Chico Buarque foi flagrado beijando uma morena no Leblon. Pintou como um escândalo, o episódio. Mas o que está por trás disso? O fato de se tratar de um artista do mais alto valor que sempre impediu que fosse invadida a sua privacidade. Aqui, portanto, o principal problema: o público e o privado. A mídia quer tudo do bom artista, vende-o permanentemente. Quando ele se destaca na produção de uma obra, aplaude-o, aperreia-o, alimenta-lhe o ego. Mas quando recua, ricocheteia, ela apronta. Projeta/explora a imagem mais vendável que aparecer. Chico, já faz algum tempo, ricocheteou, pulou fora da mídia. Por isso ficou ainda mais vulnerável a ela. No final dos anos 60, foi associada ao artista a imagem de "bom moço", filho de (boa) família que toda mãe queria ter. Depois, foi sendo agregada a essa imagem uma outra, a do artista competente, engajado. E Chico ficou como expressão de beleza (as mulheres ainda o adoram), talento e engajamento político. Agora um certo Chico "maldito", que persegue a mulher alheia, acontece. E a mídia não poderia, como sempre, deixar de palpitar, de plantar-se na praia de tão pomposa celebridade. Mas o ídolo não se borrou, pelo que percebi. Uma fã dele me escreveu (pegou meu e-mail no livro Chico Buarque do Brasil, que organizei) dizendo sentir-se a própria "morena flagrada". O Chico "maldito" parece recobrar desejos recônditos do seu público feminino.
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A coluna "Rodapé" consta de um único parágrafo contendo um comentário crítico acerca de um autor, um romance, um conto, um poema, uma cena, um personagem, enfim, sobre um aspecto da literatura. É publicada mensalmente no Rascunho , de Curitiba/PR, e semanalmente no Correio das Artes , de João Pessoa/PB. |