CUNHA DE LEIRADELLA

A SOLIDÃO DA VERDADE

ROMANCE

III PARTE - A SOLIDÃO DA VERDADE

Trinta e quatro

Hoje é domingo e já é noite e ainda estamos no motel e continuamos sem falar e o quarto cheira a sexo e a suor e a fumo de cigarro e eu olho os espelhos do teto e vejo Andréa deitada do meu lado e os pêlos do sexo mal se vêem e o cabelo parece sangue manchando o travesseiro e quero fumar e lembro que Andréa gosta de Marlboro e não tenho mais vontade e as minhas mãos me dão um Benson e eu puxo uma tragada e fico satisfeito e lembro da Casa dos Contos e do almoço e de Andréa olhando para mim e eu estava bem e estava calmo e nem lembrava mais da minha mãe e do nosso casamento e Andréa levanta-se de repente e eu não entendo e pergunto e ela não diz e pega a bolsa e sai correndo e eu fico sem saber o que fazer e vou atrás e ela já está junto do carro e eu pergunto outra vez e ela não responde e entramos no carro e eu não sei para onde ir e subo a rua e um carro passa e buzina e foda-se vou atrás dele e ele segue pela BR e passa pelo Shopping e entra no desvio dos motéis e eu também entro e não era o que eu queria o que eu queria é que Andréa pegasse na minha mão e me deitasse no colo e ela não entende e pede uma suite e vai na frente e abre as torneiras da banheira e despeja os sais de banho e liga a hidromassagem e o rádio e pede uma cerveja e um maço de Marlboro e despe-se e entra na banheira e os seios cobrem-se de espuma e abanam com a água e eu não sinto vontade de pegá-los e Andréa não entende e fica rindo e a campainha toca e ela pega a cerveja e o maço de Marlboro e enche o copo e bebe e volta a tomar banho e a água transborda e escorre pelos ladrilhos e eu lembro da minha mãe e saio do banheiro e sento na cama e acendo um cigarro e puxo uma tragada e o fumo amarga e não quero mais fumar e sinto vontade de ir embora e levanto-me e lembro da moça do Parque Municipal e dos seios abanando e tenho medo de encontrá-la e desligo o rádio e deito-me e procuro relaxar e fecho os olhos e Ana Carolina e Walkiria e Inêz de Castro e Andréa começam a dançar e os seios estão nus e são os seios da minha mãe cobertos de espuma e abanando e ela ri e diz meu menino, meu menino, deita a cabeça no meu colo, e esfrega as coxas e os seios e a espuma escorre pelo corpo e a minha garganta aperta e dói e os ouvidos começam a zumbir e eu quero levantar e as minhas mãos não deixam e pulam nas minhas pernas e cravam as unhas nas minhas coxas e quero fugir e não posso e tenho medo e abro os olhos e as minhas mãos estão rindo e apontando os espelhos do teto e eu vejo o meu corpo grudado lá em cima e tenho medo que ele caia e peço que elas o segurem e elas riem do meu pedido e escondem-se no lençol e eu quero erguer os braços e elas prendem-me na cama e eu peço a Deus que me ajude e segure o meu corpo nos espelhos se ele cair eu tenho que subir e ficar no lugar dele e se ficar no lugar dele não poderei mais ficar na cama e se não ficar na cama não poderei estar no quarto e se não estiver no quarto Andréa não estará no banheiro e Andréa está no banheiro e está tomando banho e não sei o que fazer e peço às minhas mãos que me soltem e elas riem e sobem na parede e levanto os braços e os braços não têm mãos e não alcançam os espelhos e quero pegar as minhas mãos e elas continuam subindo na parede e o meu corpo começa a balançar e a cair e tenho vontade de gritar e as minhas mãos descem e tapam a minha boca e eu tenho medo de morrer e peço a Deus que me ajude e o meu corpo gruda nos espelhos e não cai e eu fico bem e fico calmo e começo a relaxar e as minhas mãos puxam o meu corpo e ele começa outra vez a balançar e a cair e eu quero segurá-lo e não posso e sei que vou morrer e fecho os olhos e espero e não morro e abro os olhos e o meu corpo ainda está grudado nos espelhos e fico bem e fico calmo e tenho certeza que não preciso mais das minhas mãos e sei que nada mais poderá mudar dentro do quarto e mesmo que eu morra haverá sempre duas camas uma no chão e outra nos espelhos e bastará ficar um corpo numa delas para Andréa pegar na minha mão e eu deitar a cabeça no colo dela e quis pensar no colo dela e nos seios abanando e não consegui pensar em nada e tive medo de não pensar mais nada e pedi a Deus que me ajudasse e os olhos desceram dos espelhos e o meu corpo veio junto e ficou flutuando sobre mim e não caiu e eu fechei os olhos e vi Andréa e os seios abanando e fiquei bem e fiquei calmo e tive certeza que se virasse de bruços e olhasse o mundo do outro lado tudo dentro do quarto mudaria e o meu corpo ficaria suspenso sobre o chão e o chão ficaria suspenso sobre a cama e a cama ficaria suspensa sobre o teto e o teto ficaria suspenso sobre o telhado e o telhado ficaria suspenso sobre a terra e a terra ficaria suspensa sobre o céu e o céu ficaria suspenso sobre Deus e Deus ficaria suspenso sobre nada e nada ficaria suspenso sobre mim e eu ficaria suspenso sobre tudo e as minhas mãos seriam minhas e obedeceriam sempre às minhas ordens e eu governaria o tempo e o espaço e seria o que sempre pensei ser e nada poderia matar-me e mesmo que me matassem eu não poderia morrer porque estaria suspenso sobre tudo e a morte não é tudo e fiquei bem e fiquei calmo e tive certeza que as minhas mãos já eram minhas e já obedeciam às minhas ordens e dependia só de mim virar de bruços e olhar o mundo do outro lado e inverter a ordem do tempo e do espaço para ser tudo que quisesse e olhei as minhas mãos e elas concordaram e mostraram os dedos já prontos para agarrar o momento que passava e eu tive certeza que quando virasse de bruços e olhasse o mundo do outro lado tudo seria como eu sempre quis que fosse e Andréa me quereria e pegaria na minha mão e diria, meu menino, meu menino, deita a cabeça no meu colo, e seriamos mais felizes do que Deus e Deus e Deus e um arrepio de prazer sobe dos pés e rebenta na cabeça e eu me sinto flutuar e tenho certeza que chegou a hora de virar e paro de pensar e concentro-me e o som do rádio explode nos meus ouvidos e as minhas mãos assustam-se e cravam as unhas nas minhas coxas e eu grito e abro os olhos e Andréa está na minha frente e está nua e eu sei que não posso mais virar nem olhar o mundo do outro lado e Andréa sorri e ajeita a toalha na cabeça e passa as mãos nos seios e senta-se e debruça-se e os seios tocam a minha cara e quero pegá-los e as minhas mãos não querem e não obedecem às minhas ordens e a minha garganta aperta e fica seca e Andréa tira a toalha da cabeça e sacode o cabelo e os seios parecem gelatina e a minha garganta aperta mais e os ouvidos começam a zumbir e Andréa deita a minha cabeça no colo e aperta-a contra os seios e a minha mãe diz, meu menino, meu menino, deita a cabeça no meu colo, e a minha nuca estala e os olhos apagam e mergulham em milhões de fagulhas coloridas e Andréa ri e levanta-se e tira a minha roupa e entra comigo na banheira e deita-se sobre mim e os seios esmagam-se no meu peito e a minha garganta fecha e não consigo respirar e milhões de besouros cavoucam nos ouvidos e Andréa abre as minhas pernas e ajeita-se no meio delas e abraça-me e beija-me e roça os seios no meu peito e eu quero pegá-los e roçar a cara neles e as minhas mãos não querem e não obedecem às minhas ordens e pulam nas minhas pernas e cravam as unhas nas minhas coxas e Andréa morde a minha boca e esfrega o sexo contra o meu e geme e aperta-me com força e geme mais e levanta-me e leva-me para a cama e deita-me e monta nas minhas coxas e balança o corpo e os seios abanam e respingam água no meu rosto e ela morde os lábios e levanta os braços e abre os dedos e comprime o sexo contra o meu e esfrega e aperta as minhas coxas com as pernas e balança o corpo com mais força e os seios parecem gelatina e Andréa pega neles e aperta-os e acelera os movimentos e os besouros enlouquecem nos ouvidos e a garganta dá um nó e não consigo respirar e Andréa geme mais e balança a cabeça e mete um dedo na boca e molha o clitóris e esfrega com mais força e contorce o corpo e a respiração fica roufenha e agarra a cabeça com as mãos e acelera os movimentos e abre os braços e roda a cabeça com força e grita e retesa os músculos e grita mais e curva-se e crava as unhas no meu peito e rala o sexo contra o meu e os olhos estão fechados e a boca está aberta e as pernas parecem tenazes comprimindo as minhas coxas e o corpo pula e as unhas rasgam a minha pele e de repente fica dura e um uivo regouga pelo quarto e ela cai sobre mim e o suor escorre pela cara e pelos seios e eu fecho os olhos e peço a Deus que me ajude e mate os besouros dos ouvidos e quero abraçá-la e as minhas mãos não querem e não obedecem às minhas ordens e pulam nas minhas pernas e cravam as unhas nas minhas coxas e rasgam a minha pele e eu grito e as minhas mãos ficam loucas e quebram tudo e sobem no teto e estraçalham o corpo dos espelhos e os pedaços voam pelo quarto e o sangue escorre e mancha tudo e elas riem e batem palmas e esmigalham todos os espelhos e eu tenho medo que me matem e peço a Deus que me ajude e Andréa continua caída sobre mim e o suor escorre no meu peito e sinto vontade de fumar e empurro Andréa e o corpo resvala e cai no colchão e fica imóvel e eu acendo um cigarro e fico feliz por ser um Benson e puxo uma tragada e o fumo faz-me bem e não sei por que Andréa fez aquilo em vez de continuar apertando a minha cabeça contra os seios e olho-a e ela continua sem mexer e olho o meu sexo amolecido e penso no que será a nossa vida com Andréa sempre se bastando e o meu sexo sempre amolecido e lembro das vias-sacras e dos seios com espuma e das mulheres sem rosto e sem cabelo e tenho medo do que penso e não quero pensar mais e Andréa sobe no meu corpo e enfia a língua na minha boca e roça as coxas no meu sexo e o meu corpo está morto e não responde e eu só consigo pensar no corpo dela ainda cavalgando as minhas coxas e ela metendo um dedo na boca e molhando o clitóris e gemendo e gritando e uivando até gozar e eu sendo apenas um cavalo que se monta e desmonta quando quer e Andréa olha-me e sorri e pega nas minhas mãos e comprime-as contra os seios e eu lembro do Ipê Amarelo e ela gritando, não pára, não pára, não pára, não, e gozando e não gosto do que penso e lembro do quarto dela e ela abaixada e de costas e pedindo, faz, faz como ele, enfia, enfia em mim, me rasga toda, e tenho raiva do que penso e quero levantar e ir embora e as minhas mãos pulam nas minhas pernas e cravam as unhas nas minhas coxas e rasgam a minha pele e eu grito e Andréa não percebe e continua lambendo o meu umbigo e comprimindo os seios no meu sexo e a língua desce e lambe as minhas coxas e eu me sinto mal e quero que ela pare e ela não pára e eu empurro-a e o corpo resvala e cai no colchão e fica imóvel e eu fico bem e fico calmo e sei que é melhor Andréa estar assim e as minhas mãos também concordam e acomodam-se no meu peito e abro os olhos e as paredes já estão limpas e os espelhos do teto estão inteiros e só refletem os nossos sexos e um é marrom e outro é louro e agora essa é a nossa diferença.

 
 

Cunha de Leiradella
Casa das Leiras
São Paio de Brunhais
4830-046 - Póvoa de Lanhoso
Portugal
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E-mail: leiradella@sapo.pt

 
 

 

 

 

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