LÍNGUA PORTUGUESA
ENTRE DESRESPEITO E IDEOLOGIA - O PORTUGUÊS NÃO É DE PORTUGAL NEM DO
BRASIL ELE É A ALMA DA LUSOFONIA
Quem tocar na língua deve fazê-lo com
respeito e de forma moderada porque ela é a alma da cultura, a água
límpida que dá forma mais ou menos física à cultura de um povo. O
Português não é só forma e meio de expressão de um povo, de uma região, de
um país ou de um continente, ele é a a alma e expressão sublime
de muitos e nobres povos que formam uma civilização intercultural
interoceânica e intercontinental - é um idioma onde os diferentes génios
de povos se miscigenam no sentido da evolução cultural e civilizacional.
Seria ofensor do Português querer vê-lo reduzido a um lago ou país, ou
mesmo a um mar ou continente, quando integra nele a experiência de vida
dos diferentes continentes, sendo ele um mar aberto de águas
interoceânicas.
Constituiria um acto de infidelidade
e falta de brio, uma falta de autoconsciência querer apoucar-se o
Português a uma terra maninha ou baldio incultivo, querê-lo uma árvore sem
raízes ou reduzi-lo a simples coutada de alguém. O Português, como a
água tanto rega os baixios da favela como os lugares altos do país e da
civilização. No seu todo é que a língua é grandiosa, na rica expressão
multiforme e na sua capacidade de diferenciação. O português não é de
Portugal nem do Brasil; ele é teu e meu, é de todos, como o céu é das aves
onde todas voam e se encantam. O português quando ouvido lembra diferentes
melodias de variadas intonações. Ele é como a terra mais virgem ou mais
elaborada, uma intercultura a proteger-se tal como uma terra indígena a
defender-se.
A notícia de que “A Literatura
portuguesa deixa de ser obrigatória no Brasil” (1) deixou-me perplexo e
desiludido tal como a mutilação da língua, no que toca ao acordo
ortográfico.
Defraudadores da
Língua roubam as penas aos pequeninos e ao pensamento
Na minha qualidade de docente,
divertia-me quando ensinava o Português aos distraídos que o queriam
simples e imediato mas entristecia-me de sobremaneira quando, ao ensiná-lo
no secundário e na universidade (de Kassel), onde estudantes já com
capacidade de diferenciação se viam confrontados com os nossos
gramáticos simplicistas que o empobreciam, ao roubar-lhe a segunda pessoa
do singular e do plural (o tu e o vós) como se fossemos crianças que só
compreendessem o “eu” e o “você”. Esta falta originava uma certa confusão
a estudantes habituados a línguas de alta diferenciação em que se usam
normalmente todos os pronomes pessoais (Eu, Tu, Ele/Ela, você, a gente,
Nós, Vós, Eles/Elas, vocês). Contra a corrente simplicista em voga,
implementada por ideologias proletárias, optei por elaborar a minha
sebenta onde colocava todos os pronomes de expressão diferenciada e
distinta. Via-o também como uma ferramenta de trabalho – uma
possibilitação de oportunidades - tanto para futuros pedreiros como para
futuros advogados. Tratava-se de dar as mesmas armas a beneficiados e
desfavorecidos da vida para, uns e outros poderem combater pela vida fora
com as mesmas armas e não apenas com as que a sorte ou a oportunidade lhes
deixou.
A vida é luta e é desigual e quem
apregoa uma igualdade sem esforço e gratuita ou é mentiroso ou é
oportunista. Quem pretende libertar as massas do destino terá de lhes
proporcionar o instrumentário e a vontade de o fazer!
Ou queremos manter uma sociedade em que ao ouvir as pessoas falar se fique
logo com a ideia da sua proveniência como acontecia antigamente ao
olhar-se-lhes para os dentes? Quem, politicamente, tem só facilidades ou
facilitações para oferecer, sem apontar o preço que se tem que pagar por
elas, não é sério porque aposta na lei da inércia e no oportunismo que ela
proporciona às aves de rapina!
As questões da língua não podem ser
deixadas nas mãos de políticos feitos mais para as coisas grossas do que
para as finas. A ideologia de alguns, no zelo do seu preconceito, chega a
tal disfarce de dizer que o emprego do „vós“ é próprio da igreja, (de quem
aprendeu latim e grego) como se, só padres, advogados ou médicos tivessem
uma tal capacidade de discernimento e distinção! Aqui faria um apelo aos
irmãos seguidores do soberbo Marquês de Pombal e ao proletariado
intelectual de esquerda: não se virem também contra a igreja católica que
no seu processo de aculturação e inculturação aprendeu a honrar e a
respeitar a cultura seja ela a dos cedros do Líbano ou a dos pinheiritos
raquíticos fustigados pelo vento salgado. Faz-me tanta dor ver que tanta
esquerda irmã a combater Cristo pelo facto de ele se colocar ao lado dos
pequeninos mas não com os mesmos meios, os meios activistas de Judas.
Demo-nos as mãos; juntos certamente conseguiríamos tirar os irmãos das
favelas; separados continuaremos a servir a dois senhores!
Que o povo simples se expresse como
sabe e como pode, não é mal, o que é de lamentar é que já na escola se lhe
cortem as asas dando-lhe apenas asas de pardal quando precisariam das de
águia para subir mais alto. Este é o grande engano e a mentira declarada
de uma esquerda radical que só alimenta o proletariado com ideologia não
lhe facultando boas asas para que o proletariado não só possa voar mas
para que tenha também a possibilidade de voar alto e assim notar que só
das alturas se consegue ter a perspectiva de reconhecer quem explora
económica e ideologicamente. É natural que uma sociedade de modelo
soviético só precisaria do proletariado almeida e de uma pequeno grupo de
águias - troica- que os governe e que um capitalismo liberal precise só de
braços ou de mentes bem podadas para melhor produzir porque a capacidade
de pensar só estorva.
Defraudadores da Língua portuguesa,
porque roubais as penas aos passarinhos e ao pensamento? Não notais que,
as asas com que voais, as não dais à passarada que em baixo esvoaça em
volta dos trigais para que não possa voar nem subir mais?
(Se escreverem um texto como este último parágrafo – que
de propósito escrevi na segunda pessoa do plural – num computador com
programa corrector de ortografia, logo notarão que as segundas pessoas
verbais aparecerão assinalados como erro e com a indicação de se corrigir
para a terceira pessoa! A pobreza de espírito e a entropia já chegaram
a tal ponto de fazer uso da tecnologia para nos passar a ferro e
embrutecer).
Uma Ideia de emancipação masculinizada,
ao seguir o fluxo de um populismo barato, exige que, em questões de língua
e de educação, se ande de cavalo para burro. O maior passo nesse sentido
deu-se já no processo da regressão com o “Acordo Ortográfico” de 1990 (2).
Quer-se uma reforma para favorecer ideologias e uma economia ligada ao
comércio da cultura e a monopolistas e a um MEC a querer ter melhores
satisfatórios nos meios analfabetos… Cultura não se pode adquirir com
tarifa zero nem com ideologias de trazer por casa que passam como as
nuvens em tempos fortes de altas e baixas pressões.
Ai dos Vencidos!
Como pode um país jovem e promissor,
como o Brasil, seguir servilmente ideologias niilistas e marcadamente de
extrema-esquerda que são o produto importado de um estado ocidental
decadente e senil? Não notam que em cada fase do desenvolvimento seja de
uma pessoa ou da história de uma sociedade, a cada fase corresponde uma
diferente acção, pedagogia e ética? Esta Europa que já foi jovem e adulta
e agora vai passando a vidinha já não tanto com base no trabalho mas nos
serviços e na ideologia não pode ser norma para países jovens que passam a
ser mais prejudicados pelo jugo novo do que pelo antigo. Como não nota a
classe média de um país jovem que muitos dos seus impulsionadores só
seguem atrás de um progresso que os não serve, apenas os adia e leva a
empatar o melhor do seu tempo em copiar sem adaptar, no seguimento dos
arrotes de ideias e de ideologias que são característica do espreguiçar-se
de civilizações na sua fase velha e não do seu início? Não notam que
consomem não só os produtos ocidentais mas, o que é mais grave ainda,
também consomem as suas ideias de plástico, sem serem vivificadas nem
sequer aferidas? Não notam que colonizam em nome da
contra-colonização? Não notam que onde chega uma mentalidade
decadente, fruto do Ocidente, ao ser importada pelos países emergentes,
estes se destroem a si mesmos com novas doenças não só físicas como também
intelectuais, tornando-se cada vez mais dependentes? Não notam que as
instituições que exigem saber, disciplina e rigor para os seus empregados
apregoam o simplicismo e o à-vontade para um vulgo que querem inerte e
disponível? Uma nação faz-se pelo trabalho, pela qualidade da formação e
por uma vontade determinada de ser, como mostraram e demonstram os judeus,
como mostraram os portugueses, como mostrou a civilização ocidental quando
se orientava por ideais universais e não apenas por objectivos económicos,
quando a classe média se sentia responsabilizada e não se deixava levar em
conversa fiada como querem as novas burguesias intelectuais citadinas e os
novos ricos.
Ensino de
literatura lusófona em todos os Países de língua lusófona
Entre os países lusófonos deveria
haver um contracto
interestadual em que cada Estado lusófono se comprometesse a incluir e
implementar, nos seus programas e currículos escolares, literatura de
todos os estados lusófonos. Urge fortalecer
intelectualmente uma camada média consciente e capaz, com um ensino
exigente, porque desta é que vem a massa crítica que corrige, desenvolve e
equilibra os exageros dos extremos. Urge que, todas as organizações
empenhadas na lusofonia façam valer as suas influências perante os países
lusófonos no sentido de ser implementado o intercâmbio cultural e o ensino
da literatura lusófona já a nível de escolas secundárias.
Como pode haver um estudo sério do
português na escolarização sem o estudo de linguística e da história da
literatura do português desde as suas origens?
É mais que óbvio o estudo do seu desenvolvimento desde o latim vulgar e
latim erudito ao português arcaico, galaico-português, Gil Vicente, ao
português moderno de Luís Vaz de Camões, António Vieira, Fernando Pessoa e
o seu desembocar nos diferentes sistemas literários de cada país lusófono,
como, em relação ao Brasil, com um Machado de Assis, Drummond, Cecília
Meireles, Jorge Amado, etc.
A política de língua seja ela no
Brasil, Angola, Moçambique, etc. terá naturalmente que implementar o
estudo das línguas indígenas, mantendo, no interesse da identidade
nacional, uma incidência especial no português falado como o idioma
nacional oficial.
Conclusão – Fernando
Pessoa é o Protótipo do homo lusófono
Uma mentalidade bárbara procura, em
nome de um capitalismo avassalador, de um socialismo aplanador e de uma
emancipação masculinizante, acabar com as próprias raízes e origens no
desprezo pela mãe latina, como se uma sociedade se pudesse manter viva
contentando-se com o ir à prostituta, ou negar nela as virtudes e os
defeitos que tornaram povos pequenos grandes.
Quem faz das origens um borrão e acaba com as referências históricas,
retrocede em vez de evoluir. Não é justo querer funcionalizar o povo
indefeso e distraído no sentido de ser apenas braços, estômago e abdómen.
Nesta fase social da História quem não defende uma classe média forte e
consciente atraiçoa o povo. As nomenclaturas das ideologias e da
economia trabalham a grande pedalada para que toda a sociedade se torne
dependente de uma pequeníssima elite com o monopólio da influência
cultural e económica. Por isso atacam tudo o que lhes oferece
resistência seja o cristianismo, seja uma camada média resistente ou seja
o sindicalismo. Querem transformar a democracia numa democratura
Na Alemanha os sindicatos e a Igreja já colaboram em acções comuns numa
tentativa de impedirem a arrogância política e económica que se encontram
cada vez mais de braço dado.
Verifica-se que, em todos os governos,
onde a esquerda assume o governo logo procura, à maneira jacobina,
influenciar determinantemente o sistema de educação e, quando em governos
de coligação, segue a estratégia de assumir as pastas da cultura e do
ensino, seus meios privilegiados para garantir a sustentabilidade da
influência. A influência e o domínio social que o capitalismo adquire
com a economia são adquiridos pelo socialismo através da cultura: Formam
um par unido na exploração humana. Naturalmente esta estratégia não é de
condenar. O que é de condenar é a atitude descomprometida de conservadores
que por preguiça ou favorecimento da natureza se vejam apoiados sem
necessidade de se empenharem.
Uma política redutora e nacionalista
não pode ter a pretensão de querer inventar a roda de novo, nem tão-pouco,
com a desculpa do colonialismo e da opressão externa, justificar uma
colonialização ideológica interna que possa vir a alimentar o alarde de
novas ideias de gene colonizadora. As grandes nações criam-se em torno do
trabalho, do estudo e de uma vontade guiada por um sentido comum. Fernando
Pessoa é o Protótipo do homo lusófono. Fernando Pessoa reúne e resume nele
a grandeza de alma da pessoa lusófona.
A língua lusa é a pátria de Angola,
Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Macau, Moçambique,
Portugal, Timor-Leste, de São Tomé e Príncipe e de tantas comunidades
falantes do português, espalhadas por todo o mundo. A língua lusa é aquela
alma que nos torna a todos irmãos. Fernando pessoa, aquele génio de
personalidade lusa migrante, que reuniu numa só pessoa o contraditório e
os opostos, é o melhor protótipo do lusófono; na diversidade e integração
dos seus heterónomos viveu e reviveu a grandeza e multiplicidade dos povos
da lusofonia que o fez exclamar, também da perspectiva geográfica
horoscópica, com amor e devoção: “A minha pátria é a língua
Portuguesa”!
António
da Cunha Duarte Justo
Pegadas do Tempo
http://antonio-justo.eu/?p=3511
(1)
Notícia em
http://economico.sapo.pt/noticias/
literatura-portuguesa-deixa-de-ser-obrigatoria-no-brasil_243170.html
Entre outros textos que
escrevi: ACORDO ORTOGRÁFICO SEGUE A VIA POPULAR
http://antonio-justo.eu/?p=2190
BARBARIDADES CONTRA A LÍNGUA PORTUGUESA
http://antonio-justo.eu/?p=2843“Preparar uma ínclita geração”
(2)
Entre outros textos que escrevi: ACORDO ORTOGRÁFICO SEGUE A VIA
POPULAR
http://antonio-justo.eu/?p=2190 BARBARIDADES CONTRA A LÍNGUA
PORTUGUESA
http://antonio-justo.eu/?p=2843“
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ANTÓNIO da Cunha Duarte JUSTO . Nasceu em Várzea-Arouca (Portugal). E-mail: a.c.justo@t-online.de.
Professor de Língua e Cultura Portuguesas, professor de Ética, delegado da disciplina de português na Universidade de Kassel .
PUBLICAÇÕES
- Chefe Redactor de Gemeinsam, revista trimestral do Conselho de Estrangeiros de Kassel em alemão com secções em português, italiano, turco, françês, grego, editada pela cidade de Kassel, tiragem 5. 000 exemplares.
- Editor da Brochura bilingue: "Pontes Para um Futuro Comum – Brücken in eine gemeinsame Zukunft", editada na Caritas, Kassel
- Editor de "O Farol" , jornal de carácter escolar e social em colaboração com alunos, pais e portugueses das cidades de Bad Wildungen, Hessisch Lichtenau, Kassel, Bad Arolsen e Diemelstadt( de 1981 a 1985)
- Editor de „Boletim da Fracção Portuguesa no Conselho de Estrangeiros de Kassel (1984)
- Autor da Brochura „Kommunalwahlrecht für Ausländer – Argumente“ editada pela Câmara Municipal de Kassel, Fevereiro de 1987.
- Co-autor da Brochura „Ausländerbeiräte in Hessen - Aufgaben und Organisation“, editada pela AGAH e Hessische Landeszentral für politische Bildung, Wiesbaden, 1988.
Colaborador de vários jornais e do programa de rádio semanal de português de Hamburgo.
http://blog.comunidades.net/justo
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