Artur Augusto da Silva

Pequena viagem através de África

Conferência pronunciada em 1963 no salão nobre da Associação Comercial da Guiné, no 46º aniversário da sua fundação.

OBSERVAÇÃO

Devo ao homem da rua, ao homem da rua que eu sou, uma explicação:

Os assuntos africanos são mal conhecidos em Portugal, o que não impede que cada português se julgue suficientemente esclarecido e tome partido, resolutamente, nos problemas que diariamente se nos levantam.

Mostrar a complexidade do problema e chamar para ele a atenção de todos, é dever indeclinável daqueles que procuram viver em paz com a sua consciência e na vida só buscam a verdade.

Quem, para vos falar acerca de África, está perante Vossas Excelências é, no saboroso dizer de um poeta, «o vulto do meu corpo, mas eu não».

Que são os homens, mais do que a carne de outra carne, o sangue de outro sangue, vindos das gerações que nos precederam e que se projectarão nas gerações que moldarmos?

Meus Pais e Avós, desde que se iniciou a empresa magnífica dos oceanos e das conquistas, logo se estabeleceram na ilha da Madeira para, depois, descerem ao longo da costa africana fixando-se em Cabo Verde, nesta Guiné, em Angola e Moçambique. E de tal forma que hoje, quando olho para uma carta do mundo, posso assinalar a presença de parentes em todas as regiões habitadas do globo.

Parentes que, periodicamente, cumprindo um ritual secular, vão até à pequena casa lusitana para retemperar o ânimo e logo voltarem ao seu labor.

Assim, menino era eu, já ouvia as histórias daqueles parentes que tinham andado mundo e visto as suas maravilhas. E posso dizer, sem exagero, que, vivendo em Lisboa, mais familiares eram para mim as regiões de Sena e Tete, São Paulo, Nova York mesmo, do que o Porto ou Coimbra.

E quando, vai para quarenta anos, cheguei à Guiné pela primeira vez, tudo me era familiar e nada me surpreendeu.

Há mais de quarenta anos que ando pelos trópicos e há mais de vinte e cinco anos que me fixei na Guiné. Percorri toda a África desde a Argélia à África do Sul, desde o Egipto a Marrocos, utilizando aviões, comboios, vapores, carros e canoas. Dormi nesses maravilhosos hotéis que o engenho humano criou e dormi também nas mais modestas palhotas das mais modestas tabancas africanas.

Bebi aquela água barrenta, de aspecto leitoso, que se colhe nos poços das povoações perdidos no mato; atravessei rios e pântanos sob um calor escaldante; torneei florestas densas e subi montanhas abruptas; percorri as areias imensas dos desertos africanos; tiritei de frio e abrasei-me e longamente conversei com Tcherno Bokar, a quem Teodoro Monod, com aquele sentido de penetração das coisas africanas que só ele possui, chamou «um homem de Deus».

Falei com chefes políticos e religiosos e, se já estava preparado para receber as mais diversas ideias pelo sentido universalista da minha educação, mais se desenvolveu em mim e radicou a convicção de que para tudo compreendermos, tudo devemos amar.

Procurei, através do povo humilde e anónimo, estudar as estruturas em que assenta a espinha dorsal de África, partindo do princípio que me ensinou Tcherno Bokar de que «aquele que só ama os que pensam como ele não ama os outros: ama-se a si próprio. E aquele que ama os que não pensem como ele, ama a Deus, que é pai de todos».

A grande, a esmagadora maioria dos europeus, tem uma visão falsa e deformada da África, porque só nos últimos cinquenta anos se progrediu no conhecimento deste continente e dos seus povos.

África Misteriosa, África Portentosa, Terra Incógnita, eis três títulos de livros aparecidos neste século e que por si mostram o desconhecimento que atinge até as chamadas elites.

Nós outros que por cá andamos, aparecemos à imaginação dessa gente como pessoas semi-lendárias, em luta constante contra as feras, os povos, os mosquitos, as inclemências da selva e do clima. E não posso esquecer que ainda há poucos anos circulavam na então África Ocidental Francesa, umas notas de mil francos onde se via em atitude de herói cinematográfico, um europeu — presumivelmente um francês — de largo chapelão colonial, camisa folgada, calções curtos e umas imponentes botas altas empunhando uma arma e, arrogantemente, pisando uma leão morto.

Podemos dizer: a verdade da imagem correspondia ao exíguo valor da nota.
O artista que a desenhou e os graves senhores do Conselho de Administração do Banco que aprovaram, julgaram por certo ter encontrado a imagem verdadeira da vida europeia nos trópicos.

Pelo conhecimento que tenho de África, posso afirmar, sem receio de ser desmentido, que nunca nenhum verdadeiro africanista calçou tão incríveis botas, que nada protegem e só dificultam o andar no mato.

Mas é aquela a imagem que persiste e quando nós outros, em conversas com amigos, dizemos da simplicidade da nossa vida em África, da comunidade fraterna que se estabelece entre europeus e africanos, da vida dura sim, mas cheia de poesia, ninguém nos acredita e até sucede que em África, nas cidades, aqueles europeus adventícios a que os portugueses do século XVI chamavam «reinois», também não acreditam, porque transplantaram para cá a mentalidade e os hábitos da Europa.

É certo que hoje, em África, soprou um vento de insânia mas, se bem olharmos, veremos que quem provocou esse vento são aqueles que desconhecem a realidade africana e não a querem compreender.

A África aí está na soberba imponência das suas matas frondosas, dos seus rios majestosos, das suas lalas verdejantes, dos seus desertos e montanhas, dos seus povos admiráveis mas, para bem aprendermos a importância das matas, a majestade dos rios, o admirável dos seus povos, é preciso despirmos vinte séculos de preconceitos, e de coração aberto e puro nos embrenharmos por esta terra imensa, deleitarmos a vista no mar sempre verde que é a terra, parar na contemplação de todas as cambiantes que vão do verde garrafa até ao verde quase branco, ver como as próprias árvores, no mais ínvio do matagal, crescem direitas, hirtas, em busca da luz e da liberdade; é preciso percorrer os rios, ao romper da alva, quando o cinzento do dia vence a negridão da noite e as garças, no seu voo gracioso, cortam os ares em bandos; percorrer as margens desses rios e surpreender os antílopes que aí se vão dessedentar.

É preciso ainda, e essa é uma das chaves que abre os segredos do continente africano, conhecer os seus povos, irmanar-se com eles, sofrer e alegrar-se com os seus sofrimentos ou as suas alegrias, compreender a sua psicologia, penetrar a razão profunda da orgânica sócio-económica, amar as crianças e venerar os velhos.

É preciso, sobretudo, encher o coração de amor, porque só o amor derruba montanhas, porque, como disse Petrarca: é ele «che muove il sol e l’altre stelle».

É talvez esta a qualidade que um africano mais aprecia e admira.

Compreenda-se: refiro-me não ao amor físico, mas ao que encontrou em S. Francisco de Assis a sua forma mais alta e perfeita.

Só agora reparo que, com aquela psicologia fácil de que nós outros, ocidentais, somos mestres, estava generalizando a toda a África as observações colhidas em lugares restritos deste continente e, como me ensinaram os felupes: «a lebre e o burro têm ambos orelhas compridas, mas a lebre não é irmã do burro».

Mesmo onde encontrarmos semelhanças, convém não precipitar as generalizações.

Este defeito é particularmente sensível naqueles que, ao fim de um ano de África, peroram e dissertam, aliás muito doutamente, sobre África e os africanos.

Vem a propósito a citação de um provérbio felupe que diz: «a onça que nasceu na entrada do tempo seco, quando caem as primeiras chuvas, logo comenta: nunca vi chover tanto».

É porque citei, quase de seguida, dois provérbios, que devo dizer que os povos africanos têm deles uma tal riqueza, não só em quantidade com em profundidade de conceitos, que espanta.

E compreende-se o fenómeno: sem literatura escrita e com um sentido de crítica que transparece nos mais pequenos pormenores da vida, os povos africanos memorizam em pequenas frases a sua experiência milenária. Experiência que é transmitida em adágios, anexins, fábulas e poesias.

Este fenómeno, que foi verificado e apontado por todos quantos se têm dado ao trabalho apaixonante do estudo da África, foi posto em relevo no notável ensaio sobre a filosofia Bantu, do Pe. Tempels.

É absolutamente indispensável, para se conhecer o «homem africano» na sua verdadeira personalidade, contactar com ele profundamente, vê-lo recolhendo frutos, caçando ou lavrando os campos, na floresta ou na planície aberta, assistir às suas cerimonias religiosas ou profanas, conversar ao cair da tarde, sentados no «bentem» debaixo de uma árvore frondosa onde as pessoas graves da povoação se juntam, discutindo os assuntos de interesse «nessas intermináveis palavras» que são como que o coração dos africanos.

ldentificarmo-nos com eles, vivermos os seus problemas como se fossem nossos e depois de julgarmos ter conseguido uma identificação completa, lembrar o provérbio africano que diz que «um tronco de árvore pode estar no rio durante muitos anos, mas não se torna crocodilo».

Há quem pense que a cultura da chamada África Negra viveu até há poucos anos, sem qualquer ligação com as outras culturas: oriental, mediterrânica e europeia.

Os últimos trabalhos de investigadores têm provado que assim não é. Embora o caminho para um esclarecimento total dos contactos culturais seja ainda longo, a verdade é que ele vai sendo percorrido metódica e pacientemente pelos investigadores, por esses homens admiráveis que, devotados à ciência como o meu amigo e sábio Almirante Teixeira da Mota tudo devem a esta Africa maravilhosa: juventude, saúde e devotada inteligência.

O problema dos contactos culturais da chamada África Negra coloca-nos em face de um número infinito de interrogações e lacunas que só podem obter resposta ou ser preenchidas com hipóteses, enquanto não for possível encontrar elementos que habilitem o estudioso a formular uma teoria com base em dados concretos.

O estudo da África, nos seus múltiplos aspectos, só muito modernamente se iniciou e mesmo assim tem sido fragmentário, parcial e, na grande maioria dos casos, levado a cabo por curiosos dos problemas africanos e não por indivíduos devidamente habilitados.

Não se fizeram pesquisas sistemáticas, mas os elementos recolhidos pressagiam uma riqueza que deve ultrapassar as esperanças mais optimistas, e é bem provável que num futuro próximo já seja possível delinear-se uma teoria com alicerces na terra.

No estado actual dos conhecimentos históricos, podem assinalar-se duas importantes vias de comunicação da África Negra com o mundo exterior: a primeira em tempo, verificou-se ao longo da costa oriental da África onde chegou a florescer um comércio importante com a Arábia e a Índia e, através destas duas regiões, com o restante mundo.

Zendj-Bar (em tradução !iteral «costa dos escravos») chamavam os árabes àquela porção da costa africana que fica ao sul da actual Somália e correspondente sertão. O intenso comércio aí praticado colocava os povos dessa região em contacto estreito com povos da Ásia e respectiva civilização. Escavações levadas a cabo na Africa Oriental revelaram a presença de louça chinesa e indiana a par de contarias de proveniência asiática.

As lendárias minas de ouro da rainha de Sabá, ou de fenícios, que encheram a imaginação dos europeus que primeiro tiveram conhecimento das minas do Monomotapa e que as mais recentes investigações demonstraram ser puramente africanas, matando assim mais uma lenda, alimentando com o ouro delas extraído aquele intenso comércio.

O activo tráfico que os árabes mantiveram com as regiões costeiras da Africa Oriental foi, já na época proto-histórica, o primeiro grande contacto que os africanos tiveram com o exterior.

Mas, se exceptuarmos as populações africanas da orla do mar índico com quem os árabes contactavam profundamente, populações que se foram gradualmente muçulmanizando, os outros povos do interior só conheciam o aspecto material da civilização estrangeira. Compravam panos e outros tecidos, contarias, armas e essências e entregavam, como pagamento, ouro, marfim e escravos.

O aumento de comércio teve como consequência a criação de um império — o de Monomotapa — com características estranhas, entre as quais avultava a existência de uma aristocracia industrial — a dos exploradores das minas, uma plebe que vivia dos produtos da terra e uma multidão infinita de escravos que trabalhava nas minas por conta da aristocracia industrial.

Lentamente, com a lentidão própria destes fenómenos, foi-se verificando uma penetração de usos e costumes muçulmanos, a religião vai conquistando novos adeptos ou influenciando as religiões ancestrais; de qualquer forma fazendo nascer uma civilização diferente, estruturando-a em novas bases.

Compreenda-se: a transformação opera-se em virtude da modificação da base económica. Inicialmente, as sociedades este-africanas viviam em sistemas económicos fechados (de suficiência familiar ou de suficiência tribal) mas, com o desenvolvimento da exploração mineira, do tráfico de escravos e do comércio de marfim, produz-se uma modificação no sistema anterior e cresce e desenvolve-se uma civilização de tipo capitalista primário. Essa transformação é acompanhada de uma modificação da estrutura social.

Os muçulmanos, ao mesmo tempo que permutam os artigos do seu comércio, colocam os afro-negros em presença de uma religião que traz o prestígio de ser praticada pelos povos que lhes vendiam os artigos por eles cobiçados.

Contrariamente ao que depois sucedeu com o cristianismo, o Islão podia adaptar-se perfeitamente às religiões africanas porque não repudiava, antes fortalecia, um dos pilares da sociedade africana primitiva: a poligamia e uma forte estrutura familiar. E mais: os muçulmanos sempre se mostraram tolerantes para com religiões dos outros povos, nunca repudiando as sobrevivências dessas religiões nas práticas rituais dos recém-convertidos. Por isso, o islamismo africano é mais uma simbiose de religiões, do que uma religião.

E porque o antropomorfismo e o zoomorfismo estão completamente banidos de islamismo, todos os povos que o adoptaram deixaram de representar figuras de animais, o que teve com consequência o declinio das artes figurativas e o seu desaparecimento.

Os contactos culturais na África Oriental modificaram as estruturas tradicionais e produziram uma integração desses povos africanos do fenómeno religioso islâmico e assim é que ainda hoje e sobretudo graças às facilidades de comunicação se assiste a um movimento avassalador no sentido da África Negra.

Bem entendido: o fenómeno tem a sua raiz profunda numa mudança de estrutura económica e não, como pode aparecer ao observador desatento, num contágio superficial e meramente cultural.

Acelerado o desenvolvimento económico dos povos negros, estes vêem-se a braços com o problema da sua organização socio-económica, pois que as acanhadas formas que satisfizeram a época da subsistência familiar já não correspondem às necessidades da vida e, então, procuram apoiar-se numa forma de transição que representa, a seu ver, um progresso que corresponde às novas condições de vida.

Os contactos culturais vão progressivamente aumentando, e de tal sorte que deles nasce uma nova sociedade, com diferentes padrões de moral, novas estruturas e novos horizontes.

O que sucedeu na África Oriental, repetiu-se de um modo diverso, mas não menos profundo, no ocidente africano.

Assim, desde a mais remota antiguidade os povos mediterrânicos estiveram em contacto com a África. Lembremo-nos que os célebres elefantes com que Aníbal aterrorizou a Espanha e a Itália, eram de proveniência oeste africana e recordemos ainda que alguns séculos antes de Cristo já os cartagineses procuraram estabelecer contactos marítimos com os povos oeste africanos.

Conforme é do conhecimento geral, cerca de mil anos antes de Cristo, floresceu na parte ocidental do deserto do Sara uma civilização brilhante, em muitos pontos semelhantes à que se desenvolveu no sul da França e na Península Hispânica.

Atestam a presença dessa civilização, as admiráveis pinturas rupestres do Hogar, tão semelhantes pela técnica às de Altamira que já não é lícito aventar outras hipóteses que não sejam a de uma filiação numa civilização comum.

O investigador francês Vallois exprime-se do seguinte modo: «a arte Bosquimane assemelha-se extraordinariamente à das nossas cavernas. Como em França e na Espanha, a representação de animais é de uma qualidade superior às representações humanas. As duas regiões são ligadas por uma continuidade de pinturas rupestres desde a França até ao Cabo, passando pela Espanha, norte de Africa, Sudão, Tchad e Transval. Esta ligação leva-nos a considerar o continente africano um centro de importantes migrações que tiveram um papel relevante no povoamento da Europa meridional».

Devemo-nos recordar que há mais de quatro mil anos o actual deserto de Sara era uma região abundante de águas e vegetações e, logo, um local propício para a vida humana.

Assim, desde a mais remota antiguidade os povos mediterrânicos estiveram em contacto com a Africa, e esta própria designação que hoje damos ao continente, foi-nos legada pelos cartagineses que a si se chamavam Afri. Assim que os romanos chamavam a Cartago, África, pondo esta designação à Numídia e à Mauritânia que eram adjacentes.

Os viajantes que pelo ocidente africano jornadearam a partir do século Xl, desde El Bekri, que nos deixou uma descrição do célebre império do Gana, onde o ouro era usado em profusão, não só pelo soberano como pelos cortesãos e até pelo povo miúdo, passando por lbn-Batuta, que no século XIV faz um relato colorido do império de Mali, ou dos Malinkes ou dos Mandingas, até ao português Álvares de Almada que com raro espírito de observação descreve os povos da costa ocidental até ao Cabo das Palmas, todos são unânimes em pôr em relevo o estado adiantado de civilização em que viviam estes povos.

Refere lbn-Batuta que o imperador Moussa, que partiu em peregrinação a Meca em 1324, levou com ele tanta riqueza, que o curso de ouro baixou no Egipto, em resultado da abundância daquele metal.

Foram viajantes árabes quem levou, em primeira-mão, aos portugueses de Ceuta, a notícia de uma região do Sul onde havia ouro, marfim, almíscar, madeiras preciosas e plumagens vistosas.

Foram eles que acenderam em nós aquela chama de audácia e aventura, aquela ânsia incontida de vastos mares; foram eles quem, impensadamente nos abriu as portas do pequeno mundo europeu, o que nos levou nas frágeis naus e caravelas de então a enfrentar o oceano povoado de monstros, a solidão das águas, a tormenta da sede e a glória de um destino sem par.

Há mais de quinhentos anos que as primeiras caravelas portuguesas atingiram aquela região que os árabes chamavam «bilad-essudan» ou literalmente, país dos negros.

E desde aquela hora primeira em que destemidos marinheiros aqui aportaram, nunca mais cessou o vai-e-vem contínuo de portugueses em África, das naus e caravelas sulcando o oceano e, por tal forma, que lhe podemos chamar «o mar da nossa família».

Os contactos culturais foram grandes, como profunda foi a influência exercida em África pelos portugueses. E um facto, aparentemente negligenciado, nô-lo atesta: desde São Luís do Senegal, até à Serra Leoa, quem quiser jornadear sem cuidados, aprenda crioulo, pois de nada lhe valerá o francês ou o inglês. Um exemplo posso citar; percorrendo eu o sul da actual República da Guiné, tive curiosidade de visitar uma povoação da Serra Leoa onde, mensalmente, se realizava uma grande feira de ouro e diamantes. Chegando à povoação, poucas pessoas entendiam o francês ou o inglês e foi em crioulo que nos entendemos todos. E, facto curioso, nenhum dos africanos tinha a menor ideia de que estava falando urna língua filha do português.

Aquela «experiência romântica nos trópicos» a que Baltazar Lopes dedicou um estudo profundo que nunca será demais louvar com gratidão, estava comprovada, e dera os seus frutos.

Para melhor compreendermos a África, torna-se necessário descrever, embora sumariamente, as diversas formas de organização social que a tradição ainda mantém para, em seguida, lançarmos um olhar ao que se está tentando levar a cabo.

O primeiro sistema social, aquele que mais fere e compreensão dos ocidentais, é a anarquia que vigora nalguns povos africanos.

Tomemos, por exemplo, os balantas. A sua organização social corresponde à definição etimológica de anarquia: ausência de governo.

O sistema vigora em todos os agregados africanos de pequenas dimensões — agrupamentos sociais lhes chamaríamos nós — tenham eles por base a família, a religião ou associações de carácter defensivo-ofensivo, como as classes de idade.

O primado das condições materiais é o fulcro da organização anárquica: não existe, nem é necessária, uma autoridade nem força, porque as disputas são reduzidas ao mínimo pela aceitação tácita dos costumes imemoriais.

A desobediência tem como sanção um elemento moral da mais alta transcendência: o desprezo da comunidade. O homem que as sofre, na maioria dos casos, só no suicídio encontra uma fuga para o terrível isolamento em que passa a viver.

Por vezes, pode juntar-se ao desprezo da comunidade uma outra sanção moral, de fundo religioso: a doença e a morte provocadas pelos espíritos dos antepassados que velam pela boa ordem do povo.

Só em caso de extraordinária gravidade é que a colectividade toma uma deliberação extrema: o banimento daquele que infringiu o costume instituído pelos antepassados.

O parentesco ou a ligação em classes de idade é o vinculo que une os homens.

E as próprias lutas dentro da tribo, mais se assemelham a competições desportivas do que a guerras, porque nunca ultrapassam o aspecto desportivo. Veja-se como entre os felupes, por exemplo, quando duas tabancas entram em guerra, logo surge outra tabanca que vai apreciar a luta e não deixa que esta atinja grande crueldade. Quando os árbitros vêm que a contenda toma foros de crueldade, logo intervêm e apaziguam os beligerantes.

Este sistema anárquico não vive, como pretendiam os teorizadores europeus do século passado, de um individualismo sublimado, mas de um comunitarismo onde o indivíduo não existe.

Entre estes grupos anárquicos, não existe nenhum chefe — os balantas e os felupes, por exemplo, não os têm — e o único comando ou regra de vida é o costume legados pelos antepassados.

Poder-me-ão dizer que entre os felupes existe um chefe «o Aiu». Mais uma observação precipitada daqueles que querem generalizar as nossas instituições a todos os povos.

O Aiu é um chefe que não comanda, nem é obedecido. Limita-se a revelar o costume. Mas porque o costume tem base mística, o Aiu é também o grande revelador.

O poder das crenças religiosas, uma liberdade ampla, uma vida comunitária sólida e uma igualdade de fortuna, mantêm a paz social e a felicidade do povo.

Entre os felupes, há uma palavra comum para designar LIBERDADE, PAZ, FELICIDADE: «kasumeie».

Como acontecia na Roma antiga, tudo o que perturbe a ordem, é considerado um sacrilégio. E sacrilégios são a ambição, a riqueza, a vaidade...

O regime de regulados é outra forma de organização tradicional africana, ainda em vigor, e floresce normalmente nas regiões de estepe ou de savana.

Aí, a necessidade da defesa num ambiente aberto às razias ou algaras, obrigou as famílias a reunirem-se em volta de um chefe simultaneamente político e religioso.

Aliás o binómio temporal-sacral das nossas sociedades é completamente desconhecido em Africa. Quem detêm o poder temporal, guarda também o poder religioso.

Por vezes, esta poeira de pequenos regulados aglutina-se e surgem os impérios que a história africana regista: do Gana, do Mali, dos Zulus, etc. etc...

As dificuldades da comunicação cedo vêm quebrar a unidade e de novo se volta ao sistema dos regulados.

Quem conhece a história da Europa medieval, facilmente compreenderá este fenómeno.

Para que se possa fazer uma ideia aproximada de como vivem os africanos, em sistema tribal, tomaremos por exemplo um homem e segui-lo-emos desde o nascimento até a morte. Com variantes mais ou menos acentuadas, conforme a tribo, é a seguinte a sua história.

Nasceu a criança: torna-se necessário afastar do seu caminho os espíritos maus e evitar que eles a venham buscar, agarrando-a pelos cabelos. A primeira cerimónia que se realiza é a do corte dos cabelos. Os maometanos costumam rapar quase toda a cabeça, deixando uma mecha pequena pela qual Alá possa agarrar o recém-nascido e levá-lo para o céu, na hipótese de uma doença fatal.

Até aos dois anos e meio, três anos, as crianças são amamentadas pelas mães, pois a dificuldade de encontrar alimentação adequada obriga a prolongar o período de lactação. Até esse período a criança vive quase todo o tempo escarranchada nas costas maternas segura por um pano amarrado na frente. Aí dorme e aí é amamentada, pois as mães, repuxando os seios, passam-nos por baixo das axilas, de forma a atingir a boca da criança. Só a noite quando a mãe vai dormir, é que a tira da posição em que estava, para a deitar a seu lado.

Com a criança escarranchada, a mãe cozinha, lava a roupa, tece, lavra os campos, colhe os frutos, dança, caminha longas jornadas, come e conversa. Cerca dos dois anos, já a criança começa comendo do que os adultos comem: arroz ou milho, inhame, batata-doce, frutos silvestres, amendoim torrado ou pilado, folhas de certas árvores, peixe verde ou seco, carne e leite azedo, acompanhado de óleo de palma ou outro qualquer molho.

A comida é mal preparada e demasiadamente indigesta para estômagos fracos: a criança adoece e, então, experimentam-se as mezinhas dadas pelo curandeiro ou as que a prática aconselha. Se piora, intervém o feiticeiro com os seus sortilégios. A mortalidade infantil é enorme, mas a nossa criança escapou. Passou o primeiro grau de selecção e já oferece certas garantias de vitalidade. Cedo a criança começa a embrenhar-se no mato com os seus ccmpanheiros, a subir às árvores e a ajudar os pais na lavoura ou na guarda do gado.

Até à circuncisão é considerado «menino»; não conversa com os homens nem pode casar-se ou ter relações sexuais. Depois dessa cerimónia já se integra no grupo das pessoas sérias. Se é balanta, por exemplo, deixa de furtar.

À tarde, nas horas de maior calor, costumam reunir-se as pessoas de respeito à sombra de uma grande árvore, a maior árvore da povoação ou suas imediações; aí conversam sobre todos os assuntos: colheitas, chuvas, gados, casamentos, notícias palpitantes, contribuições, serviços nas estradas, etc, etc... Só depois de o nosso homem ter ido à circuncisão pode tomar parte nessas conversas. Está na idade de procurar ganhar dinheiro suficiente para se casar. Ou a família o ajuda, se tem posses e o pai vê que pode dispensar aquele trabalhador, ou ele terá de ir ganhar a vida em qualquer ofício.

Casado, constrói uma casa, sendo agora raro que vá viver para casa do pai. Realizado o casamento, temos o nosso homem armado em chefe de família, não completamente independente porque tem para com o pai obrigações que se prolongam até a morte deste.

Cultiva o campo para sua subsistência e para vender os produtos. Compra gado: primeiro caprino e suíno, depois vacum. Cria galinhas ou patos para comer mas, mais frequentemente, para vender.

Vai envelhecendo e, com o avançar da idade, recebe maiores provas de respeito e consideração por parte de todos. Envelheceu; é um «homem grande», de autoridade e conselho, ouvido com respeito em todos os assuntos que se prendem com a tribo ou com a sua tabanca. Rodeado de filhos e mulheres, tem agora muito gado e algum dinheiro metido numa lata ou garrafão, para evitar a destruição pelos bichos. Porém, um dia, adoece o nosso homem: são convocados os feiticeiros e os curandeiros (normalmente estas duas profissões liberais andam associadas) e estes decretam: está velho, vai morrer. São chamados os parentes, os filhos que vivem longe e, rodeado por todos, morre como qualquer mortal. Inicia-se a cerimónia do choro que se prolonga por muitos dias, numa orgia infernal. Abatem-se dezenas e às vezes centenas de cabeças de gado das manadas do defunto. Os não maometanos bebem quantidades enormes de vinho ou aguardente; o celeiro do defunto, onde está arrecadado o arroz ou o milho, é esvaziado para alimentar centenas de bocas. Dança-se e canta-se e ninguém descansa um minuto sequer enquanto o chôro decorre. O nosso homem baixou à terra; puseram-lhe pedras ou paus em cima. Cobriram-no de terra, enquanto o seu espírito se libertou de corpo, aquele espírito que eles vêm em sonhos e os aconselha ou repreende, os protege ou persegue.

Viveu!!

Vimos, de relance, a África milenária, aquela que se nos afigura imóvel nos seus princípios e nos seus objectivos, aquele continente que até há alguns anos parecia adormecido num quietismo ancestral.

Dominada por uma economia de suficiência familiar, esta África foi tocada pela mão do tecnicismo que tudo revolve e transforma.

E aqueles povos que eram cegamente comandados por uma economia quase autárquica, viram-se subitamente empurrados para uma nova organização que veio quebrar os laços tradicionais.

O homem isolado, em África, nada era; assemelhava-se a um grão de areia impelido pelo vento, sem destino e sem vontade.

Só a estrutura orgânica, da família, da tabanca, do regulado, das sociedades secretas ou dos grupos de idades, dava personalidade ao africano e lhe permitia sobreviver num ambiente em que a hostilidade dos elementos o espreitava a cada passo.

A lenta industrialização do continente foi carreando para as cidades, para as minas e até explorações agrícolas de tipo técnico, uma multidão de homens que se desenraizaram e não encontraram um substituto, uma nova orgânica.

O homem isolado, sem a protecção dos seus parentes e dos deuses, mergulhou no caos espiritual, passou a vaguear sem norte no meio de uma civilização que ele não compreendia, porque o salto foi demasiadamente brusco. E, entretanto, a atracção para o caos continuava, porque esse caos era a promessa de uma vida mais desafogada, em contacto com uma civilização que oferecia maiores comodidades materiais.

Passou de um povo, que era essencialmente espiritual, que vivia dos mitos que havia criado, para uma civilização de tipo eminentemente materialista, como é a nossa.

Seja-me permitido observar que a nossa civilização, apregoando o primado do espiritual sobre o material, oferece o exemplo mais acabado da luta desenfreada pela satisfação dos instintos materiais. E o exemplo mais perfeito de uma sociedade em que predomina o material sobre o espiritual, oferece-nos a América, onde os homens valem pelas fortunas que possuem e não pela perfeição da sua vida, pela grandeza dos seus pensamentos, ou pela altura da sua inteligência.

Lançados os africanos neste novo tipo de sociedade, só superficialmente nela se podiam integrar.

E então, quebrado o equilíbrio orgânico dos homens, estes entraram em todas as aventuras, buscando febrilmente uma saída que lhes permitisse reencontrar o que haviam perdido. Há cerca de uns vinte anos, estando eu em Abidjan, foi lançado pelo Sindicato dos empregados de caminho de ferro, ordem geral de greve destinado a obter um aumento de salários, que todos os empregados haviam aprovado.

Aconteceu porém que a Direcção dos Caminhos de Ferro anunciou que demitiria quem fosse para a greve. Receosos de perderem os empregos, ninguém obedece à palavra de ordem do Sindicato.

A Direcção deste teve uma ideia genial: chamou um feiticeiro que amaldiçoou e lançou anátemas sobre quem tomasse o trabalho e excomungou as locomotivas.

Nesse mesmo dia paralisaram completamente os transportes ferroviários e a Direcção dos Caminhos de Ferro teve de ceder.

Para aqueles que pensam ligeiramente sobre África e os seus problemas, este facto parece caricato e desprovido de sentido. Erro, e erro grave. Mostra-nos a força que os mitos têm sobre os africanos.

Em 1804, William Pitt, uma das mais vigorosas personalidades da política inglesa, escreveu: «que ninguém venha dizer que a África é, por natureza, incapaz de civilização. Nós fomos, outrora, tão selvagens nos nossos costumes e tão ignorantes como hoje o são os africanos. Esperemos que na sequência dos outros continentes, a África venha a gozar dos benefícios que nos são prodigalizados tão abundantemente».

Um século e meio se passou. Mas, que são cento e cinquenta anos para aqueles que vêem os acontecimentos no plano histórico e continuamente têm de navegar pelo «sombrio rio dos mortos», como à História chamava Michelet?

Um traço ligando duas palavras; uma pausa no lento caminhar da humanidade.

A África acordou: os seus duzentos milhões de habitantes foram sacudidos pela mão nervosa do progresso; os investimentos que têm sido feitos, o ardor com que os seus povos se lançaram na dura luta pela existência, levam-nos a crer que, transposta a fase de desorganização orgânica, o progresso seja seguro e durável.

Ai, porém, dos povos subdesenvolvidos; cada milímetro de progresso tem de ser regado com o suor dos homens. E seja naqueles países que directa ou indirectamente se ligaram ao bloco socialista, seja nos que dependem do bloco capitalista, a verdade é que o esforço exigido atinge quase o limite do que se pode pedir a um ser humano, no capítulo de trabalhos e sacrifícios, pois que cada vez se torna mais evidente a verdade da expressão: «capital is made at home’.

O verdadeiro capital produz-se no próprio país e aquele que importa capital, torna-se dependente.

O bloco socialista pretende exportar para África a mística da industrialização que ajudará este continente a criar um mercado interior que lhe permita diminuir, na mesma proporção, os artigos da exportação tradicional destinados a pagar as importações.

A industrialização faria morrer as classes íntermediárias e as classes feudais, facilitando uma reforma agrária que conduziria, segundo a doutrina, a uma melhor distribuição do rendimento nacional.

Por outro lado, alguns países capitalistas procuram injectar nas regiões africanas capitais e técnicos, por forma a fazerem nascer em África estruturas capitalistas semelhantes às que existem nos seus países.

Ambos os métodos — socialista e capitalista — fundam-se na hipótese de que as respectivas experiências económicas são exportáveis e adaptáveis a África, o que constitui, a nosso ver, a causa principal das convulsões deste continente. Ora, as condições económicas, sociais, morais e até climáticas são diferentes, pelo que se afigura mais ponderado considerar-se a realidade africana na sua verdadeira essência, estudar a orgânica social dos diversos povos que constituem o seu emaranhado xadrez para, com base nas conclusões a que se chegar, construir-se o mundo novo africano.

Nalguns países de independência recente, verificou-se que as duas utopias — a socialista e a capitalista — só serviram para mascarar uma intervenção política e estratégica.

Segundo estudos levados a cabo por técnicos da ONU, qualquer país subdesenvolvido que queira aumentar o seu rendimento nacional tem de investir, só em bens de equipamento, cerca de quinze por cento do seu rendimento.

Por outras palavras: se um africano deseja elevar seu nível de vida, deve aceitar, para já e durante alguns anos, uma diminuição no seu consumo de uma quinta parte do que ele produz.

Seja-me permitido dar um exemplo retirado de um estudo feito por peritos da ONU: para fornecer só aos povos asiáticos, máquinas e alfaias precisas para um leve aumento de rendimento agrícola, só num ano, seria necessário o equivalente a três vezes o rendimento total dos Estados Unidos. Bastam estes números para se ter uma ideia pálida do esforço que toda a humanidade subdesenvolvida terá de dispender para alcançar uma era de paz e prosperidade.

Só agora reparei que estas minhas palavras iam tomando o ar dogmático e conselheiral, impróprio de quem, como eu, é o mais modesto grão de arroz deste mundo. E só agora reparo que me alonguei para além do que era legítimo exigir daqueles que, como Vossas Excelências, com tanta bondade me deram a honra de permanecer aqui, para me ouvir.

Vou terminar: como ontem e como sempre, direi que para lá dos interesses materiais que envenenam a vida e dividem os homens, todos devem viver juntos e juntos trabalhar, irmanados no desejo de colaboração pacífica, sem explorações nem ódios, porque só assim bem mereceremos dos nossos concidadãos.

Artur Augusto da Silva

Pequena viagem através de África

Conferência pronunciada em 1963 no salão nobre da Associação Comercial da Guiné, no 46º aniversário da sua fundação.

Edição coordenada por
Henrique, João e Carlos Schwarz
Revisão: Henrique Schwarz
Capa e paginação: Isabel Ribeiro
Bissau, Novagráfica, 2009

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Artur Augusto Silva nasceu na Ilha da Brava, a 14 de Outubro de 1912. Ainda estudante, foi Director da revista “Momento”, réplica lisboeta da coimbrã “Presença”, onde se propunha com outros literatos jovens abrir uma “Tribuna Livre” em que livremente se discutisse e todos pudessem falar. Publicou vários artigos, fez reportagens, dirigiu saraus literários, organizou exposições de arte moderna, promoveu conferências culturais na Casa da Imprensa, na Sociedade Nacional de Belas Artes e em vários outros locais de Portugal.

Licenciou-se em Direito em 1938. Em 1939, partiu para Angola, onde trabalhou como Secretário do Governador Geral. De 1941 a 1949 exerceu advocacia em Lisboa, em Alcobaça e em Porto de Mós. Em 1949, partiu para a Guiné onde foi advogado, notário e substituto do Delegado do Procurador da República. Foi também Membro do Centro de Estudos da Guiné, juntamente com Amílcar Cabral, de quem era grande amigo.

Visitou vários países africanos, recolhendo elementos que mais tarde lhe serviriam para escrever, entre outros livros, “Os Usos e Costumes Jurídicos dos Fulas”.

Um dos seus comprometimentos cívicos em que mais se empenhou consistiu em defender presos políticos. Foi defensor em 61 julgamentos, um deles com 23 réus, tendo tido apenas duas condenações.

Em 1966, já em plena luta de libertação da Guiné, foi preso pela Pide, no aeroporto de Lisboa. Meses mais tarde, por intervenção de Marcelo Caetano e de outros responsáveis políticos, que embora discordassem das suas ideias políticas o admiravam como homem de carácter, foi libertado, mas proibiram-lhe que regressasse à Guiné, sendo-lhe fixada residência em Lisboa.

Em 1967, Marcelo Caetano, convidou-o para ir trabalhar como advogado na Companhia de Seguros Bonança. Também Adriano Moreira o convidou para leccionar no Instituto de Ciências Ultramarinas, o que ele recusou, fazendo ver ao portador do convite a incoerência de o terem prendido pelas suas ideias sobre o colonialismo português e depois o convidarem para leccionar matérias relacionadas com África.

Em 1976, de visita à Guiné-Bissau, foi convidado pelo então Presidente Luís Cabral para trabalhar como juiz no Supremo Tribunal de Justiça. Também leccionou Direito Consuetudinário na Escola de Direito de Bissau.

Faleceu em Bissau a 11 de Julho de 1983.

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