DELO BELO    

POEMAS DA GUINÉ-BISSAU

Ah! Guiné, Guiné-Bissau

às vezes escolho plantar palavras
para impedir que a amargura
de sempre ver-te a sangrar
sob lágrimas que tolhem-te
decapite o eterno meu amor por ti

às vezes prefiro escrever
ilustrar uma nova e limpa terra
arquitetar um hílare mundo
aos netos que herdarão esse vazio
que até hoje gatinha no lamaçal

ah! Guiné, Guiné-Bissau
teu passado ainda está presente
compondo sublime minha agonia
incitando intrínseco minha morte

tua morte – Guiné, pátria querida

minhas orações ainda chovem
fé e esperança nas mãos divinas
ainda acredito na tua virada, Guiné
meu lacrimejar dimana como um rio
não para, enquanto exalas sofrimento

cinjo-me no amanhã que ainda chegará
tecendo no âmago dos meus
a esperança do raiar dum novo sol
o sol da tua mudança – ah! Guiné-Bissau
és-me dor e lamento - poesia e alegria

Até quando, minha Guiné?

continuarás sem rumo nem Senhor
comboiarás teu caminho sem destino
viandarás teu trajeto sem gravidez
sem sonhos e nem mudança
até quando, minha Guiné?

dormirás enquanto o dilúvio sanguíneo
segue fenecendo tua desnutrida face
persistirás em ser minha execrável aflição
desfile de catanadas e saibros de via-crúcis
até quando, minha Guiné?

refutarás o rumo certo desta vida
o ressuscitado com poder de salvar-te
contentar-te-ás com a mudez e ceguez

sempre calar e nada ver para não desviver
até quando, minha Guiné?

a esperança é a única que resta viva
quando um humano entrega-se à morte
mas abonar-me-ás lágrimas apenas
lamúrias e lamentações face a armas
até quando, minha Guiné?

a pátria é circunspeta de pessoas e povos
amar a nação é cingir no peito seu povo
mas seguirás gemendo sob opressão
até quando, mínha Guiné?
te kal dia, nha Deus?

Enquanto viver, acreditar. Eis a virtude!

Se ainda a chuva nos rega e visita
Se ainda correm as águas dos corubais
Se ainda temos vozes ou tivemos ancestrais
Ainda acreditamos na vida e no maior Artista


Se ainda cantamos nossos gumbés
Se ainda nossos sikós e tambores uivam
E se ainda defronte a nós os dragões se curvam
Ainda mudaremos os kuntangús e os kanapés


Se vivo Cabral ainda continua em nossas almas
Se viva Rainha Pampa ainda ecoa nossas vozes
Se ainda somos guineenses e não entes ferozes
Cantaremos sempre victórias pelas famas


Se ainda Guiné continua Bissau Na N’dó
Se ainda existem sonhos a serem conquistados
E se ainda existem caminhos a serem trilhados
Sempre acreditaremos em Deus não num kumpó


Se mesmo a gatinhar ainda podemos fôlegar
Se mesmo roucos ainda temos garras e ruídos
E enquanto em nós o sangue guigui continua a flutuar
Havemos de sempre crer que o dia que esconde nos amanhãs
Será melhor e que teremos novo gritar das puras lãs.

Um dia terei leitores após flores

Sempre os salmos meus cantarão
E em versos meus desfilarão,
Dos homens os mais formosos.
Dos homens os mais fracos.


Do mundo as mais mudas terras.
Do mundo as mães mais desprezadas,
Do mundo as crianças mais órfãs.


Meus filhos cantarão os meus poemas
Como as serenatas di katchu-caleron
Em meus pensares e dizeres
 

E verão a chegada da tão esperada aurora
Que virá raiar o fogo da mudança
Na terra amada, mas pisada e adormecida.


Mergulharão nas águas dos meus rios
Como golfinhos nos seus desfiles.
E dos meus dedos encher-se-ão de amor
E esperança e coragem e verdade.
Relembrarão de mim nos meus dias e nos meus Maios
Dos meus sonhos e esperanças poemadas


Minhas vozes serão alicerces no desenlace dessa vida
Sei que um dia terei leitores após as flores.
Mas alegres meus salmos cantarão em vozes altas
Os da minha terra e os do meu mundo.

 

Delo Belo
Pernambuco, Brasil/ 2009

 

Delo Belo é estudante guineense no Brasil.
http://delo-belo.blogspot.com/

http://www.didinho.org/

http://senegambia.blogspot.com/