Contam-se pelos dedos, as vidas plácidas nesta paisagem:
uma joaninha que bate as asas contra a metade
de um coco, o lagarto que fareja a luz estriada
na roda de biclicleta, o camaleão que aprecia, invisível,
a estremunhada borboleta recém saída da crisálida.
Também a mulher, entradota, que roça os joelhos no chão
e colhe beterraba, sonha há décadas com a morte do marido;
ao vendedor de tangerinas continua a assustar o pacto
que fez com a miséria; o empregado dos seguros,
que tem no bolso o teste do HIV, mostra-se desolado;
o tipo que me serve a cerveja vela há demasiados anos
o único olho que lhe resta. Desta respeitável rua com saída
para a horta, onde um carro esventrado e um barraco de bebidas
são todo o mobiliário, vê-se que o planeta continua o mesmo
traste, às voltas com um estômago demasiado delicado.
|