REVISTA
TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências
ISSN 2182-147X
NOVA SÉRIE
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Maria Estela Guedes
Foto: Ed. Guimarães |
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Onde está o CEU? |
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O CEU - Centro Educacional Unificado - localiza-se
no Município de São Paulo, que conta atualmente com quarenta e cinco
destas unidades (1). São estabelecimentos polivalentes, primacialmente
voltados para o ensino, criados em bairros muito violentos da periferia. Parece claro que a sua fundação teve no horizonte
a esperança de adoçamento do sentimento de perigo em que vive grande
parte da população.
A instrução civiliza, a cultura eleva o pensamento, com ela a
criminalidade diminui - eis um projeto sensato, interessado na melhoria
das condições de vida dos brasileiros mais desfavorecidos, que merece
por isso ser acarinhado.
Foi pela mão de Antônio Abujamra que tomei
conhecimento da inovadora experiência, adequada ao espírito de governos de
esquerda, voltados para a questão social. Os CEUs aliam à instrução
de crianças e adolescentes o desporto, o teatro, a biblioteca, o ponto
de Internet, a oficina de
artes plásticas e visuais e outros benefícios. E aliam não somente os espaços
de ensino (jardim-escola, primária, ensino secundário) e distração como as
idades, convocando também os moradores da zona, em particular os pais dos alunos.
A programação abrange todos os
interessados.
Assim, os CEUs garantem aos moradores dos bairros mais afastados do
centro de São Paulo acesso a estabelecimentos públicos de lazer,
cultura, tecnologia e práticas desportivas. Os CEUs contribuem deste modo
para o desenvolvimento das comunidades locais. E, para
satisfazerem as disponibilidades de horário dos pais, ficam abertos
durante os finais de semana. |
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Na tarde em que
visitei o CEU da Vila Curuçá, acompanhando a equipa de Abujamra, que
ali montou o seu espetáculo «A voz do provocador», tive ocasião de
notar, e fotografar, que a maior parte dos utentes da piscina, pelo
menos nessa altura, era constituída por jovens adultos e pessoas de
maior idade. |
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A biblioteca, já na hora de encerrar,
contava por isso com poucos funcionários e utentes. Dirige-a uma
coordenadora impecável e eficiente, Gorete Cordeiro, que se
dispôs a ajudar a equipa técnica, fornecendo livros para o
cenário e prontificando-se a satisfazer a curiosidade filológica
de Antônio Abujamra, que queria saber qual a origem do vocábulo
«Curuçá», no topónimo «Vila Curuçá». Após pesquisa e alguma
discussão, eu, pelo menos, fiquei satisfeita ao saber que
provavelmente o termo, pertencente à língua tupi, deriva do
português «cruz».
Outro motivo de agrado, na
biblioteca, foi ver que, nas propostas de leitura da semana, se
acentuava uma obra transposta para o cinema, que acabava de
estrear nas salas do país: «Capitães da areia», de Jorge Amado.
É um belo filme, que tive oportunidade de ver, realizado por
Cecília Amado e Guy Gonçalves.
Foca a juventude marginal, em resultado de abandono, na cidade
de São Salvador. A realidade do filme é diversa da atual, Jorge
Amado escreveu sobre um problema do século passado, anos 30.
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Trespassa encantamento pela meninada, que vive em associação,
partilhando problemas, liberdade, comida e alegria. É preciso ter em
conta não só o encanto da adolescência como o apelo do socialismo que
subjaz à vida comunitária dos meninos para nos distanciarmos da muito
mais cruel existência das crianças abandonadas pelos cantos da cidade,
hoje em dia. |
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Motivo ainda de satisfação, no CEU da Vila
Curuçá, foi o cantinho dos objetos de cerâmica. «Não toque no urso! Ele
está ninindo==» - a advertência, na sua graça de brinquedo, preservava
os frágeis objetos de barro.
As oficinas funcionam, jovens e adultos
aprendem, formam-se e passam decerto horas agradáveis na piscina, na
sala de dança, e, claro, no teatro. Com capacidade para 400 pessoas,
encheu. Nem um zumbido de mosquito se ouviu durante o espetáculo, salvo
nos pontos em que Antônio Abujamra se dirigiu diretamente à plateia,
maioritariamente na casa dos 20 a 35 anos.
Uma salva de palmas, em pé, brindou Abujamra, findo o espetáculo. De
seguida, o camarim foi
invadido por uma multidão de jovens, para a habitual sessão de autógrafos e fotografias com o
artista que, generoso, apesar do cansaço, rebrilhava de satisfação.
Notei que o artista se sente no seu ambiente neste tipo de instituições,
o que aliás concorda com o espírito da peça, uma (anti-)aula.
O
CEU de Vila Curuçá conta
ainda com um jornal e programa de
arborização do seu próprio recinto, o que naturalmente abre as
expectativas ao interesse dos utentes pelas questões ecológicas e
ambientais. Serve os bairros de
São Miguel, Itaim Paulista, Vila Curuçá e cercanias.
Eis um
excelente projeto, que era bom alargar a outros Estados, ou pelo menos
às perigosas periferias de outras cidades grandes. Ignoro se já existem
estudos do seu impacto na população atingida, mas era interessante
saber, se, por exemplo, a criminalidade baixou desde a sua fundação, ou
se permanece idêntica. Na realidade os CEUs beneficiam tantas pessoas,
desde os professores aos artistas e aos utentes, que não precisam do
aval de estatísticas sobre a incidência do crime na sua área, para
justificarem a sua criação. |
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(1)
http://pt.wikipedia.org/wiki/Centro_Educacional_Unificado |
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Maria Estela Guedes
(1947, Britiande / Portugal). Diretora do Triplov
Membro da Associação Portuguesa de Escritores,
da Sociedade Portuguesa de Autores, do Centro Interdisciplinar da Universidade de Lisboa e do Instituto São Tomás de Aquino. Directora do TriploV.
LIVROS
“Herberto Helder,
Poeta Obscuro”. Moraes Editores, Lisboa, 1979; “SO2” .
Guimarães Editores, Lisboa, 1980; “Eco, Pedras Rolantes”, Ler
Editora, Lisboa, 1983; “Crime no Museu de Philosophia Natural”,
Guimarães Editores, Lisboa, 1984; “Mário de Sá Carneiro”. Editorial
Presença, Lisboa, 1985; “O Lagarto do Âmbar”. Rolim Editora, Lisboa,
1987; “Ernesto de Sousa – Itinerário dos Itinerários”. Galeria
Almada Negreiros, Lisboa, 1987 (colaboração e co-organização); “À
Sombra de Orpheu”. Guimarães Editores e Associação Portuguesa de
Escritores, Lisboa, 1990; “Prof. G. F. Sacarrão”. Lisboa. Museu
Nacional de História Natural-Museu Bocage, 1993; “Carbonários :
Operação Salamandra: Chioglossa lusitanica Bocage, 1864”. Em
colaboração com Nuno Marques Peiriço. Palmela, Contraponto Editora,
1998; “Lápis de Carvão”. Apenas Livros Editora, Lisboa, 2005; “A_maar_gato”.
Lisboa, Editorial Minerva, 2005; “À la Carbonara”. Lisboa, Apenas
Livros Lda, 2007. Em co-autoria com J.-C. Cabanel & Silvio Luis
Benítez Lopez; “A Boba”. Apenas Livros Editora, Lisboa, 2007;
“Tríptico a solo”. São Paulo, Editora Escrituras, 2007; “A poesia na
Óptica da Óptica”. Lisboa, Apenas Livros Lda, 2008; “Chão de papel”.
Apenas Livros Editora, Lisboa. 2009; “Geisers”. Bembibre, Ed.
Incomunidade, 2009; “Quem, às portas de Tebas? – Três artistas
modernos em Portugal”. Editora Arte-Livros, São Paulo, 2010.
“Tango Sebastião”. Apenas Livros Editora, Lisboa. 2010. «A obra ao
rubro de Herberto Helder», São Paulo, Editora Escrituras, 1010.
"Arboreto", São Paulo, Arte-Livros, 2011.
ALGUNS COLECTIVOS
"Poem'arte - nas margens da poesia". III Bienal de
Poesia de Silves, 2008, Câmara Municipal de Silves. Inclui CDRom
homónimo, com poemas ditos pelos elementos do grupo Experiment'arte.
“O reverso do olhar”, Exposição Internacional de Surrealismo Actual.
Coimbra, 2008; “Os dias do amor - Um poema para cada dia do ano”.
Parede, Ministério dos Livros Editores, 2009.
Entrada sobre a Carbonária no Dicionário
Histórico das Ordens e Instituições Afins em Portugal, Lisboa,
Gradiva Editora, 2010. "Munditações", de Carlos Silva, 2011. "Se lo
dijo a la noche", de Juan Carlos Garcia Hoyuelos, 2011; "O
corpo do coração - Horizontes de Amato
Lusitano", 2011.
TEATRO
Multimedia “O
Lagarto do Âmbar, levado à cena em 1987, no ACARTE, Fundação
Calouste Gulbenkian, com direcção de Alberto Lopes e interpretação
de João Grosso, Ângela Pinto e Maria José Camecelha, e cenografia de
Xana; “A Boba”, levado à cena em 2008 no Teatro Experimental de
Cascais, com encenação de Carlos Avilez, cenografia de Fernando
Alvarez e interpretação de Maria Vieira. |
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