REVISTA TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências
ISSN 2182-147X
NOVA SÉRIE

 

 

 

 
 

A.M. GALOPIM DE CARVALHO

2015 - ANO INTERNACIONAL DOS SOLOS

Falando dos solos (18)

Importância dos solos

Inspirados na frase que ficou célebre do grande mestre da Renascença, Leonardo da Vinci (1452-1519), são muitos os que, de quando em vez, nos lembram que “não se pode amar aquilo que não se conhece”. Afirmação, tornada lugar comum, tem plena e justa aplicação face a tudo, material ou imaterial, o que nos rodeia.

E os solos são parte importante desse tudo.

É neste contexto e no propósito de promover, a nível mundial, um melhor conhecimento acerca do solo, como base para o desenvolvimento agrícola e subsequente segurança alimentar, que a Assembleia Geral das Nações Unidas, reunida a 20 de Dezembro de 2013, aprovou a Resolução n.º 68/232 que estabeleceu o dia 5 de Dezembro como Dia Mundial do Solo e o ano de 2015 como Ano Internacional dos Solos.

No que nos diz respeito, professores, investigadores e divulgadores de ciência, cabe-nos providenciar para que esta mensagem entre e permaneça nas nossas escolas e seja pretexto para incluir nos programas curriculares  conceitos fundamentais da ciência dos solos. Indispensáveis à formação dos alunos, os professores que ensinam Geografia, Biologia e/ou Geologia, devem transmitir estes conceitos, no conteúdo e na forma adequados aos diferentes patamares de escolaridade, sem esquecer outros, não menos importantes, de cariz económico e social relacionados com a utilização do solo. 

Para além do seu significado como fenómeno geológico do presente e do passado, o solo tem capital importância no desenvolvimento e manutenção da vida subaérea, com reflexo evidente na sociedade humana. Suporte fundamental da biosfera acima das terras emersas, está na base da cadeia alimentar dos animais e do homem.

O solo fornece às plantas o indispensável complemento alimentar do que lhes é facultado pelo CO2 atmosférico. Esse complemento consiste nas substâncias químicas provenientes quer da manta morta, quer da alteração das rochas do subsolo.

Sendo certo que dispomos hoje, como nunca, de valiosa informação científica sobre o solo, torna-se urgente aumentar, a nível das populações, a consciencialização e a promoção da sustentabilidade deste recurso que sabemos ser degradável, frágil e irremediavelmente finto.

Desde sempre alvo da erosão natural, o solo está hoje, mais do que nunca, sujeito a agressões físicas, químicas e biológicas (resultantes de práticas de exploração intensivas e incorrectas) e à destruição decorrente do alastramento da urbanização e de um vasto conjunto de realizações próprias da sociedade moderna, com destaque para rodovias, barragens e aeroportos.

As alterações climáticas, a desertificação e a seca (que já ameaçam o Alentejo) são uma realidade, constituindo desafios de dimensão mundial que a todos devem preocupar e que sabemos serem objectivo da Convenção das Nações Unidas para o Combate à Desertificação, assinada no Rio de Janeiro, em 2010, por 192 países.

Assim, têm sido desenvolvidos esforços no sentido de condicionar a gestão do solo, quer quanto à satisfação das necessidades do presente, quer à das futuras gerações, tendo em vista não apenas a sua utilidade na agricultura, silvicultura e pecuária, mas também nos aspectos do terreno em termos de beleza paisagística.

Nestes termos e no que se refere a Portugal, a Sociedade Portuguesa da Ciência do Solo, consciente deste grave problema, procedeu, em 1975 (já lá vão quatro décadas), à adaptação para o nosso país da European Soil Charter, divulgada em 1972, pelo Comité dos Ministros do Conselho da Europa, cujos artigos se transcrevem:

1º - O solo é um dos bens mais preciosos do património natural.

2º - O solo é um recurso natural limitado, facilmente degradável e perecível.

3º - A política de ocupação do solo deve ser gizada em função das propriedades do solo, da ecologia e das necessidades permanentes do país.

4º - A qualidade do solo deve ser preservada e, sempre que possível, restaurada ou melhorada.

5º - O solo deve ser protegido contra a erosão e contra as inundações. Cabe à conservação do solo lugar de relevo no planeamento das actividades nacionais.

6º - O solo deve ser protegido contra a poluição.

7º - Os solos mais férteis e produtivos devem ser reservados para a agricultura, mediante promulgação de leis que impeçam a usurpação dos mesmos por outras actividades.

8º - Nos projectos de engenharia civil devem-se prever as repercussões desfavoráveis das grandes obras no solo e as verbas necessárias para a sua protecção e restauração.

9º - Deve ser incrementada a inventariação do solo e assegurada a vigilância contínua deste recurso.

10º - A investigação científica, a colaboração interdisciplinar e a extensão agrária devem ser estimuladas e fortalecidas com o fim de racionalizar a utilização do solo e, sem o degradar, aumentar o produto agrícola.

11º - A conservação do património-solo deve ser incluída nos programas de ensino primário, secundário e superior e constituir preocupação constante dos cidadãos.

12º - O Estado e as autarquias locais devem planear e gerir racionalmente os recursos do solo, a bem do povo português.      

 

A.M. Galopim de Carvalho. É professor catedrático jubilado pela Universidade de Lisboa, tendo assinado no Departamento de Geologia da Faculdade de Ciências desde 1961. É autor de 21 livros, entre científicos, pedagógicos, de divulgação científica e de ficção e memórias. Assinou mais de 200 trabalhos em revistas científicas. Como cidadão interventor, em defesa da Geologia e do património geológico, publicou mais de 150 artigos de opinião. Foi diretor do Museu Nacional de História Natural, entre 1993 e 2003, tempo em que pôs de pé várias exposições e interveio em mais de 200 palestras, pelo país e no estrangeiro.
Blogue: http://sopasdepedra.blogspot.com/