Vivemos num mundo maravilhoso em que a
massa consciente procura situar-se, através da investigação do rasto da
sua origem, na massa do universo e do seu sentido. Para isso
desenvolvem-se os mais diversos modelos de criação. A história da
criação teológica (bíblica) descreve a criação do universo e do mundo
num longo processo de seis dias (épocas) através da intervenção divina;
por outro lado, a física contemporânea faz começar a história da criação
com a teoria do Big Bang (grande estrondo). Segundo esta, a origem do
mundo e do tempo, teria o seu ponto zero no estoiro primordial anónimo
que teria dado origem às partículas elementares, aos átomos e às
galáxias.
Os modelos da ciência física quântica
perdem o rasto da criação ao imaginar as astronómicas temperaturas e a
densidade extrema da energia junto do Big Bang. Para desviar e tentar
evitar o mistério outros físicos falam já dum tempo antes do Big Bang ou
seja dum tempo antes do tempo. Uma questão que pertence já à filosofia e
à teologia atendendo a que a ciência, com o seu carácter experimental
está condicionada ao criado, ao tempo. Para chegarmos ao tempo antes do
tempo, segundo a própria teoria da relatividade, teríamos de viajar com
uma velocidade superior à da luz e assim antecipar-nos ao espaço e ao
tempo. Aí a realidade passaria a ser meramente espiritual, mera
potencialidade.
A teoria da relatividade calcula que a
matéria próxima do ponto zero perde o seu carácter físico. Isto é um
banho de água fria e atemoriza uma física sem vocação para
espiritualidades. Para fugir à questão muitos físicos servem-se da
Teoria da Gravidade Quântica em Loop (ou Teoria da Gravitação Quântica
em Laços) dividindo o tempo e o espaço em pequeníssimas unidades,
partículas tão pequenas que se tornam impossíveis à observação,
reduzindo-os a uma espécie de átomos espaço-tempo.
Assim, através de fórmulas matemáticas
puramente abstractas evitam a chegada ao ponto zero da matéria, ao Big
Bang. Se considerarmos o universo um balão de ar, mesmo que teoricamente
possamos tirar o ar ao balão, este não desaparecerá e pressuporá algo
por detrás dele. Mesmo a pressuposta existência de outros universos
anteriores ou paralelos são tentativas de explicação úteis mas não
certas, parte da realidade especulativa. A cosmologia tem lugar para as
mais diversas teorias que vão duma criação superior, existência de
universos paralelos, cíclicos ou mesmo eternos. Mesmo que conseguíssemos
saber a idade do mundo ficaria margem para se especular sobre diferentes
modelos e por determinar a sua filiação.
No meio das teorias, a Teoria das Cordas
ou Teoria das Supercordas procura a fórmula do mundo. Ela descreve a
matéria de maneira quase espiritual, nas suas partículas elementares mas
tropeça no tempo e no espaço. Por outro lado a teoria Loop descreve o
tempo e o espaço mas tropeça na matéria tempo – espaço.
Quem se embrenha no mundo das teorias da
relatividade e da física quântica constata que tal como a teologia se
esconde atrás de Deus, a física se esconde atrás da matemática. A
especulação é tão variada e abstracta que até os peritos têm dificuldade
em compreender a própria teoria, chegando uns e outros a um lugar comum:
o mistério!
Talvez a teologia, em especial a teologia
do mistério da Trindade apresente um modelo conciliador de realidade.
Para isso tanto a teologia como a física terão de soar um bocado.
Agradável é constatar que uns e outros se tornam mais humildes e mais
conscientes da complementaridade de saberes e da complementaridade da
realidade.
A física clássica, que, até há pouco,
afirmava à boca cheia que todo o existente se reduzia a matéria física
num mundo ordenado segundo leis causais, reconhece agora, nos andares
superiores do saber científico, que a imaterialidade é a outra face da
matéria e que as velhas leis da física não são gerais vendo mesmo
contrariado o seu tão sagrado (científico) mecanicismo e o determinismo,
ainda em voga numa mentalidade moderna anacrónica. A vantagem da física
quântica está em ultrapassar a teoria newtoniana da física clássica e em
ter descoberto a imaterialidade como a outra face da matéria. O saber
quântico tal como o saber da Trindade levarão muitas gerações a entrar
na consciência geral da sociedade, da política e da própria religião. Os
utilizadores estão mais interessados no folclore dos saberes.
Quanto mais perguntas a sociedade puser
mais respostas se encontrarão. Todo o desenvolvimento se resume a uma
tentativa de resposta a uma pergunta numa dinâmica de dúvida –
esperança. É a legítima ânsia de identidade (individuação) a surgir no
horizonte da consciência social tal como os grelos das diferentes flores
a surgir da terra em jardim. A pergunta sobre o princípio está na
resposta do fim.
Discutir a nível físico sobre o tempo
antes do tempo (Big Bang) será tão útil como discutir em teologia sobre
o sexo dos anjos. A vantagem é de nos encontrarmos todos, materialistas
e espiritualistas em terreno inseguro (imaterial), o que pode vir a ser
uma oportunidade para nos unirmos todos na procura da verdade, do bem,
numa mesma consciência de complementaridade.
Assim como o mundo se expande em
convulsões energéticas assim a consciência humana se desenvolve através
da linguagem e das ideias. Só quem já deixou de fazer perguntas ou já
tem respostas absolutas renuncia a germinar e abdica do desenvolvimento,
acabando por deixar de sentir o calor do sol numa mesma natureza que a
todos alimenta.
As teorias são um elemento da profecia, na
procura de descrever e antever a realidade numa perspectiva de sentido.
Não poderemos chegar ao antes da criação ou do Big Bang, assim como não
poderemos chegar ao depois da morte independentemente dos instrumentos
físicos ou mentais que usarmos. Fica-nos muito espaço para
respeitosamente nos aproximarmos mais uns dos outros num campo de
procura comum infinito não sendo preciso comportar-nos como os cães à
volta do mesmo osso. Tanto as Ciências naturais como as ciências humanas
chegam a pontos do saber onde a orientação será provocada apenas por
indícios ou referências, e a sua formulação permanecerá uma questão de
fé religiosa ou secular.
Nem a teologia se poderá pronunciar sobre
o particular do mundo nem a física poderá chegar a uma explicação do
universo na sua totalidade. O que é para uns é a porta de entrada, é
para outros a porta de saída. Uma coisa nos resta, enveredarmos pelos
caminhos da física quântica, da filosofia e da teologia e neles
poderemos saborear os frutos mais saboreáveis que nos conduzem a muitas
realidades com um ponto de encontro comum: o Homem no mistério do Mundo
e de Deus. No maná do mistério embora a manjedoura seja a mesma, haverá
alimento para os diferentes gostos. O sabor do mistério nos irmanará a
todos, crentes e descrentes. |