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REVISTA TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências

ISSN 2182-147X
NOVA SÉRIE

 

 





Maria Estela Guedes
Foto: Ed. Guimarães

Em memória de J.M. de Castro Pinto, meu primo
 
Foi hoje a cremar, possivelmente em São João do Estoril, onde morava, o escritor José Manuel de Castro Pinto, meu primo, filho de Manuel Pinto Anastácio e de Azélia Castro. Manuel Pinto Anastácio era irmão da minha mãe, Preciosa de Jesus Pinto. José Manuel de Castro Pinto descendia, como eu, pelo lado do seu pai e de minha mãe, de Francisco Pinheiro da Rocha, tio de Manuel Pinheiro da Rocha, o fotógrafo (1).

José M. de Castro Pinto é autor de obra vária, em grande parte vinculada ao Ensino. Nem toda vem indicada no site da Plátano, onde figura a lista das que publicou nessa editora, a cujo corpo diretivo pertencia (2).

O seu primeiro livro, resultado ainda de trabalho de estudante  no curso de Filologia Românica, na Faculdade de Letras de Lisboa, foi «Descobrimento da Ilha da Madeira. Ano 1420. Epanáfora Amorosa», em que reedita a obra homónima de D. Francisco Manuel de Melo. Essa edição e trabalho de investigação mantêm toda a validade, como denota Maria do Céu Fraga, da Universidade dos Açores, ao declarar, em «Um historiador "esquisito": a Epanáfora Amorosa de D. Francisco Manuel de Melo»: «No presente trabalho, adoptámos a edição da Epanáfora Terceira feita por José Manuel de Castro (Descobrimento da Ilha da Madeira. Ano 1420. Epanáfora Amorosa, Lisboa, 1975), em livro que, além de ser profusamente anotado e indicar bibliografia útil, inclui também uma leitura da Relação de Francisco Alcoforado. Referir-nos-emos a ele simplesmente como Epanáfora Amorosa.» (3).

A despeito dos seus dotes de investigação, e interesse por temas clássicos e linguísticos, José M. de Castro Pinto ficará certamente conhecido pelos romances historiográficos dedicados a José do Telhado, figura que associei à de Robin Hood (4). Aliás, nos vários desenvolvimentos do assunto, o autor continua a manifestar a sua necessidade de investigação cuidadosa, quer compulsando as fontes primárias (atas dos julgamentos de Zé do Telhado), quer as literárias, em particular Camilo Castelo Branco, preso na mesma data com o salteador, quer visitando os locais da ação, onde recolheu ainda documentação iconográfica, publicada nos livros, e reeditada no Triplov, que desta forma pôde contar com a sua colaboração (5).
Foi igualmente um defensor do bem escrever Português. Tive ocasião de recensear duas das suas obras de gramatologia, «A Dinâmica da escrita», assinada com Zacarias Nascimento, e o «Novo Prontuário Ortográfico», ambas publicada na Plátano Editora (4).
Lembro-me com ternura do Nelo, como era tratado em família, sobretudo das férias grandes, quando passava com ele e os seus sete irmãos alguns dias em Vidago. O pai, meu tio, geria as Águas de Vidago, e todo o parque era território de descobertas fabulosas, com a beleza do lago, dos pavões e das frondosas árvores ornamentais. Jogávamos putting, aliás o António, irmão do Nelo, foi conhecido jogador de golfe, apreciávamos com curiosidade os turistas estrangeiros. Também recordo a velha casa de Gondomar, perto de Tarouca, terra natal da minha tia Azélia, e das subidas que então empreendíamos, a pé, ao pico do monte em que permanece o pequeno santuário e miradouro do Cristo Rei.

No ano passado tive ocasião de dar um passeio até ao Cristo Rei, lugar de piqueniques. Pedi a Maria Judite Laranjo Batista, com cuja família ia, que parasse na casa do meu tio Pinto, que já não sabia localizar, recordando apenas uma extensa parede de varanda envidraçada. Parámos, lamento não a ter fotografado: a casa, já algo decrépita, está colada a uma moradia nova, mas o jardim, ao abandono, conserva o romântico encanto das novelas de Camilo, tão trabalhado pelo Nelo nas suas sobre o Zé do Telhado, e as vidraças lá estavam, a guardar no interior da casa de lavoura tanta memória de família. As nossas mais ternas memórias são as da infância e adolescência, justamente por serem as da criação de relações de afeto e descoberta de coisas, lugares e família.


Maria Estela Guedes
Casa dos Banhos, 8 de abril de 2013

 
 

Maria Estela Guedes (1947, Britiande / Portugal). Diretora do Triplov

Membro da Associação Portuguesa de Escritores, da Sociedade Portuguesa de Autores, do Centro Interdisciplinar da Universidade de Lisboa e do Instituto São Tomás de Aquino. Directora do TriploV.

LIVROS

“Herberto Helder, Poeta Obscuro”. Moraes Editores, Lisboa, 1979;  “SO2” . Guimarães Editores, Lisboa, 1980; “Eco, Pedras Rolantes”, Ler Editora, Lisboa, 1983; “Crime no Museu de Philosophia Natural”, Guimarães Editores, Lisboa, 1984; “Mário de Sá Carneiro”. Editorial Presença, Lisboa, 1985; “O Lagarto do Âmbar”. Rolim Editora, Lisboa, 1987; “Ernesto de Sousa – Itinerário dos Itinerários”. Galeria Almada Negreiros, Lisboa, 1987 (colaboração e co-organização); “À Sombra de Orpheu”. Guimarães Editores e Associação Portuguesa de Escritores, Lisboa, 1990; “Prof. G. F. Sacarrão”. Lisboa. Museu Nacional de História Natural-Museu Bocage, 1993; “Carbonários : Operação Salamandra: Chioglossa lusitanica Bocage, 1864”. Em colaboração com Nuno Marques Peiriço. Palmela, Contraponto Editora, 1998; “Lápis de Carvão”. Apenas Livros Editora, Lisboa, 2005; “A_maar_gato”. Lisboa, Editorial Minerva, 2005; “À la Carbonara”. Lisboa, Apenas Livros Lda, 2007. Em co-autoria com J.-C. Cabanel & Silvio Luis Benítez Lopez; “A Boba”. Apenas Livros Editora, Lisboa, 2007; “Tríptico a solo”. São Paulo, Editora Escrituras, 2007; “A poesia na Óptica da Óptica”. Lisboa, Apenas Livros Lda, 2008; “Chão de papel”. Apenas Livros Editora, Lisboa. 2009; “Geisers”. Bembibre, Ed. Incomunidade, 2009; “Quem, às portas de Tebas? – Três artistas modernos em Portugal”. Editora Arte-Livros, São Paulo, 2010. “Tango Sebastião”. Apenas Livros Editora, Lisboa. 2010. «A obra ao rubro de Herberto Helder», São Paulo, Editora Escrituras, 1010; "Arboreto». São Paulo, Arte-Livros, 2011; "Risco da terra", Lisboa, Apenas Livros, 2011; Trabalhos da Maçonaria Florestal Carbonária. Lisboa, Apenas Livros, 2012; Brasil, São Paulo, Arte-Livros, 2012.

ALGUNS COLECTIVOS

"Poem'arte - nas margens da poesia". III Bienal de Poesia de Silves, 2008, Câmara Municipal de Silves. Inclui CDRom homónimo, com poemas ditos pelos elementos do grupo Experiment'arte. “O reverso do olhar”, Exposição Internacional de Surrealismo Actual. Coimbra, 2008; “Os dias do amor - Um poema para cada dia do ano”. Parede, Ministério dos Livros Editores, 2009. Entrada sobre a Carbonária no Dicionário Histórico das Ordens e Instituições Afins em Portugal, Lisboa, Gradiva Editora, 2010. "Munditações", de Carlos Silva, 2011. "Se lo dijo a la noche", de Juan Carlos Garcia Hoyuelos, 2011; "O corpo do coração - Horizontes de Amato Lusitano", 2011.

TEATRO

Multimedia “O Lagarto do Âmbar, levado à cena em 1987, no ACARTE, Fundação Calouste Gulbenkian, com direcção de Alberto Lopes e interpretação de João Grosso, Ângela Pinto e Maria José Camecelha, e cenografia de Xana; “A Boba”, levado à cena em 2008 no Teatro Experimental de Cascais, com encenação de Carlos Avilez, cenografia de Fernando Alvarez  e interpretação de Maria Vieira.