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As coisas que então ocorreram só muito inutilmente podem ser atentadas em prosa ou em verso. Trata-se de descrever com uma quantidade de tinta impossível de ser suportada pelo papel, impregnando-o e dissolvendo-o em algo depois de um ponto indigerível: o fedor cadavérico do corpo, que nunca é inteiramente próprio, rigoroso oponente de todo materialismo. O fedor cadavérico do corpo que, um dia, ao longo do caminho, se encontra na forma de uma placa, uma poça, além da qual não se pode passar, e estava absolutamente sozinho, mas não consigo mesmo, e sim com algo no caminho, na virada, em que era deixado. Uma barbatana passa no horizonte. Cerca de três graus mais ao leste, mas mil eras antes, uma crista incandescente aparece acima das águas, e se empina lentamente como um nariz umbilical de rochas de ouro. Subida infinita. E o céu se enrola como um livro. E uma espada se embriaga no céu, de gordura, de sangue de cordeiros e de bodes, e rins de carneiros. E lixeiras repletas de peixes. E uma habitação de chacais, um sítio para avestruzes. E também os abutres, cada fêmea com o seu companheiro. E uma palavra é secretamente sussurrada, e cabelos se põem de pé. E anjos são encarregados de erros, impossíveis de deter, a medir a assustadora simetria das orquídeas comedoras de carne, como os vermes que dançam no lodo açucarado. |
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ALESSANDRO ZIR – Professor do Departamento de Filosofia da Universidade de Caxias do Sul (Brasil). Bacharel em Filosofia (UFRGS/Brasil), Bacharel em Comunicação Social (PUCRS/Brasil) e Mestre em Psicologia Social e Institucional (UFRGS/Brasil).
Membro do Grupo Interdisciplinar em Filosofia e História das Ciências do Instituto Latino-Americano de Estudos Avançados da UFRGS. Actualmente no Canadá, a preparar o doutoramento. E-mail: azir@zaz.com.br . URL: http://aletche.blogspot.com/ |