Tarentola borneensis (Gray)=Tarentola gigas Bocage, 1875
1845. Gray descreve Tarentola Borneensis a partir de quatro exemplares de Bornéu oferecidos pelo capitão Sir Edward Belcher. Não há relação nenhuma com Cabo Verde. Não há, nas secções Lacertidae, Scincidae e Gekkonidae do Catalogue de Gray, menção ao facto de Belcher ter estado em Cabo Verde, não há nenhum exemplar referido para Cabo Verde, este arquipélago prima pela ausência, no catálogo. O que é estranho, pois surge como excepção insular. Figura a Madeira, figuram as Canárias, figura a ilha de Ascensão, a de Fernando Pó, e várias espécies de Madagáscar foram oferecidas pelo próprio Gray, o que significa que as coligiu ele mesmo. Para ir a Madagáscar tinha de passar por Cabo Verde. Gray era um homem ligado ao mar, tinha o seu iate, presidiu à comissão de dragagem que foi pioneira da batimetria e biogeografia de profundidade. Dela saiu a célebre Forbe’s Azoic Theory, segundo a qual é preciso gozar a ciência ou tudo é uma seca. Divertiam-se imenso nas férias, a navegar por esses mares, décadas antes do Talisman, do Challenger e de outras celebridades oceanográficas. E só foi a Cabo Verde nos anos sessenta?
As espécies, no Catalogue, não estão arrumadas por nenhuma ordem racional. Supondo que haja uma ordem afectiva, então temos a Tarentola delalandii, a seguir a Tarentola americana e depois a Tarentola borneensis. Pode haver qualquer nexo biológico entre as três. O nexo Belcher, por exemplo, que ofereceu répteis de Bornéu e da Califórnia. Um cocktail genético das três o que daria? Só de osgas, dizia Loveridge, há umas cinquenta formas em Cabo Verde. A maior salganhada vai ser a das gigas, espere-se por Schleich e Joger. 1875. Bocage descreve Ascalabotes (=Tarentola) gigas como espécie exclusiva do ilhéu Raso.
1896. Bocage repete a descrição de 1875. Não comparei. Parece habitar exclusivamente o Ilheo Raso, onde foi descoberta em 1874 pelo nosso amigo o dr. Hopffer, a quem devemos todos os exemplares que existem no Museu de Lisboa. Compr. tot.: 236mm; c. corpor.: 163mm.
1902. Bocage nada de novo tem a dizer sobre a "Tarantola" gigas do Raso, isto apesar de Newton lhe ter mandado Tarentola gigas do Raso, dos Rombos e de S. Nicolau, mas é de crer que Bocage realmente se refira às peludas aranhas Tarantola e não às osgas borneenses de Gray.
1905. Sem quaisquer comentários, Boulenger refere Tarentola gigas Bocage para o ilhéu Raso, exemplares de Leonardo Fea. 1937. Angel refere-a para os ilhéus Branco e Raso e considera-a endémica.
1984. Joger relança Tarentola borneensis, com 5 subespécies:
1ª - Tarentola borneensis borneensis Gray, 1845, em cuja sinonímia caem T. delalandii gigas Loveridge, 1947 e T. gigas brancoensis Schleich, 1984 - ilhéu Branco.
2ª - Tarentola borneensis gigas Bocage, 1875, em cuja sinonímia cai T. gigas gigas de Bocage de Schleich, 1984 - Raso.
3ª - Tarentola borneensis protogigas Joger, 1984, em cuja sinonímia caem T. delalandii var. rudis Boulenger, 1906 (Fogo, Santiago) e T. rudis rudis - Schleich, 1984. Distrib.: Fogo, ilhéus Rombos, Brava. Esta Tarentola borneensis protogigas vai ser substituída no próximo folhetim de Joger por Tarentola rudis hartogi Joger, 1993, não só nos Rombos como na Brava e também no Fogo, logo se verá. Substituída porque a primeira deu-lhe qualquer badagaio de que Joger não revela a mortífera natureza, e entretanto a outra surgiu do nada. Não sei explicar melhor. Deve aliás haver aqui uma confusão e isto não devem ser osgas, sim os Kagados de Cardoso Júnior, a corda de vidro de Gray ou a centopeia de Lopes de Lima. Mas tudo bem, desde que sirva para provar o acerto da Forbe’s Azoic Theory.
4ª - Tarentola borneensis rudis Boulenger, 1906, em cuja sinonímia caem T. d. delalandii e T. rudis rudis - Santiago.
5ª - Tarentola borneensis maioensis Schleich, 1984, em cuja sinonímia caem T. delalandii rudis e T. rudis maioensis - Maio, Boavista. É claro que estas espécies atribuídas a Schleich não são de Schleich. Schleich o que inventou foi por exemplo a Tarentola rudis maioensis Schleich, 1984, de que Joger (1993) diz: In our specimens, dorsal bands are not "kaum wahrnehmbar" (Schleich 1987: 37). Also contrary to Schleich (l. c.), the distance between ear opening and eye is less than the distance between eye and snot tip in our specimens.
Pois sim. Destas 5 subespécies, em 1993 vão sobrar só duas. 1987. Schleich comprova Tarentola gigas para Branco e Raso. Quanto a Tarentola gigas gigas, só existe no Raso. No Branco o que há é Tarentola gigas brancoensis. Referindo-se a T. gigas gigas, diz Schleich: "A indicação de distribuição de Joger (1984: 100) não parece provada, provém provavelmente de Schleich e Wuttke", o que, trocado por miúdos, significa o seguinte: Schleich não se comprova a si mesmo, o que eu acho divinal, e mais ainda porque em Joger não há nenhuma T. gigas gigas, o que há é a Tarentola borneensis gigas, que Joger dá para o Raso e Schleich confirma para o Raso, mas o que Schleich pespega na sinonímia de T. g. gigas é com a T. borneensis borneensis de Gray de Joger, que a dá para o Branco. Isto é inenarrável. E pensar que foi Gray quem mandou estes bocagianos todos para as profundas do Érebo. Fizeste muito bem, que Allah te cubra de bênçãos. Esta bocagianada a que chamam herpetologia caboverdiana é uma formidável aplicação da Forbe’s Azoic Theory. Schleich passa a seguir para Tarentola gigas brancoensis do Branco, e escusado será dizer que é a bicha das Canárias a que Gray deu o nome de T. borneensis.
Da Tarentola borneensis borneensis escreve Schleich o seguinte: Joger contribui agora (1984) depois da minha experiência (Schleich 1984) de conseguir rever a sistemática das Tarentola de Cabo Verde, para uma maior confusão taxonómica e principalmente nomenclatural, tentando revalidar nomina oblita há muito tempo desaparecidos.
E Joger responde, a propósito de Tarentola gigas e Tarentola gigas gigas Bocage, 1875: Schleich referiu-se exclusivamente a material que ele próprio colectou, negligenciando examinar material de outras colecções.
1991. Bauer & Günther referem a existência, no Museu de Berlin, de 1 fêmea (lectotipo), ilhéu Raso, col. Hopffer, of. Bocage, informando que Boulenger, em 1885, listara um espécime oferecido por Bocage mas não o considerara sintipo. 1993. Das sobras indonésias, Joger menciona T. borneensis gigas para o Raso. Não tem novos exemplares de Bornéu, portanto plagia-se do transacto, recitando T. borneensis borneensis para o Branco. Há três espécies borneensis a que deu o badagaio, Schleich pô-las na sinonímia de não me lembro que rudis=delalandii ou assim. Entretanto, a substituir a defunta T. borneensis protogigas Joger, 1984 nasceu, esplêndida e fabulosa, a T. rudis hartogi Joger, 1993. Isto no ilhéu Cima dos Rombos, na Brava e assim.
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