Um Exemplo
para Portugal e para a Lusofonia: Bad Wörishofen
Bad
Wörishofen pode considerar-se um modelo em questões de integração de
inteligências e interesses complementares no âmbito da saúde, da política,
da economia, da formação e da cultura; os diferentes sectores da
cidade desenvolvem estratégias comuns, investindo, de maneira complementar
e cooperativa, reagindo assim, de maneira adequada, às potencialidades do
meio, aos gostos do tempo e à procura do mercado. Aqui se vê o testemunho
de que a matéria-prima mais rica, que um lugar tem, é a inteligência e a
vontade de o transformar.
Quando, em
1975, estive em Bad Wörishofen e, por curiosidade, pratiquei alguns
exercícios de aplicação de água fria nos braços e nas pernas, nas
instalações dos parques públicos, recordei-me de uma curiosidade de
espírito semelhante, que tinha verificado em Portugal. Em 1972
encontrava-me como orientador de alunos de Izeda, numa colónia de férias
da praia da Areosa, a norte de Viana do Castelo. Fiquei então surpreendido
quando vi, no lusco-fusco da manhã, mulheres vestidas, agarradas às pedras
da praia sofrendo o embate das ondas frias sobre seus corpos. Foi-me então
explicado que o faziam por razões de saúde.
Em Bad
Wörishofen impressionou-me verificar como, o simples facto da diferença de
temperatura de águas, aliada às ideias e experiência de um visionário
(“Pároco Kneipp”), ter transformado uma aldeia de vacas numa vila que se
pode considerar a sala de visitas de toda a região com renome
internacional. Quando penso em Portugal, lugar privilegiado no mundo pela
diversidade de riqueza de suas águas termais, já há dois mil anos
exploradas pelos romanos, surge-me um sentimento de melancolia e uma ideia
brilhante de um Portugal em florescência.
Por isto e
por outras, todo o pessoal de termas deveria visitar Bad Wörishofen para
ver como aqui se conseguiu unir, em torno de uma ideia,
o saber, as
necessidades, as pessoas, a natureza, os balneários, os parques, a cura, a
cultura, as caixas de previdência, a repartição de turismo e as finanças,
no sentido de uma indústria da cura e do bem-estar físico e psíquico
geral. Bad Wörishofen juntou a tendência das necessidades individuais e
sociais com a inteligência económica, vivendo, hoje, toda a cidade, dos
frequentadores das “termas”, tornando-se actualmente também num lugar de
fixação de pessoas idosas abastadas. Esta pequena cidade com quase 15.000
habitantes tornou-se, segundo a apreciação da revista TIME, numa das 12
cidades da Alemanha mais dignas de visita.
Hidroterapia
e Dietética do Naturista Sebastian Kneipp
Sebastian
Kneipp (Stephansried, 17 de maio de 1821 — Bad Wörishofen, 17 de junho de
1897) foi um sacerdote católico, defensor do naturismo, que se dedicou ao
estudo e promoção da terapia através da água, revolucionando a medicina
alternativa. Foi director das termas de Bad Wörishofen e criador da
Terapia Kneipp, uma estratégia hidroterapêutica e dietética com muito
sucesso.
Filho de
uma família pobre do sul da Alemanha,
trabalhava como pastor das
vacas da sua aldeia, mas quando a casa da família ardeu e com ela as suas
árduas poupanças de 70 Gulden, abandonou a aldeia para trabalhar fora, na
condição de criado.
Como era
inteligente, um capelão ensinou-lhe o latim, preparando-o para a
frequência do liceu. Durante os estudos, tomou contacto com o herbalismo
(uso e estudo das
plantas medicinais)
Era
estudante de teologia quando adoeceu de tuberculose e como conhecia o
livro “Lições do Poder de Cura da água fria” de Johann Siegmund Hahn,
banhou-se repetidamente por alguns momentos na água gelada (entre 5 e 10
graus) do Danúbio, ficando, depois disso, curado. Este acontecimento
impressionou-o de tal modo que o encorajou a fazer aplicações diárias com
amigos que sofriam de tuberculose e que se viram também curados.
Em
contacto com a “Associação Amigos da Água”, que se ocupava do tratamento
com água, mais se motiva a dedicar-se à cura pela água. Um farmacêutico
levantou uma queixa em tribunal contra ele, pelo facto de violar a lei do
comércio (curar sem credenciais, sem licença para isso); foi então
condenado a pagar 2 Gulden por “crime contra a proibição de curar”; esta
lei ainda vigora hoje, sendo necessário para o exercício de curar, um
título ou diploma. O pároco Kneipp foi várias vezes processado pela
medicina escolar. Dado ele não levar dinheiro pela cura e só tratar casos
declarados como impossíveis de cura pelos médicos, foi-lhe então permitido
curar os tais casos dados como perdidos pelos médicos.
Wörishofen
recebe o título de estância termal (= Bad)
Na altura
grassava na região uma epidemia de cólera e ele, ao ver tanto sofrimento e
miséria, desrespeitou a lei curando 42 pacientes, sendo, por isso,
apelidado de “capelão da cólera”. Apesar disso, o próprio bispo, instigado
pelos críticos de Kneipp, instruiu-o no sentido de se dedicar apenas à sua
missão de cura de almas. Em 1855 foi transferido como capelão para o
convento das dominicanas em Wörishofen.
Aqui, pessoas de
ambientes ricos, nobres e clericais cada vez procuram mais a sua ajuda.
Atendendo
ao sucesso de Kneipp, o imperador Wilhelm von Preußen declarou a liberdade
de cura para a região da Baviera; a Associação dos Médicos protestou
contra a nova lei.
Kneipp
passa a atender então as pessoas juntamente com um médico que o apoiava.
Kneip escreveu os livros “Minha Cura com a Água” e “Assim deviam viver”.
Em Agosto
de 1889, Wörishofen já não tinha capacidade para albergar os 4.000
candidatos à cura; dois anos depois já eram 6.000 e em 1893 Bad Wörishofen
já contava com 33.134 clientes hóspedes de cura e mais de 100.000 outros
visitantes. Constroem-se muitos balneários e surgem então associações
Kneipp.
A Câmara
municipal interessa-se pela exploração da cura em Bad Wörishofen;
Kneipp exigiu à Camara a criação de um departamento de caridade para
órfãos e doentes carentes com direito a serem tratados gratuitamente e a
um médico. Em 1892 é contratado um médico de termas para tratar
gratuitamente pacientes pobres.
Kneipp
viajou por muitos países a expor o seu método terapêutico com a água. Hoje
o seu método encontra-se aplicado internacionalmente em muitos lugares de
cura. O filantropo viu a sua acção coroada ao ser recebido pelo Papa e
nomeado Camareiro secreto pontifício.
Em 1920 a
cidade Wörishofen recebeu o título Bad=lugar de cura, passando a
designar-se Bad Wörishofen.
Na Alemanha há hoje 600
associações Kneipp com cerca 160.000 membros.
Aplicação do
Método Kneipp nas Termas / Lugares de Cura
Sebastian
Kneipp tinha um pensar holístico e dizia: "A natureza deu-nos em
abundância
tudo o que se precisa para
ficar saudável." Considerava o ser humano integrado no seu biótopo,
advogando um estilo de
vida em equilíbrio e em unidade de vida com o seu ambiente natural;
propagava, nessa qualidade, as curas naturistas e a medicina preventiva.
Os
cinco pilares da sua filosofia eram: água, plantas, movimento, alimentação
e balance (equilíbrio
na acção).
Corpo e
alma encontram-se numa relação estreita de equilíbrio com os elementos da
natureza, água, plantas, movimento ("A movimentação aumenta a paixão pela
vida e ajuda o homem através do fortalecimento do seu corpo"), nutrição
("Enquanto não houver uma mudança drástica no nosso sistema alimentar, não
podem ser resolvidos os danos de que a humanidade sofre; não resolvidos,
ainda se tornará pior.", etc.
O padre
que tratava toda a gente por tu, não exceptuando sequer o imperador,
dizia: "Nada se pode tornar mais prejudicial para a saúde do que o modo de
vida dos nossos dias. Deve ser encontrado um equilíbrio, a fim de
revigorar os nervos supertensos e manter a sua força”.
"Para mim, se há um meio de cura, esse será a água", dizia
o Cura Kneipp
A Água
Através de
esguichadelas de água (estímulos, de leves a fortes) provoca-se o
fortalecimento dos poderes de auto-cura do corpo.
A energia que surge da
aplicação externa de água de temperaturas fria e quente, estimula a
circulação sanguínea, promove o metabolismo corporal e a desintoxicação do
organismo.
Há
cerca de 120 aplicações da água, entre elas, lavagens, banhos de ervas,
banhos alternados com água quente e fria, “esguichos relâmpago de água”,
embrulhar em roupa. Uma delas, a imersão dos
braços em água fria, também chamada "O café de Kneipp" revigora o corpo e
actua contra a fadiga mental.
A
aplicação mais conhecida de Kneipp é a pisa da água fria. “O ‘jacto de
água fria lançado no joelho’ torna-se eficiente contra os pés frios,
fortalece o sistema imunológico e ajuda quando se têm pernas pesadas,
varizes, agindo ainda como anti-inflamatório” (Cf.
http://www.kneipp.de/de/kneipp_philosophie/wasser.html).
As Plantas
A
fitoterapia (medicina à base de plantas) conhece, para cada sofrimento,
uma erva correspondente.
Das 45
plantas que Kneipp usava, segundo ele, a mais querida era a erva arnica
que operava maravilhas contra hematomas, contusões, entorses, dores
musculares e doenças venosas.
Alecrim
estabiliza a circulação, Junípero (a fertilidade), erva-doce, alho (anti
envelhecimento, afrodisíaco) e cardamomo.
Aléo Vera - o "cactus
das feridas"- relaxa, limpa a pele e fortalece o sistema imunológico.
O emprego
das ervas medicinais (“medicina monástica”) sempre foi usado nos mosteiros
e era mantido na tradição dos jardins dos mosteiros.
São bem
conhecidas as propriedades curativas de ervas e plantas
seleccionadas, tal como
o emprego da argila praticado e transmitido em muitos conventos, como já
recomendava o nosso papa médico português João XXI na sua obra "Tesouro
dos Pobres" onde descreve o tratamento com produtos medicinais vegetais,
animais e minerais. Nela se encontram receitas tanto para abortar como
para fomentar a fecundidade. Hoje empregam-se, de forma eclética, os mais
diferentes modos de terapia.
O Movimento:
Comparava
o corpo com uma máquina de ferro que exposta ao tempo, sem movimento,
ganha ferrugem. Nos seus exercícios, à moda do tempo, recomendava cortar
lenha e a debulha, caminhar descalço, nadar, etc. "Tudo a seu tempo e tudo
na medida certa".
"O que faz bem à mente, não
pode prejudicar o corpo".
A
Alimentação:
Uma vida saudável implica que se
desfrute com todos os sentidos. Para isso é importante uma atenção
especial ao estilo de vida e aos hábitos alimentares. Água, plantas,
exercício físico e a alimentação são os elementos que colaboram para o
balanço da vida saudável e fomentam o entusiasmo pela vida.
(Cf.
http://www.kneipp.de/de/kneipp_philosophie/ernaehrung.html)
Não é preciso fazer dieta para se
sentir bem; para Kneipp é importante uma alimentação equilibrada e reduzir
a gordura; é útil moderar o consumo de carne em favor do peixe e consumir
muita fruta e vegetais; beber muito (2 litros) especialmente águas
minerais e chá de ervas ou fruta. Um grama de gordura animal tem o dobro
de calorias de um grama de carboidrato ou de proteína. Recomenda o pão
integral, cereais, painço e espelta. É de suma importância o equilíbrio da
saúde física, emocional e energética.
Aplicações e
tratamentos
O mais conhecido dos cinco pilares da
filosofia da Sebastian Kneipp é a aplicação de água fria e quente, que é
feita através de esguichadelas, banhos de braço, banho com mangueira a
partir do pé e subir para a perna e vice-versa, banho do joelho, banho do
corpo inteiro, embrulhamento depois do banho, pisa da água e andar
descalço. As aplicações causam efeito sobre o sistema imunológico, a pele,
e muitos outros processos metabólicos.
Indicações
terapêuticas
Deficiência
imunológica, Resiliência, Bronquite,
sintomas respiratórios,
infecções dos seios, sinusite rinite crônica,
doenças otorrinolaringológicas
crônicas, doenças urinárias
ou ginecológicas; calafrios,
crises de gota; doença
cardiovascular, má circulação, cólicas menstruais,
dor nas costas, lombalgia, dor nas articulações,
tensão, dor ciática, doença
degenerativa das articulações, osteoporose,
irritação articulações, músculos; reumatismo,
mal-estar, fadiga, cansaço físico e psicológico;
distúrbio metabólico, doenças
de pele, eczema, Estresse,
reforço da resistência,
distúrbios vegetativos,
insónias, mau humor, doenças de
órgãos funcionais; doença
venosa, varizes, problemas circulatórios,
tinnitus, flebite, Indigestão,
constipação e distensão
abdominal, condições
espasmódicas na área
abdominal. Como prevenção:
doenças da idade
e estilo de vida, infecções,
resfriados, estresse.
À Laia de
Conclusão
Bad Wörishofen fez de Kneip o seu
escudo, a marca dos seus reclames e sucesso.
As riquezas naturais da mais-valia
das termas portuguesas poderiam ser ainda mais enriquecidas com o
conceito, métodos e técnicas que se reúnem em torno de Bad Wörishofen e da
filosofia de Kneipp. Imaginemos os potenciais económicos e de mercado que
se encontram no âmbito do turismo, de tratamentos e também de
aposentadoria para pessoas abastadas de proveniência internacional.
Imagine-se uma acção concertada com os países da Lusofonia! Aí se
encontram investidores e clientes com vontade de realizar uma via própria
da lusofonia.
O potencial da economia termal
para o desenvolvimento local e da hotelaria e do turismo nacional, já nos
é indicado desde o Império romano, em que a classe alta romana frequentava
as termas de Portugal.
Unir o termalismo e os lugares de
cura a uma política de promoção do regionalismo e a uma cultura do
bem-estar e do turismo da saúde, são objectivos que poderiam atrair rios
de dinheiro da União Europeia; para isso são necessárias concepções e
projectos bem fundamentados com perspectivas económicas. (A dedicação a
estes projectos, pelos nossos deputados provenientes das regiões,
justificaria grande parte da sua acção!...). Temos de deixar o jogo das
escondidas das conversas para se passar a uma política e economia de
acções concertadas. A
conversa nunca é certa se deixa espaço para reticências. Uma sociedade
avançada atesta-se nas obras.
Portugal tem condições
excepcionais para se tornar, a nível europeu, na vanguarda termal e com
excelentes lugares de cura. Precisam-se, para isso, investidores e
políticas viradas para o fomento dos recursos locais. Precisam-se
inteligências livres e fábricas de pensamento que, a nível local/regional,
consigam projectos envolventes que as autarquias depois concretizem em
colaboração com os diferentes parceiros.
Torna-se necessária e oportuna a
aplicação da directiva comunitária Europeia nº 24/2011 relativa aos
cuidados de saúde transfronteiriços. Não chegam congressos, precisam-se
acções concertadas dos políticos da região, de investidores nacionais e
internacionais (Capital de Angola!), médicos, técnicos da saúde e do
turismo, com o apoio das universidades locais como motores do fomento
económico e regional…. No sector da formação poderia haver formação e
intercâmbio de práticas de cura promovidos pela UE…
Seguir o desenvolvimento da
hidrologia, a nível prático, tornar-se-ia muito eficiente no combate às
doenças crónicas, perturbações funcionais e doenças da civilização. O
investimento na indústria da saúde será a aplicação mais rentável para as
próximas gerações.
Qualidade e humanidade são critérios
muito atraentes para diferentes públicos com exigência/posse.
António da Cunha Duarte Justo Jornalista
www.antonio-justo.eu
|