NUNO RODRIGUES
Hesíodo: O Mito das Cinco Idades
As idades ou raças surgem numa ordem de decadência, ou seja, começa na melhor e vai progressivamente avançando para – segundo Hesíodo – raças inferiores com uma exceção como se verá mais adiante.
A primeira das cinco raças referidas foi a de ouro. Era a época em que Cronos (deus do tempo) governava e em que as pessoas viviam felizes e despreocupadas e que morriam como que vencidas pelo sono. Uma época em tudo lhes era favorável , desde a terra da qual viviam e trabalhavam e que era fértil oferecendo-lhes os seus abundantes frutos. Aqui se nota o elogio que Hesíodo faz do trabalho na agricultura, ele que não era nada favorável ao comércio pois acarretava riscos desnecessários além da perda de tempo em termos de deslocações.
A segunda raça já é do tempo de Zeus (considerado o pai dos deuses). É a raça de prata e obviamente inferior à do ouro em que tudo era perfeito (ou pelo menos seria suposto ser). Esta raça é segundo o texto “…bem pior que a anterior…” e em que a infância durava 100 anos mas que quando chegavam à juventude não tinham muito mais tempo de vida, assolados pela loucura e sofrimento. Estavam de costas voltadas para os seus deuses. Esta foi a razão principal para que Zeus Crónida os tivesse aniquilado.
Zeus também irá ser o responsável pela terceira raça, a do Bronze. Homens dotados de fala e nada semelhantes aos da prata. Era uma época de guerras com Ares (Deus da Guerra) a ditar lei num povo com uma resistência física e psicológica inabaláveis e homens de uma enorme força física.
Segundo Hesíodo tudo era de bronze desde as armas às casas. Tal como as suas antecessoras esta raça também caminhou para o fim e levada para a casa de Hades (deus do mundo dos mortos). Ao contrário da raça de ouro em que os homens quase não se apercebiam da morte, nesta raça de bronze ela está bem presente pois passavam a maior parte da sua vida em batalhas.
Zeus não contente com tudo isto terá ainda modelado uma quarta e melhor raça e esta é a exceção à regra pois, neste caso, esta raça é melhor do que a anteriores se não mesmo a melhor de todas as raças.
É a chamada raça dos heróis também conhecida como “A Idade dos Heróis”. Eram habitantes de uma terra fértil e eram homens mais justos e melhores, elevados à categoria de semi-deuses, tal a categoria desta raça. Embora sejam uma raça guerreira mas como se batiam pela justiça Zeus vai recompensá-los levando-os para a “Ilha dos Bem-aventurados” longe dos homens e onde a terra fecunda lhes oferece frutos doces como o mel 3 vezes por ano. Acredito que Hesíodo quando fala da “Idade dos Heróis” se refira aos heróis da Guerra de Tróia que foi o último grande feito da Civilização Micénica em que os Aqueus (Idade do Bronze) derrotaram os Troianos. Mais tarde cairiam nas mãos dos Dórios que já pertenciam à Idade do Ferro e é no final deste período situado entre 1100 a.C. e 800 a.C. e já depois da invasão dos Dórios em que a Grécia está mergulhada num caos político, social e económico que aparece Hesíodo inserido na próxima raça.
A próxima raça, a de ferro, segue o padrão da desvalorização das raças situando-se abaixo da raça do bronze e dos heróis. Esta é a época de Hesíodo que chega a dizer “Quem me dera que eu não vivesse no meio dos homens da quinta raça, que morresse antes, ou vivesse depois.” Para Hesíodo seria preferível viver antes ou depois desta época (raça) porque e aqui Hesíodo entra num aspeto muito pessoal quando diz “… aos pais, logo que envelheçam, eles os desonrarão…”, querendo-se referir a seu irmão Perses que subornou os juízes.
É uma crítica muito dura à justiça que deveria ser para todos e incorruptível mas não o foi. É uma época de completa insubordinação, em que a amizade é um valor ultrapassado e o ajudar o outro não quer dizer nada nesta sociedade.
Dá-nos conta da pobreza e da falta de perspetivas para o futuro da Grécia em que o pior dos homens prevalece acima dos homens bons e que não é, ao contrário das outras raças, castigada pelos deuses e por isso não terá mais salvação.
O Mito das Cinco Idades faz parte de uma das obras de Hesíodo intitulada de Trabalhos e Dias(Ergas de Hesíodo). Para compreender melhor este mito e o seu autor é preciso assimilar os seguintes aspetos :
Hesíodo foi um poeta grego que viveu por volta de 800 a.C. e que foi o primeiro a apresentar dados biográficos. O seu pai veio da Ásia Menor (a maior parte deste território conhecido mais tarde como Anatólia, situa-se atualmente na Turquia mas também abrange parte da Arménia e do Curdistão). O “nosso” autor que ficou a viver na região da Beócia tinha um irmão mais velho de seu nome Perses.
O seu irmão desbaratou a fortuna do pai daí as desavenças com ele e o recurso à justiça em que Perses suborna os juízes (anciãos) e esta será uma das razões pela qual Hesíodo não queria viver nesta época.
Escreveu duas obras muito importantes Teogonia e Trabalhos e Dias as quais marcam o ressurgimento da Grécia a um nível literário superior.
Apresentou-se como pastor de ovelhas e é num desses dias de pastagem que lhe aparecem as musas e estas dizem-lhe que são portadoras de muitas falsidades mas também de muitas verdades. Poderá isto ser mais que uma crítica a Homero, o alegado compositor dos poemas homéricos ? As musas também fazem uma crítica aos pastores devido ao facto de eles viverem no seu mundo e não expandirem os horizontes com o que se passava além fronteiras e que era muito mais importante.
Segundo estudiosos não terá vivenciado sobre os assuntos que relatou a não ser a quinta raça mas tinha conhecimento do que havia acontecido anteriormente.
Hesíodo re-organizou o Panteão Grego que aparece nos Poemas Homéricos (ou alegadamente compostos por Homero) estabelecendo, pela primeira vez, as relações entre os deuses, amizades e ódios, parentesco, poderes, hierarquia e quem vivia no Olimpo pois nem todos os deuses lá habitavam, ou seja, deu-lhes uma biografia que mais não é que uma história de vida e tentou com as suas obras educar os cidadãos a serem mais justos, fazerem o mais acertado e como não deveriam agir para que tornassem melhores cidadãos.
Nuno Gonçalves Rodrigues (2012)