ANÁLISE ASTROLÓGICA PROFUNDA PARA DOMINGOS VANDELLI (3)

III. CARÁTER E SOMBRA

Uma das mais importantes revelações da psicologia profunda é que as pessoas são, por natureza, duais, abrigando em si uma polaridade básica entre um "self" consciente e outro inconsciente. De um lado, existe o indivíduo com o qual você está familiarizado - o "eu" que pensa, sente e age da forma com a qual você se identifica. Do outro lado, existe um outro "eu" , um indi víduo oculto - o lado sombra - que contém os aspectos de sua personalidade menos desenvolvidos e mais difíceis de aceitar. Esse lado sombra luta por espaço e valorização e, ao mesmo tempo, perturba a sua auto-imagem complacente. A interação entre seus lados consciente e inconsciente é uma dança que muda de ritmo conforme os diferentes estágios de vida que você atravessa e as pressões e desafios que encontra. Nos parágrafos seguintes é descrita a tensão entre os personagens primordiais que existem em seu drama interior, fontes de energia que geram as mudanças, objetivos, conflitos e crescimentos em sua vida. Existem ainda outros personagens dentro de você - atores coadjuvantes que se misturam e entram em choque com os protagonistas principais, tornando-o a pessoa singular que você é. Quando tais personagens secundários tiverem uma presença marcante na sua carta astrológica, serão descritos, na medida do possível, tão detalhadamente quanto os personagens principais. A estória assim retratada, com sua complexa interação de luz e sombra, representa aquilo que realmente significa o destino individual.

No âmago da vida, uma poética visão da alma

O poeta austríaco von Hoffmannsthal disse certa vez que a realidade é o maior dos encantamentos que alguém já experimentou. Sua realidade é, sem dúvida, um reino encantado, que tem em seu rico reservatório interior de imagens e de sonhos como sustentar-se e que vem de sua profunda convicção não racional de que algum poder numinoso se encontra em progresso, afetando não apenas seus impulsos criativos pessoais como também a vida como um todo. Isso não quer dizer que o universo da imaginação lhe desperte algum tipo de sentimento religioso, ou mesmo místico, no sentido convencional, pois ele é por demais caótico, turbulento e às vezes sombrio para que você consiga adorá-lo com aquela humildade característica da devoção espiritual. Mas tudo que representa uma possibilidade de experiência exterior a você - pessoas, lugares, situações - está, em última análise, subordinado a sua visão interior que do sentido e da essência que eles possam ter .

A vida só lhe parece digna de interesse quando se assemelha ao máximo àquele drama mítico que você suspeita desenrolar-se dentro de si e que constitui a principal razão de sua luta por um meio de expressão pessoal. Se a escolha desse meio recair sobre as palavras, elas serão apenas lentes, destinadas a invocar impressões mais profundas em quem as lê ou escuta. Você se ressente quando precisa dar explicações simplistas sobre si próprio e sua singular visão a certas criaturas mais literais, para as quais um objeto é apenas um objeto e um símbolo, um caminho ou um veículo. Graças à força de sua aliança com o mundo da imaginação, sua adesão às convenções da vida é apenas esporádica. Muitas pessoas o julgam meio esquisito ou excêntrico porque o que importa para você não faz sentido algum para eles; e o que importa para eles em geral lhe parece simplesmente banal ou aborrecido. Você dá uma atenção tão absoluta a uma certa voz interior que, para algum relacionamento seu dar certo, sua parceira teria de entender e adaptar-se a isso. Você tende a transformar até mesmo as pessoas que lhe são mais caras em símbolos que o inspirem e reluzam como estrelas em seu mundo interior de sonhos e imagens. Ou, dito de outra forma, para você o mundo prático e as mínimas ações das pessoas estão impregnados de algo mágico e cheio de sentido, que constitui um infinito combustível para sua imaginação.

A vida imita a arte

Você é a personificação da união de um anseio místico de total dedicação a algo mais sublime e transcendental e de uma visão da vida como um palco, em que cada pessoa se torna uma personagem simbólica - e cada situação, uma parte de um grandioso enredo teatral. As relações afetivas já não são simplesmente relações, mas um pacto de emoções como os de Tristão e Isolda ou lago e Otelo; a solidão deixa de ser apenas uma desagradável, embora ocasionalmente inevitável imposição da vida, para transformar-se numa expressão de angústia existencial; as coincidências evidentemente não são mero acaso, mas vestígios inequívocos de determinado padrão de ocorrências que parece insólito por ter um ordenamento inteligente desconhecido - afinal, está acima da percepção sensorial humana.

Embora possam fasciná-Io, essas idéias não significam que tenha aceitado a teoria de que a vida funcione dessa forma. É mais provável que você tenha a forte e profunda sensação de que assim é, e que jamais se deixe influenciar o bastante por nenhuma explicação lógica ou científica a ponto de abandonar sua impressão de que há algo de mágico em tudo que existe - ou de diminuir sua compulsão irresistível a atribuir a essa percepção uma expressão à altura daquilo que a inspira. Sua personalidade é paradoxal porque, por um lado, você é intensamente egocêntrico e um pouco arrogante (mas como não sê-Io e ainda acreditar na singularidade de suas criações, quando o mundo está cheio de escritores, pintores, atores e músicos fracassados que um dia também acreditaram que eram originais?). Mas, por outro lado, você também é muito auto-abnegado, pois a devoção que dedica a seus deuses interiores e às pessoas, locais e objetos que pareçam ter algo desses deuses é absolutamente irrestrita. Embora você às vezes possa estar exagerando, provavelmente daria a própria vida, caso sua convicção interior fosse suficientemente forte. Você tende a multiplicar mesmo a mínima das crises, pois tudo em seu mundo também é aumentado, meIhorado, recheado de mistério e romantizado a ponto de ficar irreconhecível. Às vezes você pode dar uma impressão de afetamento - e até de um pouco de histeria - a espíritos mais filisteus, pois não consegue deixar nada do jeito que é, ignorando, como se não existisse, tudo aquilo que não pode transformar com sua imaginação. Contudo, embora às vezes você possa ser acusado de estar fazendo gênero e dramatizando tudo, inclusive você mesmo, não o faz apenas para impressionar: você realmente não se importa com a opinião dos outros. Seu estilo excêntrico o ajuda a manter-se próximo do drama interior que é sua fonte de realização, além de expulsar definitivamente a banalidade e a monotonia de seu cotidiano. Você é muito solidário, mas de uma solidariedade estranhamente abstrativa, que evita a prova do contato real com pessoas de verdade. Com efeito, aturar as pessoas como realmente são pode ser demais para você, pois curiosamente lhe faltam as graças do convívio social, como se você tivesse crescido em outro planeta sem conhecer as regras deste. Você prefere transformar as pessoas em personagens de seu drama interior ou em símbolos de suas oferendas criativas. Isso lhe permite administrar algo que, de outro modo, você acharia impossível sem ficar deprimido ou decepcionado. Sua tendência a mitificar as situações reais e enquadrá-las numa estrutura de épica grandiosidade não diminui sua empatia e natural generosidade. Mas você certamente não seria a primeira pessoa a quem um amigo recorreria, caso precisasse de ajuda e apoio numa emergência. É mais provável que seus amigos o procurem quando as coisas voltarem ao normal, para ajudá-los a compreender a situação por que passaram.

Uma criatividade exacerbada

Por conseguinte, você tem a alma de um profeta e de um trovador, mesmo que nunca tenha tentado expressar sua visão pessoal e mesmo que sua imaginação e seus talentos criativos tenham permanecido intocados até agora. É extremamente necessário que você encontre algum meio de exteriorizar sua criatividade, pois seu rico mundo interior não tem limites. Inclusive, em última análise, esse mundo é muito mais importante para você do que qualquer opinião acerca do verdadeiro sentido da vida que possam lhe dar a sociedade ou mesmo as pessoas de quem você gosta. O dinheiro pode ser ótimo; a segurança, desejável; os prazeres do dia-a-dia, tentadores, mas você abriria mão de tudo isso, ou de quase tudo, em favor da realização de sua prioridade número um, que é encontrar a linguagem certa - verbal, visual ou física - para glorificar o reino espiritual, sua verdadeira realidade. As estranhas situações dos mitos e dos contos de fadas encontram em você terreno para sobrevivência e crescimento, pois tudo que lhe acontece na vida é traduzido em linguagem simbólica: você acha que se não pode transformar uma orelha de porco numa bolsa de seda, então nem vale a pena levá-la em consideração. Pode ser que você deixe todos a seu redor loucos de raiva por recusar-se a dar a menor atenção às coisas que eles julgam importantes, mas ninguém põe em dúvida a sinceridade de sua visão, a riqueza de sua imaginação nem seu inconfundível anseio por algo maior, mais profundo e mais significativo que a própria vida.

Ceticismo e materialismo ocultos

Existe um outro protagonista em seu drama psíquico interior, o qual se opõe a sua poética visão da vida e ao colorido e à dramaticidade com que você costuma carregá-la. Essa personagem inclui em si todas aquelas características mais mundanas, práticas e triviais que você teve de excluir de seu estilo de vida e de seu sistema de valores, a fim de preservar o contato com seu rico mundo interior. Embora de hábito você alimente em seu íntimo um certo desprezo por todas as pessoas sem imaginação, por não conseguirem alçar-se ao reino transcendental nem reconhecer intuitivamente o sentido escondido atrás de cada experiência, você também tem um lado simples, comum e materialista. O mais provável, todavia, é que você reprima esse aspecto de sua personalidade e o projete inconscientemente em criaturas menos dotadas ou de visão mais curta, as quais depois poderão fazê-lo sentir-se superior e deliciosamente incompreendido. Essa outra personagem vive no mundo das sombras do inconsciente, e seu encontro com ela provavelmente o deixará embaraçado, intimidado e inseguro. Não obstante, você necessita relacionar-se melhor com esse seu lado sombra pouco conhecido, não apenas para conseguir lidar satisfatoriamente com as limitações impostas pela vida cotidiana, mas também para manter-se dentro de fronteiras humanamente aceitáveis, para que não crie asas e se identifique de tal modo com suas figuras míticas interiores a ponto de impossibilitar a comunicação com as pessoas que o rodeiam.

O pavor de parecer inconveniente

Existe uma estranha espécie de veneziana que às vezes obstrui a passagem entre sua mente e o rico mundo imaginário que é seu alimento essencial. Pode ser que ela lhe pareça um bloqueio criativo de algum tipo - uma súbita perda de inspiração - ou que se manifeste como um incômodo sentimento de inadequação e de inferioridade, que o faça duvidar do valor de sua criatividade. As origens dessa dificuldade estão na precária relação que você estabelece com o dia-a-dia e com as pessoas comuns. É como se seu lado sombra, que está interessado principalmente nas ocorrências diárias de seu ambiente mais imediato, de repente não suportasse mais essa prisão perpétua nos porões da psique e se levantasse em rebelião. Em curioso contraste com a confiança - e até arrogância - com que você caminha por terrenos míticos e comunga com as divinas criaturas de sua imaginação, está sua falta de jeito para a mais simples comunicação humana, que às vezes o faz achar difícil manter mesmo a mais elementar das conversas se o assunto não for a Essência ou o Sentido da Vida. Apesar de você conseguir mascarar com perfeição esses lapsos abruptos recorrendo a um ar de extrema superioridade - por que se deveria perder tempo falando bobagens, de qualquer modo? -, seria mais sincero reconhecer que tem medo de entabular qualquer diálogo, por menor que seja, e que no fundo receia parecer um bobo ou tornar-se inconveniente. Você costuma adotar uma postura defensivamente dogmática, insistindo na relevância exclusiva de sua realidade interior, o que acaba por fazê-Io sentir-se um estranho, perdido no universo ancestral dos "olás" e dos "como vais". Pode ser que você se horrorize ao descobrir que quando começa a falar de coisas banais, torna-se muito banal mesmo - e até lento, pedante e sem imaginação.

Isso tudo pode parecer desagradável e até ofensivo, mas seria uma pena que você usasse sua grande imaginação e seus poderes de expressão só para defender-se do fato de ser um simples mortal. Se você se permitir relaxar um pouco e ser apenas tolamente humano de vez em quando, descobrirá que em seu lado sombra há muitas qualidades positivas e até necessárias para contrabalançar a riqueza de seu espírito poético. Entre elas está a capacidade de aceitar sua sina humana, o que significa que sua linguagem criativa pode realmente atingir os outros - afinal de contas, seus presumíveis destinatários. Esse lado sombra pragmático, lento e pedante, que se manifesta principalmente através de uma preguiçosa espécie de concreticidade de raciocínio, pode dar-Ihe também a paciência necessária para trabalhar melhor os arroubos de sua imaginação, de modo que deixem de ser simplesmente esotéricos e obscuros e passem a ser compreensíveis. Além disso, apesar de aparentemente sem graça e destituído de imaginação, esse lado sombra tem um humor finamente irônico e sarcástico que pode operar maravilhas para controlar um pouco essa sua ocasional presunção intelectual, mantendo-o realista quanto ao que você realmente pode alcançar em termos de mercado.

O dilema de aceitar um lado sombra simples e banal

Desse modo, há em você um lado oculto bem mais sisudo, convencional, pragmático e lento, que contrabalança seu espírito poético e apaixonado. Por mais aborrecido que você possa achá-lo e por mais irritante que considere esta descrição dele, seu lado sombra pode contribuir para um enriquecimento significativo de sua vida. Ele pode dar-lhe um senso mais realista de limites, que desbaste o excedente de suas aspirações criativas e as reduza a proporções administráveis e aceitáveis; pode dar-lhe a chance de ser simplesmente humano quando sua inspiração tirar férias, permitindo-lhe que aprecie a si próprio e aos outros mesmo quando não estiver possuído de qualquer visão ou arrebatamento interior; pode preservar seu senso de humor diante da vida e de você mesmo. Essas qualidades devem ser integradas a seus valores e a seu universo, pois a psique se ressente de todo tipo de excesso. O excesso de identificação com as criaturas que povoam suas fantasias pode resultar em bloqueio e depressão, destruindo justamente o que mais lhe importa: estar a serviço da fonte interior de criatividade que é sua eterna companheira e também seu inferno. Às vezes amiga; às vezes inimiga, ela jamais lhe permite algum tipo de contentamento que não seja vital: um mistério que resta inexplicável, mesmo que você lhe dê o nome de alma, inconsciente, Deus, Diabo, arte ou amor.

Outro par de personagens importantes

Os personagens descritos até aqui representam, em seu antagonismo fundamental, o tema principal de seu drama interior. Além desses atores, há um outro par de figurantes representados em seu mapa astral que você provavelmente reconhecerá em sua vida. Esses figurantes são brevemente descritos nos próximos parágrafos.

Fidelidade aos valores individuais

Você não permite que ninguém lhe dite quem deve ser ou o que deve fazer de sua vida: a seu ver, sua individualidade é sagrada. Mesmo que tenha prazer na companhia das pessoas e facilidade em atraí-las a si graças à vitalidade que irradia, você não é capaz de fazer concessões duradouras em termos de ideais, crenças e liberdade de ação para agradar a quem quer que seja, mesmo que se trate das pessoas de quem mais gosta. Você se ressente de ter sua liberdade cerceada por regras feitas pela comunidade e para a comunidade, pois adora ser diferente e não sente senão desprezo por quem vive uma vida de cordeiro, tentando imitar as imagens impostas pela mídia ou pela publicidade, como uma maria-vai-com-as-outras. Você não abre mão da liberdade de expressar-se a seu modo; entretanto, não quer fazer certas concessões exteriores que, além de insignificantes, poderiam garantir-lhe o direito de levar a vida a sua maneira. Ao invés disso, você tende a exigir, não sem uma encantadora ponta de arrogância, que o mundo se ajuste a você. Surpreendentemente, na maioria das vezes é exatamente isso o que acontece, ao menos nos meios em que você mais circula, pois tem a inteligência e a força de caráter para ser convincente, mesmo quando seu comportamento chega a ser um abuso.

Já que é tão fiel a suas convicções interiores, é muito provável que você, mais que parecer e realmente sentir-se diferente, também faça uma valiosa contribuição: algum trabalho criativo que aja como fermento sobre a imaginação das pessoas, despertando-lhes o desejo de autodefinir-se como indivíduos. É esta a psicologia por trás do "ídolo", seja ele um ator, escritor, político, pintor ou qualquer outra pessoa que pareça ter uma percepção mais aguda: ele sempre personifica algum tipo de objetivo que se transforma num modelo para os demais. Mesmo que nunca chegue a ter fama e sucesso perante as massas, você exerce considerável influência dentro de seu círculo pessoal e profissional, simplesmente porque suas idéias e valores não dependem de ninguém. Isso o torna poderoso, pois você é você mesmo. Mais cedo ou mais tarde, entretanto, terá de resolver a questão que fica pendente, que é a da sua inconsciente dependência da coletividade - a mesma coletividade com a qual você procura não estabelecer identificação para poder sair em busca de seu sonho -, pois ninguém consegue ser tão individualista o tempo todo.

Uma secreta dependência de ser aceito

Há uma personagem em seu drama psíquico interior que se choca com sua forte individualidade. Para continuar sendo você mesmo e trilhar seu próprio caminho, você teve necessariamente que excluí-la de seus valores e de seu comportamento consciente. Seu lado sombra, que tende a viver no inconsciente porque você o reprime, se importa e muito com o que os outros pensam a seu respeito, pois é uma figura muito mais dependente e indefinida que sua personalidade habitual. É ele que secretamente o impele a buscar a aprovação e o reconhecimento dos outros - mesmo que esse reconhecimento possa manifestar-se como um respeito cheio de ressentimento ou uma condenação (você, com efeito, se sente lisonjeado em ser condenado pelos outros, pois é melhor que ser ignorado).

Essa necessidade que você tem dos outros pode ir desde uma simples exigência social - ser aprovado e aceito pelas mesmas pessoas que volta e meia você dispensa por achar chatas e " certinhas " - até uma profunda ligação com o inconsciente cole tivo, do qual você, como toda a humanidade, também é parte, mesmo que não o saiba. Como uma poderosa corrente marinha, seu lado sombra o arrasta em direção às outras pessoas por força de sua necessidade de reconhecimento e valorização, tanto de sua própria identidade quanto de sua capacidade criativa. Não importa que você continue dizendo que não se incomoda com a opinião de quem não tiver padrões à altura dos seus: na psique, tudo se estabelece a partir de polaridades. Por isso, você não pode analisar a questão da individualidade (que lhe interessa de tal forma a ponto de ser um objetivo de vida) senão em contraste com a perspectiva de seu oposto, ou seja, a fusão com o grupo e a similaridade - e não a diferença - entre as pessoas. Você não poderia tomar uma posição tão individualista se não houvesse algo que lhe servisse de contraponto. Só que essa coisa está dentro de você: trata-se de algo que o torna igualzinho a todo mundo. Falando de modo mais místico, algo que é todo mundo. Se você aceitar isso e não viver tão defensivamente, conseguirá pôr seu grande potencial criativo a serviço de idéias e opiniões que inte- ressem a todos e não sejam simplesmente uma rebelde e raivosa afirmação de diferença.

Na sua carta astrológica aparecem vários temas importantes, existindo dois personagens adicionais que também são parte essencial de sua estória. Esses figurantes são descritos brevemente nos parágrafos seguintes .

A humanidade vista como uma grande família

Conceitos como "humanidade" e "sociedade", simples abstrações para muitas pessoas, são para você repletos de significado. A humanidade representa não só uma idéia a mais em meio a sua experiência, mas uma realidade viva: os fatos que tocam sua vida pessoal transpõem-se de imediato para uma perspectiva mais geral e mais ampla, pois você não consegue conceber-se, enquanto indivíduo, como uma entidade à parte, divorciada do corpo comum da humanidade. Você é parte integrante de uma família humana, e seu senso de finalidade e valor deriva essencialmente do sentimento de contribuir com algo para essa grande família. Como possui um forte impulso para reformar as pessoas de acordo com seus ideais, você tende a pontos de vista mais revolucionários ou radicais em termos de como devem ser as coisas. Assim, é provável que entre seus assuntos prediletos estejam questões como os direitos humanos, a opressão das minorias, a responsabilidade individual perante a coletividade e os males decorrentes da estrutura de classes e do materialismo desmedido. De fato, muito pouco em sua vida não se encontra permeado por seus ideais.

O trabalho que somente representa um salário mas não contribui com nada de significativo ou relevante para a sociedade da qual faz parte provavelmente não é para você: caso se veja numa situação assim, é bem possível que fique deprimido, inquieto e infeliz. Porém a vida enfim se encarregará de apontar-lhe os limites da condição humana e, dentro destes, os limites de sua própria natureza. Mais cedo ou mais tarde, você vai precisar aceitar, pelo menos até certo ponto, as leis do mundo em que se encontra. Suas idéias e opiniões estão de vinte a quarenta anos à frente de seu tempo, além de serem elevadas demais para suas expectativas de que outros seres humanos possam alcançá-las tão rápido quanto você imagina. Como não tem interesse especial pela vida emocional dos indivíduos, exceto enquanto reflexo dos efeitos de movimentos sociais e de tendências históricas, você se inclina a desvalorizar ou até ignorar os sentimentos individuais verdadeiros das pessoas, inclusive os seus. O bem-estar do grupo em geral é o que lhe importa. Não raro você justifica, pelo menos para si próprio, os meios pelos fins, desculpando - num plano racional - o infortúnio individual em nome da evolução social. Mas, apesar da relativa crueza presente em seus ideais, você é uma alma

Um lado oculto tradicionalista

Além de sua personalidade consciente vivaz, irrequieta e rebelde, há uma figura oculta em seu drama psíquico interior que contém tudo que você excluiu de seus valores e de seu comportamento exterior a fim de preservar a liberdade intelectual, emocional e física que tanto preza. Esse lado sombra é bem mais conservador, convencional e tradicionalista do que você gostaria de admitir. Caso faça uma avaliação honesta das reações desproporcionalmente negativas que você às vezes tem quando se depara com essas qualidades nas pessoas ou nas instituições sociais, poderá vislumbrar dentro de si uma secreta simpatia por esses valores mais antiquados. O problema é que você luta para ser rebelde, progressista e individualista, mas terá de consolar-se com uma auto-imagem um pouco menos brilhante, menos charmosa e estereotipada se quiser integrar seu lado sombra a sua personalidade. E você precisa desse seu lado oculto para sentir-se completo.

Você receia demonstrar esse lado, em parte por ele abrigar valores muito diferentes dos seus, e em parte por medo de ser rejeitado e considerado chato e pouco original. Graças a sua dificuldade em lidar com desafios concretos, você voa para o reino das potencialidades, vivendo num mundo de sonhos: o eterno "um dia, quando eu crescer...." Acontece que esse vôo na verdade mascara seu medo de fracassar e de mostrar-se incompetente aos olhos do mundo. Você é uma pessoa talentosa que consegue enxergar longe e pode realizar algo verdadeiramente extraordinário. Mas terá de aceitar alguns limites e regras da vida prática, inclusive as necessidades que você mesmo tem, pois ela lhe cobrará isso quando chegar a hora. Não importa o quanto seja bem-dotado e especial, você está sujeito aos mesmos conflitos, ansiedades e necessidades (principalmente de segurança e aceitação) que todo mundo tem. Quando for capaz de realmente aceitar seus próprios limites, é provável que venha a ter muito mais serenidade interior .


Manuscrito de Domingos Vandelli