Criticar não ofende

 

 

 

 

 

 

NICOLAU SAIÃO


CRITICAR NÃO OFENDE, COMO SE DIZ USUALMENTE

Durante muitos anos, num trabalho de sapa a que certos fideístas deram larga cobertura, os membros do Poder tentaram usar – ainda que em democracia formal – para com os que criticavam o estado de coisas com princípio, meio e fim um truque muito conhecido: essas pessoas eram gente que com nada se contentava.

Assim agiu, exagerando na repressão, no passado o salazarismo. Assim depois, de forma mais arteira, hipócrita e mitigada (pois começavam as barbas a arder-lhes) o tentaram os partidários do chamado marcelismo, usando a célebre frase feita (recordam-se?) “Aceitamos críticas desde que sejam construtivas”, ou seja, as críticas que lhes convinham por nada porem em causa e nada modificarem. E ainda, por vezes, a alguns incautos, lhes aproveitavam as ideias ingenuamente dispensadas, como se fossem deles…

Mais atrás, nos tempos de subida ao poder, também assim procederam os nazis, que logo transmutaram, assim que se apanharam no poleiro, as falsas proposições em algo mais consistente, ou seja prisões e campos de concentração.

Outros, mais “progressistas”, usavam os “campos de reeducação”.

O que se visava era, claro, extinguir o senso crítico. Se não resultava, numa primeira fase, passava-se à segunda: campanhas de difamação, ou calabouço para os sectores mais renitentes.

Neste momento, de há uns tempos a esta parte, o truque sofreu nuances: privilegia-se, nos locais expressos em que ainda se consente nos exprimamos, as “críticas” ora de cariz pseudo-humorístico (roçando o desbocamento e o desabafo reles), ora o discurso estapafúrdio que por si mesmo se desbanca por apalhaçado mas permite, depois, que os tratantes de serviço venham neutralizar as parlengas mediante o tom ora pseudo-académico, ora de estatuto “consciente” e “ponderado”.

E é assim que, em determinados fóruns que foram surgindo um pouco por todos os mídias, frequentemente se ocultam textos críticos racionais e informados, deixando vir a lume ora a “macacada”, ora o desconchavo, ora o insulto até de cariz pornográfico.

Mas como o espaço interactivo tem mais que um compartimento, para além do dominado por esses cavalheiros, a pouco e pouco isso descortina-se com soma de pormenores.