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Sersgeisers

Maria Estela Guedes
Geisers

Eu, descontraída, a fazer a barba

Eu nunca fui a S. Francisco.

Sonhei porém que um geiser

explodia numa girândola rósea-de-todas-as-cores

ao fundo de uma ladeira de S. Francisco.

Freud teria alguma palavra a dizer sobre este carnudo

assunto, mas disso sei eu mais do que ele.

Primeiro foi o som, um Buuuuuum!!! de explosão,

estava eu nessa altura muito descontraída

a fazer a barba.

Corremos os dois para a porta da barbearia.

Os carros andavam de saltos altos

em cima das lombas

trepando ofegantes

por aquela rua de barrigas empinadas.

Alguns automóveis iam gritando

como sirenes da Polícia

e outros iam pulando para a valeta

e resfolegavam uns contra os outros

ao fugirem do geiser de todas as cores,

jorrante num fundo de rua

de thriller rodado por noites betuminosas

na cidade americana de S. Francisco.

Estava eu espantada a ver tudo aquilo

no meu sonho de alto de ladeira,

à porta da barbearia onde fora

aparar barba e bigode.

Toalha branca ao pescoço,

num ambiente de vapores termais,

fitava o geiser furta-cores

a despedir luz em rajadas para cima

como bomba de lívidos neutrões.

O barbeiro, de navalha na mão, com a bata de nuvem

em carneirinhos e cúmulo-nimbos aconchegantes,

gemia: Ai! Ai!......................

Os olhos de cor melada, inodoros, derretidos em lágrimas

de chocolate cremoso.

Senti tanta atracção por ele que o abracei e disse:

Meu, para nos salvarmos,

temos de sair daqui numa rapidinha!

E ele respondeu, o gesto verde-esmeralda:

Nem tiro a bata, tenho ali o carro, vamos embora numa branca!

O calor de estufa subia pela ladeira

como salamandra aquática,

Triturus marmoratus, verbi gratia.

Sem intervalo entre vapor e suor,

uma espécie de concha a chupar entre pernas,

sufocávamos no sonho de cor morna e demasiadas palavras

gostosentas entesonadas dos vapores termais.

E assim fomos de carro ao contrário da direcção do geiser,

ele de mão na cabeça das mudanças,

a roçar para cá e para lá,

eu de toalha ao pescoço e ele de bata branca,

a navalha deixada no peitoril da janela da barbearia

para fazer ela as barbas sozinha

quando o geiser rebentasse dentro do útero da noite

a tensão partida enfim num ronronar ruivo de gato.

 
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