Há dias em que o dia começa bem.
Quando esta madrugada do dia 9 de Novembro de 2012, ainda de
noite, ao abrir o e-mail que os nossos amigos Maria Augusta Silva e
Pedro Foyos, do “Casal das Letras”,
me enviaram, tive o prazer de ler os parabéns que dirigiram ao
Professor Fernando Mangas Catarino pelo seu aniversário.
Pode ler-se nesta edição do prestigiado blogue:
“Nunca em Portugal terá sido
prestada a um catedrático tão expressiva homenagem pública de
aniversário. A celebração dos 80 anos de Fernando Catarino, superlativa
referência académica do País, consegue exceder em participação o
acontecimento inolvidável que foi há uma década a última aula (ao ar
livre) deste grande comunicador científico e que decorreu no Jardim
Botânico da Universidade de Lisboa – o seu palco natural durante meio
século”.
Da homenagem que neste dia feliz se presta a este que foi meu par na
direcção do Museu Nacional de História Natural, apraz-me destacar o
“mais impressionante mar de abraços (um deles é o meu), procedentes de
Portugal inteiro e também do estrangeiro, que acaba de receber, numa
manifestação que fará história na internet”.
Emocionado por esta leitura, não pude deixar de recordar 60 anos
de convívio profissional e de companheirismo nas lides sem conta pela
vulgarização do conhecimento científico que protagonizámos neste
Portugal, cujos políticos não merecem o povo que somos.
Uma das muitas vezes que acompanhei este meu colega de
Universidade, como simples participante interessado em aprender, foi
“Onde a Terra se acaba e o mar começa”, como escreveu Camões no Canto
III de Os Lusíadas, ou seja, na ponta mais saliente do promontório que
marca o extremo ocidental da Serra de Sintra, a que os homens do mar
chamavam o “Focinho da Roca”. Com ele desci a falésia no sítio do farol,
um escarpado que permite
observar aspectos particulares da intrusão magmática que elevou esta
“jóia da petrografia”, como se lhe referiu o Prof. Afred Lacroix,
ilustre petrógrafo francês que lhe dedicou particular atenção. Mas não
foi para observar as rochas que descemos até o mar. Fomos em busca da
Armeria pseudoarmeria, uma
espécie rara de dicotiledónea, da família das plumbagináceas, que ali
floresce a um dado nível da estratificação florística presente. Já não
recordo a altura do ano dessa memorável excursão. Só sei que a subida
foi lenta e ofegante, sob um calor intenso, o que não impediu o
professor de falar, descrever, comentar, explicar um pormenor aqui e ali
e, até, lembrar Lord Byron, o poeta inglês da viragem do século XVIII ao
XIX, que se referiu a esta serra como um Éden Glorioso”, considerando-a,
deselegantemente, uma ”pérola lançada a porcos”.
A elevada sensibilidade poética deste meu amigo, revelou-se-me
numa das primeiras saídas de campo que fizemos juntos. Foi na Arrábida,
mais precisamente na Mata do Solitário. Aí, numa pausa que fizemos junto
de uma Pistacia lentiscus, a
vulgar aroeira, o mestre abriu a sacola e retirou, lá de dentro, um
livro de poemas de Frei Agostinho da Cruz
(1540-1619), que leu para um grupo de alunos deliciados com aquele outro
talento do professor.
A última das várias oportunidades em que tive o prazer de o acompanhar,
foi no parque anexo ao Palácio da Pena,
em Sintra. Estávamos em Agosto. Os cimos da serra permaneciam envoltos
numa nebulosidade fresca, a contrastar com o azul celeste e o calor
estival da planura que se estende a Sul da pequena montanha. Com o Prof.
Catarino, esta preciosa mata transformou-se numa sinfonia de espécies
arbóreas, muitas delas exóticas, diferentes de tudo o que é
característico da nossa flora.
Para os que tiveram o privilégio de lidar com ele, o Catarino, na gíria
dos alunos, ou o Mangas, para os amigos mais chegados, é uma sinfonia e
um poema de simpatia, humanidade e sabedoria.
Parabéns, amigo!
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