãs, veio a pertencer ao 2.º e
3.º Duques de Bragança e Condes de Barcelos, ambos de nome Fernando.
Entretanto, Britiande era incluída numa
lista de villae na então jurisdição de Lamego que eram doadas
João Rodrigues Pereira por D. João, ao tempo regedor do Reino (7 de
Abril de 1385), a saber: Canaveses, o Couce, Aldeia de Galegos, Várzea
da Serra, Omezio, Campo Benfeito, Lalim, e outras honras que haviam
pertencido a D. Pedro Afonso. A 31 de Agosto de 1423, D. João I, a
pedido dos vizinhos de Britiande, outorga-lhes carta de privilégios,
isentando-os do pagamento de impostos concelhios – entenda-se pagos a
Lamego – e de servir nas obras de reconstrução do castelo desta cidade.
Como intermediário, entre os vizinhos e o monarca, figura Martim Vasques
da Cunha, alcaide-mor do castelo de Lamego, que, então, detinha
Britiande como honra. Carta confirmada por D. Duarte, já a D. Fernando,
9.º Conde de Barcelos, 2.º Duque de Bragança, a 25 de Dezembro de 1433,
mas como beetria situação administrativa e jurídica que já vinha de seu
pai, D. Afonso, bastardo do rei de Portugal.
Como dissemos, esta situação por que
passou Britiande, faz dela uma Beetria, e, na verdade, a população da
vila não se desgarrou tão cedo da protecção dos Condes de Barcelos e,
mais tarde, Duques de Bragança. Foi escolha feita pelo seu Povo, como
sucedia, por vezes, no Reino, preferindo soltar-se da jurisdição directa
de Lamego e do seu almoxarifado, e ligar-se a um senhor que a vila
escolhera então, como protector, e a quem ficava a pagar direitos
senhoriais e dominiais, sobretudo em géneros e serviços. Ao monarca
solvia e reconhecia apenas os seus direitos reais, ou, tão-só, parte
deles, tendo ainda como garantia que os crimes cometidos pelos seus
vizinhos e moradores seriam julgados pelo tribunal do senhor de beetria,
excepto os que merecessem a pena capital ou o talhamento de membro sobre
o que o rei de Portugal tinha 20 dias para exarar a sua decisão. Não há
notícia de Lamego se ter insurgido contra o facto da constituição da
beetria, como sucedeu com outros casos em Portugal, dando origem, então,
a uma beetria de linhagem, por incomuniação das gentes locais. E assim
foi até 1550.
Entretanto, os tempos de instabilidade,
resultado da oposição do futuro herdeiro do trono, D. Afonso (IV),
contra o pai, temendo os favores que este fazia a seu filho bastardo
Afonso Sanches, levaram também a que o Infante D. Pedro Afonso, outro
dos filhos legítimos do Lavrador, viesse a deter um bom património,
sobretudo nas comarcas do Minho e da Beira, principalmente ao redor de
Lamego, vindo, desta feita, Britiande a pertencer-lhe de juro e herdade.
Como beetria, Britiande apenas deixou de o
ser, quando começaram a aparecer famílias nobres locais. Mas também não
lhe faltou uma vida atribulada nas conjunturas da Crise Dinástica
[1383-1385] e das Guerras com Castela [1369-1402], pertencendo a nobres
de alta linhagem que se desviaram da linha familiar mais antiga,
regressando esta, em 1397, por privilégio de D. João I ao que veio a ser
8.º Conde de Barcelos, seu filho bastardo D. Afonso, o futuro 1.º Duque
de Bragança, título concedido pelo regente D. Pedro, seu meio-irmão, em
1442, durante a menoridade de D. Afonso V. Com ela, ainda os moradores
de Várzea da Serra, de Campo Bem Feito e de Omezio haviam representado
ao rei que eles sempre foram privilegiados, com a isenção do serviço
militar, acompanhando fosse quem fosse, excepto aquele que eles
escolhessem por seu senhor, como é seu costume” e, contudo, estavam a
ser obrigados a ir servir, acompanhando os fronteiros da comarca, ou
seja, os governadores da Beira. Ficou então, por determinação régia, o
referido D. Afonso como Senhor de Beetria e depois dele, os Condes de
Barcelos e Duques de Bragança.
Como Paço (com sua área destinada à
agricultura) e depois vila ou seja centro urbano, que desponta na Idade
Média, Britiande contou com as fortificações de Lamego e de Tarouca para
defesa de investidas da parte dos Muçulmanos aguerridos. Teve a casa da
Câmara, o seu pelourinho frente ao edifício, a cadeia, uma rua do
mercado, e a sua Igreja Matriz, devota a S. Silvestre que datam da Idade
Média. As origens da
dita igreja remontam, pelo menos, aos meados do século XII, época em
que, pela primeira vez, surge referida na documentação. Mais tarde, já
no século XVII, o eventual estado de degradação do templo deu azo à sua
reconstrução, numa linguagem maneirista que se manifesta quer na
arquitectura quer na primeira campanha decorativa do interior. A fachada
demonstra, no entanto, a existência de intervenções posteriores, talvez
contemporâneas da remodelação da torre sineira, no século XIX. Esta, em
cantaria, contrasta vivamente com o alçado do templo que ostenta certa
nobreza e mesmo uma relativa magnificência arquitectural na sólida torre
já referida que ladeia da esquerda a citada igreja.
Esperemos pelos resultados do
censo que esteve a decorrer há pouco, a fim de vermos a actual situação
em número da população e da razão para se estender um tanto para terras
do seu termo.
Lamego, Maio de 2011 |
FERNANDES, A. de Almeida, Terra Dos Oito Morgados de Britiande,
sep.ª do Douro Litoral – Boletim da Comissão de Etnografia e
História, Porto, Imprensa Portuguesa, 1957;
FERNANDES, A. de Almeida, Paróquias Suevas e Dioceses Visigóticas,
Viana do Castelo, 1968;
FERNANDES, A. de Almeida, A História De Britiande. Homenagem de
Britiande a Dom Egas Moniz (no 850.º aniversário da sua morte),
Braga, Câmara Municipal de Lamego, Junta de Freguesia de Britiande,
1997;
Chancelarias Portuguesas. D. João I,
Volume I, tomo 2, organ. por João José Alves Dias,
Lisboa, Centro de Estudos Históricos da Universidade Nova de Lisboa,
2005, doc. 737;
Chancelarias Portuguesas. Ibid.,
Volume I, Tomo 3, 2005, doc. 1249;
Chancelarias Portuguesas. D. Duarte,
Vol. I, Tomo I, organ. por João José Alves Dias, Lisboa,
Centro de estudos Históricos da Universidade Nova de Lisboa, 1998, doc.
398;
Censual da Sé de Lamego (Século XVI).
Leitura, transcrição e notas de A. de Almeida Fernandes,
Arouca, 1999;
FERNANDES, Rui, Descrição do terreno ao redor de Lamego duas Léguas
{1531-1532], ed. crítica de Amândio Morais Barros, Porto, Março de
2001;
SOUSA, João Silva de, A Casa Senhorial do Infante D. Henrique,
Lisboa, Livros Horizonte, 1991;
SOUSA, João
Silva de, “Inquirição de D. Duarte aos Almoxarifados de Viseu e Lamego
(1433-1434) ”, in Mare Liberum, N.os 11-12, Lisboa, Comissão
Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, Jan./Dez.
1996, pp. 103-163;
SOUSA, João Silva de, Senhorias Laicas Beirãs no Século XV,
Lisboa, Livros Horizonte, 2005;
SOUSA, João Silva de, D. João de Menezes, 1.º Conde de Tarouca,
2008 (no prelo). |