No bloco
anterior aludi à componente mineral do solo. Neste abordo a componente
orgânica e as fracções líquida e gasosa que lhes estão associadas.
Componente orgânica do solo
Na fracção orgânica do solo, para além das
raízes vivas, dos restos de plantas vasculares mortas, de vermes,
artrópodes, outros invertebrados e os produtos das respectivas
decomposições após a morte, estão presentes micro-organismos,
representados por bactérias autotróficas e heterotróficas, algas,
fungos, protozoários e vírus. Das bactérias, merecem referência as que
promovem a fixação do azoto e, entre os protozoários, são comuns os
flagelados e as amibas. Todos estes seres e os seus restos, associados
aos nutrientes minerais e regulados pela temperatura, humidade,
arejamento, são fundamentais à vida do solo.
De entre a componente orgânica do solo, merece referência o
húmus (1)
ou humo (do
latim humu).
De cor castanha escura a negra, é constituído por partículas
extremamente finas, coloidais, evidenciando um estado avançado de
decomposição da matéria orgânica. Esta fracção, classificada entre os
cerabetumes (2),
corresponde ao que resta depois de a maior parte dos resíduos vegetais e
animais se ter decomposto por acção biológica e química.
Entendido como um conjunto de substâncias
resistentes à decomposição, dele fazem parte ácidos húmicos (solúveis em
NaOH e insolúveis em HCl, com pH 1-2), ácidos fúlvicos (solúveis em NaOH
e em HCl, com pH 1-2) e huminas, constituídas pelos resíduos insolúveis
em NaOH.
Com elevada percentagem de água, o húmus é um material amorfo, poroso,
pouco denso, com elevada capacidade de troca de bases (Na+, K+,
Ca2+, Mg2+), bom controlador do pH e fonte
fornecedora de azoto, enxofre e fósforo às plantas. O húmus é ainda um
agente aglutinador das partículas minerais do solo e, na medida em que é
um material escuro, actua como um bom absorvente da radiação solar,
proporcionando elevações de temperatura e consequente aumento das
velocidades das reacções químicas e bioquímicas. Uma outra
característica particular do húmus é a formação de complexos
organo-minerais, mais precisamente
complexos argilo-húmicos,
fundamentais nesta interface do mundo vivo com o mundo mineral e de
capital importância no bioquimismo do solo.
Sem estes complexos (ditos absorventes), as raízes não absorvem o
complemento alimentar disponível no solo.
Outros produtos resultantes da actividade e/ou
da decomposição da componente orgânica do solo, como celulose, lenhina,
proteínas, lípidos, ceras, resinas, ácidos orgânicos, álcoois, entre
outros menos comuns, não fazem parte do húmus.
No que se refere aos elementos químicos ligados
à componente orgânica do solo, merecem destaque o azoto, o carbono, o
oxigénio, o hidrogénio, o enxofre e o fósforo.
Entre os profissionais, fala-se de
solos orgânicos
ou húmicos, quando têm mais
de 20% de componentes orgânica, em solos de granularidade grosseira, e
mais de 30%. em solos de granularidade média a fina. Nos restantes casos
fala-se de solos minerais.
Fase líquida do solo
Igualmente indispensável à vida do solo e à sua evolução e
caracterização, esta fase é, praticamente, constituída por água - a
chamada água do solo - na qual se distinguem: (1) água higroscópica, fixada
ou absorvida por tensão superficial das partículas mais finas, em
especial, as coloidais, não sendo utilizada directamente pelas plantas;
(2) água capilar, que forma películas contínuas entre as partículas
sólidas maiores e preenche os vazios mais pequenos (microporos),
movendo-se por capilaridade, podendo ser absorvida pelas raízes; (3)
água gravítica, que corresponde à água que circula nos vazios mais
alargados (macroporos) e que, não estando sujeita a força atractiva por
parte das partículas sólidas, se escoa por gravidade, pouco participando
no metabolismo das plantas.
O teor de água no solo depende do clima, do relevo e da cobertura
vegetal, aspectos que, como se sabe, têm inter-relações complexas e
profundas. Ao entrar no solo, a água carrega-se de substâncias solúveis
inorgânicas (Na+, K+, Ca2+, Mn2+,
Cl-, SO42-, HCO3-,
etc.), substâncias orgânicas e, inclusive, gases atmosféricos,
constituindo o que se convencionou chamar
solução do solo. A água que
se infiltra no solo e pode aí ser veículo de processos químicos
(abióticos) ou bioquímicos, depende do balanço hídrico que se estabeleça
entre a água que cai (precipitação), a que escorre à superfície (água de
escorrência), mais intensamente nas vertentes de maior declive, e toda a
que se evapora directamente do solo ou pela transpiração através da
folhagem da plantas (evapotranspiração). Depende ainda, em especial, da
porosidade, que lhe permite escoar-se por gravidade, e da capacidade de
retenção de alguns elementos da fase sólida (argila, húmus).
Por sua vez, a água do solo relaciona-se com o teor de argila, em geral,
e com o tipo dos filossilicatos (caulinite, ilite, esmectites, clorites,
interestratificados) que a compõem, a que não é alheia a temperatura
ambiente.
No que diz respeito ao teor de água,
distinguem-se solos saturados
e solos insaturados, aspectos
do maior interesse na evolução pedológica e até na sua utilização
agrícola.
Fase gasosa do solo
Mais conhecida por ar do solo
ou atmosfera do solo, esta
fase é uma presença indispensável à vida deste corpo natural, igualmente
importante na pesquisa das suas evolução (3)
e características. Dela fazem parte: oxigénio, entre 15 e 20%, dióxido
de carbono, de 0,2 a 45%, azoto, entre 79 e 81% (4),
e vapor de água (saturado). Estes gases resultam do equilíbrio entre a
penetração de ar atmosférico nos vazios do solo e a respiração ao nível
das raízes das plantas e dos micro-organismos, com libertação de dióxido
de carbono e consumo de oxigénio. Uma tal composição é, ainda, função:
(a) da granularidade e porosidade do solo (dois aspectos que condicionam
a permeabilidade); (b) da humidade, que reduz a permeabilidade,
dificultando a renovação do oxigénio; (c) da matéria orgânica, que induz
aumento dos teores de dióxido de carbono; (d) do clima, que também
controla as actividades química e biológica, com implicações directas na
razão O2/CO2.
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