Emblemas e lemas

 

PAULO JORGE BRITO E ABREU


ORAÇÃO À VIRGEM MÃE, SENHORA DA SAUDADE

( convoco, para a minha Musa, o 2 de Copas Arcano )

Eu vi d’Amor vestida essa donzela

Com rosas nos cabelos cor de ouro;

Ela vinha-me dar um bom agouro,

Ela vinha findar minha procela.

E disse pra mim mesmo: «Quem é Aquela

Por quem os Amorzinhos fazem coro???

Será a tal??? Será o meu tesouro???

Quem é que vem na noite meiga e bela???»

Ela me disse: «Eu sou a Mãe do pobre

Nascido como poucos pra ser nobre

E pra reinar no meio das estrelas…

Não me temas, meu filho, eu sou a Rosa

A quem tu chamas Mater Dolorosa

E venho terminar tuas procelas.»


ROMANCEIRO NOVEL OU POÉTICA NOVELA

( invoco, para a minha Musa, o Arcano do Mundo )

I

Bela minha foi Dor e foi praga;

Foi minh’Alma deserta uma chaga

Que eu já pus em teu seio maldito,

Alvo e gélido como o granito.

Foi gangrena este amor, foi loucura,

Pois nem mesmo esse Demo, à procura,

De fatais e cruéis corações

Ouve a voz dos faustosos cifrões…

Como sempre na História incorrecta

Brada a Ordem, sim!, contra o Poeta;

Clamam Reis com as faces purpúreas,

Contra o Vate levantam-se as Fúrias,

E por fim um cantor, aziago,

Dos seus males fazendo-se mago,

Reza um salmo de brandas virtudes,

As violas tangendo e os alaúdes:

II

«Quisera que vós todos, Imp’radores,

Da terra donos, donos do Milhão,

Ouvísseis os profetas, os doutores

Que só comem da noite o negro pão.

Quisera ver-vos santos, impolutos,

Como a noiva que espera o Cavaleiro,

E não tão meliantes e corruptos

Quais cerdos chafurdando no lameiro.

Todo o amor que na terra desespera

Por buscar uma pomba e ter a sanha,

Terá fulgor, verá a Primavera,

Em lugar duma velha e feia aranha;

E pra aqueles que levam as pedradas

Da chacina, do mal e da injúria,

Reserva o Pai do céu as belas Fadas

Tão meigas como os pássaros. Sulfúrea

É toda a raiva, é flama que atormenta,

É dor tão pestilenta, é danação;

Quero, em lugar do ácido, água benta;

Quero, em lugar da pena, milho e pão.»

Assim falou o cantor, o grande bardo

Que nos deu toda a sua directriz.

O Rei se ajoelha aos pés do goliardo,

Fulgem rosas, fremem sons, e em frol de nardo

– Surge o Dante com a sua Beatriz.

Lisboa, 07/ 07/ 1994

AMOR MAGISTER EST OPTIMUS

POETA, JORNALISTA, BIBLISTA E ALFARRABISTA

PAULO JORGE BRITO E ABREU

A TRÁGICA PREDESTINAÇÃO

( inspirado em Gomes Leal )

( invoco, para a Musa minha, o Carro da Vitória )

Ó sarjeta! Ó canil! Ó capital maldita!

Por toda a parte, sim, onde houver um soez,

Hás-de ouvir minha Lira, azougada em vindicta,

Cuspir no trivial e espancar o burguês.

Ó bordel! Ó canil! Ó lupanar da escória!!!

Em toda a parte – ouvi! – em que beijem rameiras,

Hás-de ouvir minha Lira, ó prostituta inglória,

Cuspir no teu amor, e gargalhar nas eiras.

Ó sapos da cicuta, ó fagueiras carraças,

Que chupais o meu sangue e sorris nas tabernas,

Aqui tendes o estigma, a tíbia das devassas,

Rasputine em sabbat avermelhando as pernas.

Ó ratazanas porcas, crosta das blandícias,

Que maltratais o pobre e lambeis o Milhão,

Bardamerda pra vós, para os vossos polícias,

Chicote para a Puta, e peste para o Cão.

Milénios há que o Génio, o profeta dos astros,

Passeia entre vós dorido e maldisposto.

Fazei-lo caminhar, bem doente e de rastros,

Roubais-lhe o seu Amor, cuspis-lhe em pleno rosto!!!

Na juventude, o Génio, oh podridão!!!, maldito,

É águia que volteia ao pé de cães e vermes.

Em casa o trucidais, oh Dor!!!, mas o seu Grito

É titânico e terno, é caduceu de Hermes.

Podeis-lhe roubar tudo, tudo, o pão, a casa,

A pomba que transluz e a dignidade humana:

Na sua Lira, sim, a combustão da brasa

É Númen a luzir, é luminar, é flama.

Podei-lo vergastar, prender, pôr no asilo,

No manicómio enfim dizer que ele é demente:

Na sua Lira, sim, vereis que isto é Aquilo,

Que um Poeta, pra mim, vale mais que um Presidente.

Podei-lo maniatar, prender, tornar pedinte,

Na sarjeta o tratar como o lixo dos canos,

Que na Idade Média ou no século vinte

As rosas valem mais que os homens sub-humanos.

Por isso, ó vis poltrões, ó multidão ignara!!!

Matastes o saber, matastes, e por isto,

Tendes todo o torpor, sangue tendes na cara,

A dor de Galileu e as lágrimas do Cristo.

Por isso ter-me-eis, no campo ou na cidade,

Como em brasa mil ferros, sim!, um sinal d’ódio,

Pois serei o soluço, o mal, a mortandade,

A pena prò Senhor, o cancro para o Pódio.

Da minha pena os grãos, os Príncipes do mundo,

As palmas não terão, eu não lhes dou encómios,

Antes finco o meu barco em Zeus e Tétis fundo

Na canalha, no pus, na Dor, nos manicómios.

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E toda a gente, enfim, ao Génio das quimeras

Apupos e assobios vai dando em sua Sorte;

Ó meu pobre mortal!!! vão se eras sobre as eras,

Mas diz o demo, assim, ao Génio, até à morte:

«Ali vai o palhaço, o tolo, o tresloucado!!!

Aquele que, cultor, é zoina, atinge os cúmulos!!!»

– Vaidoso e com ardor, o Génio cospe ao lado,

A Vénus dá a mão, e marcha sobre os túmulos.

 

Tomar, Cidade Templária, 21/ 03/ 1993

VERBA VOLANT, SCRIPTA MANENT

POETA, JORNALISTA, BIBLISTA E ALFARRABISTA

PAULO JORGE BRITO E ABREU


Paulo Jorge Cardoso de Oliveira Brito e Abreu, de seu nome completo, foi nado em Lisboa, a 27/ 05/ 1960, bem perto da festa do Pentecostes cristão. Ex-aluno do Colégio Militar, licenciou-se, em Línguas e Literaturas Modernas, em 1986, por a Universidade Nova de Lisboa. Tem sido Poeta, Ensaísta, Crítico Literário, Tarólogo, Numerólogo e Artista Plástico. De entre os seus livros mais importantes, relevemos os seguintes: «Cântico Jovem Para a Tua Rebelião», de 1984, «A Minha Tropa Foram os ‘Rolling Stones’», de 1989, «Agricultura Celeste», de 1992, «Loas à Lua», de 1996, «O Livre e a Lavra», de 1999, «Ignota Fauna», de 2005, «Liber Mundi», de 2016, em co-Autoria com Filipe de Fiúza, e, ademais, «Duma Oração Portuguesa», de 2019.


DÉCIMO ENCONTRO TRIPLOV