"Condenados, assassinos proscritos, fascinados por ela, convertemos a
morte em espetáculo e narrativa; ela não cessa de frequentar nossas
representações; talvez não exista representação a não ser a dela. Como
sacerdotes, presidimos as cerimônias fúnebres; como guerreiros,
conquistadores ou defensores, nós matamos; como agricultores, enterramos
a semente; como pastores, criamos carneiros para depois sacrificá-los.
Preces, conflitos, nutrição, nossas práticas engendram a morte. Nossos
saberes também: teriam eles existido sem que tivéssemos diante de nós,
cativo em nossas mãos, um objeto imobilizado, o esqueleto de um esboço,
um conceito fantasmático... sem que transmitíssemos sua sombra de
geração em geração?
Os
cadáveres nos perseguem de tal maneira que, a todo instante, assombram
as telas de televisão no interior da caverna dos nossos quartos de
dormir.
Objeto: morte, túmulo, estátua, idéia,
fantasma"
Michel Serres Ramos
Ed Bertrand Brasil |