Lágrimas são
salgadas porque não há doçura na dor.
Pompeia também
era assim.
Velha vila a
salvo
à sombra morna
da montanha
sólida
que por acaso
desabrochou a
grande flor do caos.
Pequenas flores
de calor
bocetas são
agridoces.
Não há doçura
pura.
A pura aspereza
da dor.
Telefone então
para a farmácia:
tudo se entrega
na cidade.
Cidade-delivery.
Cidade entregue.
Aberta sobre o
inseto do planeta
a noite é uma
grande flor negra.
Ao menos seus
grãos de pólen
parecem
estrelas.
Janelas acesas.
Vidas apagadas.
É melhor se
render aos fatos
antes que eles
atirem em você.
Bala abstrata
entranhada na
carne
a dor
sangra no
cérebro.
Em mar aberto
japoneses matam
os mais
magníficos animais
que jamais
existiram
soberbas baleias
para que logo se
tornem
merda humana.
Tanta gente
insana:
porque foram
crianças
nas mãos de
gente um tanto insana.
O que se quer
de uma mulher
é algum alívio
para a dor
tantas vezes por
ela excitada.
Where is God
when I´m making love?
As asperezas da
crença
não aparam as
rugosidades do caos.
Se o mundo não
parece mais
poder ser mudado
mude-se a si
mesmo.
Foi um chamado à
cirurgia plástica.
Minha libido foi
pro saco.
Não há mais como
ser como Rimbaud
repudiar a
poesia
e a Europa.
Pode-se repudiar
a Europa
e a poesia
mas grande
porcaria.
Não tenho nada
contra a poesia contemporânea.
Se acaso achar
algo nela, aviso.
Perigo.
Risco de
explosão do não-sentido.
Nas esquinas,
mendigos
fazem um
malabarismo distraído
com as moedas e
os dias
enquanto
malabaristas mendigam
centavos de
atenção.
A esponja do
cérebro
não pode mais
absorver
o dilúvio de
loucura líquida.
Quando chove
a cidade alaga
seu caos seco.
A computação em
nuvem é o melhor reflexo
da
cultura-espuma.
A poesia
contemporânea levou a obsolescência programada ao estado de arte.
A renúncia do
papa não me interessa
mas a dos
poetas.
"Fora da Igreja
não há salvação".
Dentro também
não
principalmente
para menores.
"Nenhum livro é
tão ruim
que dele nada se
aproveite"
disse Santo
Agostinho.
Naturalmente
ele não conhecia
a poesia contemporânea.
Só há um
mandamento:
"Não faça a
ninguém
o que não quer
que lhe façam".
Não exige Deus
mas decência.
A poesia
brasileira vai muito pior que a Igreja.
O sexo é a
melhor coisa do mundo depois das preliminares.
Flores sem caule
não se colhem
com cortes
mas com
sementes.
Laranjeiras têm
flores brancas.
Tão brancas
quanto a luz do sol
no branco solar
da pele branca
como pétala de
flor de laranjeira.
Xoxotas têm
pétalas roxas.
Se não existe
poesia abstrata
ela que trate de
dizer coisa com coisa.
A líquida luz
quente do sol
sobre o veludo
frio da sombra.
Não há mais nada
a dizer sobre o amor
além de que tudo
o que ainda seja
dito
sobre o amor é
bendito.
O embate não é
entre fé e razão
mas entre fé e
lucidez.
O islã é uma
religião de paz.
Para quem
duvidar
há a guerra
santa.
Há uma guerra
civil sutil no país.
São Paulo não é
uma cidade
mas uma
esperança, uma espera e um desespero.
Suicidas
vegetarianos usam herbicidas.
Flores caídas
nas calçadas
nunca
recolhidas.
O sal da saudade
só se tempera
com o açúcar do
tato.
O amor é o sexo
abstrato.
O sexo não é o
amor concreto.
O amor é
concretamente líquido.
A internet é uma
máquina de liquefazer a timidez dos idiotas.
Entre a
liberdade e a igualdade
a esquerda
escolhe a segunda
a direita, a
primeira.
Uma prefere a
ilusão
a outra, a
mentira.
A prosa pode ser
ruim
e ainda conter
uma história bem contada.
Um poema ruim é
uma conquista da física:
puro punhado de
nada.
A tristeza é uma
dor descarnada.
Não há mais
contra o que se bater
ser beat,
hippie, punk, dark
anarquivanguardicomunista:
o ácido da
realidade
derrete tudo.
Atenção: chão
escorregadio.
Atentos pombos
pedestres
partem dos
prédios-pombais
fazem o que têm
de fazer
incluindo muita
merda
e logo retornam.
A
cidade teme
até a doçura da
chuva.
A chuva é o
sêmen de Deus.
A Terra, sua
boceta aberta.
Com 7 bilhões de
humanos no planeta
a solidão
é o animal mais
ameaçado de extinção.
O islã é a maior
ameaça à paz dos muçulmanos.
Com 7 bilhões de
humanos no planeta
a solidão
é o segundo
animal que mais prolifera.
Madrugada. O
silêncio da cidade é áspero.
O Brasil poderia
ser um grande país
não fosse sua
pequenez.
"Somos feitos da
matéria dos sonhos" (Shakespeare).
A mesma dos
pesadelos.
Se o inferno são
os outros
o céu sou eu ou
a solidão
que são, afinal,
a mesma coisa
e
igualmente infernal
Don't matter where you are
everybody gonna
need some kind of ventilator.
Algum que
ventile a dor.
A poesia parou.
Se não há Deus
só a vida
importa.
Bitches.
Luis Dolhnikoff
Nota: “Rap
branco”, não porque feito por um branco, mas porque sem rimas
sistemáticas. E “rap” porque criado para o público, com o público na alça
de mira, ao contrário da poesia atual em geral, geralmente feita para nada
e ninguém além do espelho barato da vaidade do poeta. Na direção e no
sentido contrários, aqui foi utilizado o Twitter, para o qual as frases
que compõem o poema foram originalmente criadas. Com três vantagens ou
objetivos: o Twitter exige que as frases tenham um mínimo de interesse
potencial; determina uma medida, uma “métrica”, em função do limite de 140
toques; e induz uma temática não descolada do mundo imediato. O material
bruto da coleção de frases foi então recolhido e retrabalhado, sem que seu
paralelismo, sua autonomia original, fossem totalmente apagados ou mesmo
muito diluídos, pois a coerência, a integridade, a inteireza, não são mais
deste mundo. Outro motivo para o uso do Twitter: a fragmentariedade
congênita do futuro poema, impedido de nascença de apresentar qualquer
ilusória e ociosa organicidade. Enfim, melhor talvez um rap branco do que
um poema pálido.
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