Deficiência é pobreza? Categorias de pobres

 

AIRES GAMEIRO


Neste dia internacional de pessoas com deficiência (3.12.20) gostaria de refletir sobre uma questão muito simples, agora que, quase todos os dias, se fala de pobres: quem é o pobre? A categoria pobre de meios de subsistência mistura-se com outras categorias de pobreza. Que é ser pessoa pobre? Só os pobres das instituições, os que já têm uma pensão social ou outra ajuda em dinheiro ou em géneros, casa ou roupa? E esses ainda são pobres? Quanta ajuda será necessária para deixar de ser pobre? Mas, agora, volto à questão do título: as pessoas com deficiências são pobres? Na verdade a categoria pobre parece transversal a muitas situações e condições pessoais e sociais. Contudo, as categorias que já recebem alguma ajuda por serem pobres ou deficientes de qualquer coisa, nem sempre deixam de ser pobres. Em todas as categorias, pessoal e socialmente desfavorecidas, haverá alguns pobres e haverá pessoas de vida sustentável e…faltam as palavras: miseráveis? Repete-se pobres e ricos, mas há outros graus de níveis económicos intermédios. Dizer indigente, classe baixa, média, média-alta e alta não é a mesma coisa. Com exceção de indigente, em qualquer destas classes pode haver ou não pobres de alguma coisa. As pessoas com deficiências podem pertencer a qualquer classe e ser ou não ser pobres? E os que não têm emprego, e têm alguma deficiência? Dirá alguém, com razão, alguns tem emprego e são pobres, alguns tem casa e são pobres, alguns têm deficiências e são pobres, e outros podem não ser. Os que não têm família podem ser e não ser pobres. Quantos nomes têm os pobres? Serão só aqueles que não têm meios de subsistência por direito próprio (respeitado)? A economia de morte, como diz o Papa, faz pobres de bens, alimento, roupa, cuidados de saúde, escola, casa (abrigo), emprego, dinheiro. Mas há ainda pobres de identidade, sem nome, os “ zés ninguém”, insignificantes; pobres de dignidade, desclassificados e descartados (sem classe), sem liberdade religiosa e sem acesso à prática religiosa. Há os privados de meios e direitos, devido às categorias a que pertencem, e empurrados para a pobreza. Coitados, subentende-se, são daquela religião, raça, etnia, casta, nação — não podem ter emprego, acesso a ajudas, são pobres. Numas categorias haverá mais pobres, noutras, mais ricos. Será que mais multimilionários, mais pobres, segundo o dito: os ricos fazem os pobres. Se vive nesse bairro; nessa favela; na rua; se é órfão ou abandonado — será pobre por pertencer a essa categoria. Se é cego, deficiente mental, se tem outra deficiência limitante, criança abusada, se é jovem vendida para a escravatura moderna, se é um idoso só — podem ser pobres, mas de quê? Podem não ser pobres de meios de subsistência. Mas é certo que há os pobres de familiares, de amigos, companhia; pobres de saúde, por doença, por falta de saúde mental; pobres por dependência de… álcool, droga, jogo… E podemos acrescentar: há os pobres e cuidadores da pandemia, os pobres de Cabo Delgado (Moçambique), os Rohingas, os negros de…. Neste dia de pessoas com deficiência, o Papa veio também lembrar que há pessoas com deficiência que são privadas de receber os sacramentos cristãos. O Papa reafirma a exigência de oferecer – de forma gratuita – instrumentos idôneos e acessíveis para transmitir a fé, de tornar as pessoas com deficiência em catequistas e de fazer crescer nos fiéis um “estilo de acolher” para enriquecer a vida das comunidades: “todas as celebrações litúrgicas da paróquia deveriam estar acessíveis para que cada um possa viver a sua fé” ( cf. Andressa Collet – Vatican News). Permitam que conclua dizendo que há pobres de tudo, (a muitos até roubam a vida antes de nascerem), e pobres com mil deficiências e carências de coisas preciosas, e que podem não ter falta de dinheiro para a vida. Jesus Cristo veio e vem no Natal para todos os pobres e todos os que os ajudam.


Funchal, 03.12.2020, Dia Int. de pessoas com deficiências

Aires Gameiro