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MARIA ESTELA GUEDES


«Chão de Papel»

INDEX

A Flobert

Moravas em Santa Luzia
No Chão de Papel
Numa ponta com antigo casarão
Colonial, de paredes com afrescos
De exótico assunto sariano
Vá-se lá saber porquê.
Oásis para descanso do espírito, talvez.
Para esquecer ódios, amarguras,
O desespero pelo canavial queimado,
A silenciosa chegada dos negros cordões
Da correção, que do macaquito
Só os ossos deixaram nos anéis da corrente
Que o prendia na varanda.
Outra silenciosa investida, noturna,
A do irã-cego, a potente jibóia
Que a fome fartou com a pata no choco e
Ovos na capoeira
E não quis morrer, não morria
A bela e enorme Python sebae, apesar
De atingida na cabeça pela caçadeira
Apesar de cozida em água a ferver
Estirada a todo o comprimento
Dos seus mais de seis metros de esplendor.
Não queria partir, continuava a agitar-se
No largo pátio
A querer fugir, a querer fugir…
Magoam mais do que aqueles que morrem
Os que não querem partir.
O pânico, o medo do sagrado, seria realmente
Um deus a grande cobra dourada?
Os homens pequenos e envergonhados
Impotentes perante aquele animal
Ferido e torturado e que de maneira nenhuma
Queria soltar o último suspiro
De quem se rende ao conquistador…
Bô ca misti partir, como a Python sebae
A não ser para lá,
Onde ouvias falar da caça grossa
Nos lados de Prábis, de acidentes mortais
Em Farim, Cacine, Madina do Boé e Bafatá
Bubaque e Catió
Mas nunca da guerra.
Noite zipada, as gazelas encandeadas
Pelas lanternas de cabeça.
A ternura com que te lembras
De ir à caça dos pombos verdes com o pai
A Flobert apontada como se fosse mortífera
Winchester.
E depois no pátio
Derretias com ele desperdícios metálicos
Coando gotas irregulares de Pb
Para carregar os cartuchos da caçadeira.
Umas armas usam chumbo escumilha,
Zagalote, outras,
E há o napalm, a bioquímica, venenos
E as bombas que destroem tudo
Num raio de milhares de quilómetros
Sem precisarem de chumbo nem rastilho.
Os pombos verdes, sim, para os
Treron calvus bastava uma arma
De brinquedo, levezinha,
A quase inocente Flobert.



 



LISBOA, APENAS LIVROS EDITORA


Chão de Papel
LISBOA, 2009
Autor: Maria Estela Guedes
ISBN: 978-989-618-233-5
Edição: 48 páginas

Estado: disponível
Preço: 3,80 € Poesia

http://apenas-livros.com/pagina/apenas_de_cordel/7?id=337

Maria Estela Guedes (1947, Britiande / Portugal). Diretora do Triplov

Membro da Associação Portuguesa de Escritores, do Centro Interdisciplinar da Universidade de Lisboa e do Instituto São Tomás de Aquino. Directora do TriploV.

LIVROS

“Herberto Helder, Poeta Obscuro”. Moraes Editores, Lisboa, 1979;  “SO2” . Guimarães Editores, Lisboa, 1980; “Eco, Pedras Rolantes”, Ler Editora, Lisboa, 1983; “Crime no Museu de Philosophia Natural”, Guimarães Editores, Lisboa, 1984; “Mário de Sá Carneiro”. Editorial Presença, Lisboa, 1985; “O Lagarto do Âmbar”. Rolim Editora, Lisboa, 1987; “Ernesto de Sousa – Itinerário dos Itinerários”. Galeria Almada Negreiros, Lisboa, 1987 (colaboração e co-organização); “À Sombra de Orpheu”. Guimarães Editores e Associação Portuguesa de Escritores, Lisboa, 1990; “Prof. G. F. Sacarrão”. Lisboa. Museu Nacional de História Natural-Museu Bocage, 1993; “Carbonários : Operação Salamandra: Chioglossa lusitanica Bocage, 1864”. Em colaboração com Nuno Marques Peiriço. Palmela, Contraponto Editora, 1998; “Lápis de Carvão”. Apenas Livros Editora, Lisboa, 2005; “A_maar_gato”. Lisboa, Editorial Minerva, 2005; “À la Carbonara”. Lisboa, Apenas Livros Lda, 2007. Em co-autoria com J.-C. Cabanel & Silvio Luis Benítez Lopez; “A Boba”. Apenas Livros Editora, Lisboa, 2007; “Tríptico a solo”. São Paulo, Editora Escrituras, 2007; “A poesia na Óptica da Óptica”. Lisboa, Apenas Livros Lda, 2008; “Chão de papel”. Apenas Livros Editora, Lisboa. 2009; “Géisers”. Bembibre, Ed. Incomunidade, 2009; “Quem, às portas de Tebas? – Três artistas modernos portugueses”. Editora Arte-Livros, São Paulo, 2010.

ALGUNS COLECTIVOS

"Poem'arte - nas margens da poesia". III Bienal de Poesia de Silves, 2008, Câmara Municipal de Silves. Inclui CDRom homónimo, com poemas ditos pelos elementos do grupo Experiment'arte. “O reverso do olhar”, Exposição Internacional de Surrealismo Actual. Coimbra, 2008; “Os dias do amor - Um poema para cada dia do ano”. Parede, Ministério dos Livros Editores, 2009.

TEATRO

Multimedia “O Lagarto do Âmbar, levado à cena em 1987, no ACARTE, Fundação Calouste Gulbenkian, com direcção de Alberto Lopes e interpretação de João Grosso, Ângela Pinto e Maria José Camecelha, e cenografia de Xana; “A Boba”, levado à cena em 2008 no Teatro Experimental de Cascais, com encenação de Carlos Avilez, cenografia de Fernando Alvarez  e interpretação de Maria Vieira. 

E-mail: estela@triplov.com

Curriculum vitae

Curriculo abreviado