América mais universal e menos americana
Os Estados Unidos da América elegeram o seu primeiro presidente preto,
150 anos depois da libertação dos escravos. A América apresenta-se com
um rosto novo ao mundo! Ao eleger um presidente preto, reconcilia-se
consigo mesma e com o mundo.
Barack Obama conseguiu entusiasmar a América pela política. A
participação eleitoral alcança um novo recorde. 153 milhões de cidadãos
participaram nas eleições conseguindo Obama 52 % dos votos para si. A
20.o1.2009 tomará posse como presidente. O 44.° Presidente da USA
apresenta muitas semelhanças com o presidente Kennedy que então foi o
símbolo duma nova América.
Com a derrota de McCain a USA despede-se duma era histórica nostálgica
de vitória e de força no mundo.
Num momento em que o sonho americano sofre as primeiras arranhaduras com
a crise financeira, a USA procura um novo papel na história. Barack
Obama personifica o sonho americano de vida, liberdade e felicidade. Ele
consegue subir, com o próprio esforço, duma situação modesta ao mais
majestoso cargo da América. Os votos em Obama são mais que os votos num
partido. São os votos dum movimento, o grito da esperança que surge da
profundeza da sociedade americana. Na vitória do partido democrático
está presente a desilusão de políticas falhadas e a esperança daqueles
que levantam a mão, no desejo de verem os seus interesses chegarem à
ribalta da nação. Por todo o lado se torna latente o desejo dum novo
começo.
Obama, na sua campanha eleitoral, procurou um novo estilo de discurso.
Tentou superar os clichés ideológicos de direita e de esquerda, de
Etablishment e de carenciados. Com estilo deixou alguns alertas dignos
de escrita no álbum dos partidos: “Não há uma América liberal e uma
América conservativa – há os Estados Unidos da América”. Aqui, Obama não
se revela como um político normal. Ele quer construir pontes para melhor
servir o povo americano.
Às águias do poder, que questionavam a sua experiência, ele
responde:” Trata-se da capacidade de discernimento e não da experiência”.
A América, tal como ele, é jovem e na sua juventude antecipa o futuro.
Obama fala, no plural, dum futuro melhor onde “nós todos encheremos o
sonho americano com nova vida, onde todos terão, verdadeiramente, as
mesmas chances”. A América é sempre jovem porque a sua elite sonha e com
ela o povo também. Nela a elite, com todos os seus paradoxos, não deixou
de ser povo.
O povo americano elegeu uma biografia e não um programa. Na sua pessoa
os americanos vêem a história da América, reconhecendo-se na sua
mensagem de esperança e entusiasmo.
Todo o Mundo olha para a América porque sabe que grande parte do seu
destino depende dela.
A concorrência da Rússia e da China, o ressentimento árabe, o terrorismo
e a inveja europeia terão um novo peso na nova era que agora se anuncia.
Embora o tema da guerra do Iraque tenha estado ausente durante a
propaganda eleitoral, o seu fim não pode ser adiado indefinidamente. A
sua vontade de reformar o sistema de saúde é mais que pertinente. Embora
se incline para o proteccionismo económico (o que assusta os chineses)
mostra-se mais liberal na política de segurança. Com ele talvez a
presença militar da USA no mundo, com as suas 761 bases militares em 151
países, se faça sentir menos e a ideia imperialista presente em todas as
civilizações se comece a embaçar. Com ele, os europeus querem ser
tomados mais a sério. Esperam uma política que não se aproveite da
rivalidade entre os Estados europeus e que assuma compromissos
internacionais em questões de protecção do clima e do controlo de
armamento. (O problema para Obama em relação à União Europeia será saber
o que esta quer!) Os poderes que Obama tem de enfrentar são hercúleos:
um mundo contraditório em si, os serviços secretos, as forças militares
e económicas e uma pratica mundial em que o ser humano ainda não é tema
prioritário.
Obama, filho de pai queniano e de mãe americana, desperta muitas
esperanças também na África. Espera-se que ele não escreva apenas
história americana. Os russos esperam, com ele, ser mais fácil recuperar
o velho brilho de potência que tinham no tempo da União Soviética.
Obama não será nenhum santo. Neste sentido fala a sua carreira de
político. Consta que nas escadas do poder partidário ninguém sobe sem
cadáveres na cave. Além disso, as esperanças, nele colocadas, tornarão
mais difícil o seu papel de presidente. As projecções colocadas no
presidente eleito são de tal ordem que exigiriam dele uma pessoa
sobre-humana para as satisfazer. Só resta lugar para o desencanto.
A crise financeira mostrou a necessidade duma nova ordem mundial. Uma
mudança radical seria mais que óbvia.
Obama encontra, como hipoteca, a guerra do Iraque que terá de pôr fim em
tempo determinado. O conflito israelo-árabe espera também por solução. A
necessidade da USA se libertar da dependência dos regimes do petróleo
possibilitará o renascimento da ecologia. Ele quer “um governo do povo
para o povo”. A crise histórica em que o mundo se encontra não facilita
o papel do presidente. Não será fácil tirar o carro da lama. A mudança
em curso na América terá de se dar nas outras potências também, doutro
modo o mundo não avança.
O novo presidente pode tornar-se numa oportunidade de reconciliação de
muitos países com os Estados Unidos. Ele é o símbolo da nova era. Nele
pode torna-se possível a integração da potência e da impotência e assim
se passar da era do diálogo para a era do triálogo. A chama da liberdade
deixará então de ser tão deslumbrante.
A sua vitória, integrada na sua biografia, revela a possibilidade de
integração das forças do Sul com as do norte. Na sua personalidade se
encontra a mistura americana, a mistura racial e religiosa. Barack Obama
representa na sua pessoa a post-américa, a vontade de integração do
mundo do norte e do mundo do sul. A América permanecerá sempre uma nação
universal, um luzeiro que integra em si todas as culturas.
A América continuará a ser a AMÉRICA: talvez mais universal e menos
americana!
António da Cunha Duarte Justo
antoniocunhajusto@googlemail.com |
ANTÓNIO da Cunha Duarte JUSTO . Nasceu em Várzea-Arouca (Portugal). E-mail: a.c.justo@t-online.de.
Professor de Língua e Cultura Portuguesas, professor de Ética, delegado da disciplina de português na Universidade de Kassel .
PUBLICAÇÕES
- Chefe Redactor de Gemeinsam, revista trimestral do Conselho de Estrangeiros de Kassel em alemão com secções em português, italiano, turco, françês, grego, editada pela cidade de Kassel, tiragem 5. 000 exemplares.
- Editor da Brochura bilingue: "Pontes Para um Futuro Comum – Brücken in eine gemeinsame Zukunft", editada na Caritas, Kassel
- Editor de "O Farol" , jornal de carácter escolar e social em colaboração com alunos, pais e portugueses das cidades de Bad Wildungen, Hessisch Lichtenau, Kassel, Bad Arolsen e Diemelstadt( de 1981 a 1985)
- Editor de „Boletim da Fracção Portuguesa no Conselho de Estrangeiros de Kassel (1984)
- Autor da Brochura „Kommunalwahlrecht für Ausländer – Argumente“ editada pela Câmara Municipal de Kassel, Fevereiro de 1987.
- Co-autor da Brochura „Ausländerbeiräte in Hessen - Aufgaben und Organisation“, editada pela AGAH e Hessische Landeszentral für politische Bildung, Wiesbaden, 1988.
Colaborador de vários jornais e do programa de rádio semanal de português de Hamburgo.
http://blog.comunidades.net/justo
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