A concordância,
embora rime com
relevância, nem
sempre é boa
conselheira.
Pelo contrário.
Não fosse os 102
peregrinos
separatistas terem fugido da Inglaterra em protesto contra as perseguições religiosas do rei James I, e terem, 41 deles,
jurado
e assinado o Pacto
do Mayflower[1]
e desembarcado a 21 de novembro
de 1620 em Cape Cod[2],
e talvez
jamais
pudéssemos ler Por
Quem Os Sinos
Dobram[3]
ou ver Cidadão Kane[4].
Isto, sem
falar em Como Fazer
Amigos e Influenciar Pessoas[5]
e transviâncias correlatas politicamente corretas.
Na
contrapartida, Arthur Neville Chamberlain,
primeiro-ministro
inglês, concordou, a 29 de
setembro
de 1938, com as
imposições
de Adolf Hitler, aquarelista e
führer
do
III Reich,
e as tropas alemãs invadiram a
Polônia
a 1º de setembro de 1939, e Sangue e Honra[6]
conquistou as bibliotecas e As
Mulheres
Diplomatas São
Melhores[7]
fez o mesmo
nos
cinemas. Mas
Martin Heidegger já
tinha
sentenciado, ao ser nomeado
reitor
da Universidade de Freiburg em 1933, nove anos depois de ter corrido por montes e vales de lençóis com
Hannah Arendt, a mais
brilhante
de todos os
seus
alunos: Mas
nós queremos que o nosso povo cumpra o seu
encargo histórico.
Nós queremo-nos a
nós
mesmos. Pois
a nova e a
mais
nova força
do povo,
que
passa por
cima de nós,
já decidiu sobre
isso.[8]
E
assim
caminha a
humanidade, pulando que
nem
pipoca atrás
da fama. Da fama e
da grana. Que
nestes tempos nanomaníacos, se a fama for de 15 segundos
e a grana der
para
comprar um
iPod Touch,
já é demais.
Tanta, tanta,
que ninguém
mais se lembra
sequer
do velho e
bom
conhece-te a ti mesmo.[9]
Na verdade, apesar das últimas e decantadas
descobertas
nos campos
das ciências (aplicadas, básicas,
da natureza, exatas, formais,
humanas, infusas, morais,
normativas, ocultas, sociais
ou
até estésico-angelicais) ainda nenhum problema se resume à solução.
Solução também
rima com
conclusão, mas
nenhuma delas é deverasmente
tampânica e perenítica. Todas as considerações são ponderáveis. Se a menor
distância entre
dois pontos é
uma linha
curva,
nem por
isso Deus
escreve mais usando
linhas
retas. Ou
quem ama
não mata. Ou todos os homens são mortais.
Por
isso, enquanto
as vocações sacerdotais tendem a zero, os crimes
passionais navegam no infinito. E as mulheres
também morrem. A
única
dúvida está no
uso
abusivo de vitaminas sintéticas
na composição dos filtros
de carvão
ativado
e na propaganda
tendenciosa
do padrão de
qualidade
das camisinhas importadas e conceitos correlatos. No mais,
os resultados estão
em
perfeita
consonância
com o que
determina a Constituição Federal e a prática das religiões mais
conceituadas. Fundamentalistas ou não.
Mas,
por mais
perfeita que
pareça, qualquer
solução
ou conclusão
causa sempre novos problemas.
O fato de os
orientais
comerem gafanhotos (cozidos,
fritos, assados,
grelhados, à carbonara
ou até à thermidor),
não solucionou a
economia
nem acabou com
as pragas do Egito.
Pelo
contrário, o
estudo
da força propulsora das pernas traseiras
desses acridídeos levou a humanidade
à competição olímpica dos saltos em altura. E,
com isso,
novos problemas
surgiram e verdadeiras atrocidades
foram cometidas. Seres
humanos
inocentes, que
poderiam morrer de uma
simples
morte natural,
foram vítimas de
mortes
provocadas e de desvios sem retorno das
pulsões libidinosas.
Que
fique bem claro.
Não estou chutando o
balde
nem mandando ver
em
tribunecas. Não sou filósofo. E,
muito menos,
cientista social,
árbitro de
futebol
ou politólogo.
Apenas
me dá curiosidade
saber quando
o ato
vira
fato. Espiar
o que acontece
atrás
da porta
enquanto
o pau come na
sala. O fato de
estar
morto não
me preocupa. Preocupa-me, sim, e me dá medo, o ato de morrer. Com todos os considerandos.
Mas,
mesmo sabendo que
as considerações
são
o que são,
assim como
as urinas e as
vaidades
também são,
não há dúvida
que o seu
significado deve
significar
sempre mais
do que parece.
Que
nem a honestidade
da mulher de César ao
virar
lenda.
Sean Aloysius O’Fearna, para
os registros, John Ford,
para
os êxteros, foi o maior camões de
Hollywood. Não escreveu Os
Americanídeos[10],
mas a convergência
antropométrica era cumprida. Ambos, o poeta português Luís Vaz de Camões e o
cineasta
americano John Ford eram
brancos
e cegos de
um
olho. E foi,
não
por
sôbolos rios
que vão
por Babilónia,[11] mas muito prosaicamente na cidade
de Shinbone, perdida num qualquer lugar do oeste
bang-bang americano,
que
John Ford encontrou paralelismo
nas lembranças babilocamonianas com
a honestidade da
mulher
de César: quando a
lenda
se torna
fato, publique a lenda.[12]
E
sem essa de paralelas só se
encontrarem no infinito se uma reta as cortar e a soma dos dois ângulos internos
de um
mesmo
lado for menor
que dois ângulos
retos[13].
Washington
DC, capital dos Estados
Unidos, fica no paralelo 38 e
Pyongyang,
capital da Coréia do
Norte, fica no paralelo
39, e ambas se encontram, numa boa, nos
incontornáveis banheiros da ONU, a misse
politicamente correta do nosso faz de conta.
A
culpa não existe. Eu
sou apenas o
que
posso ser e não
o que gostaria de
ser. Se eu pudesse
ser
o que quisesse e
não
fosse, aí,
sim, seria racional
e seria lógico que me culpassem. Mas
eu sou apenas
o que posso ser
e não é
racional
nem é lógico
que me
culpem pelo que
não depende de
mim.
Mas culpam. E dizem, ainda, que a razão e a lógica
são fundamentais.
Mas o que
é fundamental
para
mim? A minha
razão, a minha
lógica e a minha
realidade ou
a razão, a
lógica
e a realidade dos
outros? Na razão,
na lógica
e na realidade dos
outros,
não é racional
nem é lógico
que os besouros
possam voar. Para isso existem as leis
da aerodinâmica.
Mas
na minha
razão, na minha
lógica
e na minha
realidade, os besouros
desconhecem as leis da aerodinâmica
e voam à vontade. O
fato
de as leis da
aerodinâmica
serem racionais e terem lógica não
significa
que os besouros
sejam obrigados a
ser
racionais e a ter
lógica. Significa,
apenas,
que os homens
inventaram as leis da aerodinâmica, como
inventaram a culpa,
mas
não inventaram os
besouros. As verdades
são
transitórias. São
apenas
as verdades de
cada
um.
Tzvetan
Stoichkov, antropologista residente do Magno Colégio
de Thimphu, mata a
cobra
e mostra o
pau: A
culpa
e a verdade são
irmãs e odeiam-se como tais.[14]
Na
contramão, Ignácio Polaranha
Costa da Mó,
emérito
presidente
da Sociedade Cliopomenense de
Cultura
de Vila
Nova
de Pardais,
não
faz por
menos:
Só
a verdade é irmã da verdade,
e só
ela acaba com
a incerteza.[15]
As afirmações
são tão redondas e tão
peremptórias, que
nenhum
rei, mesmo
que fosse do
baralho, teria mais
condição
de sair por aí e andar nu. Mas uma coisa é ser
rei
e outra é
dirigir
um campo
de nudismo. Daí, a
dúvida,
também tão
redonda e tão
peremptória, virar
até preceito
de licitude:
para
quê complicar
se simplificando também nada se resolve?[16]
O
Senhor não joga com sortes[17]
embora os dados
sejam bíblicos. Vai daí, se os números nunca mentem, E = mc²
virou lei (o espaço e
o tempo unidos
pelos
sagrados laços
do matrimônio e o
universo
curvado à pressão
dos bons
costumes) e acabou o nenhenhém. Eliminado o
mau exemplo concubínico, globalizaram-se as consciências e os bordéis e
todos
se tranqüilizaram e ficaram satisfeitos,
e praticaram, sem
receio, o novo
horário
de verão.
Com os taquíons prestes a vencer o páreo da velocidade da luz e as sondas
espaciais xeretando os sovacos do ômega,
que importância
tem, agora,
discutir
uma questão ou
fazer uma opção?
Contados os zentos bilhões de neurônios do cérebro
humano e os
iguais
bilhões de
estrelas
de cada uma das
galáxias
e medida a
profundidade
do buraco
negro
do quintal do
vizinho, o homem
sabe tudo. E
mesmo que
não soubesse seria
sempre
um homo sapiens. Se o Big-Bang
explodiu no início, o Big-Crunch
só poderá encolher
no final.
Igual
à arte pós-moderna ou
ao sensualismo marsupial. Embora a concepção
seja um
tumulto
o resultado é
sempre
previsível. Cada
parte
é sempre
um
todo e o todo
é sempre
genial.
Todos vós conheceis a glória
do magister. Mas,
agora, ireis conhecer
a verdadeira história do dixit.
Na história
das nações os
homens
sempre são
heróis ou
vencedores. Mas, nas histórias verdadeiras, os
homens
são apenas
mentirosos ou
covardes. Em
todas as histórias verdadeiras assim é. Os homens
nascem, os homens falam, assistem
a banquetes, agradecem os
discursos
e as medalhas, e sentem-se importantes e verídicos.
Elogiam-se, condecoram-se, fazem afirmações categóricas e
são
os donos da
verdade.
Mas, depois,
calam-se e morrem. No fim, todos os homens
morrem. Reis
ou
mendigos,
poderosos
ou impotentes,
todos
os homens morrem.
Sem
apelo nem
agravo.
Configurados os pixels e formatados os
estilos, nada mais resta aos biguanes senão
pular amarelinha nos confins do Infinito ou jogar golfe nos buracos negros de Cygnus X-1. Ou
afinar as tubas
e os pífaros e
reger,
mesmo sem
batuta, as bandas
cambiais. Desde
que os diplomas
estejam carimbados, não importa em que moeda foram pagos.
Na verdade, a verdade sempre foi um pormenor. Só que, por menor que seja a
distância, há sempre
que atentar para a largura do buraco. Aquila
non captat muscas, mas se
captat, danem-se as águias,
as moscas e as caçadas, sempre foi assim
que se escreveu a
História: os outros
que
se danem, après moi, le déluge.
Quando se compenetrarão os homens que o importante
não é ser, é poder ser? Posso assegurar-vos que se os homens
fossem, realmente,
aquilo
que parecem, outras
palavras
que não
estas estaríamos aqui lendo. Um homem aceita
que lhe
dêem, porque
lhe
falta sempre
alguma coisa. Mas
dois homens, a
cada um
faltará uma coisa
diferente. E a mil,
a mil
homens faltarão
sempre
mil coisas
diferentes. Só
no pensamento de
quem
dá, mil
homens
necessitarão de mil
coisas
iguais.
Liberado
O Diabo na Carne de Miss
Jones[18]
e outros XXX - Rateds, o
pecado deixou de ser
original e transformou-se em fator de qualidade. O ergo sum virou erga omnes e
a liberdade um
codilismo.
Como o cogito virou
circo quando se formatou o Big-Bang.
Tudo
graças aos taquíons
que
hão de vir e aos
sovacos
do ômega xeretados pelas sondas.
Já estamos aqui há um bom tempo. E,
tenho certeza,
vós
pensais que
já
me conheceis. Mas
não é verdade.
Eu vos
menti. Embora
não
pareça, todos
nós
somos iguais.
Todos
mentimos. Mas,
agora,
eu vos
direi uma verdade. A
minha
verdade. Queria ser imortal. Eterno
como as coisas
que me
cercam. Em
relação
aos outros
homens,
todos mortais,
eu não
seria mais
um
homem. Seria uma coisa.
Mas, justamente
por isso,
queria ser imortal.
Às vezes, como agora, eu queria não pensar e ser
apenas
uma coisa. E me
comparo a um
seixo
submerso na
água
do ribeiro
que
passa debaixo
da janela do
meu
quarto. Coberto
de lodo e
anódino,
ele apenas
existe. Não
pensa.
Mas não
adianta comparar. Se
me
posso comparar, não
posso ser o objeto
comparado.
O
seixo e eu, ambos
existimos. Mas
só
eu sou em
sentido absoluto,
apesar de ser
relativo. Só
eu necessito justificar
a minha
existência.
Ou colecionando
lembranças
ou coisas
imprestáveis, ou
deitando nos
divãs
dos analistas
ou
afirmando certezas
que
não tenho. Ou
matando os meus
semelhantes
ou cometendo suicídio.
Existir não
é só estar presente. É necessário que a presença se
justifique.
Presentes, apenas
presentes, estão as
coisas. E elas
não
precisam justificar-se. A sua própria eternidade
as justifica. Além de comporem o espaço ainda
permanecem no tempo. E eu não. Por isso, sou o
que sou. Aquele
que pensa
e, às vezes,
tenta
se comparar a um
seixo submerso
na água do
ribeiro.
Mas sem
obter comparação.
Apesar de me dizerem que
sou a mais
perfeita
criação da
Natureza,
eu sou apenas
um prisioneiro
do volume.
Eu
só existo em
função do que
me cerca.
Se o chão
que
sustenta o peso
do meu
corpo
não existisse eu
também não
existiria. Se não fosse um prisioneiro
do volume
eu
viveria no tempo. Seria eterno. Imortal.
Se não nascesse, vivesse e
morresse em função das coisas, seriam elas
que precisariam de
mim
e não eu
delas.
Mas só as coisas
ficarão. Eu sou o
que
pensa, mas
sou apenas o
que
passa. O que
morre. Se eu fosse
imortal, a minha
finalidade
seria somente existir
e não apenas pensar. Correr atrás de probabilidades
e possibilidades. Pode ser
até
que o mais
forte perca
a luta,
mas
deverá ser o provável
vencedor. Pode ser
até
ser que não ganhe o prêmio, mas haverá sempre
uma possibilidade. Eu sei que tudo é possível e é provável.
Que tudo
pode acontecer. Mas
também sei que
apenas pode acontecer.
Por isso
queria ser imortal.
Na minha
imortalidade
não haveria mais
apenas pode e eu
não precisaria
mais
mentir. Apenas
isso.
Só que, assim como não há
chanel que
sempre
cheire, nem
cocô
que nunca
deixe de feder, logo,
logo, os verdadólogos deletarão tudo que é babau e a felicidade
será vendida nos motéis como se vende Prozac nas
farmácias.
Apenas, se alguma coisa
se salvar, a clonagem
dos silícios
não
só facilitará o
entendimento
do leitor
como
beneficiará também a minha criação: quando não
tiver mais o
que
dizer, escreverei em
duas línguas.
Pelo
menos, poderei calar
depois em
dois silêncios.
Não está dentro da verdade aquele que está
certo. Está
dentro
da verdade aquele
que acredita, pois
é bem mais difícil acreditar do que estar certo. Se a verdade fosse apenas a coisa verdadeira,
seria fácil
estar
no mundo.
Todos
andaríamos na mesma
direção
e todos os
fins
seriam um
só
fim. Mas
só aos deuses
é dado
conhecer.
Por isso
nós carregamos,
cada
um, a nossa
verdade e somos solitários.
E
fim. Sem mais
afirmações categóricas, e argumentos
baculinos, todos poderemos sossegar e dormir na santa paz. Ou não dormir e sair por aí e curtir até um desejo inconfessável. Isto,
si
parva
licet componere magnis não
for papo furado e ninguém
impugnar a comparação das
coisas
pequenas com
as grandes
ou
alguém inventar
outras opções.
A
nossa felicidade ainda
é, infelizmente, proporcional ao grau de intensidade
das nossas convicções. Os deuses conhecem os homens
do nascimento à morte.
Mas
não crêem, nem
sentem. Por
isso,
são deuses.
Os homens
não
conhecem os deuses.
Mas
crêem e sentem. Por
isso,
são homens.
E, por
isso,
também, acreditam
que
podem ser felizes.
Infelizmente, um homem nunca é nada ele sozinho. Nem livre, nem verdadeiro.
A liberdade e a
verdade
quem determina
são
os outros.
Quando
eu era
menino gostava de ficar
só. Deitava-me na cama
e ficava olhando o teto do meu quarto. E quando os olhos
se cansavam de olhar, o
teto
começava balançando, balançando, e, pouco
a pouco, ia baixando, baixando, até quase eu lhe poder tocar
com
um dedo,
se levantasse um
braço.
Nunca levantava,
claro.
Mas só
a ideia que podia tocar-lhe já me deixava feliz. E, às vezes, o
teto baixava
tanto,
que eu
falava com
ele
como se ele
fosse um
amigo.
Mas me
chamavam de menino
bobo.
Todos me
chamavam de menino
bobo.
Quando eu
tinha dez
anos, tinha
até medo de adormecer à noite, só de pensar que poderia acordar no inferno. O
inferno, todos
me diziam, era
o lugar para onde iam os meninos
bobos, que
tinham tetos
amigos
e conversavam com
eles
como se eles
fossem gente.
Eu
não gostava de ser
menino bobo.
Mas ninguém
acreditava em
mim
e só o
teto
do meu quarto
era meu
amigo. Hoje
não consigo
mais falar com o teto do meu quarto. A minha liberdade
não existe. Hoje,
eu sou, além
de prisioneiro do
volume,
também um
prisioneiro de
mim
mesmo. Do meu
medo, da minha
angústia e da minha
solidão.
Como
já disse (e não
é só
minha
convicção, é
convicção
de todos,
afinal
nenhum brasileiro
duvidou que o
treinador
Luiz Felipe Scolari ganhasse a Copa
do Mundo de 2002), apesar
das últimas e tão decantadas descobertas nos
campos das
ciências,
ainda nenhum
problema se resume à
solução. Todas as considerações são ponderáveis. Na mosca.
Mas se todas as
considerações
são ponderáveis,
que
dizer das situações?
Ponderabilíssimas. Se numa situação
unitista o buraco é
sempre
no meio e numa dualista é sempre mais em baixo, numa situação trialista (e não
poderá haver situação
mais trialista do
que
medo, angústia e solidão, liquidificadas in vitro), o
buraco vira um oculão.
E é sempre do
outro
lado. Para não correr o risco de mergulhar em abismos mais que
freudantescos, apelei a São Tomás
de Aquino e mandei ver:
Tudo
o que é imperfeito
tende à perfeição.[19]
Oba! Mas
oba, assim.
Mesmo tendendo, e tendendo até com as melhores intenções,
há sempre
regras. E regras
são
regras. Sejam unistas dualistas,
trialistas ou
até
pluralistas, não há
regra
sem exceção.
E o tudo
que
nasce, morre, ou
como
muito mais
escorreitamente sacou Melissos de Samos,
o que
tem um
princípio,
ou um
fim, não
pode ser, nem
eterno, nem
infinito,[20]
não deixou por
menos. Virou
exceção
à regra
que
diz que
não
há regra
sem
exceção. Aí,
dancei. O oculão trialista atravessou os
fundilhos
do ômega confinista e nem o lucasiano professor
Stephen Hawking me salvou da entropia.
I like
simple experiments, and champagne.[21]
Eu também
gosto de
experiências
simples, mas
não gosto
de champanhe.
Mesmo
se tomado num perfeito horizonte de eventos,
com ótimos
pontos de retorno
e vendo a banda
passar
à burofágfica velocidade de
escape
de mais de 1.079.252.848 800.000
milímetros hodometrados à hora. Aí, fazer o quê? Dar ao
professor
um Dom
Perignon Brut Vintage e pagar uma viagem de ida e
volta à
bancarrota
ou entrar na máquina do tempo
e vambora?
Não
há escolha.
Vós sabeis que,
agora, não
há mais
escolha. Às vezes,
vós
fingis que optais
só
para que os outros pensem que
vós ainda
podeis optar e vos
invejem. Mas,
agora,
vós sabeis que
não há mais
opção. Agora
só vos
resta esperar.
Eu sei que
é lamentável
que
não se façam mais
discursos e não
se distribuam mais
diplomas
e medalhas.
Mas
vós esqueceis que,
agora, estais nus
e não haverá, nas vossas paredes e nos vossos peitos, mais lugar para pendurar os vossos diplomas
e as vossas medalhas. Vós estais como
sois. Estais nus e nas vossas testas está somente escrito o vosso
nome, não
a relação dos
vossos
títulos. Lamentavelmente, este ofício a que assistis não
tem livro de
presenças. De cumprimentos
e de honras. Aqui, vós não
podereis escrever o
vosso
nome seguido dos
vossos
títulos. Neste
ofício, o nome dos
vossos
servos antecede o
vosso,
ainda que
isso vos
fira o orgulho e
vos
humilhe. Lamentavelmente para
vós, o tempo do
faz-de-conta
terminou. Daqui em
diante,
vós caminhareis
sozinhos. Acompanhados, apenas,
das ações que
praticastes.
Cada um é o que é e ninguém muda. Só os deuses são o que
parecem. Neste momento,
cada
um de nós
pensa no que
fez e diz a si
mesmo
que tudo
seria diferente, se pudesse voltar atrás. Mas pensar não compromete. Ninguém
lê pensamentos.
Se lesse, estaríamos nós aqui assistindo tudo
isto, calados
e impassíveis?
Exatamente,
como se nada
nos pudesse acontecer?
Porque
não sei, não acredito saber[22],
afirmou Sócrates antes do banquete
da cicuta.
Mas
Sócrates sabia e só não soube quem não quis.
El Niño mandou ver nas
águas
do Pacífico, uma
borboleta
bateu as asas na
Macedônia
e choveu na ilha Vanua Levu, e Sócrates foi
condenado à morte por
afirmar que
sabia que
não
sabia. Mas
não
só. Apolidoro, o
conhecido
facebooker ateniense, nas comemorações do 400º
aniversário dos
primeiros Jogos
Olímpicos, em
376 a. C., numa reportagem que
ficou famosa e ganhou o Prêmio
Leneias de Reportagem 375 a. C., perguntou a Antístenes,
fundador e diretor do ginásio
Cinosarges o que é
que
ele tinha
ganho com
a filosofia. A
resposta,
que deixou Apolidoro boquiaberto, mas
satisfeito por
não ter de pagar direitos de imagem, pois Antístenes, quando conversava, não
conversava, monologava, pegou foros
de compêndio humanístico: Poder
conversar comigo
mesmo.[23]
Aí, pinta no pedaço o genebrino
Jean-Jacques Rousseau, compositor
musical autodidata,
autor
da ópera O
Adivinho da Vila, além
de filósofo e teórico político nas horas
vagas, um
dos cromossomas originais da Ecologia Profunda, e
mete
bronca:
Oh homem, de qualquer
região que
sejas, quaisquer que sejam as
tuas opiniões, escuta:
eis a tua
história,
tal como
julguei lê-la, não
nos
livros dos teus
semelhantes, que
são mentirosos,
mas na Natureza,
que não
mente nunca.[24]
E danou-se. É verdade
que
a verdade está mais
na Natureza do
que
nos livros
e os homens
só
tentam distorcê-la, mas chamá-los
de mentirosos, e aqui
se pressupõe que as
mulheres
também entraram no
balaio,
não era
politicamente correto. E teve o
Jean-Jacques
que se mandar,
enquanto os chamados moralistes
lhe
isqueiravam os escritos. Nada demais, se
comparadas estas lamparinas com as labaredas
que o doutor
Paul Joseph Goebbels mandou acender para
manter
intacta a lidimez do arianismo.
E
omnia munda mundis,[25] tudo é puro para os puros. Seria,
se a pureza
não
fosse uma substância
mais
instável do que
o elemento 118 (com
118 prótons e 175
nêutrons),
atirado às feras
tecnológicas pelo
Laboratório
Nacional Lawrence Berkeley, em junho de
1999, na Califórnia. Mas os californianos são
assim mesmo.
Altíssonos e rebarbativos. Mesmo quando
contratam e pagam alguém
para
dizer o que não devia ser dito. Ou feito.
Não podendo ser o primeiro estado a geminar alguma das
suas cidades
com Nuremberg, uma
vez
que a Geórgia já
tinha geminado Atlanta em 1998, a Califórnia
vingou-se. Fez da UCLA's
Humanities Division um cabo de guerra e mandou ver na pragmática. Puxa que puxa e volta a puxar, e lá se foi Nuremberg soprar
fagotes no
campanário
das urtigas. O filósofo Rudolf
Wilhelm Klute, professor da Fakultät
Philosophischen Wissenschaften und Anhänge,
devidamente
engravatado e dolorizado, aterrou no aeroporto internacional de Los Angeles
sem mais
aquelas e mandou brasa no que sabia que
sabia:
A
filosofia
é a ciência
com
a qual ou
sem a qual
eu fico sempre
tal e qual.
Ou pior.
Se na Natureza a
perfeição
é sempre inversamente
proporcional ao Absoluto, quanto
mais eu
penso, quanto
mais eu
raciocino, quanto
mais
eu pergunto,
quanto
mais eu
questiono, mais a
minha
consciência me
torna relativo
e mais o
Absoluto
se distancia, e eu
sempre
dou nó em
pingo de água.
Felizmente, como
não se cicuta
hoje em
dia mais
ninguém, não
morrerei como Sócrates. Quero morrer como
Johann Wolfgang von Goethe: Mais
luz!
Afinal, se a caminho
de Siracusa, Pitágoras, o numerólogo e
harmonioso
reitor da dita
primeira
universidade
do mundo, disse,
meus
netos, o quadrado
da hipotenusa é
sempre
igual à soma
do quadrado dos
catetos,
também a caminho
de Pella, Aristóteles, o lógico preceptor do filho
de Filipe II da Macedônia, disse,
Alexandre, se manca, abre o
olho,
meu filho,
olha que
nem sempre
quem semeia colhe o
milho.
Todos
os filósofos falam.
Se
tu não falares
Não
serás filósofo.[26]
Concluindo,
nada mais agradável
do que degustar,
a meias
com
Epiménides, um
bom
gole de L’Esprit de Courvoisier, acompanhado com
um puro
Cohíba Corona Especial: todos os filósofos são
mentirosos.[27] |
Na
verdade,
leitor, se foi
Deus
que criou o
verbo, foi o
homem
quem criou a
linguagem e os procedimentos e as
normas do
seu
uso.
Mas foram
necessários
milênios e
milênios de caóticas
desconexões
para
que
um
cânone,
hoje
por
todos considerado
lídimo, pudesse impor-se à
confusão.
Somente no
século
passado o
ser
humano conseguiu libertar-se da
sua
condição de ser-guiado[29]
e
gozar,
inteiramente, a
sua qualificação de ser-livre.[30]
Theodor Holm Nelson, Ted Nelson para os energúmenos
do saber apressado,
um filósofo e sociólogo
americano, absolutíssimo pioneiro
da tecnologia da informação,
cansado de ser
apenas mais
um ser-guiado num
universo praticamente incomunicável como
o nosso, largou de
mão
a conivência politicamente correta e, em
1963, deu à Humanidade o instrumento que
permitiu a todos
navegar
no universo
interativo
da comunicação
criativa: o hipertexto.
Com
um simples
clique, Theodor Holm Nelson transformou o
nosso mundo
de infinidades
intransponíveis
naquela aldeia
global
que Herbert Marshall McLuhan tão bem definiria anos depois. Depois da roda,
a grande
invenção
do ser humano
é o hipertexto.
Na
verdade, leitor, a invenção
da roda
ainda
hoje é causa
de discussão entre
os historiadores. O que não acontece com
o hipertexto,
já
absolutamente documentado. Mas, seja como
for, seja quem seja o inventor da roda,
o fato é
que
sem ela,
o homem
não
teria condições
práticas
de nada.
Quatro
das maiores
fontes
de energia
que
o ser humano usa para o seu bem-estar,
seja onto ou
tecnológico, alicerçam-se na roda:
a água, a energia
elétrica, o
animal
e o vento.
Repare, leitor,
que o simples
carrinho de mão,
inventado pelos chineses circa 200 a.C., carrega e transporta
sete vezes
mais peso
do que os
lombos
humanos. A bicicleta,
idealizada, embora
ainda
toscamente, por
Leonardo da Vinci, permitiu velocidades
astronômicas, se comparadas com o nosso simples caminhar. Em 1869,
James Moore, ganhou a primeira corrida intercidades, Paris-Rouen, correndo 113 quilômetros em
10 horas e 35
minutos. O que
nos
permite afirmar que
James Moore foi um gênio velocista.
Mas todos são gênios do passado.
Hoje, o grande
gênio é você,
leitor. Da velocidade
e da comunicação,
que
é o mais
importante
fator.
Hoje, repito, o grande
gênio
é você, leitor,
não mais
o autor
que
você lê. Por mais original que o autor seja, por
mais profundo
que seja o mergulho
dentro
de si
mesmo
ou na realidade
que o cerca,
a sua
criação
é sempre linear.
Tem sempre
um
começo, tem
sempre
um meio
e tem sempre
um
fim. E por
mais que
se inverta ou
até
se misture a ordem desses fatores, o conteúdo
permanece. Cada
palavra
é sempre a
mesma
palavra e cada
história é sempre
a mesma
história.
Na
verdade, leitor, por mais pormenorizadas que
sejam as descrições e por mais
profundas que sejam as análises (exemplo,
A História
do Declínio e Queda
do Império Romano,
do inglês Edward Gibbon),
por
mais bem
construídos e por
mais
bem estruturados que
sejam os personagens (exemplo, Raskolnikov,
protagonista
do romance
Crime e Castigo,
do russo Fedor Dostoievski),
por
mais artificiosas e
por
mais multifárias
que
sejam as narrações (exemplo,
Peregrinaçam
de Fernam Mendez Pinto em que da conta de muytas e muyto estranhas cousas que vio & ouvio no reyno da China, no da Tartaria, no
de Sornau, que
vulgarmente
se chama de Sião, no de
Calaminhan, no do Pegù, no de Martauão, & em outros muytos reynos &
senhorios
das partes
Orientais, de que
nestas nossas do Occidente ha muyto pouca
ou
nenhua noticia. E também da conta de muytos casos
particulares que
acontecerão assi a elle como a
outras muytas pessoas. E no fim della trata
brevemente de alguas cousas, & da morte do Santo Padre Francisco Xavier, unica
luz
& resplandor daquellas partes do Oriente, & reitor
nellas universal da
Companhia
de Iesus,
do português Fernão Mendes
Pinto),
ou por
mais excelsas e
por
mais
transcendentes
que sejam as
intenções
(exemplo, o
romance
Na Margem
do Rio Piedra Eu
Sentei e Chorei, do brasileiro Paulo Coelho), o leitor
nada mais
poderá fazer do que
ler. Apenas ler o que lhe é apresentado. E, mesmo
que não
queira, mesmo
que
use toda a
sua
força de vontade,
será sempre guiado, será sempre conduzido. Será sempre
obrigado a seguir
o caminho traçado
pelo
autor. Mesmo
até nas criações
de maior
vanguardismo
ou de maior
hermetismo (exemplo,
os romances A
Vida e as Opiniões
do Cavalheiro Tristram Shandy
e Finnegans Wake, dos irlandeses Laurence Sterne e James Joyce),
mesmo nestas criações acontece o mesmo.
Isto, sem
falar nos ensaios acadêmicos,
fontes supremas da
norma
culta e do saber
universal (exemplo,
O Declínio do Ocidente, do alemão.Oswald
Arnold Gottfried Spengler), o leitor
é sempre guiado pelo autor.
Na
verdade, leitor, o panorama nunca muda. Ainda que a realidade seja milimetricamente decomposta e, por vezes, seja
apresentada até
como
anti-realidade, ainda que os personagens
sejam heróis,
anti-heróis
ou só
marionetes manobradas
pelo
otimismo, pelo pessimismo, pelo niilismo ou por qualquer outro ismo dos autores,
o resultado é
sempre
o mesmo.
Cada
palavra continua sendo apenas a mesma palavra e cada história continua sendo apenas
a mesma
história.
Apesar de, muitas
vezes, terem por
propósito
não serem nem
uma coisa nem
outra.
Na
verdade, leitor, nos seis mil anos que
separaram o estilete dos sumérios e a prensa
de Johannes Gensfleisch, cognominado Gutenberg, na
criação
e na leitura,
nada
de novo apareceu.
Apenas
a velocidade e a forma
evoluíram. O conteúdo, esse, permaneceu estático,
imutável como
o Infinito. A
diferença
entre um
bloco de argila,
coberto de sinais
cuneiformes, e uma
folha
de papel, coberta
de sinais
alfabéticos, é nenhuma. Os sinais cuneiformes foram ordenados
para significar alguma coisa e os sinais alfabéticos foram ordenados
para significar, também, alguma coisa. Mas somente isso. E, somente isso, porque o significado é sempre
o mesmo. E continuaria ainda sendo o mesmo
se, felizmente,
não
tivesse aparecido uma nova linguagem: a linguagem
do hipertexto.
Na
verdade, leitor, foi com
a linguagem do
hipertexto
que se abriram as
portas
da quarta
dimensão
e a humanidade,
finalmente, pôde entrar no
âmago da comunicação integral.
Na era da
comunicação
absoluta. Com
um simples
clique do seu
mouse, você, leitor, deixou de ser, apenas e tão-somente aquele-que-lê-sempre-guiado[31],
sempre conduzido,
sempre
obrigado a seguir
o caminho traçado
pelo
autor, para ser aquele que vai ler com a sua vontade e a sua
imaginação.
Na
verdade, leitor, hoje, com a sua vontade, a sua imaginação e o seu
computador, você
se transformou num criador. Cada palavra
clicada mostrará outra palavra e uma nova
norma regerá a
sua
linguagem. Você
não será mais
obrigado a trilhar
o caminho da
leitura
linha a linha,
aquela vereda de
mão
única que
o autor o obriga a
percorrer, ladeada de muros
intransponíveis.
Hoje, leitor,
você é livre para deitar e
rolar
em cima
da criação. O
mando
é seu. E o
campo
também. Nada,
nenhum detalhe
ou personagem,
ou até
uma simples
insinuação
será coisa secundária.
Todos os
elementos
serão
protagonistas. E, para
isso, bastará, leitor,
que
você use, apenas,
o seu
computador, a sua
vontade
e a sua
imaginação.
Na
verdade, leitor, as possibilidades oferecidas
pelo
hipertexto são
tantas, que
são
até absolutas.
Como
se sentiria você,
caro
leitor, se, em
vez de ler, como sempre tem
lido, a história do
gênio
de Leonardo da Vinci contada do ponto de vista dos seus biógrafos, a lesse contada do ponto
de vista do
seu
pincel favorito?
Ou a descrição
da batalha de Waterloo contada do ponto de vista do cavalo branco
de Napoleão? Ou a
primeira
ida à Lua,
contada do ponto de
vista
do banheiro da
nave
Apollo 11, e não dos relatos
arredondados dos tripulantes Neil
Armstrong, Edwin “Buzz Ligthyear” Aldrin e Michael Collins?
Não
seria absolutamente
fascinante
descobrir que
nem da Vinci pintou a Mona Lisa, nem Napoleão foi derrotado em
Waterloo e nem os
astronautas
pousaram na Lua e sim
num monte de
Vênus? E que, nestes
três
casos, como
em tantos
e tantos
outros,
infelizmente, a verdadeira verdade é sempre encoberta pelas verdades
dos autores?
Na
verdade, leitor, o mesmo
ocorre com
este
texto,
Encontro de Paralelas.
Uma narrativa
caprichosa
e linear,
absolutamente
caprichosa e
absolutamente
linear, que, além de umas poucas verdadeiras
notas
de pé de
página, contém apenas
as fantasias
do autor e é
sempre
conduzida pela
vontade
dele, como você
mesmo constatou. E,
ainda
para além
disso, como
já
no próprio título
se observa, não
só
absolutamente
caprichosa
e absolutamente
linear, e conduzida pela
vontade
do autor,
como
também confusa e
impenetrável
a qualquer
leitura,
por mais
atenta ou
acadêmica que
seja. Veja esta amostra, leitor:
E
sem essa de
paralelas
só se poderem
encontrar
no infinito se uma
reta
as cortar e a soma
dos dois ângulos internos de um mesmo lado for menor que dois ângulos retos. Washington DC, capital
dos Estados Unidos, fica no paralelo 38 e Pyongyang,
capital
da Coréia do Norte, fica no
paralelo
39, e ambas se encontram, numa boa, nos
incontornáveis banheiros da ONU,
a misse politicamente correta
do nosso faz de
conta.
A
culpa não
existe. Eu sou
apenas
o que posso ser
e não o
que
gostaria de ser. Se
eu
pudesse ser o que
quisesse e não fosse, aí, sim, seria racional e seria lógico
que me
culpassem. Mas
eu
sou apenas o
que
posso ser e não
é racional
nem
é lógico
que
me culpem pelo
que não
depende de mim.
Mas
culpam. E dizem, ainda, que a razão e a
lógica são
fundamentais. Mas
o que é
fundamental
para mim? A minha razão, a minha lógica e a
minha realidade
ou a razão,
a lógica e a
realidade
dos outros? Na
razão, na lógica e
na realidade
dos outros,
não
é racional
nem
é lógico
que
os besouros possam
voar.
Para isso
existem as leis da
aerodinâmica.
Mas na minha
razão, na minha
lógica e na minha
realidade, os besouros
desconhecem as leis da aerodinâmica e voam à vontade.
O fato de as
leis
da aerodinâmica serem racionais e terem lógica
não significa que
os besouros sejam
obrigados
a ser racionais
e a ter lógica.
Significa, apenas,
que
os homens inventaram as leis da aerodinâmica,
como inventaram a
culpa,
mas não
inventaram os besouros. As verdades são
transitórias. São
apenas
as verdades de
cada
um.
Na
verdade, leitor, estes são ou não são apenas os lamentos
de um
autor
que não
sabe e nunca soube conviver com
os outros?
Um
autor que
não é nada
a não ser um arredio? Se ele tivesse consciência
do seu estar-no-mundo, este escrito até que poderia conter algumas especulações de profundidade,
senão filosófica, pelo
menos inquisitiva.
Mas não.
O que se
lê
são apenas
os vagidos de uma
mente
arredia ao bem
e ao conhecimento.
Nem
ironista ou
sequer
iconoclastista o autor sabe ser. Apenas demonstra
um
desconhecimento
acadêmico e
ontológico
absolutos. O que
é triste, pois
quem se dá ao trabalho
de alinhavar umas quantas
linhas, deveria, pelo
menos,
ter consciência
da sua
própria
ignorância. E, se por
milagre soubesse o
que
dizer, que o
dissesse com
provas
ponderáveis. O nosso grande Machado
de Assis, no seu
magistral
romance Quincas Borba[32],
declarou: Ao vencedor as batatas. Pois eu lhe digo, leitor, nem as batatas devem ser o prêmio do autor deste
Encontro de
Paralelas.
Só as cascas.
Mas,
para que se não diga que
somos
adeptos do oswaldiano não li e não
gostei, embora seja absolutamente justificável do ponto
de vista da
Teoria
da Informação[33],
veja, leitor,
que
leitura poderia
ser feita se você pudesse viajar no hipertexto. Você poderia saber que a ignorância do autor é absoluta.
O
Senhor
castigou o Egito com dez pragas e
nenhuma delas teve caráter econômico e muito
menos culinário,
como
solertemente o
autor
insinua.
E preferir lendas a fatos,
leitor, é
apanágio
da mais
impiedosa
ignorância. Se o autor
tivesse conhecido,
ou
pelo menos
lido, o grande Isaac Newton, saberia que
até o mestre
dizia, eu
não invento hipóteses[34].
Que traduzido em
latim, significa: hypotheses non fingo.
E
no ano
300 a. C. já Euclides de
Alexandria tinha definido que duas linhas
paralelas não
poderiam encontrar-se.[35]
Além disso, você
também poderia
saber que nem só
Washington DC fica no paralelo 38
e nem só
Pyongyang fica no paralelo 39.
Muitas outras cidades têm essas latitudes e ficam nesses
paralelos.
E a culpa
existe, sim, e deve
ser
penitenciada. Se assim não fosse, como
poderia o Confiteor[36]
não ser verídico, se a sua
fórmula já
data do século
XII?
E
se há besouros
que não
parecem aerodinâmicos, na contrapartida
há besouros
muito
para além de
aerodinâmicos. Haverá, por acaso, algum animal mais
aerodinâmico do que a vespa himenóptera?
E
existir não é estar
presente!?!
Leitor, desculpa-me a exuberância dos pontos
de exclamação interrogativos, mas nesta matéria
não tenho nem
necessidade de apelar
para os filósofos. Bastam-me os
dicionaristas.
Mestre Antônio Houaiss, no seu Dicionário Eletrônico da Língua
Portuguesa, é concludente: existir, item
2, verbo
intransitivo
e predicativo:
ter
existência em
determinado período;
durar; permanecer. E o
vocábulo só,
que
o autor
usa
na frase, serve
apenas
para qualificar o que eu já disse dele: um
autor que
não sabe e nunca
soube conviver
com
os outros.
Só, de acordo
com
o mesmo
dicionário
é um adjetivo
e bem significativo: em estado
de solidão (diz-se de
quem
não consegue
conviver);
solitário.
Solitário
e abécula. A nossa
felicidade,
leitor, nada
tem a ver com
as nossas convicções. Eu creio firmemente
no programa
fiscal
do governo, acho-o
absolutamente
imprescindível, e, no entanto, sinto-me infeliz
por pagar impostos.
E
mesmo
que o sábio
Aristóteles tenha dito o que disse, leitor,
de uma coisa estou
absolutamente
certo: jamais
poderia dizer,
Alexandre, se manca, abre o
olho. Aristóteles, na sua grandeza
cultural, o mais
que
poderia ter
dito seria, Alexandre, presta atenção, tem cuidado.
Quanto
ao silogismo apresentado,
Todos
os filósofos falam.
Se
tu
não falares
Não
serás filósofo,
vê-se
que o autor
nunca leu Jan Lukasiewicz[37].
Se tivesse lido, saberia a diferença entre um silogismo peripatético
e um
silogismo
verdadeiramente aristotélico.
Se
todos
os filósofos são
cultos,
Se
ter cultura é acreditar em Deus,
então,
Todos
os filósofos acreditam em Deus.
Tudo
o que o
autor
de Encontro de
Paralelas disse são
parvoíces
infundadas. Absurdas. Então não chega ao ponto de duvidar da Ciência? Se tivesse mais
fé não
teria como
duvidar.
Em 2008, na gruta
Denisova, na Sibéria, descobriu-se um osso da ponta
de um
dedo,
velho de 50.000
anos. Terminadas as análises
ADN, concluiu-se que a falange é
de uma menina de
sete
anos, chamada
Mulher-X, que
em
denisovanês parece significar Lunauta. O ADN, leitor, está para a Ciência como o Hipertexto está para a Escrita: abre todas as portas.
Portas
que, infelizmente
para o autor
deste Encontro de
Paralelas, se manterão sempre
aferrolhadas, tantas e tão
homéricas são
as blasfêmias
por
ele cometidas.
Blasfêmias
tão descondizentes,
leitor,
que até
você poderia desmascarar, se tivesse condições
de navegar na
quarta
dimensão do
hipertexto.
Blasfêmias
tão altissonantes
e desconformes,
que
o autor se atreve
até
a dizer que não há escolha.
Como não
há escolha,
leitor!?! Se não
houvesse escolha,
eu não
teria escolhido ler
este
arrazoado de bobagens, chamado Encontro de Paralelas.
Mas escolhi. E fi-lo porque qui-lo! |
BRADFORD,
William, apud
Of Plymouth Plantation, The Vision Forum, Inc. and Mantle Ministries,
2003
In the name of God,
Amen. We whose names are
underwritten, the loyal subjects of our dread Sovereign Lord King
James, by the Grace of God of Great Britain, France and Ireland,
King, Defender
of the Faith, etc.
Having undertaken, for
the Glory of God and advancement of the Christian Faith and Honour
of our King and Country, a Voyage to plant the First Colony in the
Northern Parts of Virginia, do by these presents solemnly and
mutually in the presence of God and one of another, Covenant and
Combine ourselves together into a Civil
Body Politic, for our better ordering and preservation and
furtherance of the ends aforesaid; and by virtue hereof to enact,
constitute and frame such just and equal Laws, Ordinances, Acts,
Constitutions and Offices, from time
to time, as shall be thought
most meet and convenient for the general
good of the Colony, unto which we promise all due submission and
obedience. In witness whereof we have hereunder subscribed our names
at Cape Cod, the 11th of November, in the year of the reign of our
Sovereign Lord King James, of England, France and Ireland the
eighteenth, and of Scotland the fifty-fourth.
Anno Domini 1620.
Este
documento
é considerado por
muitos
como o fundamento
da Constituição dos
Estados
Unidos da América, aprovada em 17 de setembro
de 1787.
Os
Peregrinos datavam-se pelo Calendário Juliano, que
tem menos
dez
dias em
relação ao atual
Calendário
Gregoriano.
HEMINGWAY, Ernest, For Whom The Bell Tolls, Scribner Book
Company, 1940
WELLES, Orson, Citizen Kane, Mercury Productions and RKO
Radio Pictures, 1941
CARNEGIE, Dale, How to Win Friends and Influence People,
Simon & Schuster, 1936
ROSENBERG,
Alfred, Blut und Ehre, Eher-Verlag der NSDAP, 1938
JACOBY, Georg,Frauen sind doch bessere Diplomaten, 1941
HEIDEGGER,
Martin, A
auto-afirmação da
Universidade
Alemã, www.lusosofia.net, 2009
FEMONOE,
filha
do deus Apolo,
primeira
pitonisa do Oráculo
de Pítia, em Delfos, a quem se atribui a frase,
γνῶθι σ'αυτόν, 650 a. C.
AMERICANIANS, The, Deste poema épico, que poderia ter sido Os Lusíadas norte-americano,
escrito por
Jamesson Bot em 1690, resta apenas a primeira estrofe:
Eu
canto
os tacapes amerabados, / Que na grã pradaria
americana /
Nem pelos
deuses
foram derrotados, / Caçando e conservando a bufalana /
Ao som dos elementos
vigorados / Sem
pecado
ou vergonha
desumana, / Foram
mortos sem dó e sem razão /
Em favor
de europeia servidão. Os originais foram queimados em
1693 por Giles Anderson, primo de Abigail Philips,
primeira
esposa de Cotton Mather, o puritano pastor protestante encarregado
da acusação no
processo
das Bruxas de Salem, em 1692. A informação, embora alguns a
considerem com
reserva, é de John Clark, pai
de Elizabeth Clark Hubbard, segunda
esposa
de Cotton Mather.
CAMÕES, Luís Vaz de,
Rimas, Edições
Almedina, 1994
FORD, John, The Man Who Shot Liberty Valance, 1962
EUCLIDES,
Elementos de Geometria, Livro
I, Axioma XII (5º
Postulado),
Edições Cultura,
1944
STOICHKOV, Tzvetan, Study About Versatilities, Enima Books,
2009
MÓ, Ignácio Polaranda Costa
da, Prof. Dr., A Verdade, 3 vol.,
Câmara Municipal de Vila
Nova de Pardais,
1977
AD JURIS, Editora,
Vade-Mécum Ortópode, 2010
CESARÉIA, Eusébio de, Cartas
de Abgaro V, rei
de Edessa, a Jesus Cristo, Petar &
Karapanchev, 1999
DAMIANO, Gerard, The Devil in Miss Jones, 1973
AQUNIO,
São Tomás de, Suma Teológica,
Editora Sulina,
1980
ALVES,
José Maria, apud Deus, Alma e Morte na História do Pensamento
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2008
HAWKING,
Stephen William, How to build a time
machine, in Daily Mail, 03.05.2010
PLATÃO, Apologia de
Sócrates, Domínio
Público, 2010
LAÉRCIO, Diógenes,
Vidas, opiniones y sentencias de los
filósofos más ilustres,
Torre de Babel
Ediciones, 2007
ROUSSEAU,
Jean-Jacques, Discours Sur L’Origine Et Les Fondements De
L’Inegalité Parmi Les Hommes, Flammarion Editions, 2008
VULGATA,
Nova. Ad Titum Epistula Sancti Pauli Apostoli 1.15,
www.vatican.va, 2010
KLUTE, Rudolf Wilhelm, Philosophie und Kultur, Hummer Verlag,
2008
Idem.
Referência ao
Paradoxo de Epiménides, filósofo grego, nascido em
Cnossos, Creta, no século VI
a. C., a quem se atribui a frase
todos os cretenses
são
mentirosos. Sendo ele próprio cretense, estaria Epiménides dizendo a
verdade? O mesmo se
aplica a Rudolf Wilhelm Klute. Sendo ele
filósofo, ao afirmar que todos os filósofos
são
mentirosos, estaria Rudolf Wilhelm
Klute dizendo a verdade?
MANOEL JOAQUIM SOBRADOR nasceu em Tiros, Minas Gerais, no
dia 1º de abril
de 1945, plantão do
Arcanjo
Samuel, do Anjo Jezalel e dos Santos Valério, abade
e confessor, Hugo de Grenoble,
Gilberto, Teodora e Irineu, mártires, posterior data do uso obrigatório
do cinto de
segurança
nas rodovias brasileiras
(1989). É mestre em
Administração
Holística
pela General
Holism University e doutor em Engenharia
da Usabilidade pela
Usual
Norms University, com Ph.D. em
Interconnectivity. É casado com a professora Dorotéia Simplício Sobrador, tem duas
filhas e vive no Rio de
Janeiro. É livre
pensador,
escritor e poeta.
Dentre os vários
livros que
escreveu, destacam-se A Ponderabilidade das
Circunstâncias - Visão Quântica das Previsibilidades, prêmio Honoris Scientia da Associação
Holismo Universal
e Usabilidade Semiótica,
prêmio da Associação
Semiótica Talinesca.
SOBRADOR, Manuel Joaquim, Hipertexto, a
Liberdade
Libertária,
Uirapuru
Editora, 2006
SOBRADOR, Manuel Joaquim, Hipertexto, a
Liberdade
Libertária,
Uirapuru
Editora, 2006
ASSIS,
Machado
de, Quincas Borba, Editora Egéria, 1978
PIGNATARI, Décio, apud
Informação
Linguagem
Comunicação,
Ateliê
Editorial, 2002
NEWTON,
Isaac, THE PRINCIPIA, Mathematical Principles of Natural Philosophy, University of California Pres,
1999
EUCLIDES,
Elementos de
Geometria,
Livro I,
Definição
XXXV, Edições
Cultura, 1944
ROMANA,
Ato Penitencial dos
Ritos
Iniciais da Missa
Católica Apostólica: Confiteor Deo
omnipotenti, beatæ Mariæ semper Virgini,
beato Michæli Archangelo,
beato Joanni Baptistæ, sanctis Apostolis
Petro et Paulo, omnibus Sanctis, et tibi, pater: quia peccavi nimis
cogitatione, verbo, et opere:
(percutiunt sibi pectus ter, dicentes):
mea culpa, mea culpa,
mea maxima culpa. Ideo precor
beatam Mariam semper Virginem, beatum Michælem Archangelum, beatum
Joannem Baptistam, sanctos Apostolos Petrum et Paulum, omnes Sanctos,
et te, pater, orare pro
me ad Dominum Deum nostrum.
LUKASIEWICZ
Jan, Aristotle’s Syllogistic From the Standpoint of Modern Logic,
Clarendon Press, 1951
|