Da necessidade da mudança de uma política multicultural para uma política intercultural

 

ANTÓNIO JUSTO


O ATENTADO NA CATEDRAL DE NICE “NÃO É LUTA DO ISLÃO CONTRA O CRISTIANISMO”!

Esta é a terceira vez que terroristas muçulmanos, desde 2015, atacam a França causando um total de 270 pessoas mortas.

Desta vez, o assassino tunisino de 21 anos Brahim Aoussaoui, chegado à Europa a 20 de setembro através da ilha italiana de Lampedusa, realizou um ataque à Catedral de Nice (pelas 9 horas, 29.10.2020). Esfaqueou várias pessoas e vitimou mortalmente, duas mulheres e um homem (uma das mulheres, Simone Silva, era uma brasileira imigrada há 30 anos); uma das mulheres foi degolada; o assassino gritou várias vezes “Alá é grande”!

No mesmo dia à noite, no Hermannplatz, Neukölln, em Berlim, cerca de 150 pessoas, na sua maioria homens fizeram uma manifestação contra políticas acusados pelo presidente turco de islamofobia.

O atentado de Nice aconteceu na sequência de o Presidente turco, Erdogan, ter difamado o presidente francês (e acusado políticos ocidentais de islamofobias) e ter ainda apelado aos seus correligionários para boicotarem produtos franceses (1).

Na sua crueldade, o acto lembra um ataque numa igreja em Saint-Etienne-du-Rouvray na Normandia em julho de 2016, pelo qual o “Estado Islâmico” Terormiliz tinha assumido a responsabilidade. Nessa altura, um assassino cortou a garganta do clérigo Jacques Hamel, de 80 anos, na igreja.

No dizer do bispo do Porto “o atentado, na catedral de Nice, não é luta do Islão contra o Cristianismo”! O bispo quer assim impedir que haja cristãos que desenvolvam agressões contra o islão e afastar a ideia que alguns poderiam ganhar de que haja guerra entre religiões.

Trata-se, porém, de um atentado contra a cultura ocidental, em nome do Islão com o grito “Alá é grande „e, como tal, supera também o significado religioso. Estamos numa era de passagem da luta territorial entre nações para a luta de guerrilha entre culturas e ideologias (isto também no sentido de uma perspectiva globalista favorecida já não pela guerra, mas pela guerrilha). O atentado, ao ser perpetrado numa catedral, é também contra o cristianismo, dado este ser tomado como o símbolo da cultura ocidental! Os islamistas lutam aqui pela supremacia da cultura árabe e incomoda-os profundamente certos valores ocidentais (“valores republicanos”). Também há responsáveis muçulmanos que acusam o Cristianismo de ser conivente com um Estado secular que consideram antirreligioso. Aqui será de todos, independentemente do aspecto secular ou religioso de cada um, se erguerem contra a barbaridade que persiste em ameaçar a Europa e nela todos os seus habitantes. Seria lamentável se grupos oportunistas se aproveitassem para justificar o caso, com comparações de outrora que não têm nada a ver com o caso.

A postura de Macron relativamente aos cartoons controversos sobre Maomé foi boa na medida em que defendia valores humanistas ocidentais e a necessidade dos muçulmanos se integrarem, mas não foi cautelosa ao ser feita de maneira a ferir ou ofender os sentimentos religiosos dos muçulmanos! Que a nossa liberdade se tenha habituado a ridicularizar Jesus Cristo, o Papa e outros símbolos cristãos, isso deve-se visto como abuso e também como tolerância/indiferença dos cristãos em relação à ofensa dos seus símbolos, mas não justifica o hábito de ridicularizar os símbolos ou crenças de seja quem for!

Este é o terceiro ataque em dois meses, em França. Na sequência do ataque o primeiro-ministro francês, Jean Castex, elevou o nível de alerta terrorista em todo o país, para o nível “emergência atentado”. A segurança de edifícios, transportes e locais públicos foi elevada de maneira a serem colocados 7.000 militares nas ruas!

A política europeia multicultural, até agora seguida, manifesta-se como falhada, ao defrontar-se com uma cultura de tendência hegemónica. Daí a necessidade de uma política intercultural para se evitar a preparação de guerrilhas resultantes de um multiculturalismo desregulado num determinado biótopo cultural. Interculturalidade, complementaridade, bilateralidade e transversalidade são os elementos possibilitadores de paz e de futuro sustentável.

Desta vez como de outras a culpa não será do electricista!


O PRESIDENTE TURCO DUVIDA DA SAÚDE MENTAL DO PRESIDENTE FRANCÊS

Como protesto Paris chamou de volta o seu embaixador em Ancara.

Depois do assassínio do professor Samuel Paty que tinha mostrado caricaturas de Maomé na aula e foi depois decapitado na rua por um islamista de 18 anos, Mácron defendeu a liberdade de expressão e pôs-se do lado daqueles que mostrem as caricaturas. Mácron disse ainda: “estaremos sempre do lado dos direitos humanos e dos valores fundamentais… A nossa história é a história da luta contra a tirania e o fanatismo. Vamos continuar”. Afirmou também que iria tomar mais a peito o extremismo muçulmano!

Como reacção, países árabes e a Turquia iniciaram um boicote de produtos; comerciantes na Jordânia, Kuwait e Qatar tiraram os produtos franceses das suas prateleiras.

O presidente turco Erdogan acusou o presidente francês de islamofobia, questionou a sua saúde mental e descreveu Macron, entre outras coisas, como um caso de doença que deveria submeter-se a um tratamento psicológico. Também criticou a Alemanha de racista e islamofobia por causa de uma investigação judicial feita numa mesquita de Berlim que foi investigada por alegada fraude de subsídios da Corona.

Sou de opinião que não se deve abusar dos sentimentos religiosos das pessoas, mas nada justifica a agressividade com que todo o mundo árabe e turco reagem contra os que o ofendem.

Segundo DER TAGESSPIEGEL, jovens islâmicos alemães celebram no Telegram o assassino russo-checheno Abdullah Anzorov que se tornou num ídolo e modelo para militantes islâmicos.

Erdogan está também insatisfeito pelas sanções da EU contra a Turquia devido ao conflito entre a Grécia e a Turquia sobre a prospeção de gás e petróleo no Mediterrâneo oriental. O presidente francês pôs-se ao lado da Grécia e de Chipre.

O presidente turco, porque sabe do apoio de milhões de turcos na Europa, avisou o presidente francês: “Não tente uma querela com o povo turco”!  Ele está também consciente da atração da Turquia como grande potência de mercado para a Europa com os seus 80 milhões de habitantes; sente-se seguro porque sabe da fraqueza dos europeus mais interessados no negócio que na defesa da sua cultura. A Turquia sente-se como a defensora e ampliadora do islão também no conflito contra a Arménia.

Como se nota basta um pequeno contencioso e facilmente temos uma situação de guerrilha na Europa. A liberdade de expressão não pode ser celebrada, como fez a revista cartoon “Charly Hebdo”, de maneira a ferir os sentimentos das pessoas. Isto também não justifica o terrorismo, mas é um terreno fértil para os extremistas.

A civilização ocidental está em desvantagem em relação à civilização árabe porque enquanto esta se identifica com a sua cultura (sobretudo religiosa) os políticos ocidentais, em geral, estão interessados sobretudo no comércio e comportam-se como os vendilhões no templo! Erdogan considera as mesquitas como postos avançados do islão em terreno alheio!

É sintomático o facto de os países europeus não tomarem medidas conjuntas contra o extremismo muçulmano!


António da Cunha Duarte Justo

Pegadas do Tempo, https://antonio-justo.eu/?p=6167