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MARIA ESTELA GUEDES
NAS ILHAS DE MADALENA FÉRIN
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Homenagem a Madalena Férin
Casa dos Açores, Faro, 10 de Julho de 2004

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LITERATURA AÇORIANA
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Madalena Férin tinha vinte e oito anos quando publicou o primeiro livro, "Poemas", na colecção Arquipélago. Aconteceu isto em 1957. A edição foi subsidiada pelo Instituto Cultural de Ponta Delgada. Em prefácio, outro poeta açoriano, Eduíno de Jesus, apresentou a autora, informando que era filha de um poeta romântico da ilha de Santa Maria, Armando Monteiro.

Eduíno de Jesus revela o que se passava então na mentalidade das pessoas de cultura: apesar de a modernidade contar com a participação de poetas açorianos como Armando Côrtes-Rodrigues, ligado à revista Orpheu , de Vitorino Nemésio, da secção cultural do "Correio dos Açores", etc., os intelectuais não tinham assimilado ainda as novas artes poéticas. Continuavam presos às formas clássicas de um Antero de Quental.

Depois de 1950, cito Eduíno de Jesus, "uma profunda transformação começou a operar-se nas perspectivas literárias do arquipélago. Armando Côrtes-Rodrigues, Vitorino Nemésio, Vergílio de Oliveira, Pedro da Silveira, Luís Ribeira Seca, Silva Grelo, João Afonso, Jacinto Soares de Albergaria, Coelho de Sousa, Tomaz da Rosa, etc. [...] começam a ser os poetas de quem se fala. Uma maior e mais justa compreensão da poesia moderna tem levado a imprensa de Ponta Delgada, Angra do Heroísmo e Horta a colocar os problemas da poética contemporânea no seu devido lugar. [...] E assim o modernismo deixa de ser uma coisa que se detesta mesmo sem se conhecer, ou que vagamente se conhece de outiva, para ser uma realidade que a todos os verdadeiros intelectuais interessa".

Em suma, a assimilação da modernidade é feita pelos intelectuais, não pelo público em geral. Quando Madalena Férin aparece, estão criadas condições para ser bem recebida por eles, e de facto a classe culta atribuiu-lhe até o prémio "Antero de Quental". Mas isso não significa acolhimento, reconhecimento geral. Tantos anos volvidos, aqui estamos, na Casa dos Açores do Algarve, numa festa de homenagem à autora. Não obstante o carinho com que a élite intelectual e política tem apoiado o seu trajecto nas Letras, é claro que a obra de Madalena Férin continua tão secreta junto do grande público como a de todos os outros artistas da modernidade, sejam eles portugueses, asiáticos ou americanos. Seria difícil o público não letrado estabelecer laços de empatia com Madalena Férin, uma autora selvagem, para usar um termo - "selvagem" - habitualmente caracterizador de grupos e personalidades que se constituem e agem à revelia da autoridade que funda o paradigma.

A modernidade, tanto nas letras como na música, pintura ou teatro, é assimilada e vivida quase só pelos oficiais do mesmo ofício. O grande público não adere, por lhe faltarem pontes que permitam o trânsito entre a zona do falar e aquela de que se fala. A partir do momento em que a arte se afasta da realidade conhecida para criar a sua ou para se centrar em si mesma, o cidadão que não é artista fica marginalizado de um processo que se torna excessivamente conceptual. Para entrar no mundo da obra de arte, já não basta a sensibilidade ao belo e ainda menos ao "parecido com", pois tais suportes podem já nem existir. É preciso dispor de bagagem histórica e teórica, o que em muitos casos pressupõe até alguma especialização.

Hoje, os artistas vivem num espaço razoavelmente fechado à penetração do cidadão comum, e o cidadão comum sacia-se intelectual, afectiva e espiritualmente nos espaços próprios da cultura de massa contemporânea: a grande superfície dos estádios desportivos e a pouca profundidade dos centros comerciais.

Sendo este o estado das letras em que se insere a homenageada, é de louvar a acção do governo e instituições como a Casa dos Açores, em promover e apoiar os seus artistas. A partir da estreia, Madalena Férin fica associada àquilo a que se chama a "literatura açoriana". Os seus livros têm tido quase sempre edição ou subsídio da Secretarias da Cultura dos Açores. Assim, na colecção Arquipélago e em subsequentes, vinculadas às ilhas, tem a companhia de Armando Côrtes-Rodrigues, Cristóvão de Aguiar, Álamo de Oliveira, Luís de Miranda Rocha, J.H. Santos Barros, Emanuel Jorge Botelho, entre outros. Ainda nestas colecções, participará da roda de Vitorino Nemésio, através dos "Temas Nemesianos", assinados por José Martins Garcia. E com Ruy Galvão de Carvalho viajará no tempo até ao de Antero de Quental e de todos os poetas presentes na "Antologia Poética dos Açores". A contextualizar esta produção literária surge Onésimo Teotónio Almeida, com "A questão da literatura açoriana".

No lado mais social da sua obra, vemos a autora convidada a visitar comunidades açorianas noutros países, especialmente da América, e a representar a literatura contemporânea dos Açores em colóquios, feiras do livro e reuniões similares.

Tudo isto revela o empenho com que o governo dos Açores procura promover os seus artistas e apoiar as edições, e de outro lado a tendência dos intelectuais açorianos para sentirem que há uma independência da arte insular. Como o texto que vos leio está em linha na Internet, informo os cibernautas que as ilhas dos Açores fazem parte de Portugal. Nascida entre as montanhas do Douro, não vou eu agora discutir este assunto. Mas proponho-me apresentar a obra de Madalena Férin à luz da insularidade, isto é, visitando os seus livros mais importantes seguindo a temática da ilha.

Antes, porém, e uma vez que o meu papel nesta homenagem é o de apresentar a obra da autora, recorro à entrada que escrevi sobre Maria Madalena Velho Arruda Monteiro da Câmara Pereira Férin na "Enciclopédia dos Açores", que tem estado a ser organizada por outro açoriano, Luís Arruda:

"Em 1957, deu à estampa o primeiro livro, Poemas , agraciado com o Prémio Antero de Quental, do Secretariado Nacional de Informação. Seguiram-se outros livros de poesia: Meia-noite no mar (1984), A cidade vegetal (1987), O anjo fálico (1990) - este recebeu o Prémio Antero de Quental do Concurso Literário dos Açores -, Pão e absinto (1998), Prelúdio para o dia perfeito (1998), Quarteto a solo , de que é co-autora (2000), e Um escorpião coroado de açucenas (2003).

Além do conto Dormir com um fauno (1998), no género ficcional publicou até agora três obras: O número dos vivos (1990), Bem-vindos ao caos (1996) e África Annes (2001).

Figura em várias antologias, em especial relativas à insularidade, e tem artigos publicados na Revista Ocidente e Revista de Portugal (entre 1981 e 1996).

Com Sophia de Mello Breyner Andresen e Maria Natália Duarte Silva colaborou na programação da colecção juvenil "Nosso Mundo", na qual figuram alguns livros que também traduziu.

É sócia da Associação Portuguesa de Escritores (APE).

A obra de Madalena Férin pertence à linhagem do Romantismo que se desenvolve no Surrealismo. Embora esta modernidade se desvincule de processos narrativos lineares e de mimetização da realidade, é forte e reconhecível a imagem dos Açores na sua obra, caso de "África Annes", romance que resulta até de pesquisa em documentação histórica."

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