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DOMENICO AGOSTINO VANDELLI |
PARA UMA BIOGRAFIA DE DOMINGOS VANDELLI |
(1735-1816) |
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1801 |
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- D. Rodrigo de Sousa Coutinho é nomeado Ministro e
Secretário de Estado dos Negócios da Fazenda. Decreto de 12
de Novembro ordena a reforma da Casa da Moeda. Manda-se
abrir concurso docimástico e metalúrgico, de cuja
organização é encarregado o Intendente Geral das Minas e
Metais do Reino, José Bonifácio de Andrada e Silva.
- Fevereiro. Os espanhóis declaram guerra a Portugal. Portugal forma três exércitos. O do Alentejo era comandado
pelo duque de Lafões, presidente da Academia Real das Ciências, com oitenta anos
de idade. O essencial da guerra passa-se no Alentejo. Guerra
das laranjas, na qual as tropas do duque de Lafões têm acção
desastrosa. Portugal perde Campo Maior, Olivença e
Juromenha. O duque é destituído de todos os seus cargos.
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1803 |
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- Aves, conchas e minérios de ouro do museu da Ajuda
seguem para França, entregues por ordem do governo ao
general Lannes, embaixador de França.
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1807 |
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- Vandelli é Cônsul-Geral de Portugal na Noruega (?!) |
- Napoleão decide a invasão de Portugal. A corte parte
para o Brasil.
- Primeira invasão de Portugal, no Inverno. Governo de
Junot. Este manda ir à sua presença, para o congratular, o Corpo do Comércio de Lisboa, precedido da Real Junta. Ratton
lê e entrega ao general uma declaração em Francês da qual
diz não ter tido prévio conhecimento. Um deputado da Junta
oferece a Junot um estojo com uma jóia de brilhantes, a
qual, afirma a Ratton o cravador de diamantes Dupuy,
valeria oitenta mil cruzados. Ratton: "No que me parece se enganou, porquanto meu Colega o Dr. Domingos Vandelli, que
serviu na Inspecção da Contadoria da Real Junta, depois da
feliz Restauração, suprindo o deputado conselheiro que não
apareceu mais no Tribunal depois da expulsão dos invasores,
me disse, na ocasião da nossa deportação, haver visto no
Livro de Saída da Caixa da mesma Real Junta, a parcela de 40
contos de réis para o dito estojo."
Naquela ocasião, eram só
quatro os deputados da Junta: Ratton, Vandelli, Girardo
Venceslau Braancamp, que fazia as vezes de presidente, e
Francisco Soares, secretário.
- O visconde de Barbacena, secretário da Academia, é
escolhido por Junot para fazer parte da deputação que foi a
França cumprimentar Napoleão.
- Desembarque das tropas inglesas em Portugal.
- Carlos IV e Fernando VII de Espanha abdicam em favor
de Napoleão.
- Convenção de Sintra, pela qual Junot é autorizado
pelos ingleses a sair de Portugal com o seu saque. Os
ingleses governam Portugal, os simpatizantes dos franceses
são perseguidos.
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1808 ............................A grande massa de cobre nativo da Bahia.'. |
17 DE SETEMBRO DE 1808
Carta de Vandelli para o Regente,
in: Azevedo 1922),
que achou os documentos na Torre do Tombo (Ministério do
Reino, maço 279, Cavalariças Reais).
Senhor,
Domingos Vandelli, Director do Real Jardim Botânico,
Museu, etc., representa a V. A. R. que, entre as Repartições
da Sua Real Casa, o Museu escapou à pilhagem de Chuffre (1),
cunhado do general Junot que, tendo notícia nele haver
folhetas e barras de ouro, e supondo também porção de
diamantes, nos primeiros dias da sua chegada o foi visitar,
mas ficou lograda a sua cobiça; porque os diamantes são
pequenos e não são mais de nove, e as folhetas e barras de
ouro, precavendo o saque, as entreguei a V.A.R. em dois
saquinhos, na véspera da sua partida; pelo que o Chuffre,
não sendo curioso das outras produções naturais, não voltou.
Poucos meses depois chegou Geoffroy de Saint-Hilaire,
um dos Professores de História Natural do Museu de Paris,
mandado pelo Ministro do Interior da França, para tirar
deste Museu todas as produções naturais que faltassem no de
Paris, indicando a grande massa de cobre nativo da Baía, e
que fizesse colecção de manuscritos mais raros, donde os
achasse, e cartas geográficas das Colónias, etc..
Tive eu ordem do Governador (2) de patentear o Museu ao
Geoffroy; pelo que para assistir à sua escolha, e não
houvesse saque, nem descaminhos, pedi, nos dias em que
devia ir à Ajuda, sege ou parelha das Reais Cavalariças,
que me foi concedido, tendo-a já por mercê de V.A.R., mas
que na entrada dos franceses me foi tirada.
Escondi as mais raras produções naturais, e
principalmente a maior parte que não eram duplicadas, por
meio do fiel José António Pires.
Instei com o Geoffroy para deixar o cobre nativo, por
ser enorme o seu peso, e dificultoso o transporte por terra,
e porque era o principal ornato deste Museu; e ficassem os
animais, que como desconhecidos dos Naturalistas, eu e meu
filho, moço da sua Real câmara, tínhamos descrito, sendo os
mais animais por ele e-colhidos quase todos duplicados,
exceptuados as conchas, e algumas espécies de macacos; o
que alcancei.
Assinados os catálogos pelo Governador, do que escolheu
Geoffroy deixei encaixotar, e transportar as caixas para a
Junqueira, de onde os ia embarcar.
Mas como sucedeu a feliz restauração do Reino, dando
lugar a reclamações, logo pedi ao General Beresford a
restituição das caixas que Geoffroy tinha tirado deste
Museu, que aparecendo neste Quartel General, dizendo que
nas ditas caixas existiam misturadas muitas produções
naturais que lhe pertenciam, recolhidas na sua viagem, e
outras obtidas de várias pessoas, ou compradas, e um
herbário do Dr. Brotero, ao qual tinha dado uma grande
colecção de sementes, que se repartiram com este Jardim
Botânico, e ao Museu fez presente de muitos minerais, que
nele não existiam, e por ter eu já de V.A.R. obtido licença
de trocar as produções Naturais duplicadas do dito Museu,
para enriquecê-Io mais com o que faltasse, como por várias
vezes fiz; e prometendo-me Geoffroy, quando as coisas fossem
sossegadas, remeter-me o dobro do Museu de Paris, que
faltasse a este; e que entretanto e em compensação dos
animais me dava cinco caixas de manuscritos recolhidos em
vários pontos e 23 grandes Volumes (4) com folhas das
estampas da História de Luis XIV e coroação de Luis XV, que
ninguém reclamou, e contendo os mesmos muitas obras
inéditas, e interessantes para a História deste Reino, e das
Colónias, de Política, e finanças, Belas Letras, etc., lhe
deixei as caixas dos Animais, e me fiz restituir a das
conchas, porque continha as mais raras e das quais não havia
duplicados, a caixa dos minerais por serem quase todos do
Brasil, aquela da Flora do Peru (5) copiada do original e a
do Rio de Janeiro (6) inéditas, as quais no fim, por ordem
de Junot, tirou da Biblioteca do Museu. (7)
Apresentei na Junta da Comissão os catálogos assinados,
e a relação do que tinha recebido de Geoffroy, em
compensação dos Animais, e me passou o junto certificado.
Nesta geral separação das produções Naturais, e
reposição das que se restituiram, ficou o Museu tão
desordenado, que necessita reordenar-se e pôr as etiquetas,
que se confundiram ou perderam (8); pelo que devendo eu com
maior frequência ir à Ajuda, também para continuar o
catálogo e dirigir e vigiar as pessoas empregadas nestes
estabelecimentos, não podendo eu esperar auxílio algum do
Vice-Director (9), senão como tesoureiro, por ser
inabilitado saiu de casa por causa de moléstia crónica -
portanto P. a V.A.R. seja servida a continuação da mercê da
sege das suas Reais Cavalariças E.R.M. (10)
Anexos referidos por Vandelli:
Nesta Comissão entregou o Sr. Dr. Domingos Vandelli,
como encarregado por S.A.R. da Administração e regulação do
Museu do mesmo Senhor, todas as declarações relativas ao
mesmo Museu, declarando que em lugar de alguns animais que
nenhuma falta faziam, deu Mr. Geoffroy muitos Minerais, e
vários manuscritos raros, ficando por todas estas razões
utilizado, e não danificado o referido Museu. (11)
Lisboa, 17 de Setembro de 1808
António Rodrigues de Oliveira
We aknowledge to have received from sig.r Dr. Domingos
Vandelli a report relativ to the restitution of some
Articles of Natural History by the French to the referred
Museum as also respectivy an Exchange made with the French
of their articles and wich Exchange he states to be in
favour of the referred Museum of Belem. (11)
17 Sep. 1808t
N. Trant, L. C.el
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Notas: |
(1) Geouffre, administrador geral dos domínios da coroa
(2) Junot
(4) Estes 23 volumes provinham do palácio dos duques de
Cadaval
(5) Flora do Peru. Em vários artigos e cartas aparece
escrito "Hora do Perú". Nas listas de material levado para
Paris, o que consta é um herbário do Peru, sem indicação de
colector, contendo 289 plantas. Houve um Ruiz que explorou
o Peru no séc. XVIII e é às vezes mencionado.
(6) Flora Fluminensis, de J. M. Veloso, dizem outros
que então na tipografia; e que os franceses foram à
tipografia e levaram as chapas
(7) Esta cena lembra uma outra, exactamente da mesma altura, relativa às caixas de Link e Hoffmansegg, que
regressavam do Brasil. Haviam contratado com Vandelli que,
em troca de autorização para herborizarem no Brasil, dariam
metade das colecções ao museu da Ajuda. Não quiseram cumprir
e Vandelli reteve as caixas na alfândega. Então os alemães
pediram a Junot que as libertasse, pois em troca dariam
metade das colecções a Saint-Hilaire.
(8) Esta cena das etiquetas lembra a que autores
futuros inventarão para denegrir Vandelli, acusando-o de
prejudicar Alexandre Rodrigues Ferreira.
(9) Alexandre Rodrigues Ferreira, que sofria de gota, e
já nem saía da cama nesta data. Era protegido de Vandelli,
foi este quem o colocou na Ajuda como vice-director.
(10) Esta carta dá ideia de ter sido redigida ou ditada
no próprio Quartel-General, onde Saint-Hilaire se apresenta.
E dá ideia de que o Quartel-General fora instalado no Paço
da Ajuda. D. João VI, destinatário, estava no Brasil.
(11) Por algum motivo, Vandelli faz diplomacia por
conta própria, dizendo que o museu fora utilizado mas não
danificado. A menos que diga a verdade, e nesse caso, com
seu conhecimento, e por mão de Saint-Hilaire, só duas coisas
importantes teriam ido para França: as floras peruana e
fluminense.
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