CUNHA DE LEIRADELLA | ENCONTRO DE PARALELAS

Publicado na revista «Pontes - Filosofia da História», Rio de Janeiro, Julho de 2011

         A concordância, embora rime com relevância, nem sempre é boa conselheira. Pelo contrário. Não fosse os 102 peregrinos separatistas terem fugido da Inglaterra em protesto contra as perseguições religiosas do rei James I, e terem, 41 deles, jurado e assinado o Pacto do Mayflower[1] e desembarcado a 21 de novembro de 1620 em Cape Cod[2], e talvez jamais pudéssemos ler Por Quem Os Sinos Dobram[3] ou ver Cidadão Kane[4]. Isto, sem falar em Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas[5] e transviâncias correlatas politicamente corretas.

         Na contrapartida, Arthur Neville Chamberlain, primeiro-ministro inglês, concordou, a 29 de setembro de 1938, com as imposições de Adolf Hitler, aquarelista e führer do III Reich, e as tropas alemãs invadiram a Polônia a 1º de setembro de 1939, e Sangue e Honra[6] conquistou as bibliotecas e As Mulheres Diplomatas São Melhores[7] fez o mesmo nos cinemas. Mas Martin Heidegger tinha sentenciado, ao ser nomeado reitor da Universidade de Freiburg em 1933, nove anos depois de ter corrido por montes e vales de lençóis com Hannah Arendt, a mais brilhante de todos os seus alunos: Mas nós queremos que o nosso povo cumpra o seu encargo histórico. Nós queremo-nos a nós mesmos. Pois a nova e a mais nova força do povo, que passa por cima de nós, decidiu sobre isso.[8]

         E assim caminha a humanidade, pulando que nem pipoca atrás da fama. Da fama e da grana. Que nestes tempos nanomaníacos, se a fama for de 15 segundos e a grana der para comprar um iPod Touch, é demais. Tanta, tanta, que ninguém mais se lembra sequer do velho e bom conhece-te a ti mesmo.[9]

         Na verdade, apesar das últimas e decantadas descobertas nos campos das ciências (aplicadas, básicas, da natureza, exatas, formais, humanas, infusas, morais, normativas, ocultas, sociais ou até estésico-angelicais) ainda nenhum problema se resume à solução. Solução também rima com conclusão, mas nenhuma delas é deverasmente tampânica e perenítica. Todas as considerações são ponderáveis. Se a menor distância entre dois pontos é uma linha curva, nem por isso Deus escreve mais usando linhas retas. Ou quem ama não mata. Ou todos os homens são mortais.

         Por isso, enquanto as vocações sacerdotais tendem a zero, os crimes passionais navegam no infinito. E as mulheres também morrem. A única dúvida está no uso abusivo de vitaminas sintéticas na composição dos filtros de carvão ativado e na propaganda tendenciosa do padrão de qualidade das camisinhas importadas e conceitos correlatos. No mais, os resultados estão em perfeita consonância com o que determina a Constituição Federal e a prática das religiões mais conceituadas. Fundamentalistas ou não.

         Mas, por mais perfeita que pareça, qualquer solução ou conclusão causa sempre novos problemas. O fato de os orientais comerem gafanhotos (cozidos, fritos, assados, grelhados, à carbonara ou até à thermidor), não solucionou a economia nem acabou com as pragas do Egito. Pelo contrário, o estudo da força propulsora das pernas traseiras desses acridídeos levou a humanidade à competição olímpica dos saltos em altura. E, com isso, novos problemas surgiram e verdadeiras atrocidades foram cometidas. Seres humanos inocentes, que poderiam morrer de uma simples morte natural, foram vítimas de mortes provocadas e de desvios sem retorno das pulsões libidinosas.

         Que fique bem claro. Não estou chutando o balde nem mandando ver em tribunecas. Não sou filósofo. E, muito menos, cientista social, árbitro de futebol ou politólogo. Apenas mecuriosidade saber quando o ato vira fato. Espiar o que acontece atrás da porta enquanto o pau come na sala. O fato de estar morto não me preocupa. Preocupa-me, sim, e memedo, o ato de morrer. Com todos os considerandos.

         Mas, mesmo sabendo que as considerações são o que são, assim como as urinas e as vaidades também são, nãodúvida que o seu significado deve significar sempre mais do que parece. Que nem a honestidade da mulher de César ao virar lenda.

         Sean Aloysius O’Fearna, para os registros, John Ford, para os êxteros, foi o maior camões de Hollywood. Não escreveu Os Americanídeos[10], mas a convergência antropométrica era cumprida. Ambos, o poeta português Luís Vaz de Camões e o cineasta americano John Ford eram brancos e cegos de um olho. E foi, não por sôbolos rios que vão por Babilónia,[11] mas muito prosaicamente na cidade de Shinbone, perdida num qualquer lugar do oeste bang-bang americano, que John Ford encontrou paralelismo nas lembranças babilocamonianas com a honestidade da mulher de César: quando a lenda se torna fato, publique a lenda.[12]

         E sem essa de paralelas se encontrarem no infinito se uma reta as cortar e a soma dos dois ângulos internos de um mesmo lado for menor que dois ângulos retos[13]. Washington DC, capital dos Estados Unidos, fica no paralelo 38 e Pyongyang, capital da Coréia do Norte, fica no paralelo 39, e ambas se encontram, numa boa, nos incontornáveis banheiros da ONU, a misse politicamente correta do nosso faz de conta.

         A culpa não existe. Eu sou apenas o que posso ser e não o que gostaria de ser. Se eu pudesse ser o que quisesse e não fosse, , sim, seria racional e seria lógico que me culpassem. Mas eu sou apenas o que posso ser e não é racional nem é lógico que me culpem pelo que não depende de mim. Mas culpam. E dizem, ainda, que a razão e a lógica são fundamentais. Mas o que é fundamental para mim? A minha razão, a minha lógica e a minha realidade ou a razão, a lógica e a realidade dos outros? Na razão, na lógica e na realidade dos outros, não é racional nem é lógico que os besouros possam voar. Para isso existem as leis da aerodinâmica. Mas na minha razão, na minha lógica e na minha realidade, os besouros desconhecem as leis da aerodinâmica e voam à vontade. O fato de as leis da aerodinâmica serem racionais e terem lógica não significa que os besouros sejam obrigados a ser racionais e a ter lógica. Significa, apenas, que os homens inventaram as leis da aerodinâmica, como inventaram a culpa, mas não inventaram os besouros. As verdades são transitórias. São apenas as verdades de cada um.

         Tzvetan Stoichkov, antropologista residente do Magno Colégio de Thimphu, mata a cobra e mostra o pau: A culpa e a verdade são irmãs e odeiam-se como tais.[14]

         Na contramão, Ignácio Polaranha Costa da , emérito presidente da Sociedade Cliopomenense de Cultura de Vila Nova de Pardais, não faz por menos: a verdade é irmã da verdade, e ela acaba com a incerteza.[15]

         As afirmações são tão redondas e tão peremptórias, que nenhum rei, mesmo que fosse do baralho, teria mais condição de sair por e andar nu. Mas uma coisa é ser rei e outra é dirigir um campo de nudismo. Daí, a dúvida, também tão redonda e tão peremptória, virar até preceito de licitude: para quê complicar se simplificando também nada se resolve?[16]

         O Senhor não joga com sortes[17] embora os dados sejam bíblicos. Vai daí, se os números nunca mentem, E = mc² virou lei (o espaço e o tempo unidos pelos sagrados laços do matrimônio e o universo curvado à pressão dos bons costumes) e acabou o nenhenhém. Eliminado o mau exemplo concubínico, globalizaram-se as consciências e os bordéis e todos se tranqüilizaram e ficaram satisfeitos, e praticaram, sem receio, o novo horário de verão.

         Com os taquíons prestes a vencer o páreo da velocidade da luz e as sondas espaciais xeretando os sovacos do ômega, que importância tem, agora, discutir uma questão ou fazer uma opção? Contados os zentos bilhões de neurônios do cérebro humano e os iguais bilhões de estrelas de cada uma das galáxias e medida a profundidade do buraco negro do quintal do vizinho, o homem sabe tudo. E mesmo que não soubesse seria sempre um homo sapiens. Se o Big-Bang explodiu no início, o Big-Crunch poderá encolher no final. Igual à arte pós-moderna ou ao sensualismo marsupial. Embora a concepção seja um tumulto o resultado é sempre previsível. Cada parte é sempre um todo e o todo é sempre genial.

         Todos vós conheceis a glória do magister. Mas, agora, ireis conhecer a verdadeira história do dixit. Na história das nações os homens sempre são heróis ou vencedores. Mas, nas histórias verdadeiras, os homens são apenas mentirosos ou covardes. Em todas as histórias verdadeiras assim é. Os homens nascem, os homens falam, assistem a banquetes, agradecem os discursos e as medalhas, e sentem-se importantes e verídicos. Elogiam-se, condecoram-se, fazem afirmações categóricas e são os donos da verdade. Mas, depois, calam-se e morrem. No fim, todos os homens morrem. Reis ou mendigos, poderosos ou impotentes, todos os homens morrem. Sem apelo nem agravo.

         Configurados os pixels e formatados os estilos, nada mais resta aos biguanes senão pular amarelinha nos confins do Infinito ou jogar golfe nos buracos negros de Cygnus X-1. Ou afinar as tubas e os pífaros e reger, mesmo sem batuta, as bandas cambiais. Desde que os diplomas estejam carimbados, não importa em que moeda foram pagos. Na verdade, a verdade sempre foi um pormenor. que, por menor que seja a distância, há sempre que atentar para a largura do buraco. Aquila non captat muscas, mas se captat, danem-se as águias, as moscas e as caçadas, sempre foi assim que se escreveu a História: os outros que se danem, après moi, le déluge.

         Quando se compenetrarão os homens que o importante não é ser, é poder ser? Posso assegurar-vos que se os homens fossem, realmente, aquilo que parecem, outras palavras que não estas estaríamos aqui lendo. Um homem aceita que lhe dêem, porque lhe falta sempre alguma coisa. Mas dois homens, a cada um faltará uma coisa diferente. E a mil, a mil homens faltarão sempre mil coisas diferentes. no pensamento de quem dá, mil homens necessitarão de mil coisas iguais.

         Liberado O Diabo na Carne de Miss Jones[18] e outros XXX - Rateds, o pecado deixou de ser original e transformou-se em fator de qualidade. O ergo sum virou erga omnes e a liberdade um codilismo. Como o cogito virou circo quando se formatou o Big-Bang. Tudo graças aos taquíons que hão de vir e aos sovacos do ômega xeretados pelas sondas.

         estamos aquium bom tempo. E, tenho certeza, vós pensais que me conheceis. Mas não é verdade. Eu vos menti. Embora não pareça, todos nós somos iguais. Todos mentimos. Mas, agora, eu vos direi uma verdade. A minha verdade. Queria ser imortal. Eterno como as coisas que me cercam. Em relação aos outros homens, todos mortais, eu não seria mais um homem. Seria uma coisa. Mas, justamente por isso, queria ser imortal.

         Às vezes, como agora, eu queria não pensar e ser apenas uma coisa. E me comparo a um seixo submerso na água do ribeiro que passa debaixo da janela do meu quarto. Coberto de lodo e anódino, ele apenas existe. Não pensa. Mas não adianta comparar. Se me posso comparar, não posso ser o objeto comparado.

         O seixo e eu, ambos existimos. Mas eu sou em sentido absoluto, apesar de ser relativo. eu necessito justificar a minha existência. Ou colecionando lembranças ou coisas imprestáveis, ou deitando nos divãs dos analistas ou afirmando certezas que não tenho. Ou matando os meus semelhantes ou cometendo suicídio.

         Existir não é estar presente. É necessário que a presença se justifique. Presentes, apenas presentes, estão as coisas. E elas não precisam justificar-se. A sua própria eternidade as justifica. Além de comporem o espaço ainda permanecem no tempo. E eu não. Por isso, sou o que sou. Aquele que pensa e, às vezes, tenta se comparar a um seixo submerso na água do ribeiro. Mas sem obter comparação.

         Apesar de me dizerem que sou a mais perfeita criação da Natureza, eu sou apenas um prisioneiro do volume. Eu existo em função do que me cerca. Se o chão que sustenta o peso do meu corpo não existisse eu também não existiria. Se não fosse um prisioneiro do volume eu viveria no tempo. Seria eterno. Imortal. Se não nascesse, vivesse e morresse em função das coisas, seriam elas que precisariam de mim e não eu delas.

         Mas as coisas ficarão. Eu sou o que pensa, mas sou apenas o que passa. O que morre. Se eu fosse imortal, a minha finalidade seria somente existir e não apenas pensar. Correr atrás de probabilidades e possibilidades. Pode ser até que o mais forte perca a luta, mas deverá ser o provável vencedor. Pode ser até ser que não ganhe o prêmio, mas haverá sempre uma possibilidade. Eu sei que tudo é possível e é provável. Que tudo pode acontecer. Mas também sei que apenas pode acontecer. Por isso queria ser imortal. Na minha imortalidade não haveria mais apenas pode e eu não precisaria mais mentir. Apenas isso.

         que, assim como não há chanel que sempre cheire, nem cocô que nunca deixe de feder, logo, logo, os verdadólogos deletarão tudo que é babau e a felicidade será vendida nos motéis como se vende Prozac nas farmácias. Apenas, se alguma coisa se salvar, a clonagem dos silícios não facilitará o entendimento do leitor como beneficiará também a minha criação: quando não tiver mais o que dizer, escreverei em duas línguas. Pelo menos, poderei calar depois em dois silêncios.

         Não está dentro da verdade aquele que está certo. Está dentro da verdade aquele que acredita, pois é bem mais difícil acreditar do que estar certo. Se a verdade fosse apenas a coisa verdadeira, seria fácil estar no mundo. Todos andaríamos na mesma direção e todos os fins seriam um fim. Mas aos deuses é dado conhecer. Por isso nós carregamos, cada um, a nossa verdade e somos solitários.

         E fim. Sem mais afirmações categóricas, e argumentos baculinos, todos poderemos sossegar e dormir na santa paz. Ou não dormir e sair por e curtir até um desejo inconfessável. Isto, si parva licet componere magnis não for papo furado e ninguém impugnar a comparação das coisas pequenas com as grandes ou alguém inventar outras opções.

         A nossa felicidade ainda é, infelizmente, proporcional ao grau de intensidade das nossas convicções. Os deuses conhecem os homens do nascimento à morte. Mas não crêem, nem sentem. Por isso, são deuses. Os homens não conhecem os deuses. Mas crêem e sentem. Por isso, são homens. E, por isso, também, acreditam que podem ser felizes.

         Infelizmente, um homem nunca é nada ele sozinho. Nem livre, nem verdadeiro. A liberdade e a verdade quem determina são os outros. Quando eu era menino gostava de ficar . Deitava-me na cama e ficava olhando o teto do meu quarto. E quando os olhos se cansavam de olhar, o teto começava balançando, balançando, e, pouco a pouco, ia baixando, baixando, até quase eu lhe poder tocar com um dedo, se levantasse um braço. Nunca levantava, claro. Mas a ideia que podia tocar-lhe me deixava feliz. E, às vezes, o teto baixava tanto, que eu falava com ele como se ele fosse um amigo. Mas me chamavam de menino bobo. Todos me chamavam de menino bobo. Quando eu tinha dez anos, tinha até medo de adormecer à noite, de pensar que poderia acordar no inferno. O inferno, todos me diziam, era o lugar para onde iam os meninos bobos, que tinham tetos amigos e conversavam com eles como se eles fossem gente. Eu não gostava de ser menino bobo. Mas ninguém acreditava em mim e o teto do meu quarto era meu amigo. Hoje não consigo mais falar com o teto do meu quarto. A minha liberdade não existe. Hoje, eu sou, além de prisioneiro do volume, também um prisioneiro de mim mesmo. Do meu medo, da minha angústia e da minha solidão.

         Como disse (e não é minha convicção, é convicção de todos, afinal nenhum brasileiro duvidou que o treinador Luiz Felipe Scolari ganhasse a Copa do Mundo de 2002), apesar das últimas e tão decantadas descobertas nos campos das ciências, ainda nenhum problema se resume à solução. Todas as considerações são ponderáveis. Na mosca. Mas se todas as considerações são ponderáveis, que dizer das situações? Ponderabilíssimas. Se numa situação unitista o buraco é sempre no meio e numa dualista é sempre mais em baixo, numa situação trialista (e não poderá haver situação mais trialista do que medo, angústia e solidão, liquidificadas in vitro), o buraco vira um oculão. E é sempre do outro lado. Para não correr o risco de mergulhar em abismos mais que freudantescos, apelei a São Tomás de Aquino e mandei ver: Tudo o que é imperfeito tende à perfeição.[19] Oba! Mas oba, assim. Mesmo tendendo, e tendendo até com as melhores intenções, há sempre regras. E regras são regras. Sejam unistas dualistas, trialistas ou até pluralistas, não regra sem exceção. E o tudo que nasce, morre, ou como muito mais escorreitamente sacou Melissos de Samos, o que tem um princípio, ou um fim, não pode ser, nem eterno, nem infinito,[20] não deixou por menos. Virou exceção à regra que diz que nãoregra sem exceção. , dancei. O oculão trialista atravessou os fundilhos do ômega confinista e nem o lucasiano professor Stephen Hawking me salvou da entropia. I like simple experiments, and champagne.[21] Eu também gosto de experiências simples, mas não gosto de champanhe. Mesmo se tomado num perfeito horizonte de eventos, com ótimos pontos de retorno e vendo a banda passar à burofágfica velocidade de escape de mais de 1.079.252.848 800.000 milímetros hodometrados à hora. , fazer o quê? Dar ao professor um Dom Perignon Brut Vintage e pagar uma viagem de ida e volta à bancarrota ou entrar na máquina do tempo e vambora?

         Nãoescolha. Vós sabeis que, agora, nãomais escolha. Às vezes, vós fingis que optais para que os outros pensem que vós ainda podeis optar e vos invejem. Mas, agora, vós sabeis que nãomais opção. Agora vos resta esperar. Eu sei que é lamentável que não se façam mais discursos e não se distribuam mais diplomas e medalhas. Mas vós esqueceis que, agora, estais nus e não haverá, nas vossas paredes e nos vossos peitos, mais lugar para pendurar os vossos diplomas e as vossas medalhas. Vós estais como sois. Estais nus e nas vossas testas está somente escrito o vosso nome, não a relação dos vossos títulos. Lamentavelmente, este ofício a que assistis não tem livro de presenças. De cumprimentos e de honras. Aqui, vós não podereis escrever o vosso nome seguido dos vossos títulos. Neste ofício, o nome dos vossos servos antecede o vosso, ainda que isso vos fira o orgulho e vos humilhe. Lamentavelmente para vós, o tempo do faz-de-conta terminou. Daqui em diante, vós caminhareis sozinhos. Acompanhados, apenas, das ações que praticastes.

         Cada um é o que é e ninguém muda. os deuses são o que parecem. Neste momento, cada um de nós pensa no que fez e diz a si mesmo que tudo seria diferente, se pudesse voltar atrás. Mas pensar não compromete. Ninguém pensamentos. Se lesse, estaríamos nós aqui assistindo tudo isto, calados e impassíveis? Exatamente, como se nada nos pudesse acontecer?

         Porque não sei, não acredito saber[22], afirmou Sócrates antes do banquete da cicuta.

         Mas Sócrates sabia e não soube quem não quis. El Niño mandou ver nas águas do Pacífico, uma borboleta bateu as asas na Macedônia e choveu na ilha Vanua Levu, e Sócrates foi condenado à morte por afirmar que sabia que não sabia. Mas não . Apolidoro, o conhecido facebooker ateniense, nas comemorações do 400º aniversário dos primeiros Jogos Olímpicos, em 376 a. C., numa reportagem que ficou famosa e ganhou o Prêmio Leneias de Reportagem 375 a. C., perguntou a Antístenes, fundador e diretor do ginásio Cinosarges o que é que ele tinha ganho com a filosofia. A resposta, que deixou Apolidoro boquiaberto, mas satisfeito por não ter de pagar direitos de imagem, pois Antístenes, quando conversava, não conversava, monologava, pegou foros de compêndio humanístico: Poder conversar comigo mesmo.[23]

         , pinta no pedaço o genebrino Jean-Jacques Rousseau, compositor musical autodidata, autor da ópera O Adivinho da Vila, além de filósofo e teórico político nas horas vagas, um dos cromossomas originais da Ecologia Profunda, e mete bronca: Oh homem, de qualquer região que sejas, quaisquer que sejam as tuas opiniões, escuta: eis a tua história, tal como julguei lê-la, não nos livros dos teus semelhantes, que são mentirosos, mas na Natureza, que não mente nunca.[24] E danou-se. É verdade que a verdade está mais na Natureza do que nos livros e os homens tentam distorcê-la, mas chamá-los de mentirosos, e aqui se pressupõe que as mulheres também entraram no balaio, não era politicamente correto. E teve o Jean-Jacques que se mandar, enquanto os chamados moralistes lhe isqueiravam os escritos. Nada demais, se comparadas estas lamparinas com as labaredas que o doutor Paul Joseph Goebbels mandou acender para manter intacta a lidimez do arianismo.

         E omnia munda mundis,[25] tudo é puro para os puros. Seria, se a pureza não fosse uma substância mais instável do que o elemento 118 (com 118 prótons e 175 nêutrons), atirado às feras tecnológicas pelo Laboratório Nacional Lawrence Berkeley, em junho de 1999, na Califórnia. Mas os californianos são assim mesmo. Altíssonos e rebarbativos. Mesmo quando contratam e pagam alguém para dizer o que não devia ser dito. Ou feito.

         Não podendo ser o primeiro estado a geminar alguma das suas cidades com Nuremberg, uma vez que a Geórgia tinha geminado Atlanta em 1998, a Califórnia vingou-se. Fez da UCLA's Humanities Division um cabo de guerra e mandou ver na pragmática. Puxa que puxa e volta a puxar, e se foi Nuremberg soprar fagotes no campanário das urtigas. O filósofo Rudolf Wilhelm Klute, professor da Fakultät Philosophischen Wissenschaften und Anhänge, devidamente engravatado e dolorizado, aterrou no aeroporto internacional de Los Angeles sem mais aquelas e mandou brasa no que sabia que sabia: A filosofia é a ciência com a qual ou sem a qual eu fico sempre tal e qual. Ou pior. Se na Natureza a perfeição é sempre inversamente proporcional ao Absoluto, quanto mais eu penso, quanto mais eu raciocino, quanto mais eu pergunto, quanto mais eu questiono, mais a minha consciência me torna relativo e mais o Absoluto se distancia, e eu sempre dou em pingo de água. Felizmente, como não se cicuta hoje em dia mais ninguém, não morrerei como Sócrates. Quero morrer como Johann Wolfgang von Goethe: Mais luz! Afinal, se a caminho de Siracusa, Pitágoras, o numerólogo e harmonioso reitor da dita primeira universidade do mundo, disse, meus netos, o quadrado da hipotenusa é sempre igual à soma do quadrado dos catetos, também a caminho de Pella, Aristóteles, o lógico preceptor do filho de Filipe II da Macedônia, disse, Alexandre, se manca, abre o olho, meu filho, olha que nem sempre quem semeia colhe o milho.

Todos os filósofos falam.

Se tu não falares

Não serás filósofo.[26]

Concluindo, nada mais agradável do que degustar, a meias com Epiménides, um bom gole de L’Esprit de Courvoisier, acompanhado com um puro Cohíba Corona Especial: todos os filósofos são mentirosos.[27]  

A Quarta Dimensão
Por Manoel Joaquim Sobrador
[28]

 

     Na verdade, leitor, se foi Deus que criou o verbo, foi o homem quem criou a linguagem e os procedimentos e as normas do seu uso. Mas foram necessários milênios e milênios de caóticas desconexões para que um cânone, hoje por todos considerado lídimo, pudesse impor-se à confusão. Somente no século passado o ser humano conseguiu libertar-se da sua condição de ser-guiado[29] e gozar, inteiramente, a sua qualificação de ser-livre.[30]

     Theodor Holm Nelson, Ted Nelson para os energúmenos do saber apressado, um filósofo e sociólogo americano, absolutíssimo pioneiro da tecnologia da informação, cansado de ser apenas mais um ser-guiado num universo praticamente incomunicável como o nosso, largou de mão a conivência politicamente correta e, em 1963, deu à Humanidade o instrumento que permitiu a todos navegar no universo interativo da comunicação criativa: o hipertexto. Com um simples clique, Theodor Holm Nelson transformou o nosso mundo de infinidades intransponíveis naquela aldeia global que Herbert Marshall McLuhan tão bem definiria anos depois. Depois da roda, a grande invenção do ser humano é o hipertexto.

     Na verdade, leitor, a invenção da roda ainda hoje é causa de discussão entre os historiadores. O que não acontece com o hipertexto, absolutamente documentado. Mas, seja como for, seja quem seja o inventor da roda, o fato é que sem ela, o homem não teria condições práticas de nada. Quatro das maiores fontes de energia que o ser humano usa para o seu bem-estar, seja onto ou tecnológico, alicerçam-se na roda: a água, a energia elétrica, o animal e o vento.

     Repare, leitor, que o simples carrinho de mão, inventado pelos chineses circa 200 a.C., carrega e transporta sete vezes mais peso do que os lombos humanos. A bicicleta, idealizada, embora ainda toscamente, por Leonardo da Vinci, permitiu velocidades astronômicas, se comparadas com o nosso simples caminhar. Em 1869, James Moore, ganhou a primeira corrida intercidades, Paris-Rouen, correndo 113 quilômetros em 10 horas e 35 minutos. O que nos permite afirmar que James Moore foi um nio velocista.

     Mas todos são gênios do passado. Hoje, o grande gênio é você, leitor. Da velocidade e da comunicação, que é o mais importante fator.

     Hoje, repito, o grande gênio é você, leitor, não mais o autor que você . Por mais original que o autor seja, por mais profundo que seja o mergulho dentro de si mesmo ou na realidade que o cerca, a sua criação é sempre linear. Tem sempre um começo, tem sempre um meio e tem sempre um fim. E por mais que se inverta ou até se misture a ordem desses fatores, o conteúdo permanece. Cada palavra é sempre a mesma palavra e cada história é sempre a mesma história.

     Na verdade, leitor, por mais pormenorizadas que sejam as descrições e por mais profundas que sejam as análises (exemplo, A História do Declínio e Queda do Império Romano, do inglês Edward Gibbon), por mais bem construídos e por mais bem estruturados que sejam os personagens (exemplo, Raskolnikov, protagonista do romance Crime e Castigo, do russo Fedor Dostoievski), por mais artificiosas e por mais multifárias que sejam as narrações (exemplo, Peregrinaçam de Fernam Mendez Pinto em que da conta de muytas e muyto estranhas cousas que vio & ouvio no reyno da China, no da Tartaria, no de Sornau, que vulgarmente se chama de Sião, no de Calaminhan, no do Pegù, no de Martauão, & em outros muytos reynos & senhorios das partes Orientais, de que nestas nossas do Occidente ha muyto pouca ou nenhua noticia. E também da conta de muytos casos particulares que acontecerão assi a elle como a outras muytas pessoas. E no fim della trata brevemente de alguas cousas, & da morte do Santo Padre Francisco Xavier, unica luz & resplandor daquellas partes do Oriente, & reitor nellas universal da Companhia de Iesus, do português Fernão Mendes Pinto), ou por mais excelsas e por mais transcendentes que sejam as intenções (exemplo, o romance Na Margem do Rio Piedra Eu Sentei e Chorei, do brasileiro Paulo Coelho), o leitor nada mais poderá fazer do que ler. Apenas ler o que lhe é apresentado. E, mesmo que não queira, mesmo que use toda a sua força de vontade, será sempre guiado, será sempre conduzido. Será sempre obrigado a seguir o caminho traçado pelo autor. Mesmo até nas criações de maior vanguardismo ou de maior hermetismo (exemplo, os romances A Vida e as Opiniões do Cavalheiro Tristram Shandy e Finnegans Wake, dos irlandeses Laurence Sterne e James Joyce), mesmo nestas criações acontece o mesmo. Isto, sem falar nos ensaios acadêmicos, fontes supremas da norma culta e do saber universal (exemplo, O Declínio do Ocidente, do alemão.Oswald Arnold Gottfried Spengler), o leitor é sempre guiado pelo autor.

     Na verdade, leitor, o panorama nunca muda. Ainda que a realidade seja milimetricamente decomposta e, por vezes, seja apresentada até como anti-realidade, ainda que os personagens sejam heróis, anti-heróis ou marionetes manobradas pelo otimismo, pelo pessimismo, pelo niilismo ou por qualquer outro ismo dos autores, o resultado é sempre o mesmo. Cada palavra continua sendo apenas a mesma palavra e cada história continua sendo apenas a mesma história. Apesar de, muitas vezes, terem por propósito não serem nem uma coisa nem outra.

     Na verdade, leitor, nos seis mil anos que separaram o estilete dos sumérios e a prensa de Johannes Gensfleisch, cognominado Gutenberg, na criação e na leitura, nada de novo apareceu. Apenas a velocidade e a forma evoluíram. O conteúdo, esse, permaneceu estático, imutável como o Infinito. A diferença entre um bloco de argila, coberto de sinais cuneiformes, e uma folha de papel, coberta de sinais alfabéticos, é nenhuma. Os sinais cuneiformes foram ordenados para significar alguma coisa e os sinais alfabéticos foram ordenados para significar, também, alguma coisa. Mas somente isso. E, somente isso, porque o significado é sempre o mesmo. E continuaria ainda sendo o mesmo se, felizmente, não tivesse aparecido uma nova linguagem: a linguagem do hipertexto.

     Na verdade, leitor, foi com a linguagem do hipertexto que se abriram as portas da quarta dimensão e a humanidade, finalmente, pôde entrar no âmago da comunicação integral. Na era da comunicação absoluta. Com um simples clique do seu mouse, você, leitor, deixou de ser, apenas e tão-somente aquele-que-lê-sempre-guiado[31], sempre conduzido, sempre obrigado a seguir o caminho traçado pelo autor, para ser aquele que vai ler com a sua vontade e a sua imaginação.

     Na verdade, leitor, hoje, com a sua vontade, a sua imaginação e o seu computador, você se transformou num criador. Cada palavra clicada mostrará outra palavra e uma nova norma regerá a sua linguagem. Você não será mais obrigado a trilhar o caminho da leitura linha a linha, aquela vereda de mão única que o autor o obriga a percorrer, ladeada de muros intransponíveis. Hoje, leitor, você é livre para deitar e rolar em cima da criação. O mando é seu. E o campo também. Nada, nenhum detalhe ou personagem, ou até uma simples insinuação será coisa secundária. Todos os elementos serão protagonistas. E, para isso, bastará, leitor, que você use, apenas, o seu computador, a sua vontade e a sua imaginação.

     Na verdade, leitor, as possibilidades oferecidas pelo hipertexto são tantas, que são até absolutas. Como se sentiria você, caro leitor, se, em vez de ler, como sempre tem lido, a história do gênio de Leonardo da Vinci contada do ponto de vista dos seus biógrafos, a lesse contada do ponto de vista do seu pincel favorito? Ou a descrição da batalha de Waterloo contada do ponto de vista do cavalo branco de Napoleão? Ou a primeira ida à Lua, contada do ponto de vista do banheiro da nave Apollo 11, e não dos relatos arredondados dos tripulantes Neil Armstrong, Edwin “Buzz Ligthyear” Aldrin e Michael Collins? Não seria absolutamente fascinante descobrir que nem da Vinci pintou a Mona Lisa, nem Napoleão foi derrotado em Waterloo e nem os astronautas pousaram na Lua e sim num monte de Vênus? E que, nestes três casos, como em tantos e tantos outros, infelizmente, a verdadeira verdade é sempre encoberta pelas verdades dos autores?

     Na verdade, leitor, o mesmo ocorre com este texto, Encontro de Paralelas. Uma narrativa caprichosa e linear, absolutamente caprichosa e absolutamente linear, que, além de umas poucas verdadeiras notas de de página, contém apenas as fantasias do autor e é sempre conduzida pela vontade dele, como você mesmo constatou. E, ainda para além disso, como no próprio título se observa, não absolutamente caprichosa e absolutamente linear, e conduzida pela vontade do autor, como também confusa e impenetrável a qualquer leitura, por mais atenta ou acadêmica que seja. Veja esta amostra, leitor: E sem essa de paralelas se poderem encontrar no infinito se uma reta as cortar e a soma dos dois ângulos internos de um mesmo lado for menor que dois ângulos retos. Washington DC, capital dos Estados Unidos, fica no paralelo 38 e Pyongyang, capital da Coréia do Norte, fica no paralelo 39, e ambas se encontram, numa boa, nos incontornáveis banheiros da ONU, a misse politicamente correta do nosso faz de conta.

     A culpa não existe. Eu sou apenas o que posso ser e não o que gostaria de ser. Se eu pudesse ser o que quisesse e não fosse, , sim, seria racional e seria lógico que me culpassem. Mas eu sou apenas o que posso ser e não é racional nem é lógico que me culpem pelo que não depende de mim. Mas culpam. E dizem, ainda, que a razão e a lógica são fundamentais. Mas o que é fundamental para mim? A minha razão, a minha lógica e a minha realidade ou a razão, a lógica e a realidade dos outros? Na razão, na lógica e na realidade dos outros, não é racional nem é lógico que os besouros possam voar. Para isso existem as leis da aerodinâmica. Mas na minha razão, na minha lógica e na minha realidade, os besouros desconhecem as leis da aerodinâmica e voam à vontade. O fato de as leis da aerodinâmica serem racionais e terem lógica não significa que os besouros sejam obrigados a ser racionais e a ter lógica. Significa, apenas, que os homens inventaram as leis da aerodinâmica, como inventaram a culpa, mas não inventaram os besouros. As verdades são transitórias. São apenas as verdades de cada um.

     Na verdade, leitor, estes são ou não são apenas os lamentos de um autor que não sabe e nunca soube conviver com os outros? Um autor que não é nada a não ser um arredio? Se ele tivesse consciência do seu estar-no-mundo, este escrito até que poderia conter algumas especulações de profundidade, senão filosófica, pelo menos inquisitiva. Mas não. O que se são apenas os vagidos de uma mente arredia ao bem e ao conhecimento. Nem ironista ou sequer iconoclastista o autor sabe ser. Apenas demonstra um desconhecimento acadêmico e ontológico absolutos. O que é triste, pois quem se dá ao trabalho de alinhavar umas quantas linhas, deveria, pelo menos, ter consciência da sua própria ignorância. E, se por milagre soubesse o que dizer, que o dissesse com provas ponderáveis. O nosso grande Machado de Assis, no seu magistral romance Quincas Borba[32], declarou: Ao vencedor as batatas. Pois eu lhe digo, leitor, nem as batatas devem ser o prêmio do autor deste Encontro de Paralelas. as cascas.

     Mas, para que se não diga que somos adeptos do oswaldiano não li e não gostei, embora seja absolutamente justificável do ponto de vista da Teoria da Informação[33], veja, leitor, que leitura poderia ser feita se você pudesse viajar no hipertexto. Você poderia saber que a ignorância do autor é absoluta.

     O Senhor castigou o Egito com dez pragas e nenhuma delas teve caráter econômico e muito menos culinário, como solertemente o autor insinua.

     E preferir lendas a fatos, leitor, é apanágio da mais impiedosa ignorância. Se o autor tivesse conhecido, ou pelo menos lido, o grande Isaac Newton, saberia que até o mestre dizia, eu não invento hipóteses[34]. Que traduzido em latim, significa: hypotheses non fingo.

     E no ano 300 a. C. Euclides de Alexandria tinha definido que duas linhas paralelas não poderiam encontrar-se.[35] Além disso, você também poderia saber que nem Washington DC fica no paralelo 38 e nem Pyongyang fica no paralelo 39. Muitas outras cidades têm essas latitudes e ficam nesses paralelos.

     E a culpa existe, sim, e deve ser penitenciada. Se assim não fosse, como poderia o Confiteor[36] não ser verídico, se a sua fórmula data do século XII?

     E se há besouros que não parecem aerodinâmicos, na contrapartidabesouros muito para além de aerodinâmicos. Haverá, por acaso, algum animal mais aerodinâmico do que a vespa himenóptera?

     E existir não é estar presente!?! Leitor, desculpa-me a exuberância dos pontos de exclamação interrogativos, mas nesta matéria não tenho nem necessidade de apelar para os filósofos. Bastam-me os dicionaristas. Mestre Antônio Houaiss, no seu Dicionário Eletrônico da Língua Portuguesa, é concludente: existir, item 2, verbo intransitivo e predicativo: ter existência em determinado período; durar; permanecer. E o vocábulo , que o autor usa na frase, serve apenas para qualificar o que eu disse dele: um autor que não sabe e nunca soube conviver com os outros. , de acordo com o mesmo dicionário é um adjetivo e bem significativo: em estado de solidão (diz-se de quem não consegue conviver); solitário.

     Solitário e abécula. A nossa felicidade, leitor, nada tem a ver com as nossas convicções. Eu creio firmemente no programa fiscal do governo, acho-o absolutamente imprescindível, e, no entanto, sinto-me infeliz por pagar impostos.

     E mesmo que o sábio Aristóteles tenha dito o que disse, leitor, de uma coisa estou absolutamente certo: jamais poderia dizer, Alexandre, se manca, abre o olho. Aristóteles, na sua grandeza cultural, o mais que poderia ter dito seria, Alexandre, presta atenção, tem cuidado.

     Quanto ao silogismo apresentado,

Todos os filósofos falam.

Se tu não falares

Não serás filósofo,

vê-se que o autor nunca leu Jan Lukasiewicz[37]. Se tivesse lido, saberia a diferença entre um silogismo peripatético e um silogismo verdadeiramente aristotélico.

Se todos os filósofos são cultos,

Se ter cultura é acreditar em Deus,

então, Todos os filósofos acreditam em Deus.

     Tudo o que o autor de Encontro de Paralelas disse são parvoíces infundadas. Absurdas. Então não chega ao ponto de duvidar da Ciência? Se tivesse mais não teria como duvidar. Em 2008, na gruta Denisova, na Sibéria, descobriu-se um osso da ponta de um dedo, velho de 50.000 anos. Terminadas as análises ADN, concluiu-se que a falange é de uma menina de sete anos, chamada Mulher-X, que em denisovanês parece significar Lunauta. O ADN, leitor, está para a Ciência como o Hipertexto está para a Escrita: abre todas as portas.

     Portas que, infelizmente para o autor deste Encontro de Paralelas, se manterão sempre aferrolhadas, tantas e tão homéricas são as blasfêmias por ele cometidas. Blasfêmias tão descondizentes, leitor, que até você poderia desmascarar, se tivesse condições de navegar na quarta dimensão do hipertexto.

     Blasfêmias tão altissonantes e desconformes, que o autor se atreve até a dizer que nãoescolha. Como nãoescolha, leitor!?! Se não houvesse escolha, eu não teria escolhido ler este arrazoado de bobagens, chamado Encontro de Paralelas. Mas escolhi. E fi-lo porque qui-lo!

[1] BRADFORD, William, apud Of Plymouth Plantation, The Vision Forum, Inc. and Mantle Ministries, 2003

In the name of God, Amen. We whose names are underwritten, the loyal subjects of our dread Sovereign Lord King James, by the Grace of God of Great Britain, France and Ireland, King, Defender of the Faith, etc.

Having undertaken, for the Glory of God and advancement of the Christian Faith and Honour of our King and Country, a Voyage to plant the First Colony in the Northern Parts of Virginia, do by these presents solemnly and mutually in the presence of God and one of another, Covenant and Combine ourselves together into a Civil Body Politic, for our better ordering and preservation and furtherance of the ends aforesaid; and by virtue hereof to enact, constitute and frame such just and equal Laws, Ordinances, Acts, Constitutions and Offices, from time to time, as shall be thought most meet and convenient for the general good of the Colony, unto which we promise all due submission and obedience. In witness whereof we have hereunder subscribed our names at Cape Cod, the 11th of November, in the year of the reign of our Sovereign Lord King James, of England, France and Ireland the eighteenth, and of Scotland the fifty-fourth. Anno Domini 1620.

Este documento é considerado por muitos como o fundamento da Constituição dos Estados Unidos da América, aprovada em 17 de setembro de 1787.

[2] Os Peregrinos datavam-se pelo Calendário Juliano, que tem menos dez dias em relação ao atual Calendário Gregoriano.

[3] HEMINGWAY, Ernest, For Whom The Bell Tolls, Scribner Book Company, 1940

[4] WELLES, Orson, Citizen Kane, Mercury Productions and RKO Radio Pictures, 1941

[5] CARNEGIE, Dale, How to Win Friends and Influence People, Simon & Schuster, 1936

[6] ROSENBERG, Alfred, Blut und Ehre, Eher-Verlag der NSDAP, 1938

[7] JACOBY, Georg,Frauen sind doch bessere Diplomaten, 1941

8 HEIDEGGER, Martin, A auto-afirmação da Universidade Alemã, www.lusosofia.net, 2009

[9] FEMONOE, filha do deus Apolo, primeira pitonisa do Oráculo de Pítia, em Delfos, a quem se atribui a frase,  γνῶθι σ'αυτόν, 650 a. C.

[10] AMERICANIANS, The, Deste poema épico, que poderia ter sido Os Lusíadas norte-americano, escrito por Jamesson Bot em 1690, resta apenas a primeira estrofe: Eu canto os tacapes amerabados, / Que na grã pradaria americana / Nem pelos deuses foram derrotados, / Caçando e conservando a bufalana / Ao som dos elementos vigorados / Sem pecado ou vergonha desumana, / Foram mortos sem e sem razão / Em favor de europeia servidão. Os originais foram queimados em 1693 por Giles Anderson, primo de Abigail Philips, primeira esposa de Cotton Mather, o puritano pastor protestante encarregado da acusação no processo das Bruxas de Salem, em 1692. A informação, embora alguns a considerem com reserva, é de John Clark, pai de Elizabeth Clark Hubbard, segunda esposa de Cotton Mather.

[11] CAMÕES, Luís Vaz de, Rimas, Edições Almedina, 1994

[12] FORD, John, The Man Who Shot Liberty Valance, 1962

[13] EUCLIDES, Elementos de Geometria, Livro I, Axioma XII (5º Postulado), Edições Cultura, 1944

[14] STOICHKOV, Tzvetan, Study About Versatilities, Enima Books, 2009

[15] , Ignácio Polaranda Costa da, Prof. Dr., A Verdade, 3 vol., Câmara Municipal de Vila Nova de Pardais, 1977

[16] AD JURIS, Editora, Vade-Mécum Ortópode, 2010

[17] CESARÉIA, Eusébio de, Cartas de Abgaro V, rei de Edessa, a Jesus Cristo, Petar & Karapanchev, 1999

[18] DAMIANO, Gerard, The Devil in Miss Jones, 1973

[19] AQUNIO, São Tomás de, Suma Teológica, Editora Sulina, 1980

[20] ALVES, José Maria, apud Deus, Alma e Morte na História do Pensamento Ocidental, 2008, www.homeoesp.org, 2008

[21] HAWKING, Stephen William, How to build a time machine, in Daily Mail, 03.05.2010

[22] PLATÃO, Apologia de Sócrates, Domínio Público, 2010

[23] LAÉRCIO, Diógenes, Vidas, opiniones y sentencias de los filósofos más ilustres, Torre de Babel Ediciones, 2007

[24] ROUSSEAU, Jean-Jacques, Discours Sur L’Origine Et Les Fondements De L’Inegalité Parmi Les Hommes, Flammarion Editions, 2008

[25] VULGATA, Nova. Ad Titum Epistula Sancti Pauli Apostoli 1.15, www.vatican.va, 2010

[26] KLUTE, Rudolf Wilhelm, Philosophie und Kultur, Hummer Verlag, 2008

[27] Idem. Referência ao Paradoxo de Epiménides, filósofo grego, nascido em Cnossos, Creta, no século VI a. C., a quem se atribui a frase todos os cretenses são mentirosos. Sendo ele próprio cretense, estaria Epiménides dizendo a verdade? O mesmo se aplica a Rudolf Wilhelm Klute. Sendo ele filósofo, ao afirmar que todos os filósofos são mentirosos, estaria Rudolf Wilhelm Klute dizendo a verdade?

[28] MANOEL JOAQUIM SOBRADOR nasceu em Tiros, Minas Gerais, no dia 1º de abril de 1945, plantão do Arcanjo Samuel, do Anjo Jezalel e dos Santos Valério, abade e confessor, Hugo de Grenoble, Gilberto, Teodora e Irineu, mártires, posterior data do uso obrigatório do cinto de segurança nas rodovias brasileiras (1989). É mestre em Administração Holística pela General Holism University e doutor em Engenharia da Usabilidade pela Usual Norms University, com Ph.D. em Interconnectivity. É casado com a professora Dorotéia Simplício Sobrador, tem duas filhas e vive no Rio de Janeiro. É livre pensador, escritor e poeta. Dentre os vários livros que escreveu, destacam-se A Ponderabilidade das Circunstâncias - Visão Quântica das Previsibilidades, prêmio Honoris Scientia da Associação Holismo Universal e Usabilidade Semiótica, prêmio da Associação Semiótica Talinesca.

[29] SOBRADOR, Manuel Joaquim, Hipertexto, a Liberdade Libertária, Uirapuru Editora, 2006

[30] Idem

[31] SOBRADOR, Manuel Joaquim, Hipertexto, a Liberdade Libertária, Uirapuru Editora, 2006

[32] ASSIS, Machado de, Quincas Borba, Editora Egéria, 1978

[33] PIGNATARI, Décio, apud Informação Linguagem Comunicação, Ateliê Editorial, 2002

[34] NEWTON, Isaac, THE PRINCIPIA, Mathematical Principles of Natural Philosophy, University of California Pres, 1999

[35] EUCLIDES, Elementos de Geometria, Livro I, Definição XXXV, Edições Cultura, 1944

[36] ROMANA, Ato Penitencial dos Ritos Iniciais da Missa Católica Apostólica: Confiteor Deo omnipotenti, beatæ Mariæ semper Virgini, beato Michæli Archangelo, beato Joanni Baptistæ, sanctis Apostolis Petro et Paulo, omnibus Sanctis, et tibi, pater: quia peccavi nimis cogitatione, verbo, et opere: (percutiunt sibi pectus ter, dicentes): mea culpa, mea culpa, mea maxima culpa. Ideo precor beatam Mariam semper Virginem, beatum Michælem Archangelum, beatum Joannem Baptistam, sanctos Apostolos Petrum et Paulum, omnes Sanctos, et te, pater, orare pro me ad Dominum Deum nostrum. 

[37] LUKASIEWICZ Jan, Aristotle’s Syllogistic From the Standpoint of Modern Logic, Clarendon Press, 1951

 

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