|
||||||||||
Esse pluralismo não conhece fronteiras culturais, religiosas ou confessionais. Os mesmos métodos, abordagens ou leituras são praticados por cristãos de todas as denominações, por judeus e até por agnósticos. A situação despertou a atenção das altas instâncias da Igreja católica há mais de quinze anos. Com efeito, já em 1988, o Cardeal Joseph Ratzinger encarregou a PCB, a que ele preside, de estudar os diferentes métodos exegéticos e de os avaliar, ajudando assim os católicos a fazer as suas escolhas de maneira esclarecida. Os resultados desse estudo foram publicados em 1993 num documento intitulado A interpretação da Bíblia na Igreja (1), que apresenta um panorama relativamente completo dos métodos, abordagens e leituras actualmente praticados no estudo da Bíblia, fazendo um balanço das posibilidades e dos limites de cada um deles. Sem entrar em pormenores, vou só referir o elenco e a classificação propostos pelo documento. Este distingue entre métodos de análise, abordagens e leituras da Bíblia. Por “método exegético”, no singular, o documento entende um conjunto de técnicas científicas utilizadas para explicar os textos bíblicos. O documento reserva essa designação para o “método histórico-crítico” e para as exegeses baseadas em análises literárias: análise retórica, análise narrativa e análise semiótica. O documento começa pelo “método histórico-crítico”, o único que considera indispensável para o estudo científico do sentido dos textos antigos, categoria a que pertencem os textos bíblicos. O “método histórico-crítico” comporta várias etapas, que correspondem a outras tantas disciplinas: crítica textual, análise filológica, crítica literária, crítica das formas e dos géneros literários, crítica das tradições pré-literárias e crítica das redacções. Apesar de considerar a exegese histórico-crítica indispensável, o documento reconhece que ela tem limitações. A principal seria o facto de que com frequência a exegese histórico-crítica “se contenta com a busca do sentido do texto bíblico nas circunstâncias históricas da sua produção e não se interessa pelas outras possibilidades de sentido que se manifestam no decurso das épocas posteriores da revelação bíblica e da história da Igreja”(2). Por isso, o documento declara que “nenhum método científico para o estudo da Bíblia é plenamente adequado para apreender toda a riqueza dos textos bíblicos”. Tendo as considerações de ordem literária ocupado sempre um lugar importante na exegese histórico-crítica, os métodos baseados na análise literária mencionados pelo documento, excepto talvez a análise semiótica, não são inteiramente novos. Com efeito, o “método histórico-crítico”, particularmente abrangente, fez frequentemente apelo à retórica e à arte dos relatos, mas fazia-o de maneira ocasional e pouco rigorosa. Graças aos progressos das ciências da linguagem nas últimas décadas, a análise retórica e a análise narrativa tornaram-se verdadeiros métodos autónomos. Por seu lado, a análise semiótica é um fruto directo das ciências modernas da linguagem. Contrariamente ao “método histórico-crítico”, que é por definição diacrónico, as análises de tipo literário, sobretudo a semiótica, são sincrónicas, isto é, tomam o texto tal como ele existe, sem ter em conta a questão da sua génese, do sentido e da função que ele possa ter tido quando foi escrito. Por “abordagem”, o documento entende um estudo orientado segundo um ponto de vista particular. Classifica entre as abordagens os estudos da Bíblia feitos à luz da tradição (abordagem canónica e o recurso às tradições judaicas de interpretação), de algumas ciências humanas (sociologia, antropologia cultural, psicologia e psicanálise) ou ainda de situações contemporâneas particulares (situação dos oprimidos, das mulheres). Menciona em último lugar “a leitura fundamentalista da Bíblia”, à qual o documento não reconhece o estatuto de método nem de abordagem. Além disso, é a única que julga de maneira inteiramente negativa. |
||||||||||
(1) Sobre as circunstâncias relativas à elaboração do documento, pode ler-se José Loza Vera, «La interpretación de la Biblia en la Iglesia», Anámnesis (Revista de Teología, Dominicos, México) IV/2 (1994) 79-81 (77-117). (2) L’interprétation de la Bible dans l’Église , Città del Vaticano, Libreria Editrice Vaticana, 1993, p. 33. |
||||||||||
ISTA, Página principal - Cadernos do ISTA - TriploV |
||||||||||
ISTA CONVENTO E CENTRO CULTURAL DOMINICANO R. JOÃO DE FREITAS BRANCO, 12 1500-359 LISBOA CONTACTOS: GERAL: ista@triplov.com |