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O arrozal vai ficando para trás. A estrada, agora, é lisa e direita, com
tamareiras bravas e cibes aprumados como sentinelas à porta da floresta.
O perfume doce das acácias espalha na atmosfera
pesada o eterno sortilégio dos trópicos.
Papaeiras coroadas de papaias, bananeiras de cachos
maduros, calabaceiras de troncos enormes e raízes minúsculas erguem
majestosamente para Deus as suas copas sem fim. No coração da floresta,
a graça de Maria Luísa é como a duma flor perdida em que os olhos
repousam, exaustos de subir tanto. Dez, quinze, vinte gazelas descansam
na lala em atitudes graciosas de convalescentes. Uma fritambá preciosa
destaca-se do fundo verde do arrozal com a graça dum desenho vivo.
Colibris, duma pequenez inverosímil, tingem de cores risonhas a paisagem
brutal. Foliotocolos de penugem verde e metálica, fazem pensar em
esmeraldas vivas. E os grandes pavões dos trópicos, de papo azul e popa
castanha, abrem lentamente, sob os leques das palmeiras, os leques azuis
e vermelhos das suas asas. Um perfume intenso a flores e a frutos
espalha no ar uma frescura sumarenta. A sombra dos poilões e das
palmeiras, multiplicam-se os frutos; há bananas carnudas, pintadas de
castanho; cajus amarelos com nódoas vermelhas; ananases sumarentos de
perfume selvagem; goiabas de sabor amargo; mangas a escorrer sumo;
manípulos, implacáveis para os Europeus; manjanjas vermelhas que tombam
da árvore logo que amadurecem; e além destes, a variedade infinita dos
que não têm nome, dos que os Brancos ignoram, dos que têm uma forma
bizarra e um sabor estranho, o sabor da própria floresta. O sol, através
das árvores, chega à terra empalidecido. Dir-se-ia que todo o seu oiro
ficou na pele dos cajus, nos papos dos foliotocolos e nas corolas da
mancarra.
O automóvel segue, segue ao longo dum rio de águas
turvas, onde os crocodilos esperam as pirogas instáveis que balouçam
sobre a água, e às vezes sobre a morte, o seu carregamento vivo.
Hipopótamos pesados repousam nas margens, como troncos ao sol, e
pequenas lontras esquivas descansam à sua sombra. Macacos, macacos de
todos os feitios, de todos os tamanhos, saltam de ramo para ramo,
formando cachos, meadas, colónias, aldeias, no sétimo céu das árvores
mais altas.
Uma frescura húmida, perigosa, perversa... Formigas
enormes, pequenos animais rasteiros, toda a fauna subterrânea da
floresta vive a sua vida sem brilho aos pés da grande família vegetal
que se multiplica sobre o solo demasiado rico. Os leopardos e as onças,
escondidos nas tocas, esperam o crepúsculo equívoco, a meia sombra
propícia, para estenderem, sobre o corpo submisso da floresta, as suas
garras poderosas de eternos senhores feudais.
E sobre as feras, sobre os frutos e sobre os rios, o
jardim suspenso das borboletas.
Chão de Fulas e Mandingas. Bafatá. A casa europeia da
Administração, meia dúzia de pequenos edifícios banais, e mais além,
onde acaba a civilização, o deslumbramento de tudo o que se ignora...
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