À semelhança do grande escritor russo Fiódor
Dostoiévski, o Outono também se me afigura como um tempo sombrio a
condizer com o Outono da vida, numa espécie de angústia escondida face
ao confronto com esta realidade, ao mesmo tempo que me traz memórias
nostálgicas de há muitos, muitos anos.
Nunca gostei do Outono. Este sentimento enraizado
em criança, creio que tem a ver com o ano em que me mandaram para a
escola primária de São Mamede, tinha eu nove anos. O Verão, de que
sempre gostei, mesmo sem nunca ter visto o mar e brincado na praia,
acabara. Caíam as primeiras chuvas e a alegria do sol tinha dado lugar a
um céu cinzento. Quando, aos sete anos, chegou a minha vez de entrar
para a 1ª classe, a minha mãe entendeu que eu era muito frágil para
enfrentar a crueldade, repito, a crueldade de alguns dos seus
“pedagogos” que ali exerciam o seu mister. E essa realidade entrava-nos
quase diariamente, pela casa adentro, nas mãos do meu irmão Mário a
frequentar a aula de um desses desalmados. Mesmo no inverno, com
frieiras nos dedos, esse “bandido”, no dizer deste meu irmão, não se
coibia de lhe ferrar meia dúzia de reguadas em cada mão.
Nesse tempo, o ano escolar chegava-nos com o mês
de Outubro, mais precisamente, na segunda semana deste mês, um ou dois
dias depois do feriado comemorativo da Implantação da República.
A pedido de minha mãe, o meu pai inscreveu-me no
então Ensino Doméstico e a minha entrada na escola oficial só teve lugar
aos nove anos, directamente para a 3ª classe, já suficientemente
crescidinho para poder enfrentar os castigos do mestre-escola, nesse
outro Outono igualmente sombrio e triste dominado pelo medo.
Talvez seja esta a razão pela qual nunca gostei
do Outono. Entristecem-me o tempo chuvoso e os fins de tarde que
encurtam os dias em contraste com os tardios ocasos do verão que findou.
Entristece-me o cair das folhas que encheram de verde as ruas e avenidas
da cidade. É, tradicionalmente, a época da caça desportiva, que de
desporto não tem nada, actividade que repudio como atentado gratuito e
cruel contra a vida de maravilhosas criações da mãe natureza, nossos
pares na biodiversidade e detesto o Dia de Finados e os macabros
crisântemos, de sinistro aroma, à porta dos cemitérios.
As castanhas assadas e o vinho novo pelo São
Martinho não são suficientes para inverter este sentimento
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